O cinematógrafo "Salon Chiado" foi inaugurado em 25 de Dezembro de 1906, na Rua Nova do Almada, 116 (numa loja do edifício dos "Grandes Armazéns do Chiado"), em Lisboa, tendo sido seu proprietário a firma "Varona & C.ª" de Raul Lopes Freire. O "Salão Chiado" tinha acesso, pelo interior dos Armazens, através do ascensor.
Loja que o "Salão Chiado" tinha ocupado (dentro da área delimitada a vermelho)
Começo por transcrever uma passagem do livro "Do Rocio ao Chiado" de João A. Pestana de Vasconcellos, e publicada pela "Parceria Antonio Maria Pereira" em 1912:
Passar a noite por seis vintens e a solução do problema do goso para muito mènage alfacinha.
D'ahi estas violentas batalhas travadas a porta dos animatographos de Lisboa, principalmente aos domingos e dias de recita da moda.
N'esta conjunctura o alfacinha bate-se; mas bate-se heroicaraente.
Collocado face a face com a porta d'um animatographo, o alfacinha vê n'ella um baluarte a conquistar; o sangue dos Albuquerques, dos Castros e dos Gamas começa a ferver-lhe la por dentro, e armado d'uma bengala de doze vintens e com um quadradinho de papel na mao, assalta-a com tanta bravura e galhardia como os seus antepassados assaltavam castellos.»
O jornal "A Vanguarda" em 24 de Dezembro noticiava a sua inauguração:
Os quadros expostos são de completa novidade entre nós, principalmente o do nascimento de Jesus, a côres, um soberbo trabalho em photographia animada.»
Por outro lado e em 29 de Dezembro o "Diario Illustrado", descrevia a inauguração do "Salon Chiado":
A entrada é diminutissima, 60 réis apenas, o Salão tem tambem entrada pelo ascensor dos Armazens do Chiado.»
Um artigo, acerca do percurso cinematográfico de Raúl Lopes Freire, proprietário desta Salon, e publicado no jornal "Folha de Lisboa" de 19 de Novembro de 1916, e da autoria do seu diretor e proprietário José Faria Picão, enaltecia as suas qualidades:
«Já vão passados quinze anos, que ao lado de Raul Freire estavam alguns amigos, (entre elles quem escreve estas linhas) discutindo, e apreciando algumas, variedades que se exibiam n'essa noite, na vasta pista do Colyseu dos Recreios; Raul Freire que foi sempre um grande enthusiasta pelo teatro, via-se pelas suas opiniões, pelas suas ideias, que estava ali um grande e activo emprezario, e n'uma dessas noites em que assistia ao espectaculo, disse: "vocês ainda me hão de ver com um cinema", e se bem o disse, bem o fez. Passado algum tempo, montava na rua do Almada, um cinematographo intitulado Salão do Chiado; era uma pequena sala onde, Raul Freire conseguiu reunir um publico escolhido, e foi tal a sympatia que adquiriu, pela sua activa e boa gerencia, que sentia-se acanhado. (...)» a continuar no final deste artigo.
Raul Lopes Freire viria a ser: empresário cinematográfico; proprietário de salas de cinema; distribuidor de filmes; produtor; realizador. Viria ser agraciado, pela presidência da república, com a comenda da classe de mérito industrial.
1908
Para dar uma ideia do interior dos animatógrafos ou cinematógrafos da época, aqui ficam 3 fotografias:
Em 31 de Dezembro do mesmo ano de 1906, apontamento encorajador:
Todos os quadros foram delirantemente applaudidos, salientando-se a "Pobre Mãe" e "Desesperada" o magnifico quadro a côres "Nascimento de Jesus", e os desopilantes quadros "Em férias", "Estreia de um chauffeur" e "Estudantes em Paris".
Hontem inauguraram-se as "matinèes" com sessões da 1 hora da tarde ás 5, continuando as sessões á noite das 6 e meia á meia noite.
Na proxima semana serão exhibidos novos quadros, entre eles o grande quadro a côres "Carnaval de Veneza".»
Passado um ano e meio da sua inauguração em Dezembro de 1906, e uma nota gratificante no jornal "A Nação" de 13 de Agosto de 1908:
«Não diminuem as enchentes néste bello salão, o que não admira, visto a excellencia e novidade das suas fitas, destacando-se a de "D. Juan Tenorio", que tão grande sucesso tem alcançado. Além d'isso, nos intervallos, o popular e estimado actor Silva Lisboa, com as suas cançonetas, o que ainda mais interessante torna este salão.»
Pelo que transcrevi e publiquei, facilmente se deduz que o espaço do "Salão Chiado" já era mui exíguo para a demanda, pelo que retomo o artigo da "Folha de Lisboa" ...
« (...) A multidão de espectadores era imensa, precisava de um salão maior, com comodidades, luxo e bom gosto, e desenvolver a cinematographia. Foi então quando constituiu uma sociedade para se inaugurar na Praça dos Restauradores um outro cinema, o Salão Central.»
E o novo "Salão Central” propriedade de Raúl Lopes Freire, distribuidor de filmes, através da sua empresa “Empreza Portugueza Animatographica Limitada” constituída por: Arthur Gotschalk, Raul Lopes Freire e seu irmão Augusto Freire, Carlos Ribeiro Nogueira Ferrão, Alberto Coutinho Freire e Jaime Guerra da Veiga Pinto. Instalou-se no Palácio Foz, na Praça dos Restauradores em Lisboa, (por debaixo do "Salão Foz", inaugurado em 27 de Março de 1908 pela firma "Freire & Ereira") e foi inaugurado em 18 de Abril de 1908.
Apesar da abertura deste novo cinematógrafo nos Restauradores, o "Salão Chiado" continuou aberto à sua clientela habitual sempre com boas performances de bilheteira. Contudo, no final de 1908 Raul Lopes Freire decidiu pôr fim ao curto, mas brilhante, percurso do "Salão Chiado" para se dedicar exclusivamente à exploração, mais rentável, do novo "Salão Central", mais tarde "Central Cinema", e também do "Salão Foz" que era co-proprietario com José Nunes Ereira, através da empreza "Freire & Ereira", como atrás referido.
20 de Novembro de 1908
Em 25 de Agosto de 1988 o violento incêndio do Chiado devorou o edifício dos "Grandes Armazéns do Chiado" e com ele o nº 116.
fotos in: Hemeroteca Digital de Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa, Biblioteca Nacional Digital,
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