Restos de Colecção

5 de novembro de 2025

F. H. d'Oliveira & C.ª, Lda.

A empresa " F. H. d'Oliveira & C.ª, Lda." foi fundada em 16 de Novembro de 1895 em Lisboa, com a denominação inicial de "Francisco Henrique d'Oliveira & C.ª (Irmão)", constituída inicialmente por Francisco Henrique de Oliveira e seu irmão José Vicente de Oliveira.

Para entendermos melhor a sua criação e desnvolvimento até ao início de 1907, reproduzo excerto de um artigo publicado no jornal "Vanguarda" de 31 de Março de 1907:

«Em materiaes de construccão é já por demais conhecida a casa de F. H d'Olivelra & C.ª (Irmão), por ser já uma das mals importantes de Lisboa. Data a sua fundacão de pouccos annos, pols apenas em 1900 é que se constituiu a sociedade com aquelle nome, e este facto de uma curta carreira é de per si eloquente para aqullatar-se de quanta somma de esforco e de aplidão excepcional não implica a evolução progressiva dada aos differentes ramos industriaes dirigidos pelos dois unicos societarios. (...)

A casa de F. H. d'Ollveira & C.ª (Irmão), progredindo n passos gigantescos desde que se fundou, e já hoje um foco de expansão industrial que muito honra o espírito de Iniciativa que a domina. Tem a sua séde principal na rua 24 de Julho, n. 620 a 632, onde se encontram os escriptorios o gabinete da direccão e o mostruario de artigos de ornamentacão e sanitarios, recentemente inaugurado, e exposto artisticamente em um salão elegante e admiravel, e occupando tudo um conjuncto em que predomina o bom gosto e o esplrito de seleccão que houve nos especimens representados e toda a esthetica da installação. Em outras dependencias contiguas estão alguns depositos de materiaes, e no terreno fronteirico, situado na outra parte lateral da mesma rua, existem os grandes depositos de madeiras pertencentes ao estabelecimento. Ha ainda um outro terreno, ultimamente adquirido na mesma rua e que contorna com a rua Tenente Valadim, local que esta servindo de vasto deposito de cantarias e de outros materiaes.


Primitivas instalções na Avenida 24 de Julho, 620-632, em Lisboa

 


Carro alegórico no desfile carnavalesco de 1902, na Avenida da Liberdade

No casal do Alvito. em Alcantara, opera-se a exploração de pedrelras e a produccão de cal sendo este genero alli produzido de modo que nenhum outro com elle rivaliza, tal é o aperfeiçoamento moderno do processo de fabrico a que se sebrepõe a condição do prodocto permanecer em repouso absoluto por muito tempo para se considerar bem acabado e proprio para a consistência e solidez das construccoes. A identicas normas obedece a esmerada e escrupulosa fabricação da cal em pedra, cuja preferencia ja se impoz para trabalhos em estuque e no tratamento de vinhas.

Para avaliar a capacidade productora d'esta fabrica, basta dizer-se que apesar das repelidas requisições para consumo no paiz e para embarque com destino as Ilhas, Africa e Brazil, ha sempre depositos de mais de mil metros cublcos de cal.

A unica fabrica de cal nacional que ate hoje obteve no estrangelro uma recompensa honrosa, foi a de F. H. d'Oliveira & C.ª (Irmão), sendo-lhe conferida a medalha de prata no ultimo certamen da exposicão de S. Luiz.

Outras installações existem ns vastíssima propriedade do Casal do Alvito; referimo-nos especialmente as fabricas de polvora, de archotes e de cordas de esparto, que sao outros tantos elementos de laboração fabril por onde se distribue a louNavel e vertiginosa diligencia dos fins industriaes que os dois irmaos attingem n'um amplexo de boa harmonia e de inquebrantayel estima.

Por ultimo, em Paco d'Arcos, possui a Sociedade o deposito e as pedreiras de cantaria em continua exploracão.


5 de Setembro de 1903


1905


1 de Agosto de 1907


31 de Março de 1907

A firma Oliveira & Irmão, como vulgarmente e conbecida no nosso meio industrial, fornece de madelra de todas as qualidades e outros materiaes de construcção, sempre em concorrência de precos, os arsennaes de marinha e do exercito, obras publicas, camaras municipaes, Penitenclaria, caminhos de ferro, o que lhe permilte fazer com vantagens apreciaveis para esses importantes consumidores, como de resto a todas as emprezas particulares de construcção, em virtude das grandes compras feitas pela mesma firma em condições vantajosíssimas.»


1909

Loja na esquina da Rua do Comércio com a Rua da Madalena, em Lisboa

E a mesma loja no anúncio seguinte ...


1915


1916

Em 25 de Abril de 1933 a empresa "ENAE - Empresa Nacional de Aparelhagem Eléctrica, S.A.R.L.", inaugura a fábrica de "Lâmpadas Lumiar", na antiga estancia de madeiras, armazém de ferroestabelecimento de ferragens e ferramentas, drogas, tintas,  produtos químicos e farmaceuticos da "F. H. d'Ollveira & C.ª , Lda.", instalados no edifício da Avenida 24 de Julho, 158, ao lado do edifício-sede da empresa.


Edifício onde funcionaram os armazéns e oficinas de madeiras, alienado à fábrica de "Lâmpadas Lumiar" (ambas as fotos)


Armazéns da "F. H. d'Oliveira, & C.ª, Lda.", dentro do rectângulo amarelo. A empresa "Pinhol" no edifício de esquina 

Já em 1945, o livro "Praça de Lisboa" publicou uma resenha histórica desta empresa da qual retirei os seguintes trechos:

«A 16 de Novembro de 1895 - há, portanto, quasi meio século - Francisco Henrique d'Oliveira fundava em Lisboa, com seu irmão José Vicente d'Oliveira Júnior, a firma Francisco Henrique d'Oliveira & C.ª (Irmão), a qual pouco tempo decorrido, se transformou em F. H. d'Oliveira & C.ª (Irmão).

O objecto da sociedade, cujo capital não ia além de 50$000 Réis (Esc. 50$00), era o comercio de compra e venda de materiais de construção e a exploração duma pedreira e dum ainda mais modesto forno de cal.

O incremento que, desde logo, tomaram os negócios da firma levou a abrir um estabelecimento na Rua (actualmente Avenida) 24 de Julho, nº 96. A lisura dos seus actos e a maneira cabal e pronta com que satisfazia todos os pedidos e encomendas que lhe eram dirigidas depressa criaram a F. H. d'Oliveira & C.ª (lrmão) renome e prestigio e impuzeram-lhe a necessidade de alargar o seu campo de acção a outros ramos de comercio, dos quais, aliás, qualquer dos proprietários possuia suficiente conhecimento.

Assim é que, à instalação duma Sucursal em Paço d'Arcos, incluindo exploração de pedreiras e oficinas de cantarias, se seguiu a criação da Estancia de Madeiras, do Armazém de Ferro, do estabelecimento de Ferragens e Ferramentas e do de Drogas, Tintas e Produtos Químicos e Farmaceuticos.

Em resultado da saída do irmão do patrono da firma, esta foi modificada para F. H. d'Oliveira & C.ª, L.da, continuando sob a direcção e gerência exclusivas de Francisco Henrique d'Oliveira que, apesar de sósinho no exercício de tão delicada e absorvente tarefa, não deixou de dar sobejas provas da sua excepcional capacidade administrativa, imprimindo à firma novas e amplas perspectivas.

No intuito de corresponder à simpatia da clientela do Norte do País, onde obtiveram lisongeira preferência, F. H. d'Oliveira & C.ª L.da., instalava, em 1916, uma filial no Pôrto, com sede na Rua do Almada 243-245. Tambem nessa cidade a sua actividade se desenvolveu de tal forma que foi indispensável alargar os seus ramos de negócio e aumentar as instalações, para o que adquiriu um prédio na Rua Nova da Alfandega e construiu outros na Rua de D. Pedro V, ao mesmo tempo que passou a ocupar as lojas da Rua do Almada, 243 a 253.


13 de Maio de 1922

A firma F. H. d'Oliveira & C.ª L.da, que, êste ano, comemora as suas bodas de ouro, tem, actualmente, o capital de seis mil contos e são seus únicos sócios Francisco Henrique d'Oliveira e seus filhos Francisco Henrique d'Oliveira Júnior, António Leitão d'Oliveíra, D. Maria Júlia Leitão d'Oliveira Quina Ribeiro e D. Fernanda Rosa Leitão d'Oliveira Costa Pina, sendo os dois primeiros dedicados e dignos continua dores da obra de seu Pai.


Francisco Henrique d'Oliveira

 

                                    Francisco Henrique d'Oliveira Júnior                   António Leitão d'Oliveíra


16 de Novembro de 1945

Dispondo de sólidos recursos, representados por vastos e variados sortidos de mercadorias e por valiosas propriedades urbanas e rústicas, situadas em Lisboa, Pôrto, Paço d'Arcos, Cascais, Murtal, Porto Salvo, etc., a firma que, em 1895, iniciara a sua actividade com o insignificante capital de cincoenta mil reis, é agora uma poderosa organização comercial e a demonstração evidente das excepcionais qualidades de trabalho, iniciativa e honestidade do seu fundador, Francisco Henrique d'Oliveira. Êste, que continua ainda a gerir e a orientar superiormente a casa, é um prestigioso elemento da praça de Lisboa, onde varias vezes tem exercido o cargo de Director da Associação Comercial de Lisboa e da Associação Industrial Portuguesa. Desde há longos anos que, ininterruptamente, preside, na primeira destas entidades, à Secção de Materiais de Construção, e, na segunda, à Seccão de Pedreiros, Cal, Cimento e Gêsso, aí desenvolvendo uma actividade e zêlo verdadeiramente exemplares.»


Julho de 1940

Nos anos 40 do século XX o grande edifício-sede da empresa é alugado à General Motors Overseas Corporation - Lisbon Branch”, que ali instala seu stand e serviços.

Lembro alguns dos negócios, aém de investimentos no imobiliário, em que a empresa "F. H. d'Oliveira & C.ª Lda," expandiu a sua actividade:

Em 1931, inaugurou o seu stand de automóveis americanos "DeSoto" e camionetas, igualmente amaericanas, "Fargo", na Avenida 24 de Julho, 68, em Lisboa.


Notícia da inauguração, na revista "Notícias Ilustrado"


Cerimónia da inauguração



1940


16 de Fevereiro de 1949

Em 28 de Maio de 1957, inaugura o "Hotel Residencial Infante Santo" na Avenida 24 de Julho, em Lisboa, no terreno ao lado onde funcionaram os seus armazéns até aos anos 40 do século XX.

"Hotel Residencial Infante Santo", na esquina com a Avenida Infante Santo, em foto de 1957, ano da sua inauguração

A empresa "F. H. d'Oliveira, & C.ª, Lda.", com sede actual na Calçada de Marquês de Abrantes, 42-56, em Lisboacontinua jurídica e financeiramente activa. o seu CAE é de «Atividades dos agentes do comércio por grosso de madeira e materiais de construção» Aqui deixo alguns últimos anúncios publicitários a que tive acesso:


1964

1 de Janeiro de 1969

Instalações actuais da "F. H. d'Oliveira, & C.ª, Lda.", na Calçada de Marquês de Abrantes, 42-56

Entretanto as antigas instalações da "F. H. d'Oliveira, & C.ª, Lda.", na avenida 24 de Julho foram totalmente recuperadas. Na primeira década do século XXI, foram transformadas num condomínio de luxo, projectado pelos arquitectos Raúl Abreu e Miguel Varela Gomes. A antiga fábrica de "Lâmpadas Lumiar" foi completamente restaurada sob a responsabilidade do engenheiro João Appleton, tendo sido mantidas as fachadas dos anos 20 do século passado. Numa das fachadas existe um painel de azulejos, da "Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, Lda.", fundada em 1848, no Largo do Intendente, em Lisboa.

fotos in: Hemeroteca Digital de Lisboa,Arquivo Municipal de LisboaBiblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais)

2 de novembro de 2025

Salão Império

Segundo os jornais da época o "Salão Império" terá aberto as suas portas pela primeira vez em 3 de Fevereiro de 1914, na Rua Pascoal de Melo, 63, à Estefânia em Lisboa. Propriedade da firma "Lopes & Rogado" funcionava como animatografo e salão para concertos e festas, tendo sido apelidado de «cinema de elite».

A seta a vermelho indica o edifício, na Rua Paschoal de Mello onde funcionava o "Salão Imperio"


3 de Fevereiro de 1914

Funcionava às Quintas-Feiras, Sábados e Domingos sendo as sessões às 20:30 e 21:45 com matinés às 15:00 ao Domingo. Foi percursor na venda de bilhetes com antecedência para garantir lugar reservado na sessão pretendida, assim como a distribuição de folhetos programa. Lembro que na época não havia lugares marcados nos animatógrafos. Na maioria deles os bancos eram corridos e os espectadores sentavam-se por ordem de chegada.


Ambos os folhetos de 1914


Aqui ficam alguns apontamentos publicitários, publicados no jornal "Folha de Lisboa" o longo do ano de 1917:

«Fitas de grande valor nitidamente projetadas e concertos por artistas de subido valor.»

«Todas as noutes este elegante salão é fartamente concorrido pelas novidades que continuamente apresenta mostrando assim a empresa corresponder dignamente á boa vontade que a anima. Para breve se anunciam novos atrativos que o publico saberá certamente apreciar e aplaudir.»

«Sessões animalograficas com peliculas de maior novidade que aparecem. Este Salão, aliás já consagrado não precisa senão de uma leve referencia porque o seu nome esta feito.».

«Películas de absoluta novidade e do maior interesse. O salão Imperio capricha por agradar, o que tem conseguido plenamente.»

«Sempre com estreias continuas, tem conseguido obter enchentes e reunir um publico escolhido, esta magnifica casa do cinematographia, da Rua Pascoal de Mello, sendo os seus espectaculos ás quintas, sabados e domingos, com films extraordinariamente variados.»


1 de Janeiro de 1916


11 de Fevereiro de 1917

Ao contrário de outros animatografos que abriam e fechavam no espaço de um ano e meio de existência em média, este ainda conseguiu funcionar até Setembro de 1917, segundo, também, publicidade da época a que tive acesso, em que o "Salão Imperio" desaparece dos cartazes a partir de 22 de Setembro de 1917. Como dia 21 foi uma 6ª feira, penso que terá funcionado até Domingo dia 23. Isto são deduções minhas ...


21 de Setembro de 1917

28 de outubro de 2025

"Grande Café Nacional"

O "Grande Café Nacional" foi inaugurado em 9 de Junho de 1924, na Rua 1º de Dezembro, 55 a 65, esquina com a Calçada do Carmo, em Lisboa. Propriedade da firma "Sociedade de Cafés 1º de Dezembro, Lda.", foi projectado pelo arquitecto Deolindo Leite Pereira Vieira (1877-1965), com as obras a cargo do mestre de construção civil António de Carvalho.


No espaço que este café veio ocupar, portas 55 a 65, tinha funcionado desde 1901 o estabelecimento de «pharmaceuticos droguistas» da firma "José Feliciano Alves de Azevedo & C.ª". 

1909


Loja da "José Feliciano Alves de Azevedo & C.ª" à direita na foto

Entretanto em Março de 1919, abre no nº 59 ao "Club Internacional". Propriedade de José Móra, era um club elegante, com a sala decorada ao estilo japonês, «enfim uma maravilha de bom gosto; um conto de fadas.»

«Soavam, duas horas quando se deu principlo á segunda parte do delicioso programma e que se compunha de variedades, entre os quaes é de justiça destacar a gentil e formosa baillarina Rozario Marcellino nos seus caracleristicos bailes flamengos. Já o sol ia alto e os vtolinos ganiam os ullmos accordes n'uma estonteante valsa quando terminou esta memonavel festa, depois d'uma ceia deliciosa, onde não faltavam tal allegria e enthusiasmo, tendo-se trocado ao «toast» affectuosos brindes, onde ficou.bem patente que a par de toda a animação hayja taiem um cunho inaudivel de sinceridade e amizade para com a maioria dos convidados.


1 de Abril de 1919

A Direcção d'este confortavel o elegante Club que não se cança em prorporcionar aos seus inumeros associados, tudo que é bello, decerto não se fará esperar muito em prorporcionar a todos os seus socios a amigos uma nova festa, para assim termos onde passar umas horas de prazer e alegria que nos façam esquecer os aborrecimentos da vida real.».

Este club viria a encerrar em 1922, altura em que é adquirido em conjunto com as lojas contiguas entre as portas 55 e 65, para aí se instalar o "Grande Café Nacional".

No dia da inauguração do "Grande Café Nacional" o jornal "Diario de Lisbôa" relatava:

«O maior café de Portugal

As pessoas que estão acostumadas a frequentar os grandes centros do estrangeiro olharam hoje como um acontecimento de caracter sensacional em cosmopolitismo, a inauguração do Grande Café Nacional, na rua 1.° de Dezembro.
Fica, de facto, sendo o grandioso estabelecimento um ponto de passagem agradavel para os frequentadores estrangeiros de Lisboa - que noutra casa lisboeta não encontraríam as condições, de grandeza, de bizarria e de alacridade tão gratas a quem esta habituado ao convivio dos grandes cafés no estrangeiro.
O Grande Café Nacional, que tem uma formosa, viva e harmoniosa decoração em motivos luzitanos dispõe de uma grande cave «Bar», onde os provadores de cerveja se refugierão, defendidos de todo o calor. Um serviço de Restaurant e um «tea-concert» são dirigidos ali por pessoas competentíssimas, que têm ás suas ordens pessoal habilitado e delicadissimo. Nao podem ser melhores os recursos de exito deste empreendimento que veiu honrar a vida de comunicação na grande arteria de Lisboa.»

Igualmente o jornal "A Capital", noticiava o acontecimento:

«Uma Esplendida Instalação de "café"

E' o que se observa na rua 1.° de Dezembro, 55 a 65, onde hoje se inaugurou o Grande Café Nacional. Na visita que lhe fizemos ontem, ficámos deslumbrados com o lançamento grandioso das linhas das portas e do enorme pé direito, invulgares nas construções na nossa Baixa e admirámos a inteligencia com que os construtores procuraram obter, por tolas as fórmas, e luz maxima. Com esta grandeza e esta luz resultantes de um projecto magnifico é que o novo estabelecimento é uma esplendida instalação de calé - sem se adulterar o adjectivo «esplendido», como soe fazer-se para aí.»


Arquitecto Deolindo Leite Pereira Vieira (1877-1965)

Quanto à sua decoração interior ...

«Toda a modulação decorativa - motivada em cardos e em folhas de carvalho - tem uma patine bronzeada e a estrutura geral do tecto, continente dessa decoração, é sustida por dois pilares e mísulas que ostentam escudos das principais cidades portuguesas. Os fundos das paredes são revestidos por painéis de azulejo, emoldurados nos referidos arcos envolvidos e encimados por "cartouches" decoradas com esferas armilares - insígnias dos estilos nacionais. Esses painéis, a azul e branco, devem-se à arte de Jorge Colaço e são em número de oito, representando Trás-os-Montes, por um pelourinho dos mais nobremente antigos; o Minho pelo castelo de Guimarães; o Douro, por um trecho do rio sob a ponte D. Maria Pia; a Beira Alta, pelo parque do Fontelo; a Beira Baixa por um pedaço da grande lagoa da Serra da Estrela; a Estremadura, por um fundo azul do Tejo em que se ergue a Torre de Belém; o Alentejo, pelo templo de Diana e o Algarve pelo promontório de Sagres.
A parte inferior das paredes é forrada por um lambri de mármore brunido, de um belo tom castanho claro, esculpido em cordame náutico. Os tons da pintura foram escolhidos entre os claros - alaranjado e lilás - o que aproveita a máxima reflexão de luz e harmoniza perfeitamente com o azul e branco dos azulejos. A iluminação nocturna é constituída por 22 "plafonniers" e 8 candeeiros triplos. Colocados nas pilastras, sob as mísulas.» (*)


Na cave, escavada em toda a extensão do estabelecimento, funcionava uma cervejaria e que além da comunicação interior, tinha outra particular pela Calçada do Carmo. O salão de bilhares, parte integrante do "Grande Café Nacional", funcionava no prédio ao lado, portas nos. 47 a 53.

Quanto ao exterior ...

«As fachadas do café,  são todas de pedra branca. A que olha para a Rua 1.º de Dezembro tem sobre as partes reentrantes os escudos citadinos de Lisboa e Porto, em magníficos relevos. É rasgada por três portas monumentais, com arcos duplos envolvidos. A que dá para a Calçada do Carmo tem esculpido o escudo de Coimbra e é rasgada por dois janelões emoldurados igualmente em arcos envolvidos. Tanto as portas como os janelões são em ferro forjado, trabalhado artisticamente, com "panneaux" de vitrais e com rosáceas que abrem, estabelecendo uma franquíssima e sempre renovada ventilação. A cor dominante dos vitrais é o amarelo- dourado que, com detalhes de azul e de vermelho, dá um equilíbrio suavíssimo à forte luz do ambiente.» (*)


"Grande Café Nacional" à esquerda na foto, com o seu concorrente "Café Madrid", em 18 de Agosto de 1941


6 de Junho de 1944

Nota: nas 2 fotos anteriores pode-se avistar no andar superior ao "Grande Café Internacional" a tabuleta dos "Armazem de Lanificios Lino" que ocuparam os pisos superiores do edifício desde 1924.


13 de Julho de 1937

Na esquina oposta da Calçada do Carmo e do mesmo lado da rua, jé existia o "Grande Café d'Italia", desde 1921, e que viria a ser substituído pelo "Café Madrid" nos anos 30 do século XX.

"Grande Café d'Italia"

Concebido para uma elite da sociedade lisboeta o "Grande Café Nacional" era um estabelecimento aparte, sendo frequentado por senhoras e grupos familiares que ali podiam assistir ao quarteto musical dirigido pelo professor José Henriques dos Santos quee todos os dias, à tarde e à noite, executavam diversos programas de concerto.


19 de Dezembro de 1924


31 de Outubro de 1925


1926



1928


1 de Março de 1930


2 de Dezembro de 1930

No período da II Grande Guerra Mundial (1939-1945), o "Grande Café Nacional" fechou, tendo reaberto em 12 de Junho de 1947, depois de grandes obras ali efectuadas sob a direcção do arquitecto Raúl Francisco Tojal (1899-1969) - que já tinha projectado o café "Palladium" na Avenida da Liberdade -, coadjuvado pelo construtor civil, e seu irmão, Diamantino Tojal (1897-1958). Continuava a pertencer à firma "Sociedade de Cafés 1º de Dezembro, Lda.". Aos sócios-gerentes fundadores Alberto de Assis Camilo e José Eduardo David Paiva, juntaram-se Augusto Rodrigues, Fernando José Ferreira, Luís Ferreira de Carvalho e Joaquim Martins.

12 de Junho de 1947

Quanto às alterações efectuadas na decoração do "Grande Café Nacional", o jornal "Diario de Lisbôa" elucidava:

«(...) No salão principal apenas ficaram os magnificos paineis de azulejo de Jorge Collaço e de duas colunas centrais. Tudo o mais é novo. As colunatas e florões das janelas desapareceram, o que melhorou consideravelmente a iluminação natural da vasta quadra. Aos tons escuros nas paredes, nos ornatos, no mobiliário, sucederam os tons claros, que dão ao conjunto beleza, harmonia e esplendor. Há aquecimento central, ventilação e refrigeração cuidadas, e a iluminação fluorescente permite manter, á noite, o ambiente nocturno.
Anexo ao grande salão de café fica o esplendido restaurante-bar, centro de elegancia e de comodidade, alegrado ainda mais por dois lindos quadros do pintor Julio Santos, e com um balcão de mármore, um excelente frigorifico e toda a aparelhagem moderna. O serviço de cozinha rivalizará com os melhores de Lisboa. A garrafeira marca situação de privilégio, pela qualidade e pela quantidade. O restaurante-bar tem duas portas independentes para a rua.
Ao lado do restaurante-bar há a barbearia, primorosamente montada, com quatro cadeiras modernissimas, muitos cromados e espelhos e uma aparelhagem sem rival. E também esta dependência do estabelecimento possui uma entrada privativa.
A cozinha foi alargada e dotada com um soberbo trem; são modelares os serviços de tiragem de fumo e de ar e a refrigeração e iluminação. A frasqueira é abundante. Estão repletos os armazens e depósitos. Nem, um pormenor foi descurado, para que o Grande Café Nacional se tonasse, no seu género, um estabelecimento modelar; e isso se deve ao notável esforço e tenacidade dos novos sócios da empresa, srs. Augusto Rodrigues, Fernando José Ferreira, Luís Ferreira de Carvalho e Joaquim Martins, e aos antigos sócios gerentes, srs. drs. Alberto de Assis Camilo e José Eduardo David Paiva; á direcção técnica do distinto arquitecto Raul Tojal e ao escrupulo com que Diamantino Tojal, construtor civil, executou os trabalhos.
No salão principal há lugar para 500 pessoas, em condições magnificas de conforto e de comodidade. Na cave é o amplo e arejado salão de bilhares, óptimo no Verão, porque é fresco, e óptimo no Inverno, porque tem, como as outras dependências, aquecimento central. Existem ali dez esplendidos bilhares, de tipo normal, e um para grandes competições de mestres. Vieram da América do Norte, e são de fabrico modelar.»


24 de Dezembro de 1960


"Grande Café Nacional" já muito sujo e degradado, em 1975

Quando ainda jovem, cheguei a frequentar ao fim de semana este café, na década de setenta. Era grandioso e muito confortável. Se não estou em erro, e aproveitando o elevado pé direito, já tinha sido construída uma mezanine. Ia lá propositadamente para beber um belíssimo chocolate quente ...

Depois de encerrado uns bons anos, veio a ser adquirido pelo "Celeiro", que já existia na Rua 1º de Dezembro desde 1974, e que para ali se mudou e lhe chamou "Celeiro 1º de Dezembro".


Julho de 2024, via "Google Maps"


(*) - in blog: "Coisasdeantigamente.marr"

fotos in: Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Hemeroteca Municipal de Lisboa,  Arquivo Municipal de LisboaHemeroteca Municipal de Lisboa,  coisasdeantigamente.marr