Restos de Colecção: maio 2024

26 de maio de 2024

Saboia

A loja de camisas, gravatas, cintas, espartilhos, artigos de moda para homem e senhora, etc. "Saboia" abriu em finais de 1933, na Rua Garrett, 66 e 68, em Lisboa. Veio substituir a alfaiataria e camisaria "Marques & C.ª ", que tinha promovido grandes obras de decoração exterior e interior em estilo «Art-Déco», em 1931 com projecto do arquitecto Jorge Segurado (1898-1990). Esta, por sua vez, tinha substituído a loja de flores "Lopes, Limitada"



1931


Decoração interior que viria a ser utilizada pela "Saboia" 

A firma "Marques & C.ª ", tinha vindo da esquina da Rua Garrett com a Calçada do Sacramento, no 1º andar por cima da "Antiga Casa José Alexandre". A entrada era pela Calçada do Sacramento, 6. Os seus sócios eram: Antonio Marques, Alberto do Nascimento Lopes e Miguel Pereira Lourenço.


"Marques & C.ª " Tailleurs, à direita na foto da Páscoa de Abril de 1912

No espaço desta nova loja da "Marques & C.ª ", situada ao lado da famosa "Pastelaria Marques" (inaugurada em 1903), já tinham estado instaladas, o "Bazar Suisso" da firma "Barella & Irmão" - que na altura ocupava os nos 66 a 72 -, tendo sido seguida pelo "Jardim de Lisboa" da firma "J. Peixinho, & C.ª " que tinha vindo da Rua do Carmo.

"Bazar Suisso" já reconstruído e à direita (na foto) da "Pastelaria Marques"


"Lopes, Limitada", inquilino anterior à "Marques & C.ª ", que tinha substituído o "Jardim de Lisboa" de "J. Peixinho. Lda."

Esta loja tinha sido totalmente destruída por um grande incêndio, originado por uma explosão que atingiu o prédio todo em 14 de Novembro de 1889. Publico de seguida, a notícia pormenorizada do incêndio.


14 de Novembro de 1889

Voltando à casa "Saboia", esta foi fundada em 1933, e para a qual os seus fundadores José dos Santos Mattos e António Rodrigues Correia - ambos proprietários e fundadores, em 1895 da "Fábrica de Espartilhos a Vapor Santos Mattos & C.ª " na Porcalhota (Amadora) - constituíram a sociedade "Mattos, Correia & C.ª ". Nesta sociedade entraram os respectivos filhos, Celeste Santos Mattos David e Fernando Gouveia Correia, a primeira representada pelo marido Aníbal da Silva David.

"Saboia" à esquerda na foto de 1939, antes da "Paris-Chiado" e do "Café Chiado"


1 de Janeiro de 1940


Montra de Natal nos anos 50 do século XX


1944


"Saboia" à esquerda na foto, antes (de quem descia) da "Paris-Chiado" e do "Café Chiado"

«Confiada a gerência aos cuidados e competência dêstes últimos, de tão superior maneira se desempenharam do cargo que, sob a sua direcção e conselhos dos fundadores, a Saboia adquiriu rápidamente excepcional prestígio, impondo-se à preferência da selecta clientela.
Dispondo de óptimas oficinas próprias, onde trabalham cêrca de 50 empregados escrupulosamente escolhidos e dirigidos por técnicos habilitados, a Saboia, cujas instalações são de um encanto inexcedível, especializou-se na camisaria fina, marcando pela beleza dos seus padrões e elegante corte dos tecidos confeccionados nas melhores popelines e sêdas.» in. "Praça de Lisboa" (1945)

Por morte dos fundadores da casa "Saboia" as quotas passaram para as respectivas viúvas, continuando a gerência entregue a Fernando Gouveia Correia e Aníbal da Silva David, aos quais estava entregue, também, a direcção do estabelecimento.


Localização da "Saboia" (com toldo aberto) a seguir à "Pastelaria Marques"

"Saboia" nos anos 80 do século XX

Não sei em que ano terá encerrado em definitivo, mas em 1995 ainda funcionava ...


Actualmente, no lugar da "Saboia" uma agência do "ActivoBank"

19 de maio de 2024

"Riviera Palace" e "Casino Central" em Cascais

O casino-restuarant "Riviera Palace", da Vila de Cascais, abriu a sua primeira fase a 15 de Agosto de 1918, apenas com o restaurant no piso térreo. Posteriormente, inauguraria os espectáculos de variedades e seus salões, no 1º piso, em 6 de Setembro seguinte. Era seu proprietário o advogado Dr. Herlander Ribeiro, que, para tal, tinha adquirido o velho palácio do Conde da Guarda, junto ao edifício da "Câmara Municipal de Cascais".


Palácio do Conde da Guarda após a saída do "Riviera Palace"


6 de Setembro de 1918

«Embora se desconheça a data da construção do Palácio, sabe-se que foi na década de 1790 que a sua proprietária, D. Inês Margarida, o mandou reconstruir após o terramoto de 1755.
Em 1807, durante as invasões francesas, o palácio foi ocupado pelo Almirante Cotton (o coronel-general Junot ficou instalado no Solar dos Falcões).
Após a morte da proprietária em 1812, o Palácio foi adquirido pelo então presidente da Câmara João Lopes Calheiros e Meneses para sua residência.
Só em 1860 o filho, herdeiro da casa, recebeu o título de Conde da Guarda, data a partir da qual passou a ser conhecida como Palácio dos Condes da Guarda.
Após a morte do 2º Conde da Guarda o advogado Herlander Ribeiro adquiriu o Palácio e logo escreve ao Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal (07 de Maio de 1918) pedindo autorização para “(…) deitar abaixo uns tabiques interiores e modificar o telhado para ficar tudo num só nivelamento(…)”. Solicitou ainda que os vários serviços da Câmara ali instalados gratuitamente abandonassem as instalações.
Foi nestas obras que o 3º piso foi demolido, desmontando o painel central de azulejos que representavam Santa Bárbara e São Francisco de Borba. O edifício ficou somente com 2 pisos, como atualmente.
Uns dias antes, em 21 de Abril de 1918, tinha sido colocado um anúncio no jornal “O Século” anunciando a venda daquele painel de azulejos.
Estas obras visaram a adaptação do edifício a um grande hotel, casino, casa de banhos salgados e de água natural, restaurante e outras diversões.
E assim se instala aqui o Casino Riviera-Palace que não teve vida longa… Os Paços do Concelho só viriam para aqui em 1932.» in: "Histórias da História de Cascais"

Na época dos Condes da Guarda, o palácio era constituído por três corpos, revestidos a azulejos, possuindo o central mais um piso, que mantinha o revestimento azulejar. Segundo um artigo, publicado no final do século XIX, no jornal "Costa do Sol", a casa, ainda na posse dos Condes da Guarda, servia de alojamento a vacas, a venda de leite e outros produtos da quinta dos proprietários.


Palácio do Conde da Guarda na sua versão original

Antes de mais, lembro que, a designação casino, que não possuía o mesmo sentido actual, aplicando-se então aos estabelecimentos de âmbito recreativo e privado, nos quais, entre as muitas actividades de lazer que se podiam realizar, tais como leitura, organização de bailes, concertos, espectáculos de variedades, casamentos, jantares, etc., e onde também se jogava.

Num extenso artigo/guia que o jornal "A Capital" publicou no dia 2 de Agosto de 1918, intitulado "De Algés a Cascaes", acerca do "Riviera Palace" (a inaugurar), referia:

«Aproxima-se o momento em que o Riviera Palace ha de manifestar os seus magnificos salões e dominar em Cascaes com a soberania da sua arte e elegancia. Não podemos deixar de lhe consagrar uma notícia e de o visitarmos - visita de que guardamos as mais gratas impressões.
Alem de tudo já estão concluídas as obras para adaptação do palacio do conde da Guarda, hoje propriedade do sr. dr. Herlander Ribeiro - diz-nos o nosso cicerone - para o casino que aqui se abrirá ainda este anno e que apresentará um elegante restaurant nos baixos conservando o estylo portuguez e as salas do 1º andar, tres vastos salões para concertos e diversos jogos, entre elles alguns completamente novos em Portugal. Nos andares superiores, está, como vê, o hotel com 90 magníficos quartos e na parte de traz um balneario com dez cabines para banhos communs e salgados, quesntes e frios.
Para serviço de hospedes haverá dento do edificio estação telegraphica postal e posto telephonico, assim como um elevador ligará os andares.
Este anno, em 15 de Agosto deve inaugurar-se o restaurant que está a cargo do acreditado estabelecimento de Lisboa e o casino dirigido por um dos proprietarios do um dos mais notaveis casinos do estrangeiro, havendo um apreciado quintetto no salão de concertos e outro no salão de jantar onde serão executadas as mais inspiradas joias da musicographia classica e moderna, assim como se farão ouvir as maiores celebridades nacionaes e estrangeiras.
O projecto do grande edificio é de um distincto architecto.
O nosso informar calou-se. Puzemo-nos a cogitar, enquanto os nossos olhos percorriam velozes aquellas maravilhas. Cascaes, pois, fica com o primeiro estabelecimento do genero em Portugal e constituirá um explendido ponto de reunião de portuguzes e estrangeiros durante o inverno.
Soubemos ainda que a illuminação será electrica, fornecida por motor proprio e a condução dos hóspedes far-se-ha commodamente em dois grandes automoveis, de Lisboa, directamente das gares e pontos de vapores.
Ao terminarmos estas despretenciosas linhas, não queremos deixar de frisar que, dispondo este nosso bello paiz de pedaços de terreno, como este que a iniciativa particular tanto completou pois, o turismo nada deve aos governos é pena que os nossos homens politicos tudo sacrifiquem aos seus odios pessoaes e politicos e esqueçam que este nosso bello clima antes convida á paz, á ordem e ao trabalho.»


                                   13 de Setembro de 1918                                                      2 de Outubro de 1918

No final, o hotel não foi "para a frente", e apenas funcionariam o restaurante e casino "Riviera Palace", mas sem o sucesso pretendido e encerraria no ano seguinte. 

Entre 1920 e 1925, o palácio já era propriedade da "União Comercial de Cascais" e o piso térreo ocupado por vários estabelecimentos comerciais. A 11 de Agosto de 1930, cinco anos após a primeira intenção de compra, era aprovada em sessão de Câmara a compra do palácio por 380.000$00, apesar do valor inicial pretendido pelos proprietários ser de 650.000$00.


Palácio, à esquerda, já com as tabuletas da "União Comercial de Cascais". Ao fundo edifício da Câmara (com os sinos)


1930



*****   "Casino Central"   *****

O "Casino Central", foi inaugurado na Rua Visconde da Luz, nº 41, em Cascais, no dia 11 de Agosto de 1899, onde «foi servido um magnifico jantar. Durante o jantar tocou um magnifico sextetto dirigido pelo distincto musico, o sr. Carlos Pone. Este sextetto continuará rocando alli todas as quintas feiras e domingos.»


Jardim e Rua Visconde da Luz (a subir e de frente na foto). Foto entre 1890 e 1900


12 de Agosto de 1899


14 de Agosto de 1899

Mas, já em 16 de Outubro de 1894 ... «um descaramento inaudito»


O "Casino Central" ficava no nº 41, na correnteza dos prédios da Rua Visconde da Luz de frente para o jardim, (rua de frente na foto e a subir) como mostram as fotos publicadas de entre 1890 e 1900.  Talvez no prédio com os andaimes ... que se podem ver nesta foto, repetindo a sua publicação.


Em 14 de Agosto seguinte o jornal "A Folha de Lisboa" noticiava:

«Inaugurou-se a semana passada, em Cascaes, na Rua do Visconde da Luz nº 41 este magnifico casino de que são proprietarios dois honestos e honrados cavalheiros, que se mostraram incançaveis para dotar aquella magnifica cidadella com um estabelecimento em tudo digno d'ella.
O Casino Central é uma das casas mais encantadoras que temos visto, encontrando se alli o util aliado ao agradavel.
Vastissimo, salas ricamente mobiladas, e com todos os requintes indispensáveia á vida: deslumbrante mobiliario; formosos aparadores; estofos magnificos; espelhos do mais fino crystal de Veneza se encontram ali em profusão.
A sala de bilhar é deslumbrante, bem como deslumbrante é tambem o restaurant, a cargo de um dos mais habeis cosinheiros de Lisboa, como é o sr. Jeronymo Barroso.
No Casino Central ha todos os dias jantares de mesa redonda, opiparamente servidos por 800 réis, incluindo vinho e café, o que torna mais recommendavel ainda tão bello edificio.»


1900


10 de Agosto de 1901

13 de maio de 2024

Hotel Cidnay em Santo Tirso

O "Hotel Cidnay", foi inaugurado em Santo Tirso, a 7 de Fevereiro de 1931. Mandado construir pelo capitalista e proprietário local, Francisco Cândido Moreira da Silva (1855-1940), foi projectado pela dupla de arquitectos Baltazar Castro (1891-1967) e Rogério de Azevedo (1898-1983).



Francisco Cândido Moreira da Silva (1855-1940)


Por ocasião da inauguração o jornal "Semana Tirsense" noticiava:

«...Tratando-se da inauguração do maior hotel construido nos ultimos tempos no norte de Portugal, aqui vieram muitas familias de varios pontos do paiz, que ficaram optimamente impressionados com o grande hotel com que Santo Tirso foi dotado.
Os tirsenses, tomando parte na inauguração de ontem, não fizeram mais que prestar as suas homenagens bairristas aos proprietarios do novo Hotel. (...)
Pelo que representa de benemerencia para a nossa encantadora terra, ficamos todos os tirsenses muito gratos á familia Moreira da Silva, sempre pronta a auxiliar tudo que seja para o bem da sua terra. (...)


Ao fundo, onde viria a ser construído o "Hotel Cidnay"


Construção do "Hotel Cidnay"




A exploração do explendido Hotel está a cargo do conhecido e habil hoteleiro, sr. José Manuel Solleiro, que é um profissional conhecedor a fundo do seu métier e pessôa muito relacionada.
Durante anos dirigiu o grande Hotel Termal, das Caldas da Saúde e muitos outros importantes hoteis, em Lisboa, Pedras Salgadas, Curia, etc., tendo sempre demonstrado proficiencia e zelo, dispensando a seus hospedes todos os cuidados e atenções, o que á a garantia bastante para o completo triunfo deste grande empreendimento, que representa para o progresso local uma obra de vulto. (...)
Possuindo todas as exigencias dum estabelecimento hoteleiro moderno, o novo Hotel será, com certeza muito frequentado pelos turistas, a quem não são indiferentes as belezas de Santo Tirso.
A construção do Hotel Cidnay, cujo projecto é da autoria dos distinctos arquitectos srs. Baltazar de Castro e Rgerios de Azevedo, e que foi executado pelo conhecido e importante constructor civil sr. Ramalhão, obedece a um estilo moderno, que muito faz salientar as suas linhas arquitetónicas. (...)»




17 de Fevereiro de 1950

O guia de "Hoteis e Pensões de Portugal" para 1939, fornecia-nos as seguintes informações deste hotel:

Montado com todo o conforto moderno. Serviço de primeira ordem. Cabines para autos. Aberto todo o ano.

Concessionário: José Manuel Solleiro

Categoria: 2ª classe
Nº de quartos: 54
Diária: de 25$00 a 60$00
Pequeno-almoço: 4$00
Almoço: 12$00
Jantar: 14$00 

Em 24 de Dezembro de 1970, o, então, concessionário António Antunes de Almeida, transmitia o encerramento definitivo do "Hotel Cidnay" a 31 de Dezembro do mesmo ano.

24 de Dezembro de 1970

Como se pode ver pela próxima foto, o edifício do "Hotel Cidnay" ainda sobreviveu, e teve outras finalidades nos anos seguinte .,..

A licença de construção do novo edifício para habitação, escritórios, comércio e estacionamento, viria ser aprovada em 16 de Abril de 1982 e o Alvará de licença em 30 de Dezembro de 1982.A demolição do antigo "Hotel Cidnay" teria lugar no início de 1983.



Demolição em 1983


9 de maio de 2024

"Theatro dos Recreios"

Circo e Teatro "Recreios Whittoyne", propriedade de sociedade por accções "Empreza Exploradora de Recreios Whittoyne", fundada pelo palhaço Henry Whittoyne, foi inaugurado em 6 de Novembro de 1875, nos jardins do "Palácio Castelo Melhor" - concluído em 1858 - actual "Palácio Foz”. O projecto ficou a cargo do arquitecto Domingos Parente da Silva (1836-1901). Estas primeiras instalações eram compostas por um circo, teatro, café, restaurante, casa de jogos diversos, alamedas e jardins iluminados.

"Recreios Whitoyne" dentro da elipse desenhada, com a Avenida da Liberdade recém construída



16 de Setembro de 1876

Em 12 de Janeiro de 1879 «um dos mais pavorosos e rapidos incendios que a cidade ultimamente tem presenciado» teve lugar nos "Recreios Whittoyne", tendo provocado avultados prejuízos estragos, das quais se deram conta na notícia do "Diario Illustrado" do dia seguinte e que publico de seguida:

No dia 15 de Janeiro de 1878, uma boa notícia era dada pelo "Diario Illustrado":

«Os accionistas dissidentes da empreza exploradora dos Recreios, uniram-se com o louvavel fim de nomearem uma grande comissão para obter donativos destinados á reparação dos estragos do incendio e construir uma rotunda mais alta, e terraplanar a parte incendiada, de modo que fique unida á esplanada.
Estas obras vão começar ámanhã, e é de crêr que os promotores de tão louvavel idéa encontrem todo o auxilio entre os seus amigos e os accionistas da empreza.»
Noutra pequena nota, no mesmo jornal: «Consta que a direcção dos Recreios, em nome da empreza, manda celebrar na proxima sexta-feira, oitavario do passamento do nobre marquez de Castello Melhor, uma missa de Requiem na parochial egreja de Santa Justa, sendo o 'Libera me' executado pelos artistas da companhia italiana e toda a orchestra do theatro.
A direcção resolveu convidar para este solemne acto toda a familia e amigos do finado e a imprensa da capital»


E ainda, no tocante ao incêndio ... «A direcção dos Recreios auxiliada por todos os membros dos corpos gerentes, e alguns amigos particulares, realiza na proxima 2ª feira um beneficio destinado a attenuar os importantes prejuizos que o sr. Achiles Lupi soffreu no incendio.
Nada resta do opulento guarda roupa e abundante scenario que eram o ganha pão de tantas familias.
Os promotores d'esta recita empregam todos os seus esforços para que ella seja o mais productiva possivel, e assim succederá porque o nosso publico está prompto sempre a socorrer os que padecem com taes calamidades.»

Em 26 de Junho de 1879 umas "Variações" de Raphael Bordallo Pinheiro em "O Antonio Maria":

«O Passeio Publico, segundo annunciam os jornaes, esta sendo frequentado pelo que ha de mais selecto na sociedade lisbonense.
O Diario Popular, em abono d'esta asserção, e para que no espirito das familias mais meticulosas não ficasse restando a menor duvida, ainda na segunda-feira dizia o seguinte:
"Tendo havido alguns roubos no Passeio Publico do Rocio, parece que a sra. Amann vae requisitar para alli alguns policias. O Antunes e o Castello Branco já hontem fizeram bom serviço!"
Caspité! Passeio Publico, a que alturas tu subiste! Tal qual o que ha cousa de cinco ou seis mezes aconteceu nas salas da Ajuda!...
Os Recreios agora é que não devem ficar atraz do seu rival, e esperamos, d'um momento para o outro, ler o seguinte aviso nos jornaes, como réplica ás pretenções de bom tom do Passeio:
"Hontem a esplanada foi concorrida pelo que ha de mais distincto na nossa sociedade. Cerca d'uma duzia de senhoras ficou sem brincos nas orelhas, e oa pé do coreto foi assassinado e roubado um sujeito, do qual por enquanto se ignora o nome. 
A noite estava muito amena. Aos Recreios, pois." »


31 de Julho de 1879


18 de Setembro de 1879


24 de Dezembro de 1879

Quanto à frequência, propriamente dita, do "Theatro dos Recreios" o mesmo "O Antonio Maria" comentava:

«Nos Recreios é agora costume, quando algum espectador dá provas de desagrado aos bailados de Fuensanta, ou aos 'arrepios' da Moriones, levantarem-se a claque e o grupo de 'eternos admiradores' d'aquelles dois astros, bradando para o que pateia: - Pum, pum, fóra burro!
Parece-nos um mau costume esta troca de nomes.
O Soares deve ter muito cuidado, senão, d'aqui a pouco, são muito bem capazes de lhe comer o fundo das cadeiras.
Dar-se-ha o caso de que os Recreios se tenham mudado para Cacilhas sem a gente dar por isso? »



                                      15 de Julho de 1880                                                         8 de Agosto de 1880


Estas instalações seriam substituídas pelo Grande Colyseu, que vira a ser designado ora por "Colyseu dos Recreios" ora por “Theatro dos Recreios” e cuja construção, no mesmo local, teve início em 6 de Junho de 1881 sob projecto do arquitecto Parente, com um custo total de 26 contos de réis. Seria inaugurado, em 27 de Maio de 1882, com um sarau «gymnastico-equestre» oferecido pelo "Real Gymnasio Club Portuguez", em benefício dos "Albergues Nocturnos de Lisboa".

«Os Albergues Nocturnos, creados para acudir aos desvalidos, aos verdadeiros desgraçados que nem podem acolher-se nas sombras da noite sob um tecto que lhe abrigue os gemidos da sua triste miseria, pertencem ao numero das instituições de caridade mais dignas do alto respeito.
Sua magestade el-rei consagra-lhe entranhado amor.» in: "Diario Illustrado"



"Theatro dos Recreios" em 27 de Maio de 1882


Bilhetes


Em 29 de Maio de 1882, o jornal "Diario Illustrado" publicava uma pequena notícia, a propósito da sua inauguração:

«O salão a que nos referimos e cujas janellas deitam para o largo do passeio, é vastissimo, alegre, decorado com simplicidade, mas em extremo confortavel.
Segue-se-lhe a loja de bebidas, uma sala excellentemente disposta, cheia de ar e de luz, onde não é facil acotovellar-se a gente, o que é vulgarissimo nos restaurantes dos nossos theatros, succedendo frequentes vezes uns desastres mais ou menos comicos que todos conhecem.
Do salão de entrada uma larga escada conduz ao Coliseu.
Sem nos querermos alargar em detalhes e sendo o nosso unico fim relatar a impressão, se pode dizer, de momento diremos, comtudo, que o aspecto geral do circp, talvez porque o velho e hoje extincto circo Price nos esteja ainda bem patente na memoria não é completamente animado, como parece convir a este genero de casas de espectaculos.
A luz, por exemplo, pareceu-nos em pouca quantidade e mal distribuida.
O gosto decorativo agradou-nos bastante, senão no todo pelo menos em parte, tal como a architectura e pintura dos arcos e tecto entre aquelles e os camarotes, os quaes resentindo-se igualmente de falta de luz não era facil examinal-os.
E não ficariam estes muito distantes da arena? Assim nos parece.
Em compensação os logares de fauteils e cadeiras são magnificos e muito commodos.
A obra cremos não está ainda completa e a noite de hontem daria logar a um ensaio muito para aproveitar.
Perto das 9 horas chegando suas magestades ao camarote e sendo executado o hymno real, deu-se comeco ao espectaculo.»

E a revista "Occidente", também aquando da sua inauguração, e que publiquei no artigo "Recreios Whittoyne" em 28 de Dezembro de 2017:

«O coliseu é um recinto vasto: a arena é mais pequena que a do antigo circo de Price, mas em geral o circo é muito maior e comporta muito mais espectadores. Tem quatro qualidades de logares: 560 cadeiras, logo em torno da arena; 200 fauteuils por detraz das cadeiras na disposição em que o circo de Price eram os camarotes, 2000 logares de geral, pelo mesmo systema d'aquelle circo, e por cima da geral 62 camarotes n'uma ordem só.
Estes camarotes fazem mau effeito porque estão collocados a uma grande altura, mais altos que a 2ª ordem de S. Carlos e as divisorias convergindo todas para o centro da arena, tornando-os muito incommodos para os espectaculos que se derem no theatro.
Em frente do palco, por cima da entrada principal do circo, ficam os camarotes reservados para el-rei D. Luiz e para el-rei D. Fernando, para o proprietario do terreno dos Recreios, a filhinha do falecido marquez de Castello Melhor, e para a direcção da sociedade exploradora dos Recreios Whittoyne composta hoje dos srs. José Miguel Marques Rego, Julio Cesar da Silva e José Carlos Gonçalves.
A ornamentação do coliseu é pobre, mas da pior das pobrezas, d'aquella que finge rica e que no fim de contas sae carissima mais tarde.
Como circo o coliseu preenche as condições necessarias, mas como theatro deixa muito a desejar.
Parece-nos que foi um erro, na nossa terra e no nosso tempo, ao construir uma grande casa de espectaculos, pensar mais em fazel-a um circo de que um theatro.
No deliniamento do coliseu dos Recreios fez-se isso. Não é um theatro circo: é um circo, que em caso de necessidade arremedeia para theatro. (...)
O palco é acanhado, não tem urdimento que comporte o movimento theatral, o tablado não tem o declive proprio, de modo que as figuras que n'elle trabalharem, quando estiverem em varios planos empastam-se.
A sala depois de armada em platea é plana sem declive, de modo que os espectadores de traz difficilmente poderão ver o que se passa no palco, vendo apenas as cabeças dos espectadores que lhes ficarem á frente.
Dos camarotes muitos d'elles são inteiramente perdidos para os espectaculos theatraes, porque não se vê d'elles o palco.
Do aspecto geral do coliseu da sua architectura e ornamentação dá conta a nossa gravura.»




“Theatro dos Recreios”, teria uma existência curta já que em virtude da construção da estação central ferroviária do Rossio, os seus terrenos viriam a ser expropriados. O seu último espectáculo ocorreu em 9 de Julho de 1887, com a exibição da ópera “La Traviata”. Oito dias depois já estava demolido. Recordo que estas construções eram em madeira pelo que a sua demolição era sempre rápida, assim como quando ocorria um incêndio as consequências eram devastadoras.

«Hoje repete-se a "Traviata" em recita dedicada aos srs. accionistas e portadores de obrigações na qual teem entrada por meios preços; no espectaculo de ante-hontem agradou muitissimo a sra. Helder, tenor Bruni e distincto baritono amador mr. Leon Hollemart.
O producto d'estes espectaculos reverte a favor do pessoal ao serviço d'aquella empreza que vae ficar desempregado.»



De referir que as suas ultimas representações já tiveram no "Theatro da Trindade" (inaugurado em 30 de Novembro de 1867), que foi alugado pela direcção dos "Recreios Whittoyne", para o efeito.:

«Em consequencia da direcção dos Recreios não ter consentido que a companhia continuasse a funccionar no Colyseu embora o seu emprezario tivesse obtido do sr. marquez da Foz, proprietario do terreno, licença para haver espectaculos até ao dia 10, o emprezario sr. Santos Junior, como hontem dissemos, tratou de alugar o theatro da Trindade para a continuaçao das representaçoes da companhia de zarzuela e baile, realizando hoje o primeiro espectaculo n'este theatro com a bella operetta a Mascotte. (...)
Estamos convencidos que a companhia lucrou grandemente, com a vinda para a Trindade o nosso unico theatro adequado aquelle genero de canto.
Com a grande reducção dos preços, tanto a empreza como o publico hão de certo lucrar bastante.» in: "Diario Ilustrado" de 2 de Julho de 1887.

Em 14 de Agosto de 1890, viria ser inaugurado o "Colyseu dos Recreios", na Rua de Santo Antão, em Lisboa.