Restos de Colecção: setembro 2022

28 de setembro de 2022

Livraria Barateira

 A "Livraria Barateira", foi fundada por Salvador dos Santos Romana em 1914, na Rua do Duque, 34-36, em Lisboa. Cerca de 1936, muda-se para a Rua Nova da Trindade, 70-71, actual 16 A-C. Ocupava duas salas, outrora cavalariças do antigo Convento da Trindade. Viria a substituir as portas de madeira, por montras, em 1935 e em 1936 constrói um «depósito de livros» no interior.


Rua Nova da Trindade e a "Livraria Barateira" com o seu toldo na frente do Eléctrico

Além de editor de livros e até postais, vendia livros novos e usados, tendo-se tornado num dos mais famosos, e bem sucedidos alfarrabistas de Lisboa. O último proprietário da "Livraria Barateira", Rui Nascimento falava, assim sobre seu «avô emprestado», numa entrevista transcrita no blog "Página a Página" de Nuno Chaves, em 17 de Janeiro de 2010:

«Toda a vida foi um idealista e decidiu abrir uma livrariazinha pequena. Ele tinha aquela paixão pelos livros mas era pouco dado a regras. Se lhe dava na gana e não lhe apetecia trabalhar, fechava a porta e ia-se embora», recorda. Foi a avó de Rui – «uma mulher de armas» – que, com a ajuda do filho, Alberto Romana, fez prosperar o negócio.



Postal editado pela "Livraria Barateira"

Nos anos 60 do século XX, a "Livraria Barateira" viveu os seus tempos áureos. «Não havia ainda muitas casas do género e esta era uma das maiores», prossegue Rui Nascimento, à data da conversa  com 62 anos. «O meu pai e a minha avó entregaram-se mesmo ao trabalho. Começaram a comprar, a comprar, e ficaram carregados de livros.» 

Anúncio publicitário no "Album do Alentejo" de 1931:

« Livraria Barateira - de Salvador dos Santos Romana

CASA EDITORA. Especialista em fornecimentos para vendedores ambulantes, livros populares, romances humorísticos, galantes e de aventuras. Literatura infantil, almanaques, blócos-calendário, agendas para algibeira e de escritório, etc.
34, Rua do Duque, 36 - Lisboa »


Catálogo para a "Feira do Livro" de 1933



"Feira do Livro" de Lisboa, em 1933


1934


1942



João Lopes Holterman (1925-2021), que foi um dos mais antigos livreiros-antiquários português em actividade, fez a sua entrada no sector do comércio do livro antigo, e em segunda mão, quando tinha apenas onze anos. Começou, então, na "Livraria Barateira", tendo lá permanecido até 1939. Já estava estabelecido, com a sua "Livraria Camões", na Rua da Misericórdia, quando, em Setembro de 1989, ele e os seus pares, tomaram a decisão de constituir a "Pró-Associação Portuguesa de Alfarrabistas". Foi eleito, por unanimidade, para presidir a essa organização, que viria a ser fundada em 1994, presidida por José Ferreira Vicente. João Holterman continuou a ser presidente honorário.


1986


1984

A "Livraria Barateira" encerraria, definitivamente as suas portas em 2012. Hoje no seu lugar, existe um bar e barbearia "o Purista - Barbière", «um espaço bar & barbearia de requinte, tradição e ambiente Purista, com uma cerveja exclusiva e uma carta de Gins Purista!» ...


"Livraria Barateira" já encerrada em foto de 13 de Março de 2013


"o Purista - Barbière"


fotos in: Hemeroteca Digital de Lisboa, Biblioteca Nacional Digital, Arquivo Municipal de Lisboa, Museu do FadoBiblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian, o Purista - Barbiére

21 de setembro de 2022

Antigamente (168)

 


"Jardim Passos Manoel", no Porto em 1912


Estação de serviço "Mobil" em Pedrouços


Stand das conservas portuguesas, de Portimão, "La Rose" em Antuérpia


Carro promocional das conservas "La Rose" nas ruas de Antuérpia


Exterior e interior do stand da firma "Estabelecimentos Sida, Lda.", na "Feira Popular de Lisboa" na Palhavã



"Café Astória" na Avenida da Igreja, em Lisboa

18 de setembro de 2022

Teatro Pinheiro Chagas e Salão Ibéria

O "Theatro Pinheiro Chagas", propriedade da "Sociedade Dramatica Caldense" foi inaugurado em 16 de Setembro de 1901, na Praça Nova (vulgo Praça do Peixe, depois Praça 5 de Outubro), nas Caldas da Rainha. Projectado por Celestino Rosa, a sua construção foi supervisionada por Rafael Bordallo Pinheiro.


   

                                 10 de Janeiro de 1915                                                  14 de Março de 1915

Já o jornal "Tentativa", de 9 de Junho de 1892, noticiava:

«Já se acha concluído o projecto que a amabilidade do sr. Celestino Rosa ofereceu à sociedade dramatica caldense para a construcção do seu novo theatro. Consta-nos que, logo que seja aprovado o referido projecto, se procederá com brevidade á sua construcção, melhoramento que o estado de adiantamento desta formosissima villa, de ha muito estava reclamando.»

Manoel Pinheiro Chagas nasceu a 13 de Novembro de 1842 e morreu a 8 de Abril de 1895. Foi um  notável escritor, romancista, ilustre poeta, orador, invejado jornalista, célebre político, distinto  historiador, privilegiado humorista, exímio homem de estado e magnifico dramaturgo.

Pinheiro Chagas (1842-1895)

Sousa Bastos no seu "Diccionario do Theatro Portuguez", de 1908, descrevia o "Theatro Pinheiro Chagas", da seguinte forma: 

«E' propriedade de uma associação denominada «Sociedade Dramática Caldense». A sua edificação começou em Abril de 1897. A  obra foi dirigida pela direcção da Sociedade e pelo mestre d'obras do Hospital Real das Caldas, Francisco Mathias d'Oiveira Santos. A construcção do palco e suas dependências pelo machinista do theatro de D. Maria II, Joaquim Gomes de Carvalho. 
A inauguração do Theatro Pinheiro Chagas fez-se no dia 16 de Setembro de 1901 com uma recita promovida por um grupo de amadores, revertendo o producto a favor dos bombeiros voluntários, do theatro, e da banda da Guarda Municipal. O programma do espectáculo constou de duas partes, sendo a primeira de concerto e a segunda da comedia em 2 actos, Na Bôcca do Lobo. Tomaram n'ella parte as senhoras: D Honorina Amado, D. Maria da Conceição Eça Leal, D. Luiza d'Aboim e D. Maria Magdalena de Moraes, e os cavalheiros: Eça Leal. José Amado, D. Huberto Gonzalez, Luiz Gama, Illidio Amado, Vasco Dantas da Gama e Thomaz Eça Leal. Tomaram também parte um sexteto e a Banda da Guarda Municipal de Lisboa.
O theatro possue o seguinte scenario : sala rica, sala media, campo, praça e jardim, tudo pintado pelo scenographo Eduardo  Reis. O rendimento do theatro é approximadamente de 200$000 e a despeza, em cada recita, não incluindo a renda é de 55$000 a 18$000 réis. 
Tem duas ordens de camarotes com 21 em cada ordem, 160 fauteuils, 102 logares de superior e 50 de geral. Projecta-se  augmental-o com 6 frizas.
Já alli teem representado: uma companhia hespanhola de zarzuela, a companhia do Theatro Carlos Alberto, do Porto, a Companhia Sousa Bastos, e um grupo de artistas do Theatro da Trindade, de Lisboa. O Theatro Pinheiro Chagas aluga-se ás companhias, pagando estas 15 % da receita bruta de cada espectáculo.»

Até à inauguração deste Theatro, desempenhou um papel importante o Theatro da Travessa do Moinho de Vento, fundado em 1893.


20 de Agosto de 1916



Programa de 30 de Setembro de 1916


Grupo de actores vestidos com trajes minhotos, à porta do "Teatro Pinheiro Chagas" em 1917

Quanto ao "Theatro Pinheiro Chagas", «O início deste teatro foi no Parque, com frente para a Rua de Camões e era propriedade da Sociedade Dramática Caldense. Constituía um estorvo a uma modernização do Parque, no conceito de renovação que inspirou Rodrigo Berquó, que conseguiu que o Teatro se construísse no Terreiro das Chocas, nome porque era popularmente conhecida a Praça Nova, depois de Hintze Ribeiro e em 1911 Praça 5 de Outubro, como hoje. »

O "Theatro Pinheiro Chagas", foi gerido, inicialmente, pela "Sociedade Dramática Caldense", sendo este espaço utilizado apenas para peças teatrais. Iniciou a exibição de filmes ainda nos anos XX do século XX, - já arrendado a Eduardo Montez que fazia a sua gestão. 

21 de Março de 1929


5 de Abril de 1931

O mais antigo cinema caldense era o "Animatographo Bolander" no "Salão Central" da Convalescença, espaço que já não existe, mas onde actualmente funciona o serviço de fisioterapia do Hospital Termal. «As pessoas ficavam a recuperar na convalescença uns dias após tomarem os banhos e numa das salas eram transmitidos filmes», (Mário Lino, 2017).

No Jornal "O Círculo das Caldas" de 20 de Novembro de 1907 noticiava-se:

«Estreou-se no dormindo ultimo, no salão Convalescença, a magnifica machina animatographica apresentada pelo sr. Guilherme Bolander. (...) A primeira e única sessão de domingo teve enormissima concorrência com a instalação e nitidez dos seus esplêndidos quadros de que especialisaremos: "Amor e Pátria ou A Noiva do Voluntario", de maravilhosos efeitos de luz e intensidade dramatica (...) e bailados da Bella Romero (...). Segunda-feira foi exibida a grandiosa peça "Martyres da Inquisiçã", assumpto impressionante, muito fiel de reprodução mas, a nosso ver, pesado de mais para espectaculos de verdadeiro passatempo.» Nota: A machina animatographica era o projector de Edwin Rousby  chamado de "Animatographo Colossal" que tinha chegado às Caldas da Rainha.



Diversões em 18 de Outubro de 1914

"Theatro do Pavilhão" nos Pavilhões do "Parque D. Carlos I " foi inaugurado a 2 de Agosto de 1908. A propósito deste evento  o jornal "Echos das Caldas", do mesmo dia, noticiava com o título "Inauguração dos Pavilhões do Parque":

«A conhecida empreza Netto, Valle & C.ª " vae apresentar soberbos espectaculos núm dos Pavilhões do Parque D. Carlos I. A inauguração realiza-se com magnificas sessões do Animatographo Colossal e com esplendorosos bailados, executados pela bella e notavel bailarina Concha Monedero (Currita Madrileña) (...). Os preços são baratíssimos: cadeiras a 100 réis, superior a 80 réis e geral a 60 réis»

Entretanto, o "Teatro Pinheiro Chagas", «velho e abandonado» necessitava urgentemente de obras de remodelação profunda das suas instalações. Em consequência disso, em Fevereiro de 1934 a "Sociedade Dramatica Caldense" - que se extinguia na ocasião - oferece o Teatro à Câmara Municipal que fica encarregue das obras a seu cargo e o seu custeio. 

Plantas da construção do novo "Cine-Teatro Pinheiro Chagas" do arquitecto António Varela em 1935



plantas gentilmente cedidas por Vicente Martins

Apesar de, em Março de 1936, o Ministério das Obras Públicas ter indeferido o pedido de comparticipação no custo, é contraído um empréstimo de 150 contos junto da "Caixa Geral de Depósitos", o que permitiu o arranque das mesmas, sob projecto do arquitecto leiriense António Varela (1902-1962)

Apesar das dificuldades, o novo "Cine-Teatro Pinheiro Chagas", foi inaugurado em 14 de Novembro de 1939, com pompa e circunstância e com as presenças além do Presidente da Câmara, Júlio Lopes, do Governador Civil de Leiria, do Comandante distrital da "Legião Portuguesa", do Inspector-Geral dos Espectáculos, etc. A nova sala de espectáculos das Caldas da Rainha foi pintada a rosa velho no exterior e a verde claro no interior.


Em fase de acabamentos e antes da sua inauguração

Depois da inauguração

O jornal "Gazeta das Caldas", de 20 de Novembro de 1939 e por ocasião do acontecimento, relatava:

«Este velho teatro foi completamente remodelado exterior e interiormente, apresentando-se hoje como um elegante edifício de linhas modernas, com uma explendida sala de espectáculos, com cadeiras estofadas, em toda a plateia, tudo num conjunto moderno e de elegância que a tornam uma sala alegre e confortavel.
Após o discurso do Presidente da Câmara Municipal, iniciou-se, seguidamente, a representação da peça "A Vida é Assim", pela Companhia Teatral Portuguesa, de que fazem parte os grandes artistas Palmira Bastos e Assis Pacheco que, nos principais papeis corresponderam em absoluto aos seus altos méritos artísticos, secundados num perfeito conjunto pelos restantes artistas. (...)
No dia 15 realizou-se o segundo espectáculo, pela mesma Companhia, com uma comédia "O Sacrificado" em que Emilia de Oliveira, Irene Izidro, Brunilde Judice, Assis Pacheco e Abilio Alves se houveram como verdadeiros artistas, merecendo da assistência constantes aplausos.»

No dia 23 seguinte do mesmo mês, seria exibido o filme "Fera Humana", conforme anúncio seguinte, na "Gazeta das Caldas".


Por este Cine-Teatro passaram a título de exemplos: O "Orfeão Caldense" e "Os Pimpões" , foram algumas das colectividades locais que levaram à cena inúmeras peças. A Companhia de Vasco Santana também por lá passou, tal como Igrejas Caeiro com o seu programa "Companheiros da Alegria".
No período final da sua existência, foram os filmes que encheram a sala. «Quem não se lembra do "Piolho" (Geral), onde os filmes eram vividos com grande intensidade, pelas classes menos endinheiradas.»


Postal de 4 de Julho de 1947


                                                     1951                                                                     1958

Nos anos oitenta do século XX, o "Cine-Teatro Pinheiro Chagas" entrou em decadência e não resistiu à falta de vontade de o preservar. Em 1992 após uma tentativa (?) de o reconstruir, acabou por sucumbir, tendo sido demolido. "Os Pimpões" passavam ser a única sala de espectáculos da Cidade.


Demolição do "Cine-Teatro Pinheiro Chagas", em 1992

Lembro que os primeiros filmes, ainda mudos, exibidos nas Caldas da Rainha, passaram nos Pavilhões do Parque e quando o "Salão Ibéria" foi inaugurado em 1921 passaram a ser exibidos neste animatógrafo. De referir, ainda, a existência nas Caldas da Rainha das seguintes salas: "Animatografo Pathé" no "Salão Caldense", "Cinematografo High-Life", na Rua Camões, e o "Ibérica Club" na Rua de Camões.


20 de Dezembro de 1914

O "Salão Iberia" foi inaugurado em 5 de Março de 1921, por Salomão Levy e Benjamim Filipe, e implantado no Parque D. Carlos I nos terrenos dos Pavilhões do Parque, mesmo ao lado dos mesmos.




1904


Antes da construção do "Salão Iberia"

O edifício foi construído com os tijolos que sobraram de umas obras de substituição de fornos na "Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha". Antes da sua fachada arquitectónica ter sido alterada, chegou a ter salão de chá.




Durante muitos anos, a par com cinemas de Lisboa e Porto, foi o único, fora dessas duas cidades que exibia filmes no sistema "Cinemascope". O primeiro a ser exibido nesse sistema foi "A Túnica" Chegou a ter uma sala de chá, antes da sua fachada arquitectónica ter sido alterada. Durante muito tempo, além de Lisboa e Porto, apenas no Salão Ibéria se transmitiam filmes em cinemascope. O primeiro foi “A Túnica”.


Nova fachada do "Salão Ibéria"




gentilmente cedido por Victor Rodrigues

1918

"Cine-Teatro Pinheiro Chagas" e o "Salão Ibéria" chegaram a ter a mesma gerência e nessa altura era impresso apenas um folheto com a programação dos dois cinemas. «Por aqui passaram boas e más produções, pequenas e grandes produções, desde filmes americanos ‘westerns’, a obras portuguesas, filmes históricos e clássicos como Casablanca, O Comboio Apitou Três Vezes, Saltimbancos, A Severa, As Pupilas do Sr. Reitor, Bucha e Estica, O Dia Mais Longo, A Mantilha de Beatriz, ou Luzes na Ribalta». (Mário Lino, 2017). Era uma época, em que era comum os espectadores terem lugar cativo nas salas de cinema e receberem em casa postais com a programação.

17 de Agosto de 1930


16 de Junho de 1938

1962

O "Salão Ibéria" funcionou até 9 de Outubro 1978, quando ruiu numa noite chuvosa em que não havia sessões de cinema.

Depois do "Salão Ibéria" e do "Cine-Teatro Pinheiro Chagas", surgiu o "Estúdio Um", localizado paredes meias com o "Hotel Cristal", que foi o último cinema nas Caldas com as portas abertas fora de uma superfície comercial.

Bibliografia:

- Dissertação para obtenção do grau de Mestre em História Moderna e Contemporânea "O turismo nas Caldas da Rainha do século XIX para o século XX (1875-1936)" da autoria de Ricardo Fonseca de Oliveira Furtado Hipólito (Setembro 2014).