Restos de Colecção: setembro 2018

30 de setembro de 2018

Restaurante “Floresta do Ginjal”

O restaurante “Floresta do Gingal”, propriedade de “José A. de Melo & Filhos, Lda.”, foi inaugurado nos primeiros anos da década de 50 do século XX, no Ginjal, Cacilhas.

“Floresta do Ginjal” dentro da elipse desenhada

Edifício da “Floresta do Ginjal” em duas perspectivas em lados opostos

 

O Ginjal compreendia toda a extensão da margem sul do Tejo, entre a Estação Fluvial, de embarque de Cacilhas, e os armazéns situados no cais, junto às “escadinhas” que dão acesso a Almada, pela “Boca do Vento”. Era um local muito frequentado pelos lisboetas devido aos típicos retiros com os “comes e bebes” e onde se cantava o fado. A vida castiça dos clientes que frequentavam as antigas tabernas e os “retiros” do Ginjal foi registada por alguns escritores e jornalistas de Lisboa. Desde os princípios da década de 1910, os “retiros” da “Marraca”, da “Parreirinha” e, em especial, do “Retiro Universo”, assim como a famosa taberna do “Corredor”, (onde Luís dos Galos se viria a estabelecer poucos anos depois), eram locais muito procurados pelos alfacinhas. Por exemplo, o antigo “Retiro Universo”, situado junto ao cais que dava acesso pelo Ginjal, n.º 6 - escada, ou pela Rua das Terras, actual Rua Carvalho Freirinha, por volta de 1900, possuía um belo salão onde se exibia um dos melhores animatógrafos desta margem do Tejo, aos sábados e domingos. Atraídos pelo fado e boas caldeiradas e do vinho de “pique” ou de “agulha”, organizavam-se tertúlias que duravam de manhã até às altas horas da noite.

 

Um artigo datado de 19 de Setembro de 1931 no jornal “O Almadense”, com o título “Os restaurantes do Ginjal vão-se civilizando”, mostrava que há muito se criara o hábito de aí procurar boa comida e boa bebida:
«Os toldos de serapilheira que lhes tapavam as portas noutros tempos e a fila de fogareiros de barro onde se assavam sardinhas e se abria o marisco, tudo isso desapareceu para dar lugar a casas decentes onde decentemente se pode comer». Criavam-se, assim, condições para que cada vez mais pessoas se deslocassem propositadamente ao cais do Ginjal para apreciar os petiscos preparados nos vários restaurantes da zona.

«Do lado de Cacilhas, estes ocupavam logo os primeiros edifícios. Começando aqui pelo princípio do Ginjal, há o Farol, que era dantes a Fonte da Alegria, que era uma tasca. Foi sempre uma tasca que deu muito dinheiro… Aquilo a vender sandes e copos era um disparate! (…)  Depois, onde está aquele restaurante baixinho, era o restaurante da Maria Vagueira.
Depois a entrada da Floresta era aquela entrada que ia dar a uma tasca lá por cima, pela Rua das Terras (…). Depois a seguir havia um restaurante que era o Pepe. (…) Depois ainda havia o Pita, que era o restaurante Abrantino no primeiro andar, que ardeu, e por baixo outro restaurante que era a Palmira das Batatas. (…) Depois ao lado era o Gonçalves (…) e a seguir era o restaurante da espanhola. Era a mãe da Madalena Iglésias. Ao fundo do cais ainda havia o Ponto Final. (…)
O Floresta do Ginjal (…) era assim chamado por ser todo tapado com folhas de parreira, permitindo a realização de grandes festas com fados (…).»

“Fonte da Alegria” com o «Hispano-Suiza» de D. José de Anadia aquando da partida para uma excursão a Sevilha em 1912

  

O edifício do restaurante “Floresta do Ginjal” foi adquirido pelo Santos da “Floresta". Posteriormente este vendeu a José Alves de  Melo, que criaria a firma “José A. de  Melo e Filhos, Lda.”.  A “Floresta do Ginjal” tinha um porteiro recepcionista para receber e dar as boas vindas aos clientes, de seu nome Silvano, que também trabalhou na sucursal “Churrasqueira do Ginjal”, propriedade do mesmo José Alves de Melo, existente ao lado da “Floresta do Ginjal”. No rés-de-chão do edifício ficavam os armazéns de azeites, óleos e vinhos de “José Pinto Gonçalves Lda”.

Com a sua original entrada o antigo restaurante “Floresta do Ginjal”, foi uma referência gastronómica de então em Cacilhas, que atraía muita gente, incluindo e sobretudo de Lisboa que se dispunha a atravessar o Rio Tejo nos famosos “cacilheiros” para ir almoçar à «outra banda», para disfrutar também da maravilhosa vista sobre Lisboa, que se avistava das suas salas no primeiro e segundo andares.

Postal

7 de Agosto de 1964

Entrada da “Floresta do Ginjal” e copo com a imagem da mesma

  


Postal, copo e este cartão gentilmente cedidos por Carlos Caria

Em entrevista ao Jornal de Notícias de 15 de janeiro de 2011, Álvaro Pereira, de 55 anos, que trabalhava no restaurante "O Farol", e que resistiu ao declínio da zona, recordava: «Vinha aqui gente do Norte para o Grande Elias. A fama das caldeiradas era daqui. As pessoas atravessavam o rio só para comer a caldeirada. E a Floresta do Ginjal chegava a ter 70 trabalhadores ao fim-de-semana. Muita gente casou ali».

Com o declínio e encerramento da “Floresta do Ginjal” como restaurante, e pouco tempo depois de ter fechado as portas como casa de pasto, alguns empresários, a partir de 2006, resolveram utilizar o espaço vago como sala de espectáculos musicais, apresentando bandas de música alternativa.

    

«Era comum cruzarmo-nos nas imediações do Ginjal com gente que primava pela diferença, essencialmente pela sua forma peculiar de vestir e pentear. Ao passarmos pela "Floresta" éramos obrigados a escutar sons metálicos que aconselhavam as gaivotas a voar para outras freguesias. Hoje a música continua, mas é bastante diferente... O som que sai das janelas é mais calmo e tenta reviver os bailes e as músicas mais apropriadas para se dançar aos pares, dos anos cinquenta e sessenta. Pelas suas portas entram homens e mulheres de meia idade, à procura de muitas coisas, com um destaque especial, para o combate à solidão.» 

Em 23 de Novembro de 2012 seria substituído pelo “Bar Floresta do Gingal”

 

 

Foi assim até 2015, altura em que a 28 de Fevereiro desse ano, foi inaugurado o “Ginjal Terrasse” ocupando o primeiro andar do antigo restaurante “Floresta do Ginjal”.

                     

 

Ao celebrar o seu segundo aniversário, em 2017, o “Ginjal Terrasse” organizou um festival, com três dias e várias propostas. Foi uma grande festa com muita música, animação e vista sobre o rio Tejo e Lisboa. «Queremos ter uma oferta diversificada e apelar a vários públicos porque o Ginjal não é uma sala fechada num género musica»”, explicava na altura o programador David Pinheiro. Actualmente, continua a funcionar, quer como discoteca com dj’s, quer com espectáculos e concertos ao vivo, servindo pequenas refeições.

fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Delcampe.net

27 de setembro de 2018

Sucursal do “Diario de Noticias”

A nova sucursal do jornal Diario de Notícias”, na esquina da Praça D. Pedro IV (Rossio) com a Rua do Ouro, foi inaugurada em 27 de Outubro de 1938. Projectada pelo arquitecto Luís Cristino da Silva (1896-1976), foi construída pela “Sociedade de Construções Amadeu Gaudêncio” que tinha sido fundada três anos antes, em 1935.

 

Até então, a sucursal do “Diario de Noticias”, no Rossio, e desde 1 de Fevereiro de 1920, tinha estado instalada na “Tabacaria Neves”, na esquina praça D. Pedro IV (Rossio) com a Travessa do Carmo.

“Tabacaria Neves”

 

Com o arquitecto Luís Cristino da Silva, colaboraram: António Cristino, com as maquetes de gráficos e fotomontagem; Horácio Novais, com as suas magníficas fotografias, e Francisco Duarte, que executou estes trabalhos. A gerência da loja ficou entregue a Carlos Neves, funcionário do “Diario de Noticias”.

Estabelecimento comercial (camisaria) antes de ser substituído pela sucursal do “Diario de Noticias”. Foto durante a audição do relato do jogo de futebol Portugal-França (2-0) em 23 de Fevereiro de 1930

Tapumes das obras da Sucursal, com cartazes de Fred Kradolfer do “ETP - Estúdio Técnico de Publicidade

Em 22 de Maio de 1928 era inaugurado o placard luminoso, para visualização pelos transeuntes, de notícias transmitidas pelo “Diário de Notícias”, e colocado no prédio de esquina da Praça D. Pedro IV com a Rua do Ouro - o mesmo onde abriria em 1938 a nova sucursal deste jornal. De referir que, em 12 de Março de 1937, uma chuva de granizo partiu cerca de trezentas lâmpadas deste placard, pelo que o mesmo ficou inoperacional, tendo sido removido e só recolocado, no mesmo local, no início dos anos 60 do século XX.

                          

Placard luminoso entre o último e penúltimo andares do prédio, já no início dos anos 60 dos século XX

 

«Sugestivos motivos artísticos na decoração, no mobiliário. nos quadros de exposição prendem e encantam os olhos dos visitantes, em termos que à utilidade do estabelecimento há a acrescentar o agrado que êle dá.
Ao centro uma foto-montagem publicitária, com motivos alusivos aos espectáculos, às profissões, aos transportes, ao comércio, à indústria e à agricultura dá expressão viva esta legenda eloquente: - «Anunciar no Diario de Noticias é atingir todos os sectores da vida nacional».

 

«Os serviços de expansão e publicidade do Diário de Notícias, inaugurando hoje a nossa sucursal do Rossio, realizam um melhoramento digno de uma grande capital. Dão à mais movimentada das nossas praças, no coração da cidade, um estabelecimento «sui generis», centro de informações e comunicações de tôda a ordem, grande escritório público cujas múltiplas secções facilitam a vida de tôda a gente. Os serviços de publicidade, até aqui feitos na Tabacaria Neves, passam, a partir de hoje, para a nova sucursal, instalada na ampla casa que tem entrada pelo nº 296 da rua do Ouro e pelos nos. 10 e 11 da praça de D. Pedro IV. Mas, tratando-se de uma instalação do primeiro jornal português no local mais frequentado de Lisboa, o Diário de Notícias, sempre devotado ao interêsse geral, cuidou que ela, pela amplitude das suas funções, servisse, principalmente, o público. Estará aberta todos os dias, das 9 horas à meia noite. E, durante êsse tempo, tôda a gente a pode frequentar, utilizando os diversos e importantes serviços que a todos proporciona.
Assim, é estação telégrafo-postal, dotada ele aparelhos de transmissão automática ele telegramas, e onde se vendem estampilhas e se recebe correspondência; central telefónica. onde se podem estabelecer comunicações com as linhas inter-urbanas, nacionais e internacionais; livraria, fornecida de obras de todo o género, nacionais e estrangeiras; perfumaria, de que é depositária a Eva, com todos os artigos de «toilette» feminina; casa de figurinos e debuxos, também secção confiada aos cuidados da Eva; «bureau» de turismo, com quadros onde podem consultar-se horários de aviões, combóios. vapores e camionetas e indicações úteis sôbre museus, monumentos. teatros e cinemas; centro de informações, onde se diz ao público tudo o que o público precisa de saber; fotografia, onde se tomam encomendas, se revelam e executam todos os trabalhos da especialidade, com uma exposição permanente de fotografias de amadores e reportagens dos grandes acontecimentos dos desportos e da vida de sociedade; e centro publicitário, onde se recebem anúncios e tratam todos os assuntos relativos ao Diário de Notícias, Eva, Os Sports e Notícias Agrícola.»
citações in: “O Diário de Notícias da sua Fundação às suas Bodas de Diamante” 1º Volume - 1939 - Edição Diário de Notícias

Recibo de anúncio colocado no Rossio



Até à inauguração desta nova sucursal outras, em Lisboa, já tinham sido abertas:

2 de Junho de 1916 - Calçada do Marquês de Abrantes esquina com Av. das Cortes (futura Av. Presidente Wilson), 33 a 41
1 de Fevereiro de 1920 - Na “Tabacaria Neves” na esquina do Rossio com a Calçada do Duque.
21 de Julho de 1922  - Avenida Casal Ribeiro, 27 e 29
30 de Março de 1927 - Largo Trindade Coelho
30 de Junho de 1928 - Na “Havaneza do Calvário”, de Marceano Lourenço, no Largo do Calvário, 20 em Alcântara
Data ? - Largo do Chiado (Rua Garrett)

Sucursal do Largo do Chiado, e maqueta fotográfica do projecto de alteração do arquitecto Francisco Conceição Silva

 

Publicitando o jornal brasileiro "A Noite"

Na foto anterior, da esquerda, a sucursal do “Diario de Noticias”, inicialmente, aproveitaria o alpendre e a fachada deixados pela sua antecessora “A Garrett” , como atesta o seguinte anúncio publicitário datado de 1936.

Depois de remodelada pelo projecto em 1955 do arquitecto Fernando Conceição Silva, em fotos de 1970

 

Em 4 de Maio de 1927, tinha aberto a sua delegação/sucursal no Porto, no 1º andar do edifício da filial da Companhia de Seguros "A Nacional", que tinha sido inaugurado na Avenida dos Aliados, em 1924.

“Diario de Noticias” no 1º andar da filial da Companhia de Seguros "A Nacional", na Avenida dos Aliados, no Porto

 

Em 24 de Abril de 1940, e para encerramento das comemorações das “Bodas de Diamante” do “Diario de Noticias”, fundado em 29 de Dezembro de 1864, seria inaugurado o seu novo edifício na Avenida da Liberdade, em Lisboa, e projectado pelo arquitecto Porfírio Pardal Monteiro (1897-1957). Acerca deste edifício e da história deste jornal consultar neste blog o seguinte link: “Edifício do Diario de Noticias”.

Entretanto a Sucursal do “Diario de Noticias” no Rossio, já depois do ano 2000, passa a a livraria “Oficina do Livro” (fundada em 1999), que depois de ser ter integrada, a partir de 2008, no grupo “Leya” mudaria para actual designação “Leya no Rossio”.

Desde há poucos anos é a … “Feira dos Tecidos” … fica a foto.

fotos in: Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Hemeroteca Municipal de LisboaArquivo Municipal de Lisboa, Ruas de Lisboa com Alguma História