Restos de Colecção: novembro 2024

27 de novembro de 2024

Retrozaria "Irmãos David"

A Retrozaria "Irmãos David", abriu as suas portas pela primeira vez em 1907 na Rua Garrett, 112-118, sob a firma "David & David, Limitada". A actividade desta retrozaria já tinha sido iniciada em 1882, com estabelecimento na Rua Nova do Almada.


Foto de 1945


Anteriores inquilinos: "Guilherme Steglish" e "Matta Junior" no final do século XIX

Como foi atrás referido, nestes números 112 a 118 da Rua Garrett, já tinham funcionado duas das mais conceituadas lojas de instrumentos musicais, a referir: "Guilherrme Steglish - Armazem de Pianos", desde 1886 nos números 116 e 118, e "Matta Junior - Músicas e Pianos" fundada nos números 112-114, em 1890.

Acerca da história deste conceituado estabelecimento, nada melhor que transcrever um apontamento histórico disponibilizado no livro "Praça de Lisboa" organizado por Carlos Bastos em 1945:

«No seu ramo, retrozaria e modas, é esta firma não só uma das principais casa do Chiado, e de Lisboa portanto, como também uma das de maior antiguidade, pois foi fundada em 1882 pelos irmãos José e Firmino David, conceituados comerciantes da época que se impuseram à estima e consideração da praça de Lisboa pela probidade de carácter e alto espírito de iniciativa mercantil.
Naturais de Pedrogão Grande, os fundadores vieram ambos muito jovens para Lisboa, onde se dedicaram um ao ramo de modas, outro ao comércio de retrozaria, até que, alcançada a experiência e o prestígio suficientes, se reuniram ambos em sociedade com uma firma cuja sede primitiva foi na Rua Nova do Almada.
Graças à probidade das suas transacções, à lhaneza de trato e à superior orientação que imprimiram ao estabelecimento, êste logo conquistou acentuada preferência de larga clientela, conseguindo entrar em rápido e florescente desenvolvimento.
Êsse lisonjeiro êxito incentivou os irmãos David a maior incremento da sua incansável actividade e, assim, procurando corresponder ao acolhimento recebido, em 1907 mudaram a sede para a Rua Garrett, onde adquiriram de trespasse o antigo armazém de pianos de Guilherme Steglich e a casa de músicas de Matta Júnior, estabelecimentos que submeteram a obras de adaptação das quais surgiu a actual e magnífica sede da firma David & David.
Tendo atingido uma veneranda idade que já lhes não permitia dar ao negócio a atenção que sempre lhes dispensaram, os fundadores, em 1918, passaram a casa aos seus dedicados colaboradores, filhos de Firmino David, José, Firmino seu ramo, retrozaria e modas, é esta mino e Henrique Morais David, os quais continuaram, até hoje, mantendo as tradições honrosas do estabelecimento, quer aperfeiçoando e actualizando o ramo de modas e retrozaria, quer criando uma secção de perfumarias com laboratório próprio.
José e Firmino David faleceram respectivamente em 1923 e 1938, tendo atingido a veneranda idade de 71 e 86 anos.»

"David & David, Limitada", chegou a manter um laboratório de perfumaria na Rua Anchieta - uma perpendicular à Rua Capêlo.


Anúncios de 20 de Novembro e 20 de Dezembro de 1914

No mesmo ano de 1907, em que foi montada esta retrozaria na Rua Garrett, outra já existia nesta mesma artéria: a "Retrozaria do Chiado" da firma "Jaime de Oliveira & C.ª", nos números 69 e 71.


Retrozaria "Irmãos David" entre "A Brasileira" e "Hotel Borges"

Numa foto do seu interior actual (loja de sapatos "Zilian"), e preservado, podemos fazer uma ideia da original.



1938



Esta firma viria a ser liquidada e dissolvida em Setembro de 2016. O seu objecto ainda era: «O comércio de tecidos de lã, seda, algodão e qualquer outra natureza, perfumaria, retrosaria e novidades.»


Foto dos anos 80 do século XX


E actualmente no seu lugar ... e lá vão caindo as letras dos 
"Irmãos David" ... 


24 de novembro de 2024

Hotel Altis

O "Hotel Altis" foi inaugurado na Rua Castilho, 11 em Lisboa no dia 17 de Novembro de 1973, com a classificação de 5 estrelas. Propriedade da "Altis - Sociedade de Empreendimentos Turísticos e Hoteleiros, S.A.R.L.", foi fundado pelo empresário Fernando Martins (1917-2013) - que viria a ser presidente do "Sport Lisboa e Benfica" entre 1981 e 1987 - e pelos seus filhos Raúl Martins e Maria Júlia Valente Rodrigues. Era o quarto cinco estrelas do país e o primeiro hotel projetado para receber eventos e congressos com centenas de pessoas. 

Este hotel foi implantado num terreno, na esquina da Rua Castilho com a Rua Barata Salgueiro, onde tinha estado o palacete da família Arbués Moreira, e que tinha sido adquirido em 1967, com a finalidade de ali ser construído um edifício de escritórios. Como curiosidade:  Arbués Moreira, em 1873 era chefe de repartição do Ministério da Guerra. « - Está em Belem, com sua família em uso de banhos de mar, o sr. Arbués Moreira, chefe de repartição no ministerio da guerra.» in: "Diario Illustrado" de 19 de Agosto de 1873.

Terreno onde viria a ser construído o "Hotel Altis"

Fernando Martins (1917-2013)

O projecto de arquitectura foi entregue ao arquitecto Fernando Rafael Máximo Miranda (1927-2013) e cujo projeto de interiores, mobiliário, fardas e iluminação, datado de 1971, foi realizado por Daciano da Costa (1930-2005), José Falcão, Jorge Cid, Fernando Lemos Gomes, José Barros Gomes, Guilhermina Campos, Beatriz Alçada (grafismos e figurinos de funcionários) e Praxis (grafismos). A sua contrução ficou a cargo da empresa "Sociedade de Construções ERG". Mobiliário fornecido pelos "Móveis Sousa Braga", "Altamira", "Camaro", e alcatifas, carpetes e tapetes pela "Fábrica de Tapetes Vitória".  

Inicialmente o "Hotel Altis" possuía 206 quartos, 14 suites, 3 restaurantes, 2 bares, um salão polivalente e um clube de bridge. No átrio de entrada - onde são agrupadas as funções de recepção, portaria, escadas e elevadores - foi criado um espaço que fosse mais público, com o acesso para a rua e aberto para o exterior. O seu tecto possuí uma treliça de madeira que prolonga o espaço para uma galeria, com umas lâmpadas espelhadas incandescentes, que fazem da iluminação deste espaço pontual e difusa. A galeria é a zona de estar principal, onde se localizam as zonas de jogo, escrita, televisão e leitura. Este espaço possui também uma tapeçaria de Sá Nogueira. 




O restaurante principal, denominado "Girassol", era um espaço que pode ser compartimentado com biombos que tanto permitem uma visão de conjunto, como tornar o espaço mais acolhedor e privado. A iluminação era feita com lâmpadas incandescentes, proporcionando uma luz pontual e indireta vinda do teto, também em treliça. Neste restaurante foi colocada uma tapeçaria de Maria Velez. Com a mesma composição do restaurante principal, a sala de pequenos almoços distinguia-se do primeiro pelo seu esquema de cores no teto. O mobiliário e a tapeçaria deste espaço foram da autoria de Luís Filipe Abreu.



15 de Maio de 1975



19 de Maio de 1974



Os quartos foram organizados de modo a obedecerem às medidas de espaços mínimos regulamentares. Para isso, recorreu-se a soluções de mobiliário integrados. O mobiliário solto também foi dimensionado nos limites mínimos; contudo não abdicando das exigências de conforto pretendidas. Os materiais de revestimento e de decoração encontravam-se organizados por uma paleta de cores e texturas que permitem a variação dos ambientes, sem perda de economia de produção, por métodos industriais. Esta descrição anterior foi baseada no nº 197 da revista "Binário" de Fevereiro de 1975.




Etiqueta de bagagem

Ao longo das primeiras três décadas e respondendo às exigências e às necessidades de modernidade e atualidade, o "Hotel Altis" foi alvo de uma grande ampliação e diversas renovações no conjunto dos seus interiores e infraestruturas técnicas, assim como criação de novos serviços nomeadamente Health Club, Piscina, Coffee Shop e Business Centre. Em 2011, o Hotel iniciou a sua maior remodelação de sempre com a transformação de 200 novos quartos deluxe, renovação do hall criando o Lobby Bar e neste mesmo ano integra a coleção Luxury da "Great Hotels of the World". Em 2012 e 2013 as renovações continuaram por diversas áreas do Hotel nomeadamente as salas de reunião e banquetes, "Bar Herald" e galeria e em 2014 foram renovados 100 quartos deluxe incluindo uma nova Suite presidencial e abertura do novo spa, "GSpa By Altis Grand Hotel" que incluiu a renovação da piscina, sauna, banho turco, ginásio, studio para aulas em grupo e 5 salas de tratamentos. Estas renovações ficaram a cargo da dupla de arquitetas Cristina Santos Silva e Ana Meneses Cardoso que criaram um ambiente atual, sofisticado e elegante.







Foto de família antes do falecimento de Fernando Martins ocorrido em 28 de Julho de 2013

A atividade do "Grupo Altis Hotels", propriedade da família Martins com Raúl Martins como Administrador, teve início com a abertura do "Hotel Altis" hoje "Altis Grand Hotel", em 1973. Seguiram-se em 1994, o "Altis Park Hotel" (actual "Olaias Park Hotel"), um 4 estrelas de linhas contemporâneas com 300 quartos, localizado no empreendimento da Encosta das Olaias. A este seguiram-se-lhe o "Altis Suites" (1998), um hotel de apartamentos localizado ao lado do "Altis Grand Hotel", o "Altis Belém Hotel & Spa" (2009) com uma localização privilegiada à beira Tejo, o "Altis Avenida Hotel" (2010) um boutique Hotel em pleno centro de Lisboa, na praça dos Restauradores, e por fim, o "Altis Prime" (2010) um hotel de apartamentos de luxo a poucos metros da Avenida da Liberdade, uma das avenidas mais cosmopolitas da cidade de Lisboa. Em 2024, o Grupo expandiu a sua presença para o norte do país com a inauguração do "Altis Porto Hotel", reforçando a sua oferta de luxo em Portugal.


22 de novembro de 2024

Restaurant Central Augusto

O "Restaurant Central Augusto", teve a sua origem no "Restaurant Central", inaugurado na Travessa das Portas de Santa Catharina, 12 (actual Travessa da Trindade) em 16 de Outubro de 1879. Foi seu fundador José Jorge Augusto do Carmo, antigo empregado do famoso "Restaurant Club", que tinha sido inaugurado na Travessa Estevão Galhardo (actual Rua Serpa Pinto desde 1885), 12-1º andar e esquina com a Rua Garrett, no dia 3 de Dezembro de 1874. Era propriedade do chef cozinheiro José Antonio da Silva (? - 1892), que tinha sido discípulo do famoso cozinheiro João da Matta e, também, gerente de um dos "Restaurant Matta".


16 de Outubro de 1879

Antiga Travessa das Portas de Santa Catharina (1ª à direita ao subir)


26 de Outubro de 1879


7 de Fevereiro de 1880

Em 20 de Outubro de 1894, José do Carmo inaugura novas instalações, mudando-se para a Rua Garret, no 1º andar do edifício da "Antiga Casa José Alexandre", com entrada pela Calçada do Sacramento, nº 6, e altera a denominação de "Restaurant Central" para "Restaurant Central Augusto". 

"Grande Restaurant Central Augusto" à direita na foto, no 1º andar. Na esquina em frente a famosa "Magiolo & Magiolo", mais tarde "Ao Último Figurino".


20 de Outubro de 1894 


24 de Dezembro de 1897

Na ocasião o jornal "Diario Illustrado", noticiava a sua abertura:

«Reabre hoje o restaurant Augusto na Rua Garrett, com entrada pela calçada do Sacramento.
O local não pode ser melhor, a casa é excellente e as obras ali feitas estão o mais bem aproveitadas que é possível, para que aos freguezes não faltem commodidades.
Tem uma boa casa de jantar, bellos gabinetes e tudo mobilado ricamente e com gosto. Hoje são de crer duas enchentes: uma no Real Colyseu e outra no restaurant Augusto.»


1900


25 de Dezembro de 1902

Em 1904 o "Restaurant Central Augusto" já pertencia a Domingos José Moinhos Soares, tendo sido este o ultimo ano de existência deste restaurante, que chegou a ser o mais afamado e requintado de Lisboa.

1º Piso onde funcionou o "Restaurant Central Augusto" e onde se instalou o estabelecimento de decorações "Mobílias da Granja", em 2 fotos de épocas diferentes ( 1ª foto de 1939)

Doze anos depois de encerrado, o jornal "A Capital" de 14 de Julho de 1916 recordava o "Augusto":

«No primeiro andar d'este predio, esteve uma modista - E. Jaume - durante muitos annos. Era casada com um antigo administrador do Jornal do Commercio. Liquidou, sucedendo-lhe o restaurante Augusto, que foi, no seu tempo, o mais afamado e o melhor frequentado de Lisboa. Depois, os tempos mudaram, e a casa teve de liquidar, sendo os seus haveres vendidos em almoeda. A frasqueira do restaurante Augusto era riquissima, havendo especialidades que attingiram, no leilão, altos preços.»

Entretanto, outro restaurante e café "Central", denominado de "Café Restaurant Central", já tinha sido fundado em 1895 na Calçada do Carmo, nº 19, por José Alves Rodrigues e Antonio Alonso Meyra. Em 1904, já pertencia a  Manuel Souto Passos.  

"Café Restaurant Central" na área delimitada pela linha vermelha

28 de Abril de 1895

fotos in: Hemeroteca Digital de LisboaArquivo Municipal de LisboaBiblioteca Nacional Digital

20 de novembro de 2024

York Bar

O "York Bar", foi fundado pelo barman Ângelo Pereira, em 14 de Novembro de 1929, na Rua Serpa Pinto, 23 em Lisboa. Esta bar, e boite, foi projectado pelo arquitecto Jorge de Almeida Segurado (1898-1990) e decorado por António Soares. Era o primeiro passo de Ângelo Pereira como proprietário ou gerente de conceituados bares, dancings e restaurantes lisboetas, como veremos mais adiante.


Fachada do "York Bar" na Rua Serpa Pinto

No dia da inauguração o jornal "Diário de Lisboa" noticiava:

«Lisboa moderniza-se dia a dia.
Hoje, realizou-se a inauguração de um novo estabelecimento, onde o lisboeta pode encontrar aquela alegria de viver que dão o conforto, o bom gôsto, os líquidos espirituosos e a atmosfera agradável da "tertúlia". O "York Bar" instaladao na Rua Serpa Pinto, 23 em pleno Chiado, e que constitui uma bela afirmação de progresso e de espirito de iniciativa.»


Foto a noite de inauguração, com os arquitectos Carlos Ramos e Pardal Monteiro (3º e 4º em pé a contar da direita)

O mesmo jornal no dia seguinte ...

«Lisboa, capital europeia das mais belas, sente a necessidade de ser, simultaneamente, das mais modernas.
As exigencias de vida de hoje, obedecendo ao imperio despotico de correntes de bom gosto e elegancia, obrigam a cidade de Ulisses a europeisar-se, a internacionalizar-se sob determinado ponto de vista, ou pelo menos, a transigir no set: casticismo, a permitir que, a par dos seus recreios pitorescos e bebidas indígenas - o vinho e o retiro - surjam locais e formulas tão «Novo Mundo» como o «bar» e o «cocktail».
Tal transigencia «alfacinha» satisfaz nao só os portugueses elegantes e viajados, frequentadores da «calle» do «Savoyan, de Madrid, como os turistas americanos, nostalgicos dos «bars», de Nova York.
Estas considerações vem a proposito da inauguração do «York Bar», uma «boite» bizarra que ontem surpreendeu a curiosidade lisboeta, ali na rua Serpa Pinto.
Um portico modernista e uma porta giratoria dão acesso ao mais ousado «bar» que a cidade ainda conheceu, projecto que, apesar do reduzido das dimensões, representa um grande, um autentico triunfo do arquitecto Jorge Segurado e do pintor Antonio Soares. O primeiro realizou pelos processos mais modernistas, um «cercle» elegantissimo, ideal para o fim a que se destina; o segundo colaborou no plano geral de decoração e pintou deliciosos quadros que se combinam maravilhosamente com o ambiente. «Maples» confortaveis completam a linda casa de estar, onde um «barman» afamado, Harry Dimauro, vindo de Biarritz, prepara os mais «esquisitos» «coktail».
A inauguração do York Bar, a que assistiram jornalistas, artistas e «sportsman», marca um acontecimento citadino e merece, sem favor, ser arquivada para a historia da Lisboa moderna com estas ligeiras considerações.
Lisboa, na frase dum antigo e elegante jornalista, ja tem onde tomar o seu «coktail» das Cinco.»


26 de Junho de 1933


25 de Dezembro de 1935


1943

Ângelo Pereira, além de barman de profissão, viria a ser proprietário e/ou somente gerente de conceituados estabelecimentos hoteleiros lisboetas, como: gerente da "Taverna Imperial" inaugurada em 31 de Dezembro de 1931, na Praça dos Restauradores; gerente do Bar-Dancing "Arcádia" inaugurado em 5 de Fevereiro de 1932, na Rua Eugénio dos Santos; proprietário e gerente do restaurante "Negresco", inaugurado em 5 de Março de 1937, na Rua Jardim do Regedor.


30 de Dezembro de 1944

O "York Bar" terá encerrado em 1951, já que a última publicidade a esta casa, e que tive acesso, apareceu na "Gazeta dos Caminhos de Ferro" em 1 de Janeiro de 1951, e que publico de seguida. Por sua vez, o "Arcádia" continuou «a todo o vapor» nos anos seguintes. Mas quanto ao "York Bar" descobri-o numa lista do "Diario de Lisboa" de 23 de Março de 1970 e que publico de seguida ...


1 de Janeiro de 1951


23 de Março de 1970

De referir que, a partir do mês seguinte, o "York Bar" deixou de aparecer nesta mesma lista ...