O “Theatro Luiz de Camões” localizado na Calçada da Ajuda, em Lisboa, foi mandado construir por João da Cunha Açúcar e inaugurado em 8 de Junho de 1880, durante as comemorações do tricentenário da morte do poeta Luiz Vaz de Camões em 10 de Junho de 1580.
Este Teatro é remanescente de um edifício mandado construir pelo Rei D. João V, entre 1735 e 1737 como sendo a “Casa de Opera da Real Quinta de Belem”. Também conhecido como “Casa de Opera da Ajuda”, “Real Theatro da Ajuda” ou “Opera Real de Belém”, entre outras designações, foi o primeiro Teatro real de ópera «à italiana» construído em território português. Funcionou regularmente como Teatro do Rei até ao adoecimento de João V em 1742.
Acerca do “Real Theatro da Ajuda” dois artigo no jornal “Comercio da Ajuda” de 3 e 17 de Dezembro de 1932
O “Theatro Luiz de Camões” permaneceu fechado até a ascensão do Rei D. José I e continuou a ser utilizado até ao reinado da Rainha D. Maria I, sendo fechado após a abertura do “Real Theatro de São Carlos” em 30 de Junho de 1793. Passou por períodos de abandono e foi utilizado como Celeiro Real - celeiro de uso do Palácio de Belém e de suas cavalariças situadas defronte junto ao Picadeiro Régio - até ser vendido na década de 1870 a João da Cunha Açúcar, proprietário de uma drogaria na Rua da Junqueira, com a ideia de o explorar como Teatro, tendo procedido a uma profunda reforma. Por esta altura, já ninguém mais tinha recordação do Teatro que ali um dia existira, razão pela qual foi noticiada a inauguração de um novo Teatro, o “Theatro Luiz de Camões”, em 8 de Junho de 1880, com a primeira récita “Camões e o Jau”, de Casimiro d’Abreu, a ser exibida em 10 de Junho.
8 de Junho de 1880 20 de Junho de 1880
10 de Dezembro de 1880 19 de Dezembro de 1880
Depois de, em 1892, passar para a propriedade de Joaquim Maria Nunes, o “Theatro Luiz de Camões” não teve grande sucesso como tal e, depois de um processo de herança, permaneceu fechado por alguns anos, até 2 de Fevereiro de 1912, dia a partir do qual se instala o “Belém Club”, - fundado na Rua de Belém em 1899 - uma Associação formada por dissidentes do antigo “Belém Recreio”. Em 1925 o imóvel já era propriedade de D. Amélia Peyssonneau Nunes, viúva de Joaquim Maria Nunes.
“Programa” de 20 de Maio de 1953
«Como em tantas outras colectividades recreativas de bairro, era aqui que se reuniam as famílias para conviver, dançar, fazer teatro ou música, comemorar datas festivas, jogar, etc. Também seria mais um daqueles locais onde, à época, se proporcionaram os namoricos dos jovens, sob o olhar atento e respeitável dos papás e mamãs! À medida que o tempo decorreu, com a evolução natural na vida , os hábitos de lazer das pessoas também se modificaram. Por outro lado, uma obrigatoriedade de obras na zona do palco e a habitual falta de meios e espera de subsídios, originou que, agora, a actividade no Club esteja bastante reduzida. Fazem-se, no entanto, ainda algumas exposições de arte e, por vezes ensaios e gravações musicais.» in Simecq.cultura(15-11-2008) . Foi neste Teatro que foi realizado o programa “Melodias de Sempre”, grande sucesso da RTP em 1960 e apresentado por Jorge Alves.
gentilmente cedido por Carlos Caria
No átrio, no lugar onde existia o bengaleiro estava agora um pequeno bar. Um pouco para a direita situava-se uma escadaria que levava ao andar superior. As paredes laterais estavam cobertas com diversas placas que assinalavam a passagem por ali de grandes figuras do espectáculo já desaparecidas, como: Procópio Ferreira, Alves da Cunha, Adelina Abranches, Tomás Alcaide, Mirita Casimiro, Luís Piçarra, João Villaret, entre outros.
Interior em 2009
A sala principal, pela sua configuração, era o o que vulgarmente se designa por «um teatro à italiana». Na plateia, restavam algumas das cadeiras primitivas de madeira. Os camarotes que rodeavam a sala, num plano superior, estando assentes em colunas de madeira e, delimitados por um varandim em ferro forjado.
Em 1952 o edifício do “Teatro Luís de Camões” encontrava-se em muito mau estado de conservação (designadamente no que respeitava à cobertura) e em 1954 o proprietário do imóvel, Justino Gonçalves, depois de ignorar sucessivas intimações do Município lisboeta, para que realizasse as obras necessárias (designadamente no palco), a Câmara Municipal de Lisboa torna-se proprietária do imóvel, via expropriação, em virtude do não cumprimento das referidas intimações.
“Teatro Luís de Camões” e a Calçada da Ajuda em 1964
Último espectáculo no “Teatro Luís de Camões” em 12 de Dezembro de 2015
Depois deste espaço ter sido desocupado pelo “Belém Clube” no final de 2015, e se ter mudado para as suas novas instalações cedidas pela Câmara Municipal de Lisboa, num edifício recuperado na Rua da Junqueira e inaugurado em 23 de Maio de 2016, a Câmara Municipal de Lisboa iniciou este ano, a construção dum novo espaço, no lugar do “Teatro Luís de Camões”, mantendo a fachada original …
A este propósito, pode-se ler no blog “Cidadania LX” a seguinte carta dirigida ao Presidente da CML:
«Exmo. Senhor Presidente
Dr. Fernando Medina
Cc. AML, DGPC, SRU Lx Ocidental, Arq. MGDias, JF e media.
Serve o presente para apresentarmos o nosso protesto veemente pela destruição quase integral do Teatro Luiz de Camões/Belém Clube, teatrino histórico sito da Calçada da Ajuda, por iniciativa da empresa municipal SRU-Lisboa Ocidental e ao abrigo de um suposto projecto de reabilitação do espaço, do arq. Manuel Graça Dias, que afinal se revelou um projecto de alterações profundas e de construção nova, apenas isso.
Assumimos, erradamente, que o intuito de tal projecto fosse a reabilitação de facto do edifício, que necessitava, basicamente, de uma operação de restauro, e que o deixassem genuíno, eximindo-se os intervenientes da tentação de nele exibirem "marca de autor", contemporânea, num edifício que dela não necessitava. Acreditámos, infelizmente, na bondade de uma iniciativa apregoada pelos agentes envolvidos como de valorização da zona. E acreditámos na resposta da SRU Lx Ocidental ao nosso pedido de esclarecimentos de 2012. Puro engano, já que Lisboa ficou mais pobre.
Mais uma vez, os responsáveis pela destruição de património na cidade ficarão impunes.
Melhores cumprimentos»
Ante-projecto
Fotos disponibilizadas pelo blog “Cidadania LX” em 1 de Junho de 2016
A opinião e avaliação do Professor Doutor Arquitecto Paulo Roberto Masseran da Universidade Estadual Paulista, de São Paulo, Brasil, especializado em arquitectura teatral luso-brasileira, e que gentilmente partilhou comigo o essencial da sua investigação histórica acerca do “Teatro Luís de Camões”, vem reforçar a ideia do texto anterior.
«Tomei conhecimento do início das obras de reforma do prédio, realizadas pela Câmara Municipal de Lisboa, por meio de um blog e fiquei surpreso com o grau da intervenção impetrada ao histórico edifício. O projeto arquitetônico desenvolvido age sobre um edifício do século XIX, erroneamente, pois trata-se, efetivamente, de um dos principais monumentos arquiteturais do conjunto do Palácio de Belém, construído no século XVIII. O grau de transformação do espaço interno era mínimo, reservado à substituição dos gradis dos camarotes superiores, ao plafond da sala de espetáculos e à reformulação dos acessos, aquando a escadaria central, outrora privativa do rei e que o conduzia diretamente à Tribuna Real, transformou-se em acesso principal ao piso superior. Era um teatro simples, longe do fausto decorativo das arquiteturas empreendidas por D. João V, mas preservava as colunatas, a Tribuna Real, a boca-de-cena e a estrutura do palco, quase intocadas, o que o tornava um monumento singular.»
fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Hemeroteca Digital, Lisboa SOS, Anteprojectos, Cidadania LX