Restos de Colecção: novembro 2016

29 de novembro de 2016

Antigamente (137)

Carro publicitário do “Cine-Parque” do Funchal, em 1941

Equipa e filmagens da película sobre sementes seleccionadas, em 1953

  

Publicidade no “Mercado 31 de Janeiro” na Avenida Fontes Pereira de Melo em Lisboa, em 1961

Aviões nas “Festas do Senhor de Matosinhos”, em 1970

fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Artur Pastor

27 de novembro de 2016

Casa das Tesouras

A “Casa das Tesouras” abriu as suas portas por volta de 1893, na Rua da Escola Politécnica em Lisboa, inicialmente com a designação de “Alfaiate Popular” e propriedade do alfaiate José Clemente. Esta alfaiataria instalou-se num edifício construído, em 1858, em frente da Escola Polythecnica”, criada em 1837 no reinado de D. Maria II.

“Alfaiate Popular” num anúncio em 5 de Novembro de 1893

Entretanto a alfaiataria de José Clemente, “Alfaiate Popular”, em 1896 ampila-se ao ocupar a loja do edifício contíguo com os numeros 53 e 53-A, e muda de designação para “Alfayateria Elegante”.

20 de Outubro de 1896

Conhecido pela “Casa das Onze Portas” este edifício foi destinado a habitação e comércio, num luxo desusado na época, em imóveis de rendimento. O seu projecto é atribuído ao arquitecto francês Pierre Joseph Pézerat, encarregado dos trabalhos de construção da “Escola Polytthecnica”, onde era professor de desenho desde 1853.

Entretanto no início do século XX, José Clemente, muda, mais uma vez, a designação da sua alfaiataria para “Casa das Tesouras”. Este famoso alfaiate de Lisboa, torna-se divulgador dos gabões de Aveiro, abafo para homens e rapazes absolutamente nacional, cómodo, eficaz e elegante, tornando-o acessível a todas as bolsas. O gabão elegante de linhas fradescas de cor preta ou castanha, de capuz, sem cinto, era impermeável e quentinho.

Na foto anterior, pode-se observar na esquina com a Rua Monte Olivete, um  concorrente bem próximo da “Casa das Tesouras”, a “Grande Alfaiateria da Polytechnica”, inaugurada em 5 de Dezembro de 1895.

1913

José Clemente, concitava a curiosidade do público com uma publicidade, que nesse tempo não era comum, e por isso tinha um efeito muito grande, levando o público a estabelecer a moda, de que todos aproveitaram: o José Clemente, os fregueses e os concorrentes que não foram poucos ...

Exemplo de interiores de outras duas alfaiatarias concorrentes

 

A "Casa das Tesouras" não se limitou a fazer só um tipo de publicidade; de vez em quando fazia desfilar pelas ruas da Baixa de Lisboa uma fila extensa de homens de gabão, encapuzados, marchando solenemente a provarem a superioridade do produto das tesouras do sr. Clemente. Acrescente-se a todas estas manifestações de publicidade a dos jornais, também inovadora e deveras curiosa por vezes.

                                        1 de Outubro de 1908                                                  16 de Outubro de 1908

        

                                1 de Dezembro de 1908                                                11 de Dezembro de 1908

                  

                    11 de Dezembro de 1908                                                            13 de Agosto de 1909

     

«Cliente significa freguês. O título foi a primeira grande conquista da cientificação do reclamo. O comprador ou a isso candidato é cliente e todos juntos são a clientela do sapateiro, do carvoeiro, do alfaiate, etc.»

Quanto ás suas convicções políticas José Clemente era um republicano, e em 18 de Novembro de 1910 é publicado no jornal “O Século”, em destaque, um texto assinado por José Clemente, intitulado "Um alvitre a todas as classes que estão em Greve, e para aquelas que, de futuro, pretendam fazer reclamações” e cujo conteúdo passo a transcrever:

1.º - Atendendo a que as Greves nesta ocasião só poderão contribuir para a destruição do nosso ideal, que foi a implantação da República Portuguesa (…), todos deverão retomar o trabalho;
2.º - Nomear-se-á uma comissão de 3 membros de cada Classe, a qual fará as reclamações por escrito a seus patrões;
3.º - Na sendo atendida, reclamar por intermédio da Associação de Classe (…):
4.º - Nunca abandonar o trabalho sem que estejam esgotados os esforços daquelas entidades;
5.º - Não se declarar Greve numa classe sem que outra esteja terminada.”

O nunca esquecendo a publicidade ao seu estabelecimento, o texto termina com um inesperado parágrafo:

«É esta a minha humilde opinião (…) e estou convicto se hoje todos tomarem as suas ocupações, se tornará simpático esse acto e todos aplaudirão os funcionários, indo trabalhar. Ganharão o sustento para os seus e ainda lhes ficará alguma coisa para comprarem os Fatos, Sobretudos da Moda e Gabões de Aveiro da célebre Casa das Tesouras, da Rua da Escola Politécnica (…), que bem precisos estão sendo para a quadra que estamos atravessando.»

Mas a “Casa das Tesouras” não era a única alfaiataria com “Tesouras” no seu nome. Na Rua da Palma tinha-se instalado a alfaiataria “Tesouras de Ouro” que, em 1916, se mudaria para a Rua dos Fanqueiros, conforme anúncio seguinte na “Folha de Lisboa” de 10 de Outubro de 1916.

fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Biblioteca Nacional Digital, Ruas de Lisboa com Alguma História

24 de novembro de 2016

Teatro Luís de Camões

O “Theatro Luiz de Camões” localizado na Calçada da Ajuda, em Lisboa, foi mandado construir por João da Cunha Açúcar e inaugurado em 8 de Junho de 1880, durante as comemorações do tricentenário da morte do poeta Luiz Vaz de Camões em 10 de Junho de 1580.

Este Teatro é remanescente de um edifício mandado construir pelo Rei D. João V, entre 1735 e 1737 como sendo a “Casa de Opera da Real Quinta de Belem”. Também conhecido como “Casa de Opera da Ajuda”, “Real Theatro da Ajuda” ou “Opera Real de Belém”, entre outras designações, foi o primeiro Teatro real de ópera «à italiana» construído em território português. Funcionou regularmente como Teatro do Rei até ao adoecimento de João V em 1742.

Acerca do “Real Theatro da Ajuda” dois artigo no jornal “Comercio da Ajuda” de 3 e 17 de Dezembro de 1932

O “Theatro Luiz de Camões” permaneceu fechado até a ascensão do Rei D. José I e continuou a ser utilizado até ao reinado da Rainha D. Maria I, sendo fechado após a abertura do Real Theatro de São Carlosem 30 de Junho de 1793. Passou por períodos de abandono e foi utilizado como Celeiro Real - celeiro de uso do Palácio de Belém e de suas cavalariças situadas defronte junto ao Picadeiro Régio - até ser vendido na década de 1870 a João da Cunha Açúcar, proprietário de uma drogaria na Rua da Junqueira, com a ideia de o explorar como Teatro, tendo procedido a uma profunda reforma. Por esta altura, já ninguém mais tinha recordação do Teatro que ali um dia existira, razão pela qual foi noticiada a inauguração de um novo Teatro, o  “Theatro Luiz de Camões”, em 8 de Junho de 1880, com a primeira récita “Camões e o Jau”, de Casimiro d’Abreu, a ser exibida em 10 de Junho.

                                        8 de Junho de 1880                                                 20 de Junho de 1880

     

                               10 de Dezembro de 1880                                          19 de Dezembro de 1880

    

Depois de, em 1892, passar para a propriedade de Joaquim Maria Nunes, o “Theatro Luiz de Camões” não teve grande sucesso como tal e, depois de um processo de herança, permaneceu fechado por alguns anos, até 2 de Fevereiro de 1912, dia a partir do qual se instala o “Belém Club”, - fundado na Rua de Belém em 1899 - uma Associação formada por dissidentes do antigo “Belém Recreio”. Em 1925 o imóvel já era propriedade de  D. Amélia Peyssonneau Nunes, viúva de Joaquim Maria Nunes.

“Programa” de 20 de Maio de 1953

«Como em tantas outras colectividades recreativas de bairro, era aqui que se reuniam as famílias para conviver, dançar, fazer teatro ou música, comemorar datas festivas, jogar, etc. Também seria mais um daqueles locais onde, à época, se proporcionaram os namoricos dos jovens, sob o olhar atento e respeitável dos papás e mamãs! À medida que o tempo decorreu, com a evolução natural na vida , os hábitos de lazer das pessoas também se modificaram. Por outro lado, uma obrigatoriedade de obras na zona do palco e a habitual falta de meios e espera de subsídios, originou que, agora, a actividade no Club esteja bastante reduzida. Fazem-se, no entanto, ainda algumas exposições de arte e, por vezes ensaios e gravações musicais.» in Simecq.cultura(15-11-2008) . Foi neste Teatro que foi realizado o programa “Melodias de Sempre”, grande sucesso da RTP em 1960 e apresentado por Jorge Alves.

 


gentilmente cedido por Carlos Caria

No átrio, no lugar onde existia o bengaleiro estava agora um pequeno bar. Um pouco para a direita situava-se uma escadaria que levava ao andar superior. As paredes laterais estavam cobertas com diversas placas que assinalavam a passagem por ali de grandes figuras do espectáculo já desaparecidas, como: Procópio Ferreira, Alves da Cunha, Adelina Abranches, Tomás Alcaide, Mirita Casimiro, Luís Piçarra, João Villaret, entre outros.

Interior em 2009

       2009 Belem Club.11

 

A sala principal, pela sua configuração, era o o que vulgarmente se designa por «um teatro à italiana». Na plateia, restavam algumas das cadeiras primitivas de madeira. Os camarotes que rodeavam a sala, num plano superior, estando assentes em colunas de madeira e, delimitados por um varandim em ferro forjado.

2009 Belem Club.6  

 

Em 1952 o edifício do “Teatro Luís de Camões” encontrava-se em muito mau estado de conservação (designadamente no que respeitava à cobertura) e em 1954 o proprietário do imóvel, Justino Gonçalves, depois de ignorar sucessivas intimações do Município lisboeta, para que realizasse as obras necessárias (designadamente no palco), a Câmara Municipal de Lisboa torna-se proprietária do imóvel, via expropriação, em virtude do não cumprimento das referidas intimações.

“Teatro Luís de Camões” e a Calçada da Ajuda em 1964

 

Último espectáculo no “Teatro Luís de Camões” em 12 de Dezembro de 2015

2015 Último espectáculo (12-12)

Depois deste espaço ter sido desocupado pelo “Belém Clube” no final de 2015, e se ter mudado para as suas novas instalações cedidas pela Câmara Municipal de Lisboa, num edifício recuperado na Rua da Junqueira e inaugurado em 23 de Maio de 2016, a Câmara Municipal de Lisboa iniciou este ano, a construção dum novo espaço, no lugar do “Teatro Luís de Camões”, mantendo a fachada original …

A este propósito, pode-se ler no blogCidadania LXa seguinte carta dirigida ao Presidente da CML:

«Exmo. Senhor Presidente
Dr. Fernando Medina

Cc. AML, DGPC, SRU Lx Ocidental, Arq. MGDias, JF e media.

Serve o presente para apresentarmos o nosso protesto veemente pela destruição quase integral do Teatro Luiz de Camões/Belém Clube, teatrino histórico sito da Calçada da Ajuda, por iniciativa da empresa municipal SRU-Lisboa Ocidental e ao abrigo de um suposto projecto de reabilitação do espaço, do arq. Manuel Graça Dias, que afinal se revelou um projecto de alterações profundas e de construção nova, apenas isso.

Assumimos, erradamente, que o intuito de tal projecto fosse a reabilitação de facto do edifício, que necessitava, basicamente, de uma operação de restauro, e que o deixassem genuíno, eximindo-se os intervenientes da tentação de nele exibirem "marca de autor", contemporânea, num edifício que dela não necessitava. Acreditámos, infelizmente, na bondade de uma iniciativa apregoada pelos agentes envolvidos como de valorização da zona. E acreditámos na resposta da SRU Lx Ocidental ao nosso pedido de esclarecimentos de 2012. Puro engano, já que Lisboa ficou mais pobre.

Mais uma vez, os responsáveis pela destruição de património na cidade ficarão impunes.

Melhores cumprimentos»

Ante-projecto

Fotos disponibilizadas pelo blog “Cidadania LX” em 1 de Junho de 2016

 

A opinião e avaliação do Professor Doutor Arquitecto Paulo Roberto Masseran da Universidade Estadual Paulista, de São Paulo, Brasil, especializado em arquitectura teatral luso-brasileira, e que gentilmente partilhou comigo o essencial da sua investigação histórica acerca do “Teatro Luís de Camões”, vem reforçar a ideia do texto anterior.

«Tomei conhecimento do início das obras de reforma do prédio, realizadas pela Câmara Municipal de Lisboa, por meio de um blog e fiquei surpreso com o grau da intervenção impetrada ao histórico edifício. O projeto arquitetônico desenvolvido age sobre um edifício do século XIX, erroneamente, pois trata-se, efetivamente, de um dos principais monumentos arquiteturais do conjunto do Palácio de Belém, construído no século XVIII. O grau de transformação do espaço interno era mínimo, reservado à substituição dos gradis dos camarotes superiores, ao plafond da sala de espetáculos e à reformulação dos acessos, aquando a escadaria central, outrora privativa do rei e que o conduzia diretamente à Tribuna Real, transformou-se em acesso principal ao piso superior. Era um teatro simples, longe do fausto decorativo das arquiteturas empreendidas por D. João V, mas preservava as colunatas, a Tribuna Real, a boca-de-cena e a estrutura do palco, quase intocadas, o que o tornava um monumento singular.»

 fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Hemeroteca Digital, Lisboa SOS, Anteprojectos, Cidadania LX