O "Hotel Pimenta", fundado em 1872, e de que falarei mais á frente, foi o mais antigo de Torres Vedras. O "Hotel Natividade" foi o segundo hotel mais antigo de Torres Vedras, sendo a fundação anterior a 1890, e cuja primeira localização não consegui apurar. A sua proprietária era a D. Maria da Natividade Marques. Contudo em 24 de Junho de 1890, muda-se para o, então Largo da Graça (futuro Largo D. Carlos I), esquina com a Rua d'Olaria (futura Rua Paiva de Andrada). No mesmo ano a sua proprietária, anunciava:
Haverá tambem uma tina para banhos gratuitos á disposição dos pobres.»
A quinta de Vale dos Cucos era propriedade de João Gonçalves Neiva desde 1851, arrematada em leilão resultado de uma disputa de herança judicial entre 1782 e 1830 onde construiu, por volta de 1860, novas casas de banho ainda em madeira e casas para alojamento dos doentes, no local hoje chamado de Cucos Velhos. Mas o seu filho José Gonçalves Dias Neiva, a partir de 1890, inicia todo um processo de edificação de uma vila termal, iniciadas por escavações que vêem a descobrir uma nascente com grande manancial de água. O projecto traçado em 1891 pelo engenheiro António Jorge Freire, que pretendia ser completamente inovador em serviços termais e de lazer, previa a construção do Balneário, Hotel, Casino, 40 moradias num parque termal que contava ainda com uma capela e mercado.
O Estabelecimento Thermal viria a ser inaugurado em 15 de Maio de 1893, três anos depois o Casino, ao que se lhe seguiu o Hotel, bem mais modesto do que o edifício programado de 300 quartos, e das moradias projectadas concretizaram-se apenas duas, uma das quais no princípio albergou, temporariamente, o Hotel. Viria a ser construída uma capela e oficinas de preparo de lamas e de águas. Tinha como diretor médico, o Dr. Justino Xavier da Silva Freire.
Entretanto em 11 de Junho de 1893, José Dias Neiva tinha aberto o "Hotel dos Cucos" , na Avenida Ignacio Casal Ribeiro que ligava a Estação de Caminho de Ferro ao Largo da Graça (Largo D. Carlos I a partir de 1894), tendo como gerente Ernesto Nobre.
28 de Maio de 1893
O transporte do hotel ao estabelecimento balnear é gratuito uma vez por dia, das 5 ás 8 horas da manhã. Egualmente é gratuito o transporte dos hospedes e suas bagagens da estação do caminho de ferro ao hotel.
O almoço, das 9 ás 11 da manhã, tem 3 pratos, chá e cafe. O jantar, ás 4 1|2 da tarde, tem sopa, 5 pratos, queijo, fructas, café e chá. Vinho á descripção em ambas as refeições.
Das 9 ás 11 da noite haverá chá para os hospedes que o desejem.»
Neste mesmo ano de 1893, encontrava-se instalado na Rua Serpa Pinto, 10-14 junto ao Largo da Graça, o "Hotel Pimenta", o mais antigo de Torres Vedras, que tinha sido fundado por Antônio da Cruz Pimenta em 1872.
15 de Junho de 1893
Aquando da reabertura do "Hotel dos Cucos" (naquela época a maioria hotéis nas estâncias termais, e não só, encerravam no Outono e só reabriam em Maio do ano seguinte), em 14 de Maio de 1894, o edifício, já tinha sido aumentado em 2 pisos, ao mesmo tempo que tinha promovido a reformas «tendo-se attendido à todas as condiçõas a prescripções santtarias, a pelas auctoridades medicas, taes como canalisacão externa; ventilação, etc., etc.,»
14 de Junho de 1894
Neste mesmo ano de 1894 já o Largo da Graça tinha sido renomeado de Largo D. Carlos I e a Rua d'Olaria renomeada de Rua Paiva de Andrada. Seria neste Largo e neste ano que seria inaugurada a "Havaneza Torreense". E em 1896 a mais antiga colectividade de Torres Vedras o "Club Torreense", fundado em 1873, passa a designar-se "Casino de Torres Vedras".
Largo D. Carlos I (ex-Largo da Graça), já como Largo da República (após 1910)
Anúncio de 13 de Maio de 1894. O edifício do Hotel creio ser o da Sapataria na foto anterior
Entretanto em 23 de Maio de 1895 era inaugurado o "Estabelecimento das Águas da Fonte Nova", em Torres Vedras.
Assim cada descoberta que hoje se faz de agua com qualidades medicinaes é o mesmo que descobrir um thesouro : para o proprietario, pelo rendimento que d'ellas póde tirar ; para o publico pelos beneficios que lhe podem fazer aos seus achaques.» in: "Occidente" nº 592.
Em Janeiro de 1898 foi o ano de todas as mudanças nos hotéis de Torres Vedras. O "Hotel dos Cucos" é extinto e viria a ser criado outro num dos chalets do "Estabelecimento Thermal dos Cucos". O "Hotel Natividade" muda-se para as antigas instalações do "Hotel dos Cucos" na Rua Ignacio Casal Ribeiro, e nas antigas instalações do "Hotel Natividade" nasce o "Hotel Central", propriedade de Ernesto Nobre, antigo gerente do extinto "Hotel dos Cucos". Este hotel funcionava todo o ano.
Chalet onde ficou instalado provisoriamente o "Hotel dos Cucos", no complexo termal dos Cucos
26 de Maio de 1898
«Este novo estabelecimento, onde esteve instalado por muitos anos o Hotel Natividade, Administrado pelo Gerente do extinto Hotel dos Cucos. Torna-se recomendado pelo asseio e comodidade que oferece aos seus hospedes. Situado proximo da estação do caminho de ferro e da estação telegrapho postal, junto do jardim publico e do Casino, e o ponto mais central desta vila. Preços desde 1$000:00 reis Temporada das thermas - Thermas dos Cucos e das Aguas Medicinais da Fonte Nova.
Socio Gerente Alberto Nobre»
Abril de 1899
Entretanto, no "Estabelecimento Thermal dos Cucos" é criado em 1899, o "Hotel das Thermas", vindo a ocupar, temporariamente, um dos dois chalets (construídos em 1895 e 1896) no complexo termal. Este hotel era explorado por Antonio Borges, proprietário do "Grande Hotel Borges", na Rua Garrett, em Lisboa.
Abril de 1899
O hotel definitivo só viria a ser mandado construir por José António Neiva em 1929, localizado nas traseiras do edifício dos balneários ao qual estava ligado. Mesmo depois de construído o novo hotel, o chalet que tinha ocupado até então, continuou a servir de «extensão» ao hotel em alturas de maior afluência.
Edifício do Hotel (construído em 1929) nas traseiras do edifício principal e à direita na foto
Entretanto, em 1902 o "Novo Hotel" de Antonio Duarte Capote, empresário de transportes.
Em 1907, o "Hotel das Themas dos Cucos", já era "propriedade" (concessionária) de Maria da Natividade Marques dona do "Hotel Natividade".
Quanto a transportes, em 1911, pela sua centralidade, o Largo da República (ex- Largo D. Carlos I) foi escolhido para ponto de chegada e partida das primeiras carreiras automóvel para a Praia de Santa Cruz, iniciadas no Verão de 1911 pela empresa de António Capote
Outras empresas vão surgir ao longo do século XX para transportar veraneantes para Santa Cruz, escolhendo aquele Largo ou as sua proximidade como ponto de largada ou recolha de passageiros: João Henriques dos Santos a partir de 1923; "Empresa Sociedade Progresso de Santa Cruz" a partir de 1925, tendo como sócios Joaquim Morais de Castro, Guimarães Júnior e José Duarte Capote sobrinho, cujos direito foram adquiridos por Ruy da Costa Lopes em 1928, sendo este o único operador em 1941, ano em que este, por sua vez, cede os direitos à empresa "Capristanose Ferreira, Lda." da Caldas da Rainha, mais tarde adquirida pela empresa Claras, que operou esta linha de camionagem até 1975.
Largo das camionetas na Praia de Santa Cruz
Em 28 de Maio de 1922 o "Hotel Natividade", provavelmente por morte de D. Natividade, é adquirido pela sociedade "Lopes & Sá", e o jornal "O Torreense" noticiava:.
Os novos proprietarios do hotel Natividade são pessoas que conhecemos há muitos anos e de quem temos as melhores e mais ligeiras informações; e conhecedores como são do seu metier, animados dos melhores desejos.de bem servir os seus clientes, proporcionando-lhes todas as modernas comodidades, para o que se não pouparão a despezas e sacrificios, tencionam já na proxima época balnear estabelecer carreiras de automoveis, a preços reduzidos, principalmente para os seus hospedes que tenham de fazer tratamento nas termas dos Cucos.
E' um melhoramento importante para esta vila, pelo que felicitamos a firma Lopes & Sá desejando lhe muitas prosperidades.
Em outro local vai o respectivo anuncio.»
1922
Em 1934 o "Hotel Central" já aparece instalado no edifício do antigo "Hotel Natividade", na avenida 5 de Outubro (antiga Avenida Ignacio Casal Ribeiro), sendo seu proprietário José da Silva Carnide. No pequeno edifício contíguo cria o "Café do Hotel Central" onde comercializava os afamados pastéis de feijão, além de «café, chá, cervejas, refrigerantes e licores». Por seu lado o hotel já possuía «excelente serviço de mesa, óptimos quartos, retretes modernas e bela casa de banho.»
"Hotel Central" à esquerda e defronte da Escola Primária, Secundária e de Educação Física, neste postal de 1953
Em 1939 no guia de "Hoteis e Pensões de Portugal", o "Hotel Central" aparecia com as seguintes informações:
Nº de Quartos: 30
Pequeno almoço: 2$50
Almoço: 12$00
Jantar: 13$00
Diárias: 20$00 a 26$00
Já propriedade da família Neiva Vieira dos Cucos, o "Hotel Central", foi demolido por volta de 1955. Pouco tempo antes, a esposa do antigo proprietário, José da Silva Carnide e uma sobrinha tinham morrido eletrocutadas no jardim, numa noite de temporal.
Edifício que substituiu o "Hotel Central" em captação de 2022 via Google Maps
Quanto às "Termas dos Cucos", encerrariam definitivamente em 1999. « (...) abriram pela última vez em 1998. Contrariamente ao que se poderia pensar, a lotação esteve esgotada. "Encerrámos porque corríamos o risco de sermos encerrados compulsivamente a meio da época, por causa de um valor numa análise da água. Considerámos que mais valia fechar ou podiam fechar-nos a meio da época e o desprestígio era maior" ». palavras de José António Neiva in: jornal "Sol" (2021) artigo de José Cabrita Saraiva.
Hoje o complexo das antigas "Termas dos Cucos" é utilizado principalmente para festas de casamentos ...
fotos in: Hemeroteca Digital de Lisboa, Biblioteca Nacional Digital, Biblioteca Municipal de Torres Vedras, Torres Vedras Antiga (Facebook), Delcampe.net
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