A "Garage Auto-Lys", propriedade da firma "J. Caldas , Lda." foi inaugurada em 1934, na esquina da Rua da Palma com a Calçada do Desterro, no terreno do antigo teatro-circo "Real Colyseu de Lisboa".
Sousa Bastos, no seu livro "Diccionario do Theatro Portuguez" publicado em 1908, resumia sucintamente a história do "Real Colyseu de Lisboa" no seguinte texto:
«Esta casa de espectáculos, sita na rua Nova da Palma, tem funccionado com companhias equestres acrobáticas, gymnasticas, mímicas, de opera, opera cómica, zarzuela e opereta. Foi este theatro-circo construído em terrenos da Condessa de Geraz de Lima, hoje do seu viuvo, o Conde da Folgosa (Antonio de Souza e Sá). Foi feito por meio de obrigações. Tendo fallido a empreza, ficaram os obrigacionistas sem coisa alguma.»
O "Real Colyseu de Lisboa" encerrou em 1917. Posteriormente, veio a servir de armazém de encomendas postais dos Correios, até 1926 ano em que foi demolido. No seu terreno seria construída a "Garage Auto-Lys". Quanto à parte sul do terreno contíguo do "Paraizo de Lisboa", ao lado do "Real Colyseu de Lisboa", foi nele construído, em 1928, o edifício da "Federação Espírita Portugueza" fundada em 1925, e que após a Constituição de 1933, foi perseguida e obrigada a cessar as suas actividades. O edifício viria a ser transformado no "Cine-Rex" que seria inaugurado em 23 de Novembro de 1936, mais tarde "Teatro Laura Alves".
"Cine-Rex"
A firma "J. Caldas, Lda." submeteria, em 1933, o projecto de construção do edifício para a "Garage Auto-Lys", do arquitecto Hermínio Barros, à Câmara Municipal de Lisboa, que seria rapidamente aprovado. A construção foi adjudicada à firma "Gabinete de Engenharia, Lda.", dirigidas pelo engenheiro Jaime Leal. Recordo que o arquitecto Hermínio Barros, já tinha sido o autor do projecto da vizinha "Federação Espírita Portugueza", futuro "Cine-Rex".
Esta garagem foi projectada com a finalidade de fazer recolha de automóveis, estação de serviço e central de camionetes de passageiros, de vários pontos do país.
A "Garage Auto-Lys" ficaria como sendo um dos expoentes máximos da arquitectura modernista de Lisboa, mais propriamente da arquitectura de transportes. Digno de nota, os elementos que encimam os pilares da fachada Leste, da que faz gaveto e da fachada Norte, repetiriam-se noutras construções da mesma época, como por exemplo no "Parque Mayer".
«Na sequência do previsto inicialmente, as pequenas áreas da Rua da Palma receberam diferentes estabelecimentos comerciais, que foram mudando através dos tempos, para o que foram apresentadas propostas de novos alçados. Mas algumas destas intervenções não respeitaram o valor integral do imóvel. Aliás, em 1992, a propósito de um pedido de legalização de alterações, - em 1981, foi este imóvel classificado como de interesse público, por despachos do ex-IPPC e da Câmara Municipal de Lisboa, de que resultou a constituição de uma zona de protecção - o parecer do IPPAR considerou "altamente danosas quaisquer obras efectuadas ilegalmente no edifício em questão, sobretudo quando estas implicam a perda de uma montra em ferro forjado pintado, que contribuía para a manutenção do ambiente “Art--Déco” no piso térreo". Refere ainda o mesmo parecer que "a montra proposta, pelo acto de ser uma intervenção pontual, nada tem a ver com o espírito do edifício, contribuindo para a continuação da sua descaracterização."» in: "Arquitecturas de Esquina em Lisboa" de Jorge Mangorrinha.
As décadas foram passando por este edifício, e os sinais de degradação foram-se acumulando e evidenciando, principalmente nos últimos anos, em que o seu aspecto exterior era de um prédio abandonado. Muitos vidros partidos, paredes sujas, exceptuando o restaurante que funcionava no rés do chão, tudo o mais estava num estado de desgraça, fazia tempo. O interior da garagem, apesar de alguns remendos e pinturas, o abandono era evidente.
Em meados de 2019, o grupo "Sonae" aluga o edifício à "Garagem Auto Lis - Recolha Automóveis da Lis, Lda." e apresenta à Câmara Municipal de Lisboa um projeto para instalação neste edifício dum supermercado "Continente - Bom Dia". O requerente comprometia-se a manter «a matriz estrutural pré-existente, sem qualquer tipo de alteração relevante», a não ser a instalação de um elevador, fazendo ainda «reabilitação e reposição integral das fachadas» e realizando «obras de conservação e restauro geral». O projecto viria a ser aprovado e as obras tiveram início em 2021.
A renovação exterior privilegiou a «limpeza e reposição da imagem, no sentido de retirar todos os elementos descaracterizadores da linguagem original do edifício», «numa relação de respeito para com os elementos e bens arquitetónicos classificados desde 1983 pela DGPC».
Durante as obras no interior, em Outubro de 2021 foram encontrados vestígios do local onde se realizavam os espectáculos de ópera, teatro e circo - "Real Colyseu de Lisboa" - , assim como restos de madeira que sobreviveram até aos dias de hoje. «Achados que foram catalogados e posteriormente soterrados, com aprovação da Direção-Geral do Património Cultural, mas protegidos por uma camada de geotêxtil que os irá preservar tal como foram encontrados.»
O supermercado "Continente - Bom Dia", foi inaugurado em 29 de Julho de 2022.
fotos in: Biblioteca Nacional Digital, Arquivo Municipal de Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo,
1 comentário:
Folgo em ver esse edifício em estado de qualidade!
Faz parte da minha infância e juventude. Ia ao Largo do Intendente cortar o cabelo ao Salão Gama, deixando o carro do meu pai a lavar na Garagem. Terminado o corte, havia uma pequena tasca com aquelas bifanas tradicionais feitas na frigideira que nunca é lavada. Belas memórias...
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