Restos de Colecção: Teatro Viriato em Viseu

1 de outubro de 2023

Teatro Viriato em Viseu

O "Teatro Viriato" foi inaugurado em 13 de Junho de 1883, sob a designação de "Theatro Boa-União", que seria a primeira casa de espectáculos de Viseu. Foi erguida por vinte elementos da "Sociedade Phylarmonica Viseense Boa União", que, para tal, adquiriram  um terreno por um conto e duzentos mil réis. As obras tiveram início em 1879, com muitas dificuldades financeiras, apesar dos apoios de alguns proprietários locais. A certa altura os trabalhos tiveram de ser suspensos por falta de dinheiro. Então, foi decidido emitir acções no valor de dez mil réis, para estabelecerem um fundo que desse continuidade à obra. Isto além de, também, recorrerem a empréstimos bancários. Apesar de todas as dificuldades foi possível concluir a tão desejada obra. A arte de carpintaria foi entregue ao mestre Jose Antonio Peres, a pintura a José Monteiro Nelas, e o engenheiro responsável foi João de Gonta.


Já em 19 de Janeiro de 1858, um anúncio no jornal "O Viriato", acerca da representação de uma peça de teatro, sem especificação do local.


19 de Janeiro de 1858

A inauguração do "Theatro Boa União", ficou inserida nas Festas da Cidade. Os espetáculos de estreia, foram da responsabilidade da "Companhia de Teatro do Porto"dirigida pelo artista dramático António Pedro: sobem à cena, sucessivamente, "O Paralytic " (drama em 5 actos), "O Negreiro", "Roupa Branca " (comédia), "O Bébé" (comédia) e também "Amor e Dinheiro" (comédia musical), "O Saltimbanco" (de António Enes), "O Agiota" e também "Em Maus Lençóis", e, a encerrar, "O Sargento Mor de Vilar".

No jornal "O Viriato" de 15 de Junho de 1883 era noticiada a sua inauguração:

Inaugurou-se no dia de Santo Antonio o novo theatro Boa-União, d'esta cidade.
Aquillo não é um theatro aquillo é um milagre! Como meia duzia d'artistas se abalançam a levar ao fim uma obra d'aquellas, é um d'estes rasgos de que só uma vontade de ferro e um devotado amor pelo trabalho são capazes. (...)
O novo theatro rivaliza com os melhores da capita; e se não fosse o grande defeito dos camarotes dos lados só verem bem as pessoas que estão á frente, o que por certo foi devido ou a erro de construção ou á impossibilidade de se dar mais largura á circunferencia da sala, se não fosse isto, podiamos affirmar que o nosso theatro é um dos melhores do paiz, graças á sollicita inteligencia da direcção, que o publico não victoriou da inauguração podendo e até devendo fazel-o.



18 de Dezembro de 1883


3 de Maio de 1892

Em Fevereiro de 1897, chega o animatógrafo a Viseu e ao "Theatro Boa-União". A primeira sessão de cinema, foi promovida do senhor Luciano, «um homem dinâmico e empreendedor, proprietário de uma cervejaria mesmo em frente ao teatro, que se chamava precisamente, 'Cervejaria Cinema'». As enchentes sucederam-se para ver filmes como "Guerra Europeia", "Quo Vadis", entre muitas outros de amor ou comédia.

Em 24 de Abril de 1899 o "Theatro Boa-União" passa a designar-se "Theatro Viriato" e em 1904, por iniciativa de Bento Cardoso de Mello Girão são pintadas pelo artista viseense Felisberto Nellas, no teto do Teatro, as figuras de Gil Vicente, de Almeida Garrett, de Viriato e uma alegoria à poesia lírica. O "Theatro Viriato" é inaugurado com a Companhia de Lucinda de Simões: do repertório escolhido para a ocasião constam as peças "Casa de Boneca" (drama em 3 actos, de Henrik Ibsen), "Georgette" e "Que Sogra".


Sala de espectáculos do "Theatro Viriato"

O "Diccionario do Theatro Portuguez" (1908), de Sousa Bastos descreve o "Theatro Viriato"

«Chamou-se outr'ora theatro Boa União, por serem os seus fundadores artistas que compunham a phylarmonica do mesmo titulo. Foi inaugurado a 13 de Junho de 1883 com o drama Paralytico, desempenhado por uma companhia de que fazia parte o grande actor Antonio Pedro. Em virtude da abertura da Avenida Emygdio Navarro, foi expropriada uma parte do theatro, onde existia o átrio e um salão. Em 1898 foi posto em praça pela fazenda nacional por contribuições em divida, sendo arrematado pelo actual proprietário, Bento Cardoso de Mello Girão, que era credor. Foi restaurado e reedificado o frontespicio, ficando tudo em melhores condições.
O proprietário Mello Girão é mais conhecido pelo Bento de S. Miguel. Depois das obras foi reinaugurado, a 24 de abril de 1899, pela companhia da actriz Lucinda Simões, que alli representou, em três recitas seguidas, as peças: Casa de boneca, Georgette e Que sogra!
Este theatro possue muito scenario, e, na sua maioria, muito bom. O rendimento do theatro, pelos preços ordinários, é de 196$200 réis; mas os preços costumam ser augmentados quando as companhias são boas. A despeza em cada recita, incluindo renda do theatro, orchestra, illuminação, pessoal, policia, bombeiros e licença, é approximadamente de 30$000 réis. Tem 23 camarotes de 1ª ordem, 9 de 2ª, 109 fauteuils, 163 cadeiras, 152 logares de geral, 100 de galeria e 2 frizas.
N'este theatro teem representado algumas companhias lyricas, de zarzuela e quasi todas as melhores de Portugal. Entre os muitos artistas de primeira plana que alli teem trabalhado, podemos citar : Taborda, Virginia, Joaquim d'Almeida, Palmyra Bastos, Ferreira da Silva, Pepa, Vallé, Lucinda do Carmo, Augusto de Mello, Lucinda Simões, Augusto Rosa, Lucília Simões, Eduardo Brazão, Rosa Damasceno, João Rosa, Cinira Polónio, Santos, Amélia Vieira, António Pedro, Carolina Falco, Ignacio, Georgina Pinto, Cardoso, Christiano de Sousa, Polia, Joaquim Costa, etc.
O palco d'este theatro é amplo e tem junto uma grande arrecadação para scenario e bagagens, com portão independente. O panno de bôcca é copia de um quadro hespanhol de Fontana. Representa um arco manuelino, encimado pelas armas de Vizeu, tendo ao centro uma allegoria á Arte. E' muito bonito este trabalho do distincto pintor viziense Almeida e Silva. A planta da reedificação do theatro foi executada pelo fallecido engenheiro João de Gonta.»




Apesar da confusão no nome, um bónus da revista "Invicta Cine" de 5 de Março de 1934

Em 7 de Setembro 1921 é inaugurado o "Avenida Teatro", na mesma rua que o "Teatro Viriato" e que, pela novidade, condições, equipamentos e grandeza (2.000 lugares), viria a tornar-se um forte concorrente. Viria encerrar em 1961, um ano depois do encerramento do "Teatro Viriato". Por sua vez, em Julho de 1952, abriria o "Cine-Rossio", a exibição do filme "O Preço da Juventude" realizado em 1950 por de René Clair. Viria a fechar definitivamente em 1983 e demolido em 1994.


"Avenida Teatro" com o "Teatro Viriato" ao fundo da rua


1 de Outubro de 1944


"Cine Rossio"

Devido à séria concorrência do espectáculo cinematográfico, o "Teatro Viriato" viria a encerrar as suas portas em 1960, com a actuação do grupo vocal feminino "Coro Harmonia". Reabre em 1985 e encerra em 1986, ano em que a Câmara Municipal de Viseu, em Setembro, compra o imóvel e dá início ao processo de reconstrução.



O "Teatro Viriato" chegou a servir de armazém de mercearia

Na primeira metade do século XX, Viseu chegou a ter cinco salas de espectáculos: "Theatro da Rua Escura", "Theatro Viriato", "Theatro Paraíso", "Avenida Teatro" e o "Cine-Rossio". Em 1959 já só estavam activos o "Avenida Teatro", o "Teatro Viriato" e o "Cine-Rossio".

Assim, a partir da década de 1960, Viseu passou a ter apenas uma única sala de espectáculos em actividade, o "Cine-Rossio", até ao seu encerramento em 1983. Localizado nas traseiras da Câmara Municipal, foi nesta sala que o "Cine Clube de Viseu" (fundado em 1955) realizou a sua primeira de muitas sessões de cinema. 

Em 8 de Maio de 1998 é inaugurado o novo "Teatro Viriato", com um concerto da "Orquestra Filarmonia das Beiras". Do programa fazem parte o "Barbeiro de Sevilha", de Rossini, "Amor Brujo", de Manuel de Falla e a "Sinfonia em Lá Menor, Opus 92", de Beethoven."






O "Centro Regional de Artes do Espetáculo das Beiras" (CRAEB), criado em 8 de Maio de 1998, passa a funcionar no "Teatro Viriato", com a "Companhia Paulo Ribeiro" como companhia residente, - que viria deixar de ser em Janeiro de 2023.

No dia 29 de Janeiro de 1999 foi inaugurada a 1ª temporada da nova vida do "Teatro Viriato", com a apresentação do espetáculo “Raízes Rurais, Paixões Urbanas” de Ricardo Pais, especialmente remontado para esta ocasião.


Bibliografia: Teatro Viriato / História

4 comentários:

Luís Pinheiro disse...

Parabéns!
Mais um excelente artigo.
Luís Pinheiro

José Leite disse...

Muito obrigado.
Cumprimentos
José Leite

José Leite disse...

Grato pela correcção.

Os meus melhores cumprimentos

José Leite

José Fernandes disse...

Desculpe, mas sugiro mais uma correção / complemento à informação:
Em setembro de 1985 foi apresentado (5 récitas) nas ruínas do Teatro Viriato o espetáculo “Teatro de Enormidades Apenas Críveis à Luz Eléctrica”, com textos de Aquilino Ribeiro (no centenário do seu nascimento), dirigido por Ricardo pais, que também interpretou, com Olga Roriz, Luís Madureira, António Emiliano (música), António Lagarto (cenário e figurinos) e Orlando Worm (luz), coproduzido por Área Urbana – Núcleo de Acção Cultural de Viseu e ACARTE / Fundação Calouste Gulbenkian. O público ficou no espaço que foi palco (reforçado para o efeito) e a peça desenvolvia-se no local da plateia, dos camarotes e das frisas.
Mais tarde, a 29 e 30 de novembro e 1 de dezembro desse mesmo ano, foi palco para a apresentação das peças “Mestre Ubu” e “O Fidalgo Aprendiz” pelo grupo “Sala 33” composto por alunos da Escola Secundária Alves Martins de Viseu, dirigidos pelo prof. Jorge Fraga.
Estas apresentações naquele espaço, que foi um teatro e que havia mais de 25 anos tinha sido transformado num armazém, serviram para a sensibilização pública e do Município para a necessidade de recuperação do único teatro que restava na cidade.
Cumprimentos.
José Fernandes