Restos de Colecção: Tipografia "Lallemant Frères" em Lisboa

12 de novembro de 2023

Tipografia "Lallemant Frères" em Lisboa

A tipografia da "Sociedade Typographica Franco-Portugueza" foi fundada em 1850, na Rua do Thesouro Velho (actual Rua António Maria Cardoso), nº 6 em Lisboa, pelos irmãos François e Adolphe Lallemant e Fradesso da Silveira - « ... o Centro comercial de Fradesso da Silveira, homem tão talentoso, tão empreendedor, e tão infeliz!». Esta tipografia vinha ocupar o edifício sul do Palácio do Marquês de Valença nos terrenos da Casa de Bragança.

"Palácio Valença" onde estiveram instaladas a "Typographia Lallemant Frères" (segundo edifício) e a "Libraraire Française de Madame Marie François Lalllemant" (primeiro edifício). Ao fundo topo do "Braganza Hotel" já na Rua Ferragial de Cima (actual Victor Cordon)


Edifício da "Typographia Lallemant Frères"  à esquerda (na foto) do "Braganza Hotel


1882

O reputado mestre tipógrafo e livreiro Libanio da Silva (1858- ?), - "Imprensa Libanio da Silva" na Travessa do Fala-Só, 24 Lisboa - no seu livro "Manual do Typographo", de 1908, cita esta casa na realidade portuguesa, no que respeitava à fabricação de caracteres tipográficos:

«A primeira oficina de gravura e fundição de typos que houve em Lisboa, foi a de João Villeneuve, convidado a vir estabelecel-a, e por certo auxiliado por D. João V, em 1732. Parece, porém, que caiu em decadência e não durou por muitos annos, pois por decreto de 26 d’agosto de 1756 era auctorisada a admissão, por dez annos, livre de direitos, de toda a letra que os impressores mandassem vir do estrangeiro.
Em 1768, sob o reinado de D. José e por inspiração do Marquez de Pombal, foi creada a Imprensa Regia, hoje Imprensa Nacional.
Houve depois a fundição de Pedro Alexandrino, e a de Silva & Filhos, para onde veiu como director François Lallemant. Este distinctissimo artista, instituiu mais tarde com Fradesso da Silveira a Typographia Franco-Portugueza, para a qual veiu como impressor outro artista igualmente de muito valor, Adolpho Lallemant, a quem a arte deve uma boa parcela do aperfeiçoamento que atingiu entre nós.
Parece que houve ainda uma de Bèzan, que fôra contramestre da precedente.
Actualmente, além da fundição da Imprensa Nacional, há uma no Porto e outra em Lisboa.»


22 de Dezembro 1854


     


Exemplos de máquinas de encadernar da oficina de Alexis Bouret em 1882



Exemplos de oficinas tipográficas

A "Sociedade Typographica Franco-Portugueza", além de fundição de tipos, livros, gravuras, etc., foi responsável pela impressão de alguns jornais e revistas, ilustrados ou não, folhetos, cartazes, programas de teatros, etc. donde se destacou a parceria com a conceituada revista "Occidente". Parceria esta que perduraria entre a impressão do seu nº 1, em 1 de Janeiro de 1878, e o nº 171 de 21 de Setembro de 1883, altura em que passou a ser impresso pela "Typographia Elzeviriana" sediada na Rua Oriental do Passeio, 8 a 20, em Lisboa, propriedade da firma "Caetano Alberto & Faro". Caetano Alberto tinha sido o fundador, e continuava sendo director artístico, gravador artístico e principal capitalista da "Occidente". Esta nova parceria duraria até Abril de 1887. Depois seriam sucessivamente: "Typographia Castro Irmão" (Maio 1887 a Janeiro de 1890); "Typographia e Lytographia de Adolpho, Modesto & C.ª" que, em 1894, é adquirida pela "Barata & Sanches" (até Dez.1904); "Typographia do Annuario Commercial de Portugal" (até Out.1914); e, por último, a "Typographia de César Piloto".


1867


1871


1877

Última página do último número da revista "Occidente" impresso pela "Lallemant Fréres, Typ." em 21 de Setembro de 1883


1882

Entretanto a "Sociedade Typographica Portugueza" tinha iniciado, a partir de 1860, a impressão da "Revista Contemporânea de Portugal e Brazil", que até então (de Abril de 1859 a Março de 1860) tinha sido da responsabilidade da "Typographia do Futuro" sediada na Rua da Cruz de Pau, n.º 15, em Lisboa. 

A partir 1870, a "Sociedade Typographica Franco-Portugueza", passa a designar-se "Lallemant Fréres, Typ.", continuando a funcionar nas mesmas instalações.


1874


1877


      1879                                                                                        1882

No início dos anos 70 do século XIX, seria criada, no nº 22 da mesma Rua do Thesouro Velho, mas edifício norte do Palácio do Marquês de Valença, a "Libraraire Française de Madame Marie François Lalllemant", que a exemplo da "Sociedade Typographica Franco-Portugueza" de Lallemant Frères, tinha o estatuto de «Fornecedora da Casa de Bragança». Esta livraria, além de editora, vendia publicações religiosas, científicas, políticas, clássicas, de educação, etc. Disponibilizava, igualmente, assinaturas para jornais franceses de modas, políticos e literários, assim como importação e exportação da sua especialidade para Paris, Londres, Madrid, Rio de Janeiro e capitais africanas.


Edifício do "Palácio Valença" onde funcionou a "Libraraire Française de Madame Marie François Lalllemant"


1874


1880


19 de Dezembro de 1881


1882


Publicidade m 15 de Abril de 1883 e em 10 de Janeiro de 1885

Esta livraria, a partir de 1876, teve como gerente a poetisa, romancista e dramaturga Maria Rita Colaço Chiappe Cadet (1836-1885). Em 1880 publicou o livro "Flores da Infancia, contos e poesias moraes dedicados à Mocidade Portugueza", editado, inevitavelmente, pela "Libraraire Française de Madame Marie François Lalllemant".


Maria Rita Colaço Chiappe Cadet (1836-1885)


1880


Firma paralela criada «para a obra de "Angola á Contra Costa"

Enquanto a "Libraraire Française de Madame Marie François Lalllemant", dava os primeiros passos ...

«Data de 1872 a primeira tentativa de organização dos tipógrafos numa linha declaradamente de resistência. Enquadra-se ela na actuação da Fraternidade Operária, criada entre fins de 1871 e Fevereiro de 1872, principalmente como eco da Comuna parisiense. Confederação que viria a agrupar no seu apogeu algumas dezenas de classes de trabalhadores,
declarava seu objectivo exclusivo a melhoria da situação dos operários. Os tipógrafos lisboetas, descontentes com a sonolenta Associação Tipográfica Lisbonense, organizaram-se então em duas classes distintas da FO, a dos compositores e a dos impressores, sendo os primeiros 110 e os segundos 56 à data da constituição das suas classes, respectivamente em Agosto e Outubro de 1872. (...)
A 20 de Novembro estalaria o maior e o último conflito desta série, entre os proprietários da Tipografia Franco-Portuguesa (Lallemant Frères) e seus compositores e impressores. Os proprietários haviam intimado os tipógrafos "confederados" a abandonarem a empresa ou a desistirem da associação, devendo neste caso publicar uma declaração nos jornais demarcando-se da FO. Antes desta atitude patronal, os tipógrafos filiados na FO tinham sido prejudicados semanas a fio pelo encarregado da oficina, que, na distribuição do trabalho, favorecia os não associados. Em resposta
à intimação patronal, os «confederados» entraram em greve, exigindo a demissão do encarregado, igual tratamento para todos os trabalhadores e respeito pela livre filiação dos operários nas suas associações. Em declaração publicada nos jornais, os Srs. Lallemant 'afirmaram então que as exigências dos trabalhadores eram infundadas, sublinhando que não estavam dispostos a responder a nenhum ofício da FO1, para poderem entregar todo o seu tempo à sua arte e satisfazerem as ordens dos seus fregueses. A uma delegação que a FO lhes enviou com intuitos negociadores, os
Lallemant responderam que, "se tinham algumas reclamações a fazer, se dirigissem à Associação Tipográfica Lisbonense, criada expressamente para discutir os interesses da classe". A greve teve um fim desastroso para as pretensões dos tipógrafos, vendo-se uns obrigados a perder o trabalho e outros a declarar nos jornais que desistiam voluntariamente da Fraternidade Operária.». in: "Os tipógrafos e o despontar da contratação colectiva em Portugal (I) - José Barreto (1981).

Voltando à "Libraraire Française de Madame Marie François Lalllemant", o jornal "Diario Illustrado", de em 19 de Dezembro de 1881, informava:

«Na livraria de Madame Narie François Lallemant encontra-se uma variada escolha de livros instructivos e recreativos, illustrados, e com boas encadernações. Recebem sempre todas as novidades litterarias de Paris, e tomam se assignaturas para todos os jornaes scientificos, politicos e de modas. Rua do Thesouro Velho, 22, Lisboa.»

A partir de 10 de Janeiro de 1885 teve início uma nova parceria da "Lallemant Frères, Typ.", desta vez com Raphael Bordallo Pinheiro (1846-1905) e a sua revista "António Maria", que até então tinha sido impressa pela "Lytographia Guedes", sediada na Rua da Oliveira ao Carmo, 12, em Lisboa.

1902


1909


A "Lallemant Frères, Typ." foi extinta no final do século XIX e na primeira década do século XX, e a edição para a "Real Associação dos Archietctos Civis e Archeologos Portuguezes", em 1904, já foi obra da "Typographia Lallemant" que pertencia a Lucian Lallemant (antigo sócio-gerente da "Lallemant Frères, Typ."), funcionando nas mesmas instalações da anterior. Nos anos 30 do século XX, já tinha sido substituída pela "Tipografia Maurício & Monteiro", que já em 1932 ali estava instalada. 

Em 1921, uma factura da firma "Bordallo Pinheiro, Lallemant, Lda." ...

Lucien Lallemant também foi recordado, aquando das lutas operárias em 1890:  «Ainda no mesmo ano, em Dezembro, todo o pessoal da casa Lallemant Frères entrou em greve quando o industrial Lucien Lallemant insultou e agrediu o encarregado da oficina, um velho tipógrafo.»

Hoje, as mesma instalações são o salão de exposição "Smeg Store", firma italiana de electrodomésticos de design.

fotos in: Hemeroteca Digital de LisboaArquivo Municipal de LisboaBiblioteca Nacional DigitalDa Xilogravura à Fotogravura de José Pacheco

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