A alfaiataria "Lourenço & Santos, Lda." foi fundada em 10 de Maio de 1910, na Rua do Príncipe (actual Rua do Primeiro de Dezembro) esquina com a Praça dos Restauradores, em Lisboa. Foram seus sócios-fundadores Miguel Pereira Lourenço e Manuel Gomes dos Santos, dois nomes reputados no ramo. Teve como seu primeiro cliente o sr. J. S. Moura que encomendou «um completo jaquetão».
Miguel Lourenço, tinha trabalhado
como contra-mestre na casa "J. Nunes Corrêa & C.ª - Armazém de
Fazendas e Fato Feito", fundado em 14 de Abril de 1856, e depois sócio da
casa "Marques & Lourenço" no Chiado. Quanto a Manuel Gomes dos Santos,
além de ter sido empregado em alguns estabelecimentos da sua arte, tinha sido
proprietário do atelier de modista "Le Chic Parisien", na avenida da
Liberdade, nº 11. Este convidaria seu irmão, José Gomes dos Santos, para trabalhar na nova alfaiataria o que aceitou e o fez por seis anos.
Tendo as suas amplas e excelentes
instalações numa das lojas do "Avenida Palace”, a firma "Lourenço
& Santos, Lda." viria a tornar-se numa das melhores alfaiatarias de Lisboa,
graças à competência dos seus funcionários e à importação directa de tecidos
era um estabelecimento de requintada elegância e bom gosto.
Três dias após a Revolução de 5
de Outubro de 1910, Afonso Costa
(1871-1937), nomeado ministro da Justiça e Cultos do Governo Provisório (depois
Ministro das Finanças e Presidente do Ministério), entrou na "Lourenço
& Santos, Lda." e mandou fazer uma casaca (44 mil réis), um fraque (27
mil réis) e umas calças de fantasia (10 mil réis), porque as suas novas funções
assim o exijiam ... Uns dias depois, foi a a vez do Ministro dos Negócios
Estrangeiros, Bernardino Machado (1851-1944), (nomeado Presidente da República,
em 1915), de encomendar fraque e calças, tendo gasto um pouco menos que Afonso
Costa.
De referir que, a “Lourenço &
Santos, Lda.” instalou-se numa loja onde anteriormente funcionava a loja de
flores e corôas “A La Ville de Paris” de Marius Lathelize, que era sucursal
lisboeta, da sede em Coimbra e que era propriedade de F. Delport, que mantinha
outra sucursal no Porto.
A partir de 1913, a “Lourenço & Santos, Lda.” deu início à comercialização de tecidos para roupa de senhora, havendo notícia de encomendas de Madame Anahory, mulher que nessa época, era tida como «uma das senhoras mais chiques de Lisboa». Existe, igualmente, registo datado de 18 de Fevereiro de 1914, de encomendas de peças de roupa em nome de mademoiselle Amélia Rey Colaço. Outros clientes famosos como Calouste Sarkis Gulbenkian (1869-1955) ali se vestiam e que já doente, ali mandava fazer os seus fatos que eram provados no "Aviz Hotel". Ainda outros como o Prínce Rainier III do Mónaco, S.A.R. Dom Duarte de Bragança, empresários, advogados, políticos, etc.
Entretanto, Miguel Pereira
Lourenço, retira-se da actividade comercial e fica o seu sócio Manuel Gomes dos
Santos como único proprietário, durante alguns anos, até 1926, altura em que
reconstitui o pacto social da firma, dando sociedade a vários dos seus mais
devotados empregados, entre os quais Augusto Lopes. Devido ao afastamento
sucessivo dos restantes sócios era, em 1945 o único proprietário do
estabelecimento.
Augusto Lopes
Augusto Lopes, natural de Lisboa,
entrou para o comércio com 14 anos de idade, iniciando a sua aprendizagem na
casa "Machado, Torres & C.ª ", fundada em 1901 na Praça D. Pedro
IV esquina com a Rua da Betesga. Serviu nesta casa até à abertura da
"Lourenço & Santos, Lda." na qual ingressou como caixeiro. Sob a
sua orientação esta reputada alfaiataria, continuou não só a fornecer o seu
grande sortido de fazendas, como também manteve o corte impecável de todo o
vestuário executado nas suas oficinas.
Entretanto José Gomes dos Santos, como já foi mencionado anteriormente, irmão do fundador Manuel Gomes dos Santos tinha sido seu funcionário, entre 1910 e 1916, ano em que constituiu a firma "Castilla & Santos", numa loja do "Palácio Foz". Porém, em 28 de Janeiro de 1926 constitui a firma "J. Gomes dos Santos, Lda." abrindo uma nova alfaiataria, em 3 de Outubro de 1941, também na Praça dos Restauradores, ao lado da "Guérin, Lda."
Por volta de 1956, nova alteração no pacto social da "Lourenço & Santos, Lda.", com a entrada de José Augusto Guerra Machado (filho de Augusto Lopes), Álvaro Santos e Manuel Gomes da Silva que se juntam a Augusto Lopes. Por morte deste último, José Augusto Guerra Machado herda a parte do pai e compra as cotas a Álvaro Santos e a Manuel Gomes da Silva, ficando desse modo único proprietário.
José Augusto Guerra Machado
Em 1955 o "Avenida Palace", desentende-se com a "Lourenço & Santos, Lda." ao querer a desocupação do espaço que tinha arrendado à alfaiataria, o que leva à firma, no entretanto, a arrendar outro espaço na mesma Praça dos Restauradores, num prédio que era propriedade de Stanley Ho.
Em 8 de Outubro de 1957, a "Lourenço &
Santos, Lda.", inaugura a sua segunda loja na Praça dos Restauradores, no nº
47 A-B, bem perto do cinema "Condes". Vinha substituir a
"Pastelaria Riviera", que por sua vez tinha substituído uma loja de flores. Esta nova loja, - que eram duas ligadas interiormente
na rectaguarda e na cave, tendo sido projectada pelo arquitecto Carlos Tojal, que viria a ser,
igualmente, responsável pelo projecto de remodelação e ampliação da "Loja das Meias", em 1960. A sua decoração incluía balaustradas, balcões
abertos, tectos em níveis, chão em tacos de azinho envernizados. Na cave, a
sala de provas também com uma decoração cuidada e as salas da alfaiataria. As
montras amplas tinham o nome da firma em néon e numa das entradas a marca em
calçada à portuguesa.
Entretanto o desentendimento com
os proprietários do "Avenida Palace" ficou sanado, e a
"Lourenço & Santos, Lda." manteve as duas lojas na Praça dos Restauradores.
Por altura da comemoração do seu primeiro cinquentenário ("Bodas d'Ouro"), em
1960, a loja no edifício do "Avenida Palace” é alvo de melhoramentos e de
introdução das secções de camisaria e novidades. A sua reabertura teria lugar em
19 de Dezembro de 1960.
No final do século XX, as camisas
ainda eram feitas à mão e por medida, pacientemente cozidas por quatro ou cinco
das melhores costureiras, das poucas que restavam saber casear, cerzir, colocar
punhos e colarinhos e outros pormenores importantes, já que o cliente escolhia
o tecido e o colarinho que mais gostava. Numa enorme gaveta existiam centenas
de moldes de colarinhos em cartão, com o nome dos clientes e respectivas
medidas. A loja contava agora com atelier de camisaria, atelier de alfaiataria,
e antigo escritório.
A firma "Lourenço &
Santos, Lda.", deixaria as suas instalações, no edifício do "Avenida
Palace" em 2006, passando a ser ocupada, na altura, pela “Calzedonia”, (loja de meias,
peúgas, collants, leggings, fatos de banho), e ficaria apenas com a sua segunda
loja, da Praça dos Restauradores, nº 47 A-B anteriormente mencionada.
Em 2009, a firma "Lourenço
& Santos, Lda." foi adquirida pelo grupo "Diniz & Cruz -
Vestuário do Homem, Lda." detentor das marcas de pronto-a-vestir, feminino
"Dalmata" e masculino "Do Homem".
Fotos seguintes de 2018
Entretanto a “Lourenço &
Santos, Lda.” foi extinta, e a respectiva loja deu lugar a duas, com diferentes
finalidades.
Para terminar uma pequena história publicada por José Gomes Ferreira em 29 de Março de 1975, em que conta que indo Guerra Junqueiro um dia a passar por ali, e por ser muito forreta, entrou no Lourenço & Santos para mandar colocar fundilhos numas calças, em vez de mandar fazer umas novas. Dias depois, quando as foi buscar, o empregado disse-lhe que por tal trabalho, não lhe cobravam nada! ...
Agradecimento: Muito agradeço, a valiosa contribuição em fotos e dados históricos, disponibilizados por D. Manuela Machado, filha de José Augusto Guerra Machado, que em muito ajudaram, e valorizaram, a elaboração e edição deste artigo.
fotos in: Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Hemeroteca Digital de Lisboa, Arquivo Municipal de Lisboa, Biblioteca Nacional Digital
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