Restos de Colecção: Laboratório Sanitas

22 de maio de 2021

Laboratório Sanitas

O "Laboratório Sanitas", foi fundado em Abril de 1911 na Travessa do Carmo, 1 - 1º, em Lisboa pelo médico Francisco Cortez Pinto, e o farmacêutico Horácio Pimentel, tendo, para o efeito, constituído a firma "Cortez Pinto & Pimentel, Lda.". A palavra Sanitas é um substantivo latino que significa Saúde ...

Francisco Cortez Pinto (1885-1974) foi um major médico de carreira, que teve consultório no nº 24 da Rua Dom João V, tendo sido, a partir de 1939, o 1º Presidente da Direção do "Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas".

Francisco Cortez Pinto (1858-1974)

Como industrial, Francisco Cortez Pinto exerceu cargos dirigentes em empresas dos setores metalúrgico, eléctrico, do papel, do mobiliário metálico, da banca e dos seguros tendo também até aos seus 89 anos de vida desempenhado vários funções na direção da "AIP  – a Associação Industrial Portuguesa" tendo sido seu Presidente da no período entre 1941 a 1960, tendo logo no exercício do seu primeiro mandato a AIP adquirido uma nova sede na Avenida da Liberdade. Em 1949, recuperou  pavilhões da "Exposição do Mundo Portuguêsde 1940 e transformou-os na "FIP – Feira das Indústrias Portuguesas", a antecessora da "Feira Internacional de Lisboa" inaugurada em 26 de Maio de 1957. 

O "Laboratório Sanitas" teve sempre a sede em Lisboa. Em 1917 figurava já, com comprimidos e ampolas, entre as firmas exportadoras de especialidades farmacêuticas. Nesse mesmo ano foi criada uma outra sociedade onde participavam os proprietários do Sanitas, a "Neto, Natividade & C.ª", dedicada ao comércio de produtos farmacêuticos. Em 1923, foi instalada na Travessa do Carmo, 1 uma secção de material cirúrgico e afins.


2 de Abril de 1917

Uma publicação dos anos 50 do "Laboratório Sanitas" dá bem conta do panorama da indústria farmacêutica nacional nos anos 1910 e do contexto que levou à fundação daquela sociedade:
«Situa-se em 1911 esse primeiro balbuciar de indústria farmacêutica. Todas as tentativas feitas, até então, não tinham qual- quer carácter de continuidade, eram meramente esporádicas e, na maior parte dos casos, cingiam-se a um só produto.
Todavia a infiltração das especialidades farmacêuticas es- trangeiras no nosso mercado agigantava-se de ano para ano, aproveitando-se do campo que lhe estava aberto por ausência de uma indústria nacional efectiva e de quaisquer disposições oficiais que dificultassem essa infiltração.»


Folheto de 1926


Rótulo


Stand na "Exposição Industrial Portugueza" de em Novembro de 1932


1938


O "Laboratório Sanitas", manteve por décadas a sua "Farmácia Sanitas" na Praça Luís de Camões, em Lisboa. Era sua directora técnica, em 1931, a farmacêutica Esperança Castro Ferreira, licenciada pela Faculdade de Farmácia de Lisboa. «Escrevo no antigo laboratório da Farmácia [Sanitas], no tempo em que as mezinhas eram manipuladas aqui nas traseiras. São cerca de 17:00 e os empregados tomam cházinho com bolos. (...) Ah! o cházinho é porque a minha tia Esperança faz... 71» in: blog "Kant o Photomático"


Na foto seguinte, e segundo o proprietário do blog "Kant o Photomático" (donde foi retirada a foto) ... «Foto de família - até se reformar a minha tia-avó Esperança, farmacêutica, foi directora técnica da Farmácia Sanitas, em Lisboa, ao Camões. Na foto com a menina Conceição, a caixa». 


Esta farmácia ainda se manteve, pelo menos até 2007, como "Farmácia Sanitas". Mais recentemente tornou-se na "Farmácia Camões". 



Frente e verso de postal publicitário



Embalagem de medicamento


Publicação da Secção Infantil do "Laboratório Sanitas", em 1952

O "Laboratório Sanitas", que adquiriu uma dimensão inédita no cômputo da indústria farmacêutica nacional, como deixou, aliás, bem claro no seu Catálogo Geral de 1934: 

«Tal como está actualmente organizado, o Laboratório Sanitas é um dos melhores estabelecimentos do género na Europa, não só pela proficiência como estão montadas todas as suas secções, como ainda pela organização científica que a elas preside. As suas instalações são constantemente visitadas por Médicos, Professores de Medicina e pelos cursos dos últimos anos de medicina das Por toda a parte se admiram os mais modernos maquinismos, tanto nos laboratórios propriamente ditos, com os seus aparelhos de emulsionar, comprimir, encher ampolas, fabrico de pastas, pensos e outros produtos, como nas sa- las de estufa, empacotamentos, galeria de máquinas, instalação de caldeiras, gabinete de consultas e tratamento e oficinas de lavagem de garrafas e frascos. Os serviços são extraordinariamente simplificados pelo emprego mecânico, que lhes assegura o máximo da produção com um mínimo de pessoal. Nos mesmos edifícios encontram-se os depósitos de embalagens. A colagem de rótulos, o encher dos frascos, dos tubos, a rolhagem, tudo tem o seu maquinismo apropriado a assegurar-lhe a perfeição do acabamento. Nos vastos terrenos onde se encontram os laboratórios estão situadas todas as instalações fabris da Sanitas, num conjunto de edifícios. Assim, logo à entrada fica a secção de contabilidade, numa casa própria e os armazéns de drogas num grande pavilhão com anexos, onde se faz a distribuição dos produtos químicos e se recebem os já manufacturados, a fim de serem transportados para as secções de Expedição e Exportação. Há também um serviço especial de bacteriologia, com salas de preparação, salas de estufa, geleiras, etc., sob a direcção de três técnicos especializados, distintos bacteriologistas, ocupando outro edifício, em cujo primeiro andar fica a sala de Conferências. Escolas Médicas, que todos os anos fazem uma visita de instrução ao nosso Laboratório»




Fruto do desenvolvimento comercial que alcançara em menos de 20 anos, em Junho de 1930, o "Laboratório Sanitas" inaugurou novas instalações, concentrando perto das Amoreiras, na então Rua Silva Carvalho, (futuro quarteirão formado pelas Ruas D. João V, Custódio Carvalho e Silva Carvalho) toda a componente fabril. Num conjunto edificado que ocupava mais de 7.000 metros quadrados, os laboratórios em si encontravam-se instalados em seis edifícios com 40 metros de comprimento e 8 de largura

O jornalista da revista "Indústria Portuguesa" que cobriu a inauguração afirmou que «por toda a parte se admiram os mais modernos maquinismos, tanto nos laboratórios propriamente ditos, com os seus aparelhos de emulsionar, comprimir, encher ampolas, fabrico de pastas, pensos e outros produtos, como nas salas de estufa, empacotamento, galeria de máquinas, instalação de caldeiras, gabinete de consultas e tratamento e oficinas de lavagem de garrafas e frascos». O repórter ficou particularmente impressionado com a mecanização das diferentes secções «que lhes assegura o máximo de produção com um mínimo de pessoal». 




Os laboratórios possuíam uma central geradora de electricidade própria a vapor, uma sala com as máquinas de granular, de confeitar e de comprimir «dirigidas por um único homem», outras salas de encher e encapsular, de embalagem, de preparação dos solutos para as ampolas, de enchimento das ampolas, de lavagens de vasilhame e de fabrico de água oxigenada. Um dos pavilhões era o denominado de culturas, com o serviço de bacteriologia, com salas de preparação, de estufa e de geleiras. O serviço era dirigido por três bacteriologistas, cujos gabinetes privativos («à maneira da organização alemã 'Bayer'») se situavam em outro pavilhão, junto com a contabilidade e a Sala de Conferências. Num grande pavilhão com anexos funcionava o armazém, para as drogas, produtos químicos e produtos acabados e prontos para serem expedidos. Os funcionários dispunham de vestiário, refeitório e «recreio ajardinado num miradouro sobre a cidade e o Tejo».

Em 1930, fruto do sucesso dos seus produtos no mercado brasileiro, e por intermédio de Thomaz Pimentel, foi instalado um laboratório na cidade de São Paulo, denominado "Laboratório Sanitas do Brasil".

Em 1945 inauguraria um novo e grandioso edifício implantado no mesmo local, e cujo projecto foi da autoria do arquitecto Raúl Rodrigues Lima (1909-1980), o mesmo que projectou o "Cinema-Teatro Monumental", o "Cinema Cinearte" e o "Cinema Europa".


Entrada do novo edifício










Livrinho promocional editado em 1954

O investimento na área de Investigação e Desenvolvimento (I&D) levou à constituição de um Gabinete de Estudos constituído pelos dois directores técnicos - João Carvalho Guerra e Eurico Pimentel -, seis médicos, três farmacêuticos, dois professores de Medicina Veterinária e dois engenheiros químicos. Além de especialidades, o Laboratório Sanitas comercializava material cirúrgico, de medicina dentária, de raios X e electromedicina, de anestesia e oxigenoterapia e material de laboratório. 

O "Laboratório Sanitas" tinha sucursais no Porto, Coimbra, Évora, Lourenço Marques e Luanda. Encontrava-se também associada à "Metalúrgica da Longra, Lda" para a produção de material hospitalar e outro mobiliário metálico, tendo fornecido o "Hospital de Santa Maria" de Lisboa.


Duas vistas da Rua D. João V


Foto nos anos 60 do século XX


Salão de exposição


1964

«Como refere Bispo (2015), Luís Dourdil e Fernando Carvalho Seixas (administrador e sócio do laboratório Sanitas) partilhavam amizade e gosto pelas artes. Carvalho Seixas era tido como um inovador no que diz respeito às embalagens farmacêuticas, decidindo convidar Luís Dourdil para responsável do gabinete de publicidade e artes gráficas do Laboratório Sanitas. Ficou ainda encarregue de executar murais, por forma a ilustrar melhor a função e a atividade do laboratório, garantindo desta forma maior respeitabilidade ao Laboratório. Em 1996, devido a alterações no edifício os murais foram destacados e após conservação e restauro (colocação das pinturas em suporte artificial) pela empresa Mural da História, vieram a integrar a atual  exposição do Museu da Farmácia  anos.» (MCG - 1973.10.31)


Painéis de Luís Dourdil (1914-1989) para o "Laboratório Sanitas"

Este complexo viria ser demolido nos anos 90 do século XX, para dar lugar a conjunto de edifícios de escritórios e habitação. Quanto ao "Laboratório Sanitas" mantém um escritório em Miraflores - Algés.

Espaço onde esteve implantado o "Laboratório Sanitas" (via Google Maps)

Nota: Foi consultado o livro: "A Indústria Farmacêutica em Portugal - 75 Anos" - Edição APIFARMA - Dez.2014.

fotos in:  Hemeroteca Digital de LisboaArquivo Municipal de LisboaBiblioteca Nacional DigitalArquivo Nacional da Torre do Tombo, Kant o Photomático

3 comentários:

Alvaro Pereira disse...

Meu caro José Leite

Tal como o saudoso Teatro Monumental, também este edifício de Rodrigues Lima foi destruído e no seu lugar fizeram um edifício banal e piroso!

E assim se vai perdendo o nosso património!

Um abraço

Álvaro Pereira

José Leite disse...

Acompanhe a sua opinião.
Abraço
José Leite

João Celorico disse...

Caro José Leite,
recordo que ali à volta, nos idos de 1951/52 os terrenos davam para ir jogar à bola. E lá íamos nós da Machado de Castro, até à SANITAS que eu e outros achávamos um piadão e dizíamos que íamos às sanitas!
Tempos!

Cumprimentos,
João Celorico