Restos de Colecção: Hotel Ritz

11 de outubro de 2015

Hotel Ritz

O “Hotel Ritz”, localizado na Rua Rodrigo da Fonseca, em Lisboa e projectado pelo arquitecto Porfírio Pardal Monteiro (1897-1957), foi oficialmente inaugurado em 24 de Novembro de 1959, após 7 anos desde o início do projecto. A inauguração, foi grandiosa e contou com as presenças do Ministro da Presidência Dr. Pedro Theotónio Pereira,  cinco membros do Governo, o Rei Humberto de Itália, os Príncipes de Sabóia, os Condes de Barcelona e os Duques de Bragança.

O suíço César Ritz fundador do primeiro “Hotel Ritz” na Europa, é considerado o pai da hotelaria. Iniciou a sua vida profissional a trabalhar no “Hotel Savoy” e abriu seu primeiro hotel em 1898 em França. Daí em diante o turismo passou a conhecer "o rei dos hoteleiros e o hoteleiro dos reis", como ficou conhecido.

César Ritz é sinónimo de elegância e sofisticação. Era um grande anfitrião, recebia a realeza e as classes abastadas. Era chamado de "mago" porque transformava hotéis decadentes em sofisticados, nada menos do que os melhores. A hotelaria é dividida em antes e depois de Ritz, ele revolucionou todos os padrões da época e continuam até hoje. Personalizou o serviço. Foi ele que criou os uniformes dos funcionários dos hotéis, estabeleceu várias modalidades de serviço, aumentou os quartos, inovou com a prática das casa de banho privativa em cada quarto, centralizou os serviços na recepção para melhor atender os clientes.

César Ritz (1850-1918)

Nos anos 50 do século XX, Ricardo Espírito Santo Silva e Manuel Queiroz Pereira, entre outros empresários, uniram-se para apetrechar Lisboa com uma unidade hoteleira de grande luxo, ao nível das melhores do mundo. O promotor deste hotel foi a “Sociedade de Investimentos Imobiliários”, da qual faziam parte além de outros Manuel Queirós Pereira e Ricardo Espírito Santo.

A “Sociedade de Investimentos Imobiliários SODIM, S.A.R.L.”, com um capital social de 30.000 contos e dez sócios (cada com uma quota de 3.000 contos, equivalente a 10%), tinha sido constituída em 28 de Agosto de 1953. Os sócios iniciais foram: António de Medeiros e Almeida (proprietário da empresa de automóveisA. M. Almeida, Lda.), António Manuel de Almeida, Caetano Sanguinett Beirão da Veiga, José Eduardo de Barros Guedes de Sousa, José Ribeiro de Espírito Santo Silva, Manuel Cordo Boullosa (empresa de petróleos “Sonap”), Manuel Teixeira de Queiroz Pereira, Ricardo Ribeiro do Espírito Santo Silva e ainda as empresas “Bensaúde e Companhia, Lda.” e “Empresa Geral do Fomento, S.A.R.L.”.

Arquitecto Porfírio Pardal Monteiro (1897-1957)

As três propostas do arquitecto Pardal Monteiro

                                Anteprojecto de 1952                                                              Anteprojecto de 1954

 

«No período entre o final e o início de 1955, António Pardal Monteiro está mais ligado ao desenvolvimento dos edifícios da Cidade Universitária, Biblioteca Nacional e Hotel Tivoli e será com Jorge Ferreira Chaves que Porfírio PM, irá desenvolver, em tempo recorde, uma nova solução para todo o hotel, esta já muito semelhante à que foi construída. Na equipa trabalharam ainda vários jovens arquitectos ou arquitectos estagiários, como Ferreira Santana, Luís Fernandes Pinto e Eduardo Medeiros.» (1)

Perspectiva final de 1955

Maquetas

 

 

Terreno para implantação do “Hotel Ritz” ao lado da “Ford Lusitana”, também projectada por Pardal Monteiro

«O edifício com a sua linguagem moderna chocou as entidades oficiais nomeadamente no SNI quando em 1955 foi submetido à aprovação. O arquitecto Leonardo Castro Freire encarregado de emitir o parecer terá tido que defender cuidadosamente a solução, para conseguir a sua aprovação.
Mais tarde em 1964 seria o mesmo Leonardo Castro Freire que irá fazer o projecto das Galerias Ritz que viriam a substituir os jardins sobre elevados da construção inicial.
Nos anos 90 António Pardal Monteiro, faz a ampliação do Jardim de Inverno, salas de conferências e uma garagem subterrânea, que tem como particularidade, poder entrar e manobrar um automóvel da dimensão de um Rolls-Royce, e as inclinações das rampas permitirem alturas ao solo muito reduzidas como tem por exemplo um Ferrari.» (1)

A empreitada de construção civil ficou entregue à parceria das firmas construtoras “Rámon Beamonte” e “Diamantino F. Tojal (Herdeiros)”, parceria esta que continuaria as suas actividades, após esta construção, sob a designação de “Obrecol - Obras e Construções, Lda.”, com sede na Rua Ilha Terceira, em Lisboa.

Fases de construção

“Hotel Ritz” no ano da sua inauguração e ainda sem as “Galerias Ritz” construídas

Principais empreiteiros, fornecedores de bens e serviços

O arquitecto Pardal Monteiro não chegou ao final das obras por ter falecido em 1957, tendo sido substituído pelo arquitecto Leonardo Castro Freire. A arquitectura, a dimensão, a ousadia construtiva que colocou parte do edifício sobre pilares, ou a complexidade e actualidade do programa hoteleiro, fazem desta obra uma das mais monumentais da cidade de Lisboa. Domina a cidade como um grande paralelepípedo com a cobertura em terraço, linhas puras e recorte anguloso a quebrar a continuidade das frentes de rua e a escala da arquitectura circundante, «impositivamente moderno e também monumental».

 

“Hotel Ritz”, já com as “Galeria Ritz”, construídas em 1964 (arquitecto Leonardo Castro Freire)

Acarinhada desde a primeira hora, a ideia da construção de um grande hotel de luxo, que se transformaria na sala de visitas da cidade, acabou por receber um forte impulso com a venda por parte do estado Português de um terreno de 13.000 metros quadrados, no centro de Lisboa, junto ao Parque Eduardo VII.

Após a morte de Ricardo Espírito Santo Silva a direcção do projecto foi integralmente assumida por Manuel Queiroz Pereira, que visitou diversos hotéis estrangeiros para conhecer o que de melhor existia na altura.

Acompanhado por Georges Marquet - um belga proprietário da companhia “Les Grands Hôtels Européens”, que nos Anos Cinquenta era responsável pela exploração de algumas das melhores unidades hoteleiras mundiais -, Manuel Queiroz Pereira negociou o nome “Ritz” com o dono da famosa cadeia hoteleira, Charles Ritz, sendo então criada a “Sociedade Hotéis Ritz - Portugal, S.A.R.L.”

Na construção do “Hotel Ritz”, - cujo empreiteiro geral foi a empresa “Obrecol” - foram utilizados materiais de primeira qualidade, entre os quais 15.000 toneladas de mármore. O hotel tem 15 andares, com uma área total de 52.000 metros quadrados. Foram construídos 290 quartos (incluindo 20 suites) em dez dos andares. Nos restantes estão a garagem, aréas técnica e pública, dois restaurantes - "Grill" e "Varanda" - um bar e 14 salas de conferências.

 

Hotel Ritz.31 (tapeçaria de Pedro Leitão).1

 

Hotel Ritz.31 (tapeçaria de Pedro Leitão)

  

Alguns dos mais prestigiados artistas portugueses contribuíram para a decoração do “Hotel Ritz’”com obras de grande valia - entre eles, Almada Negreiros, Martins Correia, Lagoa Henriques, Sara Afonso e Carlos Botelho. Carlos Calvet e Lino António e Pedro Leitão criaram motivos para tapeçarias, que depois foram produzidas na famosa fábrica de Portalegre, a “Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, Lda.”. As tapeçarias do salão de baile foram produzidas em Bruxelas e os três esplendorosos candelabros de cristal que aí se encontram vieram da Áustria, por encomenda especial. Todas as portas são em mogno americano e as que servem de ligação entre os quartos têm dez centímetros de espessura, para assegurarem um completo isolamento acústico; o mesmo acontece com as janelas, equipadas com vidros duplos, produzidos em série pela primeira vez em Portugal.

Etiquetas de bagagem antigas

      

Com já foi dito, a sua inauguração ocorreu em 24 de Novembro de 1959, para a qual foi organizado um baile de gala para dois mil convidados.

«O país vibrou, as grandes lojas de alta costura encheram-se, jóias há muito esquecidas foram retiradas dos seus estojos. Mais de uma centena de estrangeiros chegaram dos mais variados países para essa noite de festa. Uma ceia memorável, concebida por Pierre Gachet, foi servida com os pratos mais sofisticados. As baixelas vindas de Paris brilharam em uníssono com os cristais desenhados especialmente para o hotel num décor memorável». Hélder Carita no livro “Ritz - Quatro Décadas de Lisboa”, editado para assinalar os 40 anos.»

Havia boutiques, uma barbearia, restaurantes e até uma boîte com duas orquestras, a “Carrossel”, que encerrou em 1974. «Opulento de grandeza, o Hotel Ritz» foi o título da notícia do jornal “O Século” a propósito da inauguração. E, três anos depois, o “Ritz” era capa da revista americana “Life” num artigo sobre os novos hotéis de luxo no mundo.

Salões enriquecidos com tapeçarias da autoria de Almada Negreiros

 

 

 

 

 

«Este foi o hotel que naquela época mais decoração teve», confirma Querubim Lapa. «E acho que mesmo depois nunca se fez um hotel com tanta colaboração de artistas tão diversos. Aqui a decoração nasce com a própria construção do hotel.»

«A quantidade de espaços que não se vêem, que estão nos bastidores e que garantem a qualidade do serviço. Há, por exemplo, 16 elevadores, quatro para os hóspedes, e 12 de serviço, há sete entradas, das quais apenas duas dos hóspedes, há toda uma estrutura escondida que permite o funcionamento de tudo.» Ana Magalhães
 
Com uma localização privilegiada, sobre o Parque Eduardo VII, os terraços permitem fruir de horizontes espectaculares sobre as sete colinas da cidade e uma ampla panorâmica do rio Tejo.

Em 30 de Novembro de 1961, o “Hotel Ritz” inaugurava o seu Bar, Dancing e Boite “Carroussel”.

Após a revolução de Abril de 1974 as convulsões por que passou o país reflectiram-se no “Hotel Ritz’” que foi intervencionado e utilizado durante bastante tempo para acolher os regressados das antigas colónias. O hotel passou por um período de auto-gestão, até que a família Queiroz Pereira procedeu à recompra de parte significativa das acções, tornando-se sócia maioritária da ‘SODIM, S.A.R.L.

“Snack-Bar Monumental” nas “Galerias Ritz” inauguradas em 19 de Maio de 1969

 

Em 1979 foi estabelecido um contrato de management com a cadeia “Inter-Continental”, acordo que terminou no final do ano de 1997.

Cartaz de 1982

Foram iniciadas em 1990 obras de renovação total do “Hotel Ritz”, começando pela infraestrutura técnica e estendendo-se depois aos quartos e suites e finalmente às áreas públicas. A decoração começou por estar a cargo de Maria José Salavisa, passando em 1992 o responsável a ser o arquitecto de interiores francês Pierre-Yves Rochon, reconhecido internacionalmente pelo trabalho desenvolvido em projectos hoteleiros de luxo, como por exemplo a renovação do “George V Four Seasons Hotel” , em Paris.

O “Ritz Four Seasons Hotel“, actualmente

 

Em 1997 foram executadas as obras no "lobby", bar e galeria de lojas, que contam com a presença da “Cartier”, “Godiva”, “Anna Molinari”, “Antique Luís Ferreira”, “Mulberry” e “Louis Vuitton”.

  

Em 1998 o “Hotel Ritz” passou a poder oferecer aos seus clientes uma excepcional Suite Presidencial cuja decoração foi coordenada por Maude Queiroz Pereira Lagos, irmã de Manuel Queiroz Pereira.

 Suite Presidencial

 

A partir de 1 de Janeiro de 1998 a gestão desta unidade hoteleira passou a ser assegurada pela “Four Seasons Hotels Inc.” e a sua nova denominação passou a ser “Ritz Four Seasons Hotel “ Lisboa.

Em 25 de Novembro de 2009 , comemorou os seus 50 anos.

(1) - Bibliografia: Foi, também consultado, de onde foram retiradas as fotos dos projectos iniciais, o trabalho de investigação: “Para o projecto global-nove décadas de obra - Arte, Design e Técnica na Arquitectura” do atelier Pardal Monteiro Vol I - Doutoramento em Design de João Pardal Monteiro pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa. Lisboa, Dezembro de 2012.

fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais)

9 comentários:

ié-ié disse...

Bom dia, belo trabalho, parabéns!

Uma dúvida: quando foi efectivamente inaugurado o hotel? Tinha a informação de que tinha sido a 25 de Dezembro de 1959 (Fonte: "Pessoas e Marcas na História do Mundo", Fernando G. Blázquez, Livros d'Hoje, 2014).

O próprio texto do "Restos de Colecção" fala em 24 de Novembro de 1959 e 25 de Novembro de 1959.

Obrigado,

Luís Pinheiro de Almeida

José Leite disse...

Caro Luís Pinheiro de Almeida

A inauguração oficial foi a 24 de Novembro de 1959 conforme notícia que pode ler no seguinte link:

http://www.fundacao-mario-soares.pt/aeb_online/visualizador.php?bd=IMPRENSA&nome_da_pasta=06537.075.16527&numero_da_pagina=7

Quanto a eu colocar duas datas de inauguração, 24 e 25 é do "alzheimer" que parece começar a atacar .... :-)

Agradeço a sua chamada de atenção.

Cumprimentos

José Leite

ié-ié disse...

Muito obrigado e parabéns uma vez mais.

Luís Pinheiro de Almeida

José Leite disse...

Caro Luís

Eu é que agradeço não só a sua chamada de atenção, a bem do rigor que pretendo, e a generosidade das suas palavras.

Os meus cumprimentos

José Leite

rita ferreira disse...

Trabalho muito interessante.
Uma questão : a Sra. D. Maude Queiroz Pereira, que redecorou a suite presidencial não foi casada com o Sr Manuel Queiroz Pereira; é irmã do falecido Manuel Queiroz Pereira e filha do Sr Manuel Queiroz Pereira ( mesmo nome pai e filho).
melhores cumprimentos
Rita Ferreira

José Leite disse...

D. Rita Ferreira

Muito grato pela sua chamada de atenção.

Vou proceder à devida correcção.

Os meus cumprimentos

José Leite

CENTRAL DE LIBROS ANTIGUOS disse...

Olá Jose, muito interesante o artigo, para quando um artigo sobre o bairro que existe atrás do Ritz em torno da rua Rodrigo da Fonseca com uma arquitetura muito interessante?

Tiago Aires Mateus disse...

No texto refere-se a Paulo Leitão, mas creio que queria dizer Pedro Leitão (autor da tapeçaria que está na parede de um dos salões, justamente batizado com o nome de Pedro Leitão).

José Leite disse...

Caro Tiago Mateus

Muito grato pela sua correcção.

Os meus cumprimentos