«Quer acertar o relógio? Use o do Cais do Sodré como padrão». Antes de haver sinal rádio e, mais tarde, o sistema de posicionamento global via satélite (GPS), os navios que partiam do porto de Lisboa necessitavam de acertar os seus cronómetros de bordo em terra para, mais tarde, calcularem a longitude no alto mar.
Até meados do século XX, a determinação da hora legal era uma tarefa exclusivamente do foro Astronómico, pois a observação rigorosa das estrelas permitia acertar os relógios de então com uma precisão muito superior ao que estes possuíam. Com o advento da electrónica e de outros padrões internacionais de medição do tempo, o “Observatório Astronómico de Lisboa” equipou-se com relógios atómicos e de quartzo, que permitem manter a hora com uma precisão da ordem do microssegundo.
“Observatório Astronómico de Lisboa” na Tapada Real da Ajuda
Quanto à adopção da “Hora Legal” em Portugal alguns factos e datas:
1884 - Reunião do Congresso internacional de Washington, em que se adoptou o sistema de fusos horários;
1911 (24 de Maio) - Promulgação do decreto da República Portuguesa, estabelecendo em todo o território nacional, desde 1 de Janeiro de 1912, a hora legal, pelo tempo médio de Greenwich
1912 (15 de Outubro) - Conferência internacional da hora realizada em Paris;
1914 ( Junho) - Inauguração do "Posto do Relógio Padrão da Hora Legal”, na Praça Duque de Terceira em Lisboa.
Relógio de Sol “Meridiana dos Remolares” que ocupou até 1874 o centro da Praça dos Remolares, futura Praça Duque de Terceira
Praça dos Remolares, futura Praça Duque de Terceira, e pontão de embarque, que depois do aterro seria ocupado pela sede da “Administração-Geral do Porto de Lisboa” e pelo "Posto do Relógio Padrão da Hora Legal”
Com o fim de emitir a Hora Legal para a cidade e, especialmente, para os navios ancorados no Tejo, foi construído em 1914 o "Posto do Relógio Padrão da Hora Legal», na zona do Cais do Sodré e contíguo ao edifício da “Administração- Geral do Porto de Lisboa”, equipado com um relógio mecânico, ligado directamente por cabo eléctrico ao “Observatório Astronómico de Lisboa”, situado na Tapada da Ajuda. Desta Posto partia um sistema semafórico, ao longo da costa, até Belém, para indicação luminosa da Hora a quem estava ancorado no rio.
2º “Balão da Hora” no “Arsenal da Marinha”, recebia o sinal horário enviado pelo “Observatório Astronómico de Lisboa”
Edifício da “Administração-Geral do Porto de Lisboa”
Artigo na revista “Illustração Portugueza” em Dezembro de 1913
"Posto do Relógio Padrão da Hora Legal”
Enquadramento do "Posto do Relógio Padrão da Hora Legal”, na Praça Duque de Terceira
A revista “Occidente” descrevia assim o “Posto do relógio padrão da Hora Legal”
«Dois corpos compõe o edifício do Posto: a torre, pouco elevada, rectangular, do relogio-padrão; e a barraca contígua que amplia a instalação e, porventura, suficientemente, para os correspondentes serviços: uns relativos á conservação da hora legal; outros, interessantes á distribuição dos signaes horarios.»
Rui Agostinho, director do “Observatório Astronómico de Lisboa” - entidade que tem a responsabilidade de difundir a hora certa no País - contava ao “Diário de Notícias” «depois do 25 de Abril o relógio esteve praticamente ao abandono». Em 2000, o então director do OAL, Nuno Marques, pediu à “Administração do Porto de Lisboa” para retirar do local a designação "hora legal", inscrita sobre a pala metálica que protegia o exemplar. «O relógio avariava, estava parado, depois arrancava, estava desfasado e confundia as pessoas».
A guarita do Cais do Sodré exibiu, até 2008, o título de “Hora Legal”. No entanto, o “Observatório Astronómico de Lisboa” pediu que esta designação fosse retirada, pois o relógio nunca tinha funcionado em condições. O local está sujeito a grandes amplitudes térmicas e nem a pala que foi acrescentada à estrutura impediu que o mecanismo sofresse com isso. Por outro lado, as trepidações cada vez mais fortes, fruto da passagem do trânsito rodoviário, também afectavam a marcha do mecanismo.
Em 21 de Janeiro de 2009 e ao fim de quase 40 anos, o “Posto do Relógio Padrão da Hora Legal” ,voltou a ter a “Hora Legal”. A “Administração do Porto de Lisboa” anunciava a reactivação a sincronização do mecanismo com o “Observatório Astronómico de Lisboa”, passando esta a ser feita via Internet.
Foi necessário esperar quase um ano para encontrar uma solução que permitisse ao relógio do Cais do Sodré aceder à hora legal. O novo equipamento, vindo da Suíça, da marca “Tissot”, foi montado em finais de Novembro pela empresa portuguesa “Tempus”.
Este relógio recebe sistematicamente a “Hora Legal” e processa um ajuste automático da hora interna, garantindo, assim, a sua exactidão. Esta interface tem um relógio electrónico próprio, com uma unidade de energia eléctrica independente. Deste modo, se houver um corte de energia na zona, os ponteiros param, mas reposicionam-se na hora correcta assim que seja restabelecido o fornecimento de energia. A única desvantagem é que o aparelho não tem ponteiros dos segundos. Se quiser acertar o seu relógio, terá que esperar atentamente pelo movimento do ponteiro dos minutos.
Enquadramento actual
Fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, A Imagem da Paisagem
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