Em 1928 é iniciada a construção do “Arsenal do Alfeite”, financiada pelas indemnizações alemãs da 1ª Guerra Mundial, após a assinatura do acordo de Versalhes. As obras de construção foram concluídas em Dezembro de 1937 e entrou em plena laboração em 1938, mas só a 3 de Maio de 1939, o Arsenal do Alfeite foi formalmente inaugurado. O “Arsenal do Alfeite” foi considerado, então, um dos maiores e melhores apetrechados estabelecimentos do género.
Vista aérea do complexo do “Arsenal do Alfeite”
Praia do Alfeite
Este complexo de construção e reparação navais, veio substituir o "Arsenal da Marinha", situado na Ribeira das Naus, em Lisboa, desde 1501. Por sua vez este descendia das "Tercenas Navais" criadas em 1377.
“Tercenas Navais” “Arsenal da Marinha” na Ribeira das Naus
A propósito da Ribeira das Naus, Paulo Sande escrevia no século XVI:
«Ocupa a Ribeira das Naus um espaço vastíssimo (...). Constrói-se ali (...) essas grandes naus e galeões que abriram a navegação da Índia (...) Diz-se que a construção de cada uma dessas naus custa vinte mil cruzados
É admirável aqui, na verdade, a abundância de tudo o que é necessário para abastecer a armada, pois não falta grande quantidade de mastros, vergas e calabares muito ensebados e compridos; toda a sorte de pez e alcatrão; nem a arte de amolecer o ferro e o aço (...).»
Faz parte do complexo do Arsenal da Marinha o Palácio Real do Alfeite. As suas origens remontam a 1690 altura em que foi celebrado o contrato entre a Casa do Infantado e o Conde de Tarouca para a integração naquela Casa da Quinta do Alfeite.
foto in: Náutico
Inicialmente quinta agrícola e rural veio a ser incorporada na Casa do Infantado, posteriormente à Casa Real e após a implantação da República em 1910, passou a fazer parte do património da Marinha.
A partir dessa altura o Palácio alberga, actualmente, a Base Naval de Lisboa, a Flotilha e o Gabinete do Vice-Almirante do Comando naval e Secretaria de apoio.
fotos in: Marinha.pt (Comunicação apresentada pela Mestre Susana Maria Lopes Quaresma, em 13 de Novembro)
As instalações do "Arsenal do Alfeite", estão integradas no Perímetro Militar do Alfeite, que inclui as instalações da Base Naval de Lisboa, Escola Naval, Escola de Tecnologias Navais, Base de Fuzileiros e Bairro Social do Alfeite, ocupando uma área de 35 hectares de área descoberta e de 8 hectares de área coberta.
Escola Naval
Bairro Social do Alfeite
Caserna dos Praças Casa dos Sargentos
Desde logo o “Arsenal do Alfeite” iniciou a sua laboração com as reparações dos contratorpedeiros da Armada, “Dão” e “Tâmega”, sendo este último, o primeiro navio a atracar no Estaleiro. A par destas reparações, foi iniciada a construção de navios, tendo no próprio dia da inauguração do Estaleiro, sido efectuada a cerimónia de “assentamento da quilha”, daquele que viria a ser o 1º navio a ser construído, o navio Hidrográfico ”D. João de Castro”. Estava assim lançada a actividade do Estaleiro que seria durante muitas décadas uma referência, a nível nacional e internacional, não apenas na construção, reparação e manutenção de navios militares, como também na construção de grandes, médios e pequenos navios mercantes.
Navio Hidrográfico ”D. João de Castro”
“NRP Afonso de Albuquerque” o primeiro navio a subir o plano inclinado em 1937
As três décadas que se seguiram, os anos 40, 50 e 60 do séc. XX, foram caracterizadas por uma relativamente grande autonomia de gestão, que permitiu ao “Arsenal do Alfeite”, não só a construção de navios militares e outros, para entidades estatais, tais como :
- Várias classes de Patrulhas (N.P.) e (L.F.P)
- Vedetas de transporte de passageiros ; Batelões de carga ; Rebocadores
- Navio Petroleiro “Sam Bras” (1º petroleiro construído em Portugal)
- Petroleiros : “Sameiro”, “São Mamede”, “Erati “ e “Gerês”, este último com 191,7 metros foi até hoje o maior navio construído no Arsenal do Alfeite.
- Construção do casco do cargueiro “ Beira”, para a “CNN - Companhia Nacional de Navegação”.
Primeiro petroleiro construído em Portugal, o “Sam Bras”
foto in: Navios e Navegadores
Navio-Tanque “Sameiro” em fase de acabamentos
Para saber mais acerca deste petroleiro “Sameiro” consultar o artigo intitulado: Navio Tanque “Sameiro”
Navios construídos e outras realizações, pelo “Arsenal do Alfeite” entre 1940 e 1974
excerto da tabela in: Arsenal do Alfeite
Projecto para uma Vedeta de Transporte de Passageiros para a Marinha de Guerra em 1945
Iate de recreio “Donapilla II” entregue em 1968 construído pelo “Arsenal do Alfeite”
Este iate de recreio, desenhado em 1967 por Jorge d’Almeida Araújo, e sob a última designação de “Thea Yacht” ( ex- “Donapilla II”, “Myrna”, “Yanka”, “Deerrama”, “Rama”), encontra-se neste momento à venda por US$ 4.250.000,00, e também dísponivel para charter.
Neste longo período o “Arsenal do Alfeite” construiu também para Armadores estrangeiros, nomeadamente: do Reino Unido, os arrastões de pesca, “Portisham” e “Portaferry”; da Suécia, o navio petroleiro (casco) “ Hector”; e no final da década de 60, do Liechtenstein, o Iate “Donapila II” entregue em 1968, projecto do arquitecto português, Jorge de Almeida Araújo.
1958
A partir de 1970 realizam-se várias obras que permitiram aumentar as capacidades operacionais do Estaleiro, nomeadamente a construção de uma Doca Seca e de uma Doca Flutuante, esta última, construída no “Arsenal do Alfeite”, destinada principalmente a docar e reparar os submarinos classe “Albacora” da Armada. Submarinos estes, para cujas reparações e manutenção, o “Arsenal do Alfeite”. formou em França e em Portugal, operários e técnicos com elevado grau de especialização e integrou um serviço dedicado, a IRS (Inspecção de Reparação de Submarinos). Assim, nas décadas de 70 e 80 o aumento da capacidade de docagem permitiu ao Estaleiro realizar as grandes revisões das Fragatas e dos Submarinos, alargando o âmbito da manutenção dos meios navais da Armada, onde se inclui, pela sua importância a grande modernização do Navio Escola “Sagres” em 1988.
Fases da construção
Ainda nestas duas décadas o Estaleiro não deixou de realizar algumas grandes obras navais, começando logo no início dos anos setenta pela construção de um Navio Balizador, o “Shultz Xavier”. Mais tarde, após o 25 de Abril de 1974, o Estaleiro alargou mesmo o seu mercado, construindo dois grandes navios de carga refrigerada, o “Dzieci-Polskie” e o “Zyrardów”, para a Polónia. Seguiram-se: uma Lancha de Desembarque Grande (LDG); várias Lanchas de Desembarque Médias (LDM); um Navio de Pesquisas Oceânicas; várias Vedetas de Transporte de Passageiros; duas Lanchas salva-vidas; Lanchas de Fiscalização, a classe “Albatroz”; duas Lanchas Hidrográficas, “Andrómeda” e “Auriga”.
Entre 1990 e a actualidade ocorreram várias reestruturações sendo as mais importantes as que vieram criar novas valências e capacidades ao Estaleiro, como sejam a integração no “Arsenal do Alfeite”, das “Oficinas de Armamento e de Electrónica”, a criação e acreditação dos Laboratórios do “Arsenal do Alfeite”, e também, ao nível da gestão da produção, a melhoria verificada com a implementação, em 1994, do “SIAGIP - Sistema Informático de Apoio à Gestão Integrada da Produção”.
Correspondendo aos superiores interesses da Marinha, o “Arsenal do Alfeite” assegurou a especialização de trabalhadores, não só em Portugal como no estrangeiro, para a manutenção das fragatas da classe “Vasco da Gama”, nomeadamente nas áreas da mecânica, electricidade, electrónica e armamento.
Para além das obras próprias o “Arsenal do Alfeite” realizou durante a sua já longa existência, outros trabalhos dignos de nota, para a indústria naval e metalomecânica portuguesa, tais como a manufactura de grandes estruturas: enformação de chapa e construção de blocos para superpetroleiros da “Lisnave - Estaleiros Navais de Lisboa, SARL” na Margueira; enformação de chapa e blocos para navios construídos em Viana do Castelo; elementos de guindastes ou de pórticos, lanças e pernas do pórtico da “Setenave” na Mitrena, etc. ...
No que refere à formação, o “Arsenal do Alfeite” tem sido uma Escola da industria naval e da metalomecânica nacional, pois a contribuição dada a essas Industrias, pelos trabalhadores especializados no “Arsenal do Alfeite” ao longo dos anos, é tão extensa que as suas consequências dificilmente podem ser avaliadas.
São apenas alguns exemplos: a deslocação e permanência durante vários anos das décadas de 60 e 70, de uma equipa de mestres do “Arsenal do Alfeite”, no “Estaleiro de Viana do Castelo”, para formação daquele Estaleiro na construção de navios por blocos, a formação dada por técnicos saídos do “Arsenal do Alfeite”, nas escolas de formação da ““Lisnave - Estaleiros Navais de Lisboa, SARL”” ou os muitos profissionais das mais diversas áreas tecnológicas, que ingressaram nas indústrias de toda a área metropolitana de Lisboa e cuja formação foi adquirida nas oficinas do estaleiro, ou iniciada na Escola de Formação do “Arsenal do Alfeite”, criada no início dos anos setenta do século XX.
Para melhor observação das embarcações nesta foto amplie a mesma
fotos in: Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian
Ao fim de setenta anos de actividade, o Ministério da Defesa Nacional, a de 5 de Fevereiro de 2009, estabeleceu a extinção do “Arsenal do Alfeite”, com vista à sua empresarialização. Sucede, então, ao “Arsenal do Alfeite”, a “Arsenal do Alfeite, S.A.”, constituída com a forma de sociedade anónima, com capitais exclusivamente públicos, a qual integra o cluster naval da “EMPORDEF, SGPS, S.A.”, holding das indústrias de defesa portuguesas cuja actividade consiste na gestão de participações sociais detidas pelo Estado em sociedades ligadas directa ou indirectamente às actividades de defesa, como forma indirecta de exercício de actividades económicas.
últimas 4 fotos in: Arsenal do Alfeite, Blog dos Navios e do Mar
A “Arsenal do Alfeite, S.A.” iniciou a sua actividade no dia 1 de Setembro de 2009, tendo na sua génese a necessidade de criação de uma entidade de referência na indústria naval, a nível nacional e internacional, imposta pela evolução tecnológica deste sector.
Actualmente o “Arsenal do Alfeite” , conta com os seguintes equipamentos:
35 áreas tecnológicas para a construção e reparação de navios
Implantação: 35 hectares
Coberta: 8 hectares
Meios de docagem / atracação:
2 Planos Inclinados (deslocamento máximo até 1250t)
1 Doca Seca (138m x 18m)
1 Doca Flutuante (60m x 12m e capacidade de elevação máxima de 900t)
672m de Cais de Atracação
Equipamentos de elevação (guindastes sobre carris):
1 - 40t x 20m (Cais Acostável)
1 - 1,9t x 20m (Cais Acostável/Doca Flutuante)
1 - 1,9t x 35m (Plano Inclinado n.º 1)
1 - 3t x 35m (Plano Inclinado n.º 1)
1 - 5t x 27m (Doca Seca)
Isto tudo apoiado por 1470 funcionários entre militares e civis.
Bibliografia: o texto histórico foi, em parte, baseado na história disponibilizada no site do “Arsenal do Alfeite”
15 comentários:
boa noite,
o edifício palaciano da antiga real quinta do Alfeite também não faz parte do património da base naval?
(http://www.marinha.pt/PT/amarinha/actividade/areacultural/academiademarinha/Conferencias/Documents/13_NOV_2012_(2).pdf)
Caro Anónimo(a)
Quando elaborei este artigo pretendi focar-me mais na parte industrial e nas actividades navais do Arsenal do Alfeite, e fazer uma brevíssima referência ao Palácio Real do Alfeite.
No final esqueci de todo dessa referência.
Graças à sua chamada de atenção recuperei a passagem, e recorri a 2 fotos, inseridas no mesmo trabalho que teve a gentileza de me indicar.
Feito o aditamento de informação. muito agradeço a sua colaboração e gentileza.
José Leite
caro José leite, gostei de ver este trabalho, que está bem estruturado, bem deleniado... como ex funcionado só gostaria de saber se ainda hoje contamos com 1470 funcionarios como diz. um abraço
Caro Anónimo
Muito agradecido pelas sua amáveis palavras em relação a este trabalho.
Quanto ao número de funcionários, foi «pescado» do site oficial, pelo que se é verdade não sei ...
Um abraço
José Leite
Parabens ao patrocinador deste "blog" espetacular. Também sou Arsenalista, embora tenha saído em 1972. Todavia, estive em Maio de 2013 no almoço de confraternização dos atuais e antigos técnicos do "gabinete de estudos/sala de desenho)
Caro Anónimo
Grato pelas suas amáveis palavras.
Os meus cumprimentos
José Leite
Muitos parabens por este belo trabalho de apresentaçao do Arsenal do Alfeite.
Como antigo trabalhador do Arsenal fiquei muito triste com a situaçao que encontrei numa visita de trabalho que efectuei recentemente,o Arsenal era uma grande escola na area da construçao naval e muito deu a este pais ,o Arsenal que encontrei recentemente ,esta completamente ao abandono ,sai de la ja la vao 23 anos e nessa epoca todo o estaleiro fervilhava com as grandes reparaçoes aos navios da Marinha (coisa que ja nao se faz) , e varias construçoes em curso,todo o cais estava ocupado ,e sempre em movimento.
Sinto alguma tristeza quanto ao que fizeram do Arsenal do Alfeite,mas sinto um grande orgulho em ter pertencido a uma grande escola na area da construçao naval
Obrigado por me fazer recordar essa epoca , e a todos aqueles grandes profissionais com o qual muito aprendi a todos tambem o meu muito obrigado .
Mario Caleia
Caro Mário Caleia
Muito agradecido pelo seu comentário
Os meus cumprimentos
José Leite
A destruição sistemática do tecido produtivo deste País,nomeadamente no domínio da construção naval,foi, criminosamente,levada ao cabo pelos incompetentes que, salvo raras excepções , têm presidido aos destinos deste país. O Arsenal do Alfeite há anos e, mais recentemente, os estaleiros de Viana de Castelo o a Lisnave, são bem o exemplo desta incompetência e de despreocupação com os reais interesses da Nação. Excelente trabalho este que nos permitiu recuar no tempo e , com mágoa,relembrar-nos como poderíamos ser uma voz , neste mundo, ouvida e respeitada. E eles por aí andaram ou andam a viver anafados e sorridentes, passeando-se sem remorsos pelas ruínas deste recanto.
Caro Domingos Farinha
Muito grato pelo seu comentário cheio de propriedade e muito acertivo
Os meus cumprimentos
Muitos parabéns por esta recordação sobre o Arsenal do Alfeite. Sempre ouvi o meu avô, Diamantino Roxo, falar desta casa uma vez que lá trabalhou da década de 40 a meados da década de 60. Aliás, começou por trabalhar no Arsenal de Lisboa e depois mudou-se para o Arsenal do Alfeite. Na fase inicial havia uma pequena embarcação que fazia a travessia do Tejo para levar os trabalhadores que vinham destacados do Arsenal de Lisboa. Posteriormente o meu avô passou a residir em Almada no bairro do Pombal, para onde foram residir muitos trabalhadores do Arsenal e (creio) da Lisnave.
Cumprimentos e votos de continuação de bom trabalho.
Miguel Roxo
Caro Miguel Roxo
Muito grato pelas suas simpáticas e amáveis palavras
Cumprimentos
Olá boa tarde,
Vivi até aos 6 anos na Base do Alfeite com os meus pais e o meu irmão.
Tenho algumas fotografias dessa altura.
O meu pai dava aulas na Escola Naval e o meu avô era o director do Laboratório dos Explosivos.
A casa dele e da minha avó (a que tem o observatório) agora serve as pessoas com problemas de álcool e drogas.
Estive lá (no Alfeite) após mais de 35 anos sem lá ir.
Foi no dia do funeral do meu pai, em Abril de 2014.
Valeu a pena.
E obrigada pelo artigo que gostei muito.
Ana Margarida Johnson Conceição Silva.
Trabalho muito bem elaborado. Trouxe-me boas recordações. Obrigado e boa noite!
Atualmente o Arsenal do Alfeite conta com 481 funcionários... e com tendência a diminuir...
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