O "Teatro Jordão", propriedade da "Empreza do Teatro Jordão, Lda." foi inaugurado na cidade de Guimarães a 20 de Novembro de 1938, com a designação oficial de "Teatro Martins Sarmento", em virtude de decisão política comunicada dias antes da sua abertura. Foi iniciativa do empresário Bernardino Jordão (1868-1940), - «concessionário da luz electrica em Guimarães» - que entregou o projecto e direcção de obra ao arquitecto e engenheiro civil Júlio José de Brito (1896-1965), cuja sua obra mais conhecida é o "Teatro Rivoli", no Porto.
Bernardino Jordão (1868-1940)
Este Teatro nasceu da necessidade de dotar Guimarães de uma sala de espectáculos condigna, como já reclamava em 1929 a "Sociedade de Propaganda e Defesa de Guimarães". Nesta altura só existia o "Teatro Gil Vicente" já que o "Teatro D. Afonso Henriques" construído em 1853, já tinha encerrado.
«Por essa altura, havia muitos anos que o velho Teatro D. Afonso Henriques estava fechado (tendo sido publicado em 1933 um decreto que autorizava a sua demolição, para a abertura de uma rua de ligação entre a rua de S. Dâmaso e o largo da República do Brasil) e o Teatro Gil Vicente não reunia as condições necessárias, sendo mesmo classificado no Notícias de Guimarães de 5 de Fevereiro de 1933 como indecente, nauseabundo e indigno da nossa terra.»
No dia 18 de Fevereiro de 1936, a Câmara Municipal de Guimarães reuniu em sessão extraordinária para decidir acerca da construção de um novo teatro. A ideia seria a reconstrução do "Theatro D. Affonso Henriques", que continuava de pé, por não se ter rasgado a rua prevista no decreto de 1933. Desta reunião não saiu qualquer solução para o problema, uma vez que logo começaram a circular rumores de que a reconstrução do velho teatro estaria encravada.
A 1 de Janeiro de 1937 Bernardino Jordão confirma ao jornal "O Comercio de Guimarães" as suas intenções de construir um novo Teatro: «Vou construir o teatro e conto que ele funcione já no próximo verão.» O mesmo assegurava que um arquitecto tinha iniciado os trabalhos, apreciando diversos locais prováveis para a implantação do tão desejado edifício, que teria as condições para receber espectáculos teatrais e cinematográficos.
Entretanto, neste mesmo ano de 1937, o "Cinema Gil Vicente" retomara as suas actividades de exibição cinematográfica, após ter sido sanado o conflito que tinha obrigado ao seu encerramento por 18 meses.
Quanto ao projecto do "Teatro Jordão", a sua memória descritiva informava...
«Este teatro cuja lotação está prevista para uns 1400 espectadores, destina-se a cinema e teatro, para o que fica dispondo de toda a aparelhagem e depências necessárias. Pelo facto do terreno se encontrar abaixo do nível da Avenida, cerca de 9,00 metros, tem este abaixo do nível da plateia, um rez-do-chão e um pavimento. Acima da plateia tem uma ordem de balcão e de camarotes e ao nível da plateia uma ordem de frizas, como se vê no projecto. Toda a estrutura do prédio é de cimento armado, incluindo as fundações. (...)»
A sua construção, ficou a cargo da empresa "SIMCO, Lda." e começou a 22 de Fevereiro de 1937, na, então, Avenida Cândido dos Reis, atual Avenida D. Afonso Henriques, sendo «grandiosa» para a época, a atestar pelos seguintes dados publicados no programa distribuído aquando da sua inauguração:
«Para dar uma pequena ideia desta obra apresentam-se os seguintes dados: Gastaram-se entre outros materiais 979 camiões de areia, cascalho e saibro; 684 camiões de perpianho e alvenaria; 62 vagões de cimento, cal, gesso e marmorite; 13 vagões com 127000 quilos de ferro; 31000 ou sejam perto de 30 vagões de tijolos "SIMCO" gastos para os pavimentos. Só os pinheiros utilizados na obra somam um comprimento que chega para fazer uma via dupla desde a Praça do Toural até à Penha. As tábuas e escoras gastas nas cofragens e soalhos chegariam para fazer um tapamento a toda a volta da Praça do Toural com uma altura de 20 metros. Se carregássemos um comboio com todo o material gasto nesta obra, teríamos uma composição de 835 vagões excluindo a máquina e o tender ou seja um comprimento total de 9,2 quilóm., isto é, uma distância igual à que vai da estação de Guimarães até Vizela. Com as 926 lâmpadas num total de 46000 watts aplicadas na iluminação, e distanciadas de 10 m. podiamos iluminar toda esta linha.»
O "Teatro Jordão" tinha capacidade para mais de 1.200 espectadores. O programa da sua inauguração, que, como já foi referido, teve lugar a 20 de Novembro de 1938, foi composto por um "Serão Vicentino", representada pela companhia do "Teatro Nacional Almeida Garrett" ("Teatro Nacional D. Maria II), com a representação da peça "Monólogo do Vaqueiro", do "Auto Pastoril Português" e do "Auto Mofina Mendes". Amélia Rey Colaço, Lucília Simões, João Villaret, Álvaro Benamôr e Raul de Carvalho, faziam parte do fabuloso elenco. Nas duas noites seguintes 21 e 22 foram representadas as peças "Romance" e "Izabel, Rainha de Inglaterra" protagonizada pelos actores Amélia Rey Colaço, Robles Monteiro e Maria Clementina. O espectáculo de inauguração contou, ainda, com a participação da "Orquestra Ibéria".
E ,,, «A Sociedade de Perfumarias Nally, Lda. Representada nesta cidade pela firma Dias & Carvalho, Lda. manda por gentileza perfurmar a sala de espectáculos com "Noite de Prata"».
Entretanto, a sua denominação de "Teatro Martins Sarmento" perduraria até Dezembro de 1940, altura em que o despacho do Ministro da Educação Nacional, autorizou o uso do nome de Teatro Jordão, já depois da morte de Bernardino Jordão, que ocorreu a 23 de Maio de 1940.
13 de Dezembro de 1940 20 de Dezembro de 1940
Quanto ao cinema no "Teatro Jordão", transcrevo de seguida excertos de um artigo publicado no site "MaisGuimarães" que inclui excertos de uma entrevista ao vimaranese Sr. José Luís Fernandes:
«Na primeira pessoa, lembrando-se de várias histórias lá vividas, o vimaranense José Luís Fernandes recorda o esqueleto. “Os lugares não eram todos iguais, eram bilhetes numerados e havia imensas categorias”, diz. Frisas, plateia geral, plateia, camarotes, balcão. As memórias são várias. As frisas, na parte de baixo, levavam seis pessoas, como os camarotes, em cima. O bilhete mais barato era na plateia geral e o mais caro no primeiro balcão, onde os lugares eram estofados. O balcão era feito em escada, subindo degrau a degrau. Havia ainda um hall “muito grande”, onde tinha um bar e “uma menina a vender chocolates e aquelas coisas”. No fundo, os lavabos. O Teatro Jordão fez parte da vida de muitos vimaranenses e José Luís Fernandes frequentou-o sempre. “Vi fazer as obras”, comentou enquanto nos fazia viajar entre as paredes do espaço.
Começou com apenas um filme por semana, ao domingo à tarde. A quinta-feira à noite passou a fazer parte da programação e as pessoas ganharam o hábito do cinema. A terça-feira e o sábado surgem no cartaz e o domingo passa a receber espectadores duas vezes, às 15h00, na matiné, e às 21h00, na sessão noturna.
“O sábado era dedicado aos filmes de cowboys. Não faltava a um”, revive José Luís Fernandes. Não se lembra de muita coisa do início do Teatro Jordão, tinha apenas 11 anos de idade, mas quando começou a trabalhar já “ganhava dinheirinho para comprar um bilhete para o cinema”. Quando o filme acabava, confessa, “ia ao Vira Bar beber um fininho e comer um prego”, ri.
Ao domingo, da matiné, dez tostões davam entrada para duas pessoas, “normalmente eram os homens e os rapazes que iam ao cinema”. Havia ainda um lote de bilhetes para o mês todo e o porteiro furava os cartões, “como nos comboios”, conta. Por 30 escudos por mês, “a cadeira era nossa, ninguém se sentava nela”.»
De referir que no piso térreo do edifício funcionava o "Restaurante Jordão".
O "Teatro Jordão" encerraria em finais de Dezembro de 1993 e em Agosto de 2010 a Câmara Municipal de Guimarães compra do edifício à família Jordão, por 2,2 milhões de euros.
Em 2012 o projeto do arquiteto Miguel Guedes é distinguido com o primeiro lugar no concurso público promovido pela Câmara Municipal de Guimarães para a reabilitação e reconversão funcional do "Teatro Jordão". Em Maio de 2017, é lançado o concurso público para recuperação do edifício, mas que acaba por ser anulado, devido às empresas concorrentes não terem "cumprido as normas de procedimento". O início das obras terão lugar em Janeiro de 2019.
A inauguração do conjunto "Teatro Jordão" e "Auto-Garage Avenida" teve lugar em 12 de Fevereiro de 2022, como Escola de Artes Visuais, Artes Performativas e Música. A sala de espectáculos principal tem lotação para 400 pessoas.
2 comentários:
Magnífico poste que me trouxe boas recordações (obrigado!).
De "o operador de máquina «o senhor Neves»" posso referir que era o meu primo José Neves, e que sofria de alopecia.
Uma referência à belíssima iconografia que acompanha o texto.
Em 2018 (?) saíu, de Paulo Cunha, com o patrocínio do Cineclube de Guimarães, a obra "Cinema e Cinefilia em Guimarães / 1895-1957", mas o seu poste contém o essencial sobre o tema.
Muitos parabéns pela qualidade do poste!
Os melhores cumprimentos,
Alberto Soares
Caro Alberto Soares
Muito grato pelo seu amável comentário e informação adicional.
Os meus melhores cumprimentos
José Leite
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