O "Eden-Palace Hotel" foi mandado construir pelo Conde Joaquim Palhares d'Almeida Araújo (1855-1909) antes de 1910, na Foz do Arelho, freguesia das Caldas da Rainha. Como este hotel só abriu em 1910, o Conde já não assistiu ao evento, visto que já que tinha falecido em 26 de Novembro de 1909.
A exploração deste hotel foi entregue a Manuel Saudade e Silva, que já possuía o "Hotel da Copa", com 100 quartos, e fundado em 1900 na Rua Miguel Bombarda, nas Caldas da Rainha. «Estabelecimento de primeira ordem na artéria de maior circulação, a dois minutos da Estação do Caminho de Ferro e do estabelecimento Thermal, possuindo uma espaçosa e magnífica casa de jantar com mezas para 1 a 6 pessoas.»
Postal publicitário datado de 27 de Setembro de 1910
«Estabelecimento de primeira ordem junto á praia de banhos», e por 400 réis, os seus clientes podiam viajar de Caldas à Foz do Arelho e voltar, e por 800 réis tinham um jantar de 5 pratos !
Por morte do Conde d'Almeida Araújo, o comerciante e filantropo Francisco d' Almeida Grandella (1852-1934), dono dos famosos "Armazéns Grandella & C.ª ", em Lisboa, adquire o "Eden-Palace Hotel" e entrega a sua gestão a seu filho Luiz Grandella, (que já era sócio dos "Armazéns Grandella & C.ª ", desde 1916) em 1923, renomeando-o de Pensão e Restaurant "O Facho". Mas Luiz Gradella não foi feliz na sua gerência e pouco tempo depois encerraria.
Conde d'Almeida Araujo (1855-1909)
Notícia no "Diario Illustrado" en 26 de Novembro de 1909
De referir que o chalet do Conde d'Almeida Araújo, foi a primeira construção, digna de nota, na Foz do Arelho, tendo sido projectada em 1903, pelo arquitecto Leonel Gaia. Foi também o Conde que mandou construir as primeiras ruas nesta freguezia.
Luiz Grandella
Por ocasião do encerramento da Pensão e Restaurant "O Facho", o jornal "Gazeta das Caldas" de 1 de Novembro de 1925, publicava o seguinte artigo de opinião:
«Ha anos, e ha anos que não vão muito longe, muitos melhoramentos aquela praia ficou a dever ao Exmo. Sr. Conde de Almeida Araújo, que pela Foz tinha uma grande admiração construindo ali um magnifico palacete e ainda um hotel e restaurant, que em qualquer parte são bons. E quando essas construções se concluiram, a Foz tinha um aspecto totalmente diferente do que tem hoje!
A praia animava-se, o hotel e restaurant tinham uma frequencia regular, e duma maneira geral o movimento da povoação aumentou.
Infelizmente para a Foz e para as Caldas, poucos anos depois de iniciados melhoramentos importantes, falecia aquele ilustre titular, a quem a população da Foz tanto ficou devendo.
Não quero neste momento esquecer os beneficios que o Exmo. Sr. Francisco d'Almeida Grandella, tem prestado á linda praia, construindo ali a sua residencia, creando uma escola primaria e realizando outros melhoramentos de vulto, que muito teem contribuido para o desenvolvimento da pequenina povoação, que ano para ano, vai aumentando em numero de fogos e em população.
E, aqui temos nós como a Foz se encontrava ha anos. Dentão para cá, nada tem progredido, sucedendo até que a sua frequência tem diminuido, especialmente por ter acabado o hotel e restaurant, que com tão boa vontade o grande amigo da Foz, Conde d'Almeida Araujo, tinha mandado construir! (...)
(...) Para isso torna-se necessário, - não me canço de repetir - que a população da Foz compreenda a sua missão, trabalhe, com a sua junta de freguezia, de forma a fazer progredir a sua terra, o que com o auxílio da Comissão de Iniciativa das Caldas conseguiriam.
E, quem sabe até, que essa junta se avistasse com o Exmo. Sr. Francisco d'Almeida Grandella, a quem a Foz do Arelho já tanto deve, ele se resolveria a explorar o hotel e restaurant, principal condição para o progresso da praia?»
Entretanto Francisco Grandella «pega» de novo na Pensão Restaurant "O Facho" e promove obras de beneficiação, ampliação até ao terceiro andar, e equipado com luz eléctrica em todo o edifício, sob o projecto do arquitecto João Tabarra.
Francisco de Almeida Grandella no "Almanak d'O Mundo"
"Chalet Joaquim Frutuoso" e "Escola Primaria Oficial", mandada construir por Almeida Grandella
O prenúncio da guerra marcava mais uma etapa da vida do Pensão "O Facho", com a sua venda, ao oficial do exército inglês Charles Harbord. Este oficial tinha comprado em 1930 a concessão das minas de urânio da Urgeiriça, sendo muito do minério extraído exportado directamente para a Inglaterra. Nessa altura, já Harbord tinha construído o "English Hotel" da Urgeiriça, uma mansão construída inicialmente para albergar a família e os engenheiros que trabalhavam na extracção do minério, mas que depois foi alvo de ampliações e transformada em hotel.
Segundo o guia "Hoteis e Pensões de Portugal" de 1939, os preços praticados pela Pensão "O Facho" , com 30 quartos, eram os seguintes:
Diária: de 27$00 a 45$00
1º Almoço: 2$50
Almoço: 12$00
Jantar: 14$00
Em Agosto de 1942, no auge da guerra, nasce a sociedade "Hotéis Internacionais Lda." O império alargava-se então a outras unidades hoteleiras: o "Hotel do Facho" na Foz do Arelho, a "Estalagem da Lezíria" em Vila Franca de Xira e o "Grande Hotel" das Caldas da Felgueira.
Ainda como "Pensão e Restaurant "O Facho"
No postal anterior pode-se observar e ler na legenda do mesmo que o edifício lateral ao do Hotel e térreo que outrora tinha albergado o Restaurant do "Eden-Palace Hotel" já tinha sido vendido e transformado numa casa particular de seu nome "Vila do Mar". Apesar da freguesia da Foz do Arelho só vir a ter electricidade em 1950, o hotel já tinha esse «luxo».
Interiores do "Hotel do Facho"
A revista de turismo "Panorama" de Abril de 1943 noticiava:
«Depois de cuidada adaptação, reabriu, há pouco, o Hotel do Facho, na bela praia da Foz do Arelho, a o Kms. das Caldas da Rainha e a cêrca de 100 kms. de Lisboa. Dispõe agora, de 34 quartos - todos com água quente e fria encanada, e 8 com casa de banho privativa.
O Hotel é todo iluminado a electricidade, tem telefone e 3 fogões de sala. Das varandas e amplas janelas da fachada principal (virada a Sul) abrange-se largo horizonte, sôbre o Oceano e, em tempo limpo, vêem-se claramente as Ilhas Berlengas.
Fica, assim, extraordináriamente valorizada uma das mais aprazíveis estâncias da beira-mar do País, cuja situação disfruta o privilégio da proximidade da Lagôa de Óbidos (a 200 metros do Hotel), óptimo local para campismo, e onde se podem praticar os agradáveis desportos da pesca e da caça.»
Já com a designação de "Hotel do Facho"
O "Hotel do Facho" servia então de casa de veraneio aos engenheiros ingleses instalados na Beira que procuravam no litoral um clima mais ameno. Era também a este hotel que eram recolhidos muitos refugiados judeus da II Grande Guerra Mundial. Era uma espécie de último reduto, um porto seguro pela neutralidade de Portugal e muitas vezes um ponto de passagem para os Estados Unidos, mesmo ali em frente.
Entre 1935 e 1944 passa a ser explorado por um espanhol, natural de Sottomayor, Domingos Losquiños Garrido. Este já se encontrava nas Caldas da Rainha antes do enorme afluxo de refugiados da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) começar a chegar à localidade. Numa carta remetida pelo presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, Júlio Lopes, a um veraneante lisboeta António Barbosa Sobrinho, informa-o seguinte:
«Respondendo á carta de V. Exª. datada de 17 do corrente, informo que na Praia da Foz do Arêlho, mesmo junto ao mar, existe a Pensão - “O Facho” - de Domingos Losquinhos Garrido. As diárias, por pessoa, vão desde 27$50 a 50$00 e para casal desde 50$00 a 80$00. Dirigindo-se V. Exª. directamente ao dono da pensão, obterá todas as mais informações que desejar.
A Bem da Nação. Caldas da Rainha, 19 de Agosto de 1938 (seguido do nome do presidente, Júlio Lopes)».
Postal promocional
Etiqueta de bagagem
Entretanto, em 15 de Maio de 1950 a "Gazeta das Caldas" apelava ao turismo na Foz do Arelho:
«A Foz, dotada já de todos os requisitos modernos - e falamos assim por estar próximo o dia em que se inaugurará a iluminação eléctrica, - com esplendido hotel, óptima pensão e café, é de facilimo acesso pois é servida por uma das melhores estradas do país e por carreiras de camionetes quase constantes. Muito frequentada de verão e de inverno, tem sido escolhida para nela serem construidas encantadoras moradias por familias da capital e doutras cidades do pais e foi-o pela FNAT que lá instalou a Colónia de Férias Marechal Carmona.»
Nos anos 80 do século XX, o "Hotel do Facho" viria a ser, também, o porto de abrigo de Jorge Coito, onde ancorou nos anos 80 depois de uma adolescência psicadélica passada em Montreal. A vontade de assentar num lugar mais quente do que o Canadá, fez este estudante de Design voltar a Portugal com a ideia de montar um negócio e viver perto do mar. Ao início, o projecto era partilhado com o irmão, mas a busca tornou-se infrutífera e acabariam por voltar ao Canadá sem terem encontrado nenhum local que servisse esse sonho. O "Hotel do Facho", descoberto por membros da sua família que viviam na zona, viria a ser comprado pelos dois irmãos à distância de um oceano, com um crédito especial que era concedido a emigrantes para comprarem bens imóveis na terra natal. E se para Jorge Coito, este hotel foi um amor à primeira vista que se tornou num projecto de vida, para o seu irmão foi a certeza de que a vida pacata junto à lagoa e ao mar não tinha suficiente "sex, drugs and rock'n'roll" e por isso voltou para o Canadá. Em 1980, Jorge Coito encontra-o numa quase ruína insalubre, fruto de uma ocupação de seis anos por inúmeras famílias regressadas das ex-colónias.
A verdade é que a ocupação do Facho era muito para além do que a capacidade do hotel tinha. Mas o estado em que encontrou o "Hotel do Facho" ... «Já não havia água canalizada, nem janelas. Criavam porcos nas casas de banho e cozinhavam no quarto. Tirámos tanto lixo que fizemos uma fogueira que ardeu durante um mês.»
Depois de recuperado, este hotel passou a ser um refúgio de escritores, um ponto de encontro anual de arquitectos e um destino obrigatório para quem gosta de sítios que carregam o ar do tempo, fora das convenções, e especial o suficiente para não se perceber logo à primeira o que nos atrai naquele sítio. Viria a tornar-se, «acima de tudo, numa casa de hóspedes e não um hotel».
A actual "Facho Guest House", na Rua Francisco de Almeida Grandella, é uma pensão com 24 quartos e que, como se pode testemunhar pelas seguintes fotos, mantem a traça antiga e tradicional.
Bibliografia:
Artigo: "Casa do Facho", publicado no jornal "Público" em 6 de Abril de 2004.
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