A exploração deste hotel foi entregue a Manuel Saudade e Silva, que já possuía o "Hotel da Copa", com 100 quartos, e fundado em 1900 na Rua Miguel Bombarda, nas Caldas da Rainha. «Estabelecimento de primeira ordem na artéria de maior circulação, a dois minutos da Estação do Caminho de Ferro e do estabelecimento Thermal, possuindo uma espaçosa e magnífica casa de jantar com mezas para 1 a 6 pessoas.»
«Estabelecimento de primeira ordem junto á praia de banhos», e por 400 réis, os seus clientes podiam viajar de Caldas à Foz do Arelho e voltar, e por 800 réis tinham um jantar de 5 pratos !
Por morte do Conde d'Almeida Araújo, o comerciante e filantropo Francisco d' Almeida Grandella (1852-1934), dono dos famosos "Armazéns Grandella & C.ª ", em Lisboa, adquire o "Eden-Palace Hotel" e entrega a sua gestão a seu filho Luiz Grandella, (que já era sócio dos "Armazéns Grandella & C.ª ", desde 1916) em 1923, renomeando-o de Pensão e Restaurant "O Facho". Mas Luiz Gradella não foi feliz na sua gerência e pouco tempo depois encerraria. O Restaurante seria, entretanto, vendido
e transformado em residência privada, conhecida como "Villa do
Mar".
Conde d'Almeida Araujo (1855-1909)
Notícia no "Diario Illustrado" en 26 de Novembro de 1909
De referir que o chalet do Conde d'Almeida Araújo, foi a primeira construção, digna de nota, na Foz do Arelho, tendo sido projectado, em 1903, pelo arquitecto Leonel Gaia (1871-1941). Foi também o Conde que mandou construir as primeiras ruas nesta freguezia.
Luiz Grandella
Por ocasião do encerramento da Pensão e Restaurant "O Facho", o jornal "Gazeta das Caldas" de 1 de Novembro de 1925, publicava o seguinte artigo de opinião:
«Ha anos, e ha anos que não vão muito longe, muitos melhoramentos aquela praia ficou a dever ao Exmo. Sr. Conde de Almeida Araújo, que pela Foz tinha uma grande admiração construindo ali um magnifico palacete e ainda um hotel e restaurant, que em qualquer parte são bons. E quando essas construções se concluiram, a Foz tinha um aspecto totalmente diferente do que tem hoje!
A praia animava-se, o hotel e restaurant tinham uma frequencia regular, e duma maneira geral o movimento da povoação aumentou.
Infelizmente para a Foz e para as Caldas, poucos anos depois de iniciados melhoramentos importantes, falecia aquele ilustre titular, a quem a população da Foz tanto ficou devendo.
Não quero neste momento esquecer os beneficios que o Exmo. Sr. Francisco d'Almeida Grandella, tem prestado á linda praia, construindo ali a sua residencia, creando uma escola primaria e realizando outros melhoramentos de vulto, que muito teem contribuido para o desenvolvimento da pequenina povoação, que ano para ano, vai aumentando em numero de fogos e em população.
E, aqui temos nós como a Foz se encontrava ha anos. Dentão para cá, nada tem progredido, sucedendo até que a sua frequência tem diminuido, especialmente por ter acabado o hotel e restaurant, que com tão boa vontade o grande amigo da Foz, Conde d'Almeida Araujo, tinha mandado construir! (...)
(...) Para isso torna-se necessário, - não me canço de repetir - que a população da Foz compreenda a sua missão, trabalhe, com a sua junta de freguezia, de forma a fazer progredir a sua terra, o que com o auxílio da Comissão de Iniciativa das Caldas conseguiriam.
E, quem sabe até, que essa junta se avistasse com o Exmo. Sr. Francisco d'Almeida Grandella, a quem a Foz do Arelho já tanto deve, ele se resolveria a explorar o hotel e restaurant, principal condição para o progresso da praia?»
Entretanto Francisco Grandella «pega» de novo na Pensão Restaurant "O Facho" e promove obras de beneficiação, ampliação até ao terceiro andar, e equipado com luz eléctrica em todo o edifício, sob o projecto do arquitecto João Tabarra.
Francisco de Almeida Grandella no "Almanak d'O Mundo"
"Chalet Joaquim Frutuoso" e "Escola Primaria Oficial", mandada construir por Almeida Grandella
O prenúncio da guerra marcava mais uma etapa da vida do Pensão "O Facho", com a sua venda, ao oficial do exército inglês Charles Harbord. Este oficial tinha comprado em 1930 a concessão das minas de urânio da Urgeiriça, sendo muito do minério extraído exportado directamente para a Inglaterra. Nessa altura, já Harbord tinha construído o "English Hotel" da Urgeiriça, uma mansão construída inicialmente para albergar a família e os engenheiros que trabalhavam na extracção do minério, mas que depois foi alvo de ampliações e transformada em hotel.
Segundo o guia "Hoteis e Pensões de Portugal" de 1939, os preços praticados pela Pensão "O Facho" , com 30 quartos, eram os seguintes:
Diária: de 27$00 a 45$00
1º Almoço: 2$50
Almoço: 12$00
Jantar: 14$00
Em Agosto de 1942, no auge da guerra, nasce a sociedade "Hotéis Internacionais Lda." O império alargava-se então a outras unidades hoteleiras: o "Hotel do Facho" na Foz do Arelho, a "Estalagem da Lezíria" em Vila Franca de Xira e o "Grande Hotel" das Caldas da Felgueira.
Ainda como "Pensão e Restaurant "O Facho"
No postal anterior pode-se observar e ler na legenda do mesmo que o edifício lateral ao do Hotel e térreo que outrora tinha albergado o Restaurant do "Eden-Palace Hotel" já tinha sido vendido e transformado numa casa particular de seu nome "Vila do Mar". Apesar da freguesia da Foz do Arelho só vir a ter electricidade em 1950, o hotel já tinha esse «luxo».
Interiores do "Hotel do Facho"
A revista de turismo "Panorama" de Abril de 1943 noticiava:
«Depois de cuidada adaptação, reabriu, há pouco, o Hotel do Facho, na bela praia da Foz do Arelho, a o Kms. das Caldas da Rainha e a cêrca de 100 kms. de Lisboa. Dispõe agora, de 34 quartos - todos com água quente e fria encanada, e 8 com casa de banho privativa.
O Hotel é todo iluminado a electricidade, tem telefone e 3 fogões de sala. Das varandas e amplas janelas da fachada principal (virada a Sul) abrange-se largo horizonte, sôbre o Oceano e, em tempo limpo, vêem-se claramente as Ilhas Berlengas.
Fica, assim, extraordináriamente valorizada uma das mais aprazíveis estâncias da beira-mar do País, cuja situação disfruta o privilégio da proximidade da Lagôa de Óbidos (a 200 metros do Hotel), óptimo local para campismo, e onde se podem praticar os agradáveis desportos da pesca e da caça.»
Já com a designação de "Hotel do Facho"
O "Hotel do Facho" servia então de casa de veraneio aos engenheiros ingleses instalados na Beira que procuravam no litoral um clima mais ameno. Era também a este hotel que eram recolhidos muitos refugiados judeus da II Grande Guerra Mundial. Era uma espécie de último reduto, um porto seguro pela neutralidade de Portugal e muitas vezes um ponto de passagem para os Estados Unidos, mesmo ali em frente.
Entre 1935 e 1944 passa a ser explorado por um espanhol, natural de Sottomayor, Domingos Losquiños Garrido. Este já se encontrava nas Caldas da Rainha antes do enorme afluxo de refugiados da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) começar a chegar à localidade. Numa carta remetida pelo presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, Júlio Lopes, a um veraneante lisboeta António Barbosa Sobrinho, informa-o seguinte:
«Respondendo á carta de V. Exª. datada de 17 do corrente, informo que na Praia da Foz do Arêlho, mesmo junto ao mar, existe a Pensão - “O Facho” - de Domingos Losquinhos Garrido. As diárias, por pessoa, vão desde 27$50 a 50$00 e para casal desde 50$00 a 80$00. Dirigindo-se V. Exª. directamente ao dono da pensão, obterá todas as mais informações que desejar.
A Bem da Nação. Caldas da Rainha, 19 de Agosto de 1938 (seguido do nome do presidente, Júlio Lopes)».
Postal promocional
Etiqueta de bagagem
Entretanto, em 15 de Maio de 1950 a "Gazeta das Caldas" apelava ao turismo na Foz do Arelho:
«A Foz, dotada já de todos os requisitos modernos - e falamos assim por estar próximo o dia em que se inaugurará a iluminação eléctrica, - com esplendido hotel, óptima pensão e café, é de facilimo acesso pois é servida por uma das melhores estradas do país e por carreiras de camionetes quase constantes. Muito frequentada de verão e de inverno, tem sido escolhida para nela serem construidas encantadoras moradias por familias da capital e doutras cidades do pais e foi-o pela FNAT que lá instalou a Colónia de Férias Marechal Carmona.»
Nos anos 80 do século XX, o "Hotel do Facho" viria a ser, também, o porto de abrigo de Jorge Coito, onde ancorou nos anos 80 depois de uma adolescência psicadélica passada em Montreal. A vontade de assentar num lugar mais quente do que o Canadá, fez este estudante de Design voltar a Portugal com a ideia de montar um negócio e viver perto do mar. Ao início, o projecto era partilhado com o irmão, mas a busca tornou-se infrutífera e acabariam por voltar ao Canadá sem terem encontrado nenhum local que servisse esse sonho. O "Hotel do Facho", descoberto por membros da sua família que viviam na zona, viria a ser comprado pelos dois irmãos à distância de um oceano, com um crédito especial que era concedido a emigrantes para comprarem bens imóveis na terra natal. E se para Jorge Coito, este hotel foi um amor à primeira vista que se tornou num projecto de vida, para o seu irmão foi a certeza de que a vida pacata junto à lagoa e ao mar não tinha suficiente "sex, drugs and rock'n'roll" e por isso voltou para o Canadá. Em 1980, Jorge Coito encontra-o numa quase ruína insalubre, fruto de uma ocupação de seis anos por inúmeras famílias regressadas das ex-colónias.
A verdade é que a ocupação do Facho era muito para além do que a capacidade do hotel tinha. Mas o estado em que encontrou o "Hotel do Facho" ... «Já não havia água canalizada, nem janelas. Criavam porcos nas casas de banho e cozinhavam no quarto. Tirámos tanto lixo que fizemos uma fogueira que ardeu durante um mês.»
Depois de recuperado, este hotel passou a ser um refúgio de escritores, um ponto de encontro anual de arquitectos e um destino obrigatório para quem gosta de sítios que carregam o ar do tempo, fora das convenções, e especial o suficiente para não se perceber logo à primeira o que nos atrai naquele sítio. Viria a tornar-se, «acima de tudo, numa casa de hóspedes e não um hotel».
A actual "Facho Guest House", na Rua Francisco de Almeida Grandella, é uma pensão com 24 quartos e que, como se pode testemunhar pelas seguintes fotos, mantem a traça antiga e tradicional.
Bibliografia:
Artigo: "Casa do Facho", publicado no jornal "Público" em 6 de Abril de 2004.
2 comentários:
Boa tarde caro José Augusto Leite
Desta sua entrada sobre o Éden Palace / Hotel do Facho na Foz do Arelho, gostaria de fazer uma pequena observação em nome da realidade factual do passado: na sua referência à "Villa do Mar" diz ter sido entretanto vendida, interpretando eu, pela família Grandella posteriormente à compra do Hotel, quando de facto na venda do Éden à família Grandella, em 1925, o restaurante do Éden foi desanexado da venda, continuando na posse do filho herdeiro do construtor do Éden, vendedor do Hotel, para sua casa de férias na Foz do Arelho até aos anos de 1960, já que em partilhas, o palacete do 1ºConde de Almeida Araújo tinha ficado para a filha mais velha, entretanto casada com o 2º Visconde de Morais.
Por outro lado gostaria de saber a sua fonte quanto ao Arq.º Leonel Gaia ser o projectista do palacete em 1903 e se calhar do hotel, já que sou aparentado com o referido arquitecto.
Agradecendo desde já a sua resposta
Bom dia,
Grato pelo seu comentário e informações adicionais.
Quanto `origem da minha informação acerca do arquitecto , consulte o seguinte link:
https://pt.revistasdeideias.net/pt-pt/a-construcao-moderna/in-issue/iss_0000002717/3
Os meus cumprimentos.
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