A “Joalharia do Carmo”, abriu as suas portas em 1926, na Rua do Carmo, em Lisboa. Em 1924, Alfredo Pinto da Cunha, proprietário da "Ourivesaria Cunha", no Porto, seu irmão Gabriel Pinto da Cunha e Alberto Vieira de Sampaio, adquirem a joalharia "Raúl Pereira e Cª Ltda.", localizada na Rua do Carmo em Lisboa, passando a casa a designar-se de "Joalharia do Carmo". Em 1925, é registado o respetivo logótipo, que passou a integrar a decoração da fachada, desenho da autoria do arquiteto Manuel Norte Júnior. No interior mobiliário em mogno talhado, candeeiros em cristal Baccarat, paramentos revestidos por lambris de madeira a meia altura e expositores em madeira e vidro, seguindo os ambientes luxuosos que os Pinto da Cunha atribuíam aos seus estabelecimentos.
A “Joalharia do Carmo” é um dos sete estabelecimentos que foram construídos, a partir de escavações para o efeito, na “Muralha do Carmo”. Esta forte barreira de alvenaria, foi construída após o terramoto de 1755, para consolidação do “Monte da Pedreira”, junto às ruínas do Convento do Carmo, e que inicialmente se estendia para Norte até à Rua do Príncipe, actual Rua 1º de Dezembro.
“Muralha do Carmo”, à direita na foto
Em 1901 abrem as lojas até ao número 87, inclusivé, até 1917 altura em que o o comerciante Joaquim Rodrigues Simões - que integrou o executivo camarario entre 1919 e 1923 - requer autorização para construir estabelecimentos na parte ainda desaproveitada da Muralha. Pelo que em 1920 é submetido à Câmara um projecto onde se pretende construir na parte livre, três estabelecimentos, compostos de loja e sobreloja; o Ministério das Obras Públicas aprova o projecto do engenheiro Artur Cohen, para na então parte cega da muralha se abrirem estabelecimentos, visto reconhecer-se que a inicitaiva não punha em perigo a muralha. As obras durariam 4 anos, pelas dificuldades na perfuração; verificou-se que além da Muralha, que é dentada pelo lado interior, agarrando-se assim à estrutura dos terrenos. O engenheiro Domingos Mesquita dirigiu a construção no que respeita a cimento armado, sendo toda a obra finalizada por parte do Estado, pelo engenheiro Valério Vilaça.
Durante o cortejo camoneano incluído nas “Festas da Cidade”, em Junho de 1913
Finalmente, em 1924 instalam-se na “Muralha do Carmo” a “Casa Atlas” (n.º 87-D), a Companhia “Wagons-Lits” (n.º 87 C); “Ourivesaria Raúl Pereira & C.ª, Ltda.”, (n.º 87-B) e a Joaquim Rodrigues Simões é dada a concessão da loja com o nº 87-A pelo prazo de 25 anos, onde abriria a “Luvaria Ulisses” em 1925, cabendo à Fazenda Pública 20 % das rendas das lojas da Muralha.
"Joalharia do Carmo" em obras (onde estão os andaimes)
“Ourivesaria Raúl Pereira & C.ª, Ltda.”
30 de Novembro de 1925
Todas as lojas da “Muralha do Carmo” nos anos 60 do século XX
Como foi dito no início, a história da “Joalharia do Carmo” começa com a aquisição da “Ourivesaria Raúl Pereira e C.ª, Ltda.” por Alfredo Pinto da Cunha, (tio-padrinho do actual proprietário, Alfredo Sampaio), ourives no Porto, e proprietário da “Cunha & Sobrinho - Jóias e objectos d’arte em prata”, fundada em 1 de Janeiro de 1880 por José Pinto da Cunha, na Rua do Loureiro, no Porto. Em 1915, muda de instalações para a Rua 31 de Janeiro, também no Porto, para uma loja projectada, em estilo “Arte Nova”, pelo arquitecto Francisco de Oliveira Ferreira. Numa política de expansão e crescimento, é adquirida a “Ourivesaria Raúl Pereira & C.ª”, em 1925.
Com a entrada de Jacinto Machado o negócio cresceu visivelmente, quer pela sua enorme carteira de clientes quer pelas modernas técnicas de comunicação. Em 1954, Jacinto Machado já é sócio da, já, “Ourivesaria Cunha”, um belo estabelecimento na Rua 31 de Janeiro, instalado num edifício classificado e que ainda hoje se mantém em actividade. Em 1957, com a morte de Alfredo Pinto da Cunha, iniciaram-se negociações com a família deste, e Jacinto Machado adquire, pouco depois, a totalidade das quotas da “Ourivesaria Cunha”, que passará a ser conhecida a partir dos anos 80 do séc. XX por “Machado Joalheiro”.
Entretanto, a “Ourivesaria Raúl Pereira e C.ª, Ltda.” passou a designar-se “Joalharia do Carmo”, a partir de 15 de Janeiro de 1926, registando o respectivo logótipo em forma de coração, que passou a ostentar na fachada “Art Déco”.
15 de Janeiro de 1926
Vista nocturna
1934
Nesta casa passariam a trabalhar o irmão do fundador, Gabriel, e Alberto Vieira de Sampaio, cunhado de Alfredo Pinto da Cunha e pai de Alfredo Sampaio, que acabou mais tarde por adquirir as quotas dos sócios.
O negócio prosperou com o eclodir da II Guerra Mundial, com a compra de joias pelos refugiados. Nas décadas seguintes, chegavam à “Joalharia do Carmo” encomendas de baixelas de prata com cerca de 200/300 kg, que integravam listas de casamento dos casais da época.
1941
Ao admirarmos esta Joalharia, a sua arquitetura e decoração não deixam dúvidas sobre a antiguidade da loja. Na fachada, em Art Déco, destaca-se um coração coroado, envolto em ramos de louro. No interior do estabelecimento, o mobiliário em mogno talhado e os candeeiros de cristal ajudam a recriar uma atmosfera histórica.
A “Joalharia do Carmo” mantém-se assim, há 91 anos, sempre na mesma família, no mesmo ramo de negócio, e com a mesma decoração inicial. Mais um caso de rara longevidade, no panorama do comércio actual na baixa lisboeta.
Quanto à loja da “Machado Joalheiro”, na Rua 31 de Janeiro, na cidade do Porto, aqui ficam fotos actuais da mesma.
fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Hemeroteca Municipal de Lisboa, Lojas com História
3 comentários:
Espero que nem esta nem a luvaria ao lado, com desenho de Raul Lino, desapareçam. De preferência que as classifiquem. Belo artigo. Ainda bem que voltou às lides.
Cumprimentos. Gonçalo
Estas casas deveriam permanecer eternas pelo fascínio que ainda provocam.
Obrigada pelas suas pesquisas, sempre interessantes que revivem outros tempos, outros costumes.
Cultura, nos seus matizes variados, é património, é enriquecimento.
a fotografia da rua do carmo, com a loja em obras, é dos anos 1950's, repare-se nos automóveis com matrículas "série 22" de 1955.
valdemar silva
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