Restos de Colecção: "Club Hotel" e "Hotel Club"

6 de novembro de 2022

"Club Hotel" e "Hotel Club"

Este artigo pretende fazer uma resenha histórica de dois equipamentos hoteleiros, o "Club Hotel" e o "Hotel Club", cuja denominação era praticamente a mesma, tendo ambos iniciado a sua actividade na  década de 70 do século XIX.

O "Club Hotel" terá aberto as suas portas pela primeira vez, no início dos anos 70 do século XIX, na Rua Nova do Bom Sucesso, em Belém, e era pertença da firma "Dejante & C.ª ". Lembro que Belém nesta altura era, ainda, considerada como arredor de Lisboa.



26 de Abril de 1874

A propósito da sua reabertura anual, em 26 de Abril de 1874, o jornal "Diario Illustrado" de 2 de Maio referia:

«Este estabelecimento, fundado ha poucos annos pelos srs. Dejante & C.ª, reabriu no dia 26 do mez de abril findo.
A uma situação excellente, perto das melhores praias do Tejo, reúne muitas commodidades para pessoas ou famílias que precisem de bons ares e de banhos do mar.
Alem de um grande numero de quartos, magnificamente mobilados, encontram-se ali um salão commum, circumdado de terraços com linda vista sobre o Tejo, casa de leitura e café, e casa de banhos.
Annexo ao hotel ha um grande deposito de vinhos nacionaes e estrangeiros das casas mais acreditadas.
O Club Hotel, sem duvida um dos melhores estabelecimentos do seu genero nos arredores da capital, fornece jantares de meza redonda e particulares.
A estes jantares, perfeitamente servidos, costumam concorrer muitas pessoas d'esta cidade. E a facilidade das communicaçõas e a barateza d'ellas faz com que a concorrência augmente todos os dias.
E para reunir todas as condições que o torna recommendavel, nas proximidades estão differentes monumentos como o convento dos Jeronymos, a torre de Belem, a egreja da Memoria, lindas quintas, como as do duque de Cadaval em Pedroiços, e as de el-rei em Belem e na Ajuda, etc.
Dentro de pouco mais uma diversão accrescerá a estas: vae estabelecer-se ali proximo o campo das corridas de cavallos.
Em conclusão, para nao sermos prolixos, que o podíamos ser se houvéramos de fazer a narração de todas as commodidades que tornam este estabelecimento um dos mais recommendaveis para os fins de que temos fallado, diremos que os srs. Dejante & C.ª nào se teem poupado a esforços paia conseguir o seu preposito alliando os interesses do publico aos seus, a são dignos de elogio.»



Dentro dos círculos, onde viria a estar (carta topográfica) e onde esteve instalado o "Culb Hotel" (foto aérea)


27 de Junho de 1874

A frequência deste hotel teve o seu auge após a inauguração do "Hippodromo de Belem" em 29 de Junho de 1874, com corridas de cavalos promovidas pelo "Club Equestre" fundado em 1873, e com sede na Rua Nova dos Martyres, 25-1º, em Lisboa. A sua denominação viria a ser mudada em 1876, para "Jockey-Club" que passou a organizar as corridas. Este club viria a ser extinto em 1883, depois de terem sido iniciadas as primeiras corridas nas alamedas do Campo Grande, em Lisboa. O "Jockey-Club" viria a ser substituído pela "Sociedade Promotora do Apuramento de Raças Cavalares" que arrematara os bens do extinto "Jockey-Club".


"Hippodromo de Belem"




8 de Outubro de 1874

Uma pequena praia de areia que existia junto à Torre de Belém, era muito frequentada por banhistas, que para ali se deslocavam, a partir do Cais do Sodré, por terra ou em vapores, da "Vapores Lisbonenses", e que partiam de meia em meia hora. O preço do bilhete de ida e volta era de 100 réis.




Areal junto à "Torre de Belém"


18 de Julho de 1883

No "Novo Guia do Viajante em Lisboa e Seus Arredores" de 1880 uma referência particular ao "Club Hotel" :

«Já que n'este passeio nos achamos no aprazivel e hoje muito frequentado bairro de Belém, citaremos aqui ao cançado viajante o Club Hotel, magnifico estabelecimento com saída e cães sobre a magnifica praia de banhos do Bom Successo, torna-se muito recommendavel não só pela sua posição excepcional e salubre como pelos commodos que offerece ás pessoas ou famílias que desejarem tomar os banhos de mar ou permanecer no campo, reunindo assim, todas as vantagens para aquelles que preferirem viver confortável e economicamente no campo, perto da cidade, n'um estabelecimento que lhes offerece a independência domestica sem os encommodos e maiores despezas que fariam em casa sua.
A sua collocaçao topographica e a salubridade d'aquelles sitios dão toda a garantia para se poder aconselhar ás pessoas que precisarem restaurar a saúde a sua residência n'aquella localidade, como o attestam os médicos mais conhecedores d'ella.
- Meza redonda e jantares particulares.
- Pastelaria aonde se acceitam encommendas para todas as qualidades de iguarias.
- Salão commum circumdado de terraços com soberba vista sobre o Tejo, casa de leitura e café, jardim, casa de banhos, cavallariça, e cocheira.
- Communicações diárias por terra e por mar com Lisboa por preços diminutíssimos, todas as meias horas.
- Serviço telegraphico permanente com Lisboa e os paizes estrangeiros na estação próxima ao estabelecimento.
- Estabelecimentos de carruagens, cavallos e jumentos de aluguer muito próximos.
- No caes de Belém e na praia da Torre, existem embarcações para passeios e pescarias, podendo-se embarcar no caes do mesmo hotel.
- Annexo a este hotel ha um grande deposito de vinhos nacionaes e estrangeiros das casas mais acreditadas.
- Fallam-se vários idiomas.
- Preços rasoaveis e por convenção.»



1877

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O "Hotel Club" foi inaugurado em 31 de Maio de 1874, na Cova da Piedade. Implantado em frente ao jardim, este hotel, café e bilhares era propriedade do industrial Pompeu Dias Torres, que por sua vez era proprietário da maioria dos terrenos da zona.




30 de Maio de 1874

E a propósito da sua inauguração o jornal "Diario Illustrado", noticiava:

«Damos hoje á estampa a fachada do elegante hotel que ha de inaugurar-se amanha na Cova da Piedade.
O sitio ó realmente lindíssimo. Não podia o seu proprietário escolher melhor local.
Defronta com o jardim publico que servirá do recreio aos visitantes.
O hotel tem excellentes accommodações para hospedes.
Conhecemos, o proprietario e podemos assegurar que o tratamento será excellente.
Deve ser muito concorrido no tempo dos banhos, principalmente porque está proximo de Lisboa e offerece grandes  commodidades.» 


11 de Junho de 1874


15 de Agosto de 1874

E o mesmo jornal, em 19 de Junho do mesmo ano, informava:

«Não podemos deixar de recommendar o Hotel Club no largo da Piedade, aos que quizerem passar algum tempo no campo com commodidade, ou áquelles que fizerem uma simples digressão de um dia.
O jantar de meia redonda é muito bem servido e com esmerado aceio.
A casa é nova, está bem situada, e o proprietario que é um industrial diligente, activíssimo e muito delicado, esforçase por contentar todos quantos procuram o seu Hotel.
A mobília dos quartos é muito boa, e no pavimento baixo do estabelecimento, onde tambem se serve por lista a toda a hora, ha um botequim com bilhar e do outro lado uma mercearia fornecida de excellentes generos pelos preços de Lisboa.
O sitio da Piedade necessitava bem deste melhoramento, e temos a certeza de que o proprietario do Hotel Club auferirá bons lucros da sua tentativa.»

Já que estamos a falar da Cova da Piedade em 1874, aproveito para referir a inauguração do "Salão Veneziano" , que ocorreu em 21 de Junho do mesmo ano, anunciada na véspera no "Diario Illustrado":

«E' amanhã que abre ao serviço do publico o Salão Veneziano, conforme anuunciamos no logar competente. A casa está ornada com muito gosto e aceio, e o sitio é o melhor possível. E' de esperar que a concorrência compense os sacrificios feitos pelo proprietário, que decerto saberá corresponder ao favor publico.»


Em 31 de Junho seguinte, no Folhetim "Cartas Lisbonenses" publicado pelo "Diario Illustrado" ...

«(...) Á beira da estrada o Salão Veneziano, com os seus gelados e sorvetes e o seu champagne democratico, porque se serve aos copos, e cada copo a troco de um tostão. Digam-me se ha cerveja mais barata do que este champagne, que por escrupulos de seriedade não se atreve a espumar nos copos, tão grave é a sua compostura e tão urbana a sua effervescencia mesmo debaixo dos tectos de um salão veneziano, titulo que nos despeita na memoria as orgias pintadas por Paulo Veroneso, e as desinvolturas tempestuosas do Byron na poética cidade dos Doges. (...)» .

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