A “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.” foi fundada na Amadora, por Eduardo Jorge, em 1928, sendo constituída oficialmente em 13 de Março de 1939. Mas, Eduardo Jorge já tinha iniciado o seu percurso de empresário nos transportes de passageiros em 1888.
«Na Lisboa dos nossos avós a deslocação por via motorizada era um verdadeiro sonho. Em meados do século XIX começaram a circular os primeiros transportes colectivos de tracção animal.
Por volta de 1835, foram os “omnibus” (em latim, transporte para todos) os primeiros transportes colectivos que começaram a circular dentro da cidade. Eram carros grandes e desajeitados, com janelas de cada lado e porta nas traseiras, com lotação para 15 pessoas sentadas em bancos corridos, puxados por duas parelhas de animais.
Em 17 de Novembro de 1873 foi inaugurada a primeira linha de “Americanos” (comprados a uma firma de Nova Iorque), que ia desde a Estação da Linha Férrea do Norte e Leste (Sta. Apolónia) e o extremo Oeste do aterro da Boa Vista (Santos).
Em 1878, Eduardo Jorge, então com 18 anos, vindo, como tantos, do interior pobre, empregou-se como moço de cavalariça nos “Americanos” ».
Carro do “Eduardo Jorge” na Praça do Comércio
Anúncio da “CARRIS” em 11 de Novembro de 1874 e tabela da “Companhia de Carruagens Omnibus” em 1888
Carruagem “Omnibus” junto à Estação de Santa Apolónia
Em 1888, Eduardo Jorge depois de se desfazer de uma pequena taberna, criou a sua pequena empresa de transportes, que fazia a carreira entre o Intendente e Belém, com tarifas económicas. Era o carro do “Chora” que veio a ser o mais famoso dos “Americanos” - «carruagens de Nova Iorque, puxadas por mulas brasileiras» na feliz descrição de Ramalho (in: Revista Municipal). “Chora” foi a alcunha que lhe puseram os colegas por frequentemente se lamentar (“chorar”) de ao fim de cada dia considerar os seus ganhos serem sempre poucos. Em 1892, foram eliminados os ”omnibus” e iniciou-se a monopolização progressiva da rede dos transportes públicos por parte da “Companhia Carris de Ferro de Lisboa”.
Em 1900, Eduardo Jorge tinha já 24 carros, de sua alcunha “Chora”, em Lisboa. Chegaram a circular em simultâneo os “Americanos”, do “Jacinto”, do “Salazar”, do “Joaquim Simplício”, da ”Eduardo Jorge” e da “Companhia Carris de Ferro de Lisboa”.
Carruagem “Omnibus” na Praça do Comércio
Carros da “Eduardo Jorge” no Largo do Pelourinho e no Largo do Intendente
Carro da “Eduardo Jorge” durante a greve dos eléctricos em 1912, na Avenida 24 de Julho
Capa de partitura de música da revista “Lisbia Amada”, estreada em Novembro de 1917 no “Teatro da República”
Gentilmente cedido por Carlos Caria
Carros das companhias “Jacinto” , “Salazar” e “Joaquim Simplicio”
Em 1901, apareceriam os eléctricos, os “Amarelos”, da poderosa “Companhia Carris de Ferro de Lisboa” e todos se lhe juntaram menos a “Eduardo Jorge” e o “Jacinto”, que preferiram continuar sozinhos. Eduardo Jorge colocou nos seus carros um letreiro “Esta Empresa Não Se Vende”.
“Americano” e carro eléctrico da “Companhia de Carris de Ferro de Lisboa”, na Praça D. João da Câmara
A partir de 1905 toda a rede estava electrificada, pelo que os “Americanos” desapareciam de Lisboa, mas o “Chora” resistia. Em 1910, a “Eduardo Jorge” tinha 38 carros e o Governo da República, reconhecendo o seu contributo para o desenvolvimento da cidade, reduziu os impostos à sua empresa. Eduardo Jorge resolveu, então, fazer uma distribuição pelos seus colaboradores, correspondente a 50% do que poupava com essa redução.
Bilhetes dos “Chora” da “Eduardo Jorge”
Bilhetes gentilmente cedidos por Carlos Caria
Veio a “ I Grande Guerra Mundial” em 1914, e vieram as dificuldades, contudo, a “Eduardo Jorge” só renunciou aos seus carros em 1917. Vendeu os cavalos e as mulas, pagou ao pessoal e incendiou todos os carros, para não irem parar à “Companhia Carris de Ferro de Lisboa”, sua eterna rival. De todos os concessionários de carreiras urbanas, somente Eduardo Jorge - o “Chora” - conseguiu, à força de persistência e luta, circular os seus carros de tração animal, durante três décadas, sem nunca ter aumentado os bilhetes, ficando os seus carros tão conhecidos, que ainda hoje são lembrados.
Aos 69 anos de idade, Eduardo Jorge foi viver para a Amadora, onde fundou a “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.”, mas somente com camionetas, todas iguais, amarelas, tal e qual como os carros eléctricos da “Companhia Carris de Ferro de Lisboa” aos quais não perdoava a sua derrota. Em 1929, inaugurou a primeira carreira entre as Portas de Benfica e Amadora, que depois se prolongou até Queluz. Em 1937, entrou com as suas carreiras em Lisboa, de onde, contra sua vontade, havia saído.
Dos primeiros autocarros da “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.”, um “Fargo” de 1938
Vai fixar-se em 1939 na Amadora, agora como empresa de camionagem. Com serviço regular de autocarros entre freguesias de Amadora, Queluz, Algés, Queijas, Oeiras, Cacem etc. De relatar uma história curiosa com a camioneta que ia Queluz para Oeiras via Fabrica da Pólvora: quando subia a rampa/calçada para Leceia, os passageiros por vezes tinham de sair da mesma subir a pé para esta galgar a referida calçada esperando posteriormente pelos passageiros, isto ainda pleno anos 50 do século XX.
Paragem na Praça dos Restauradores em Lisboa
Autocarro “Borgward” de 13 lugares e de 1957
Paragem na Praça dos Restauradores nos anos 60 do século XX
Emblema de boné
Eduardo Jorge viria a falecer em 1940, mas a sua “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.” permaneceria por muitos e bons anos.
Autocarros da “Eduardo Jorge” estacionadas junto à “Gare Marítima de Alcântara”
Excursão e Autocarros da “Eduardo Jorge” estacionadas junto à “Gare Marítima da Rocha do Conde de Óbidos”
1952
Autocarros da Eduardo Jorge subindo a Avenida da Liberdade, em Lisboa e outra na Venda Nova-Amadora
Em Agosto de 1967, a “Empresa de Viação Eduardo Jorge,Lda.” adquire a “Companhia Sintra-Atlântico, S.A.R.L.” na operação de aumento de capital social desta. Por esta altura a a frota da Companhia era constituída por 15 autocarros: dois “Vulcan” de 1951, cinco “DAF” de 1952, dois “Maudslay” de 1953, um “Atkinson” de 1955 e três “AEC” de 1956, uma “AEC” de 1961 - tendo este autocarro sido o primeiro equipado com portas automáticas a trabalhar na área dos concelhos de Sintra-Cascais-Oeiras - e uma “Leyland” de 1966. E na mesma altura adquire a “Empresa de Viação Gaspar, Lda.” da Ericeira.
“Maudsley” da “Companhia Sintra-Atlântico”, em Colares e uma “AEC” da “Empresa de Viação Gaspar, Lda.” em Mafra
Igualmente nos anos 60 do século XX é criada a ”TURIJORGE - Agência de Turismo Eduardo Jorge, Lda.”, com loja na Praça de Londres, em Lisboa. A participação financeira da “Rodoviária Nacional, E.P.” no capital social desta agência de viagens, ao abrigo da alínea d) do nº 1 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 662/76, seria transferida para a titularidade e gestão directa da “Enatur - Empresa Nacional de Turismo, E.P.” em 1976.
gentilmente cedido por Carlos Caria
Em 1968 , a “Empresa de Viação Eduardo Jorge,Lda.” associa-se á “UTIC - União de Transportadores para Importação e Comércio”. Lembro que a “UTIC” foi fundada em 1944, em Lisboa, tendo sido formada pelas principais empresas rodoviárias de transporte de passageiros com o objectivo de obter peças a preços competitivos para os seus autocarros, principalmente pneus, atendendo ao período conturbado que o país e o resto do mundo. Após a “II Grande Guerra Mundial”, a “UTIC” passou a importar chassis directamente aos fabricantes, sendo as carroçarias construídas pelos seus membros. A primeira grande série de chassis importados foram “Mack” de origem americana, entre 1947 e 1948, seguindo-se 30 “Guy” Arab III 6LW, em versão de exportação com com volante à direita e que também foi utilizado em grandes quantidades na Holanda e na Bélgica. De modo a responder às necessidades das empresas rodoviária, a “UTIC” optou por passar a construir as suas próprias carroçarias. Para tal inaugurou em Lisboa - Cabo Ruivo uma fábrica. Posteriormente construiu uma outra nos arredores do Porto, em Laborim, que com alguma autonomia, construiu os seus próprios modelos.
Desenho do autocarro “AEC UTIC” da foto anterior
Desenho do autocarro anterior “AEC UTIC” modelo U2055 de Março de 1972
Autocarro “AEC UTIC” modelo U2035, na Praça do Império em 1968
Desenho do autocarro “AEC UTIC” modelo U2035 da foto anterior
Os desenhos digitais publicados foram gentilmente cedidos por Eugénio Santos via “Memórias de Empresas e Autocarros Antigos”
A “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.” operou com grande sucesso e reconhecimento até 12 de Junho de 1975, altura em que foi nacionalizada, passando a concessão desta região Amadora- Oeiras, Sintra para mãos da recém criada “Rodoviária Nacional, E.P.” que iniciou a sua actividade efectiva a 1 de Junho de 1976, tendo até esta data sido gerida por uma Comissão Instaladora. A Amadora, mesmo após o 25 de Abril de 1974, veio a manter o topónimo de uma artéria da recém criada na cidade da Amadora a Eduardo Jorge.
A “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.” à data da nacionalização em 5 de Junho de 1975, era assim constituída:
- 94 carreiras
- 250 autocarros, dos quais 10 autocarros de turismo e 5 autocarros de 2 pisos
- 967,9 km concessionados
- 926 Funcionários: 303 motoristas, 73 de escritório, 189 de manutenção e 343 no movimento
Autocarro “ AEC UTIC” da RN ex nº 184 da “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda.”
Em 15 de Maio de 1995, em final de processo de privatização, a “Empresa de Viação Eduardo Jorge, Lda., Queluz CEP 5” da RN, é adquirida pela “Vimeca Transportes, Lda.” empresa fundada em Carnaxide, em 21 de Setembro de 1931.
Bibliografia: Blog “Gazeta de Miraflores”
Fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Hemeroteca Digital, Memórias de Empresas e Autocarros Antigos, Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Portugal Memória, Fundação Portimagem
13 comentários:
Olá José Leite, boa tarde.
Parabéns por este excelente artigo, bem desenvolvido e bem documentado.
Este é um tema que me atrai bastante, espero por mais novidades.
Um abraço.
Luciano Canelas
Caro Luciano Canelas
Muito grato pela gentileza do seu comentário.
No próximo mês terá um artigo acerca da "Transportadora Setubalense" de "João Cândido Belo".
Não sei se sabe, mas no mês passado publiquei um artigo acerca do "Companhia Sintra-Atlântico"
Um abraço
José Leite
Caro José Leite
Os meus melhores agradecimentos sobre este artigo da Eduardo Jorge, uma empresa que faz parte do imaginário da minha infância, visto que eu vivo na Amadora!
Gostaria também que fizesse um artigo sobre outra empresas de transportes que fazem parte do meu imaginário: Arboricultora, Transul, e especialmente João Cândido Belo, visto que os meus pais são alentejanos e íamos sempre para o Alentejo nas camionetas dessa empresa.
Os meus parabéns pelo seu blog!
Álvaro Pereira
Caro Álvaro Pereira
Muito grato pela gentileza do seu comentário e nas suas amáveis palavras.
O artigo sobre a empresa "João Cândido Belo" já está feito e publicarei no início de Novembro.
Quanto às outras que me pede:
Transul: tem muito pouca história pois resultou da fusão da "Beira Rio" e da "Piedense", fusão essa que se deu em 1 de Janeiro de 1968. Como 7 anos apenas depois, em 1975 foi nacionalizada, a sua história foi super efémera ...
Arboricultora: tenho visto muito pouca coisa sobre ela e tenho algumas fotos. Pode ser que vá encontrando mais "material" que justifique um artigo.
Com os meus renovados agradecimentos, os meus cumprimentos
José Leite
Parabéns por este artigo da Empresa Eduardo Jorge,pois a mim diz-me muito trabalhei lá muitos anos.
José Galopim
Caro José Golpim
Eu é que agradeço a gentileza da sua mensagem.
Ao longo dos anos tenho apenas tentado, que os mais velhos não esqueçam, e os mais novos conheçam, o que de bom Portugal teve, com os seus defeitos e virtudes, e que infelizmente muito foi destruído, e apagado da nossa história.
Os meus cumprimentos
Sou apenas mais um de muitos milhares de anónimos que seguem o seu Blog.
Agradeço o seu trabalho e disponibilidade que promovam através da nostalgia momentos de felicidade, quer a mim, quer aos que visionam a sua página.
Peço-lhe que não pare.
Só mais uma pequena coisa...
Se tiver algo sobre a empresa Barraqueiro relativo aos anos 70 e 80 que construísse um tema sobre esta empresa com algumas fotografias e desenhos.
Obrigado
Caro(a) anónimo(a)
Muito grato pelo seu amável comentário.
Quanto à empresa "Barraqueiro" está nas minhas intenções a elaboração dum artigo, apenas estou coleccionando fotos e documentação.
Hoje fiz um artigo acerca da empresa de autocarros de passageiros, e não só, "Arboricultora, Lda." de Caneças.
Os meus cumprimentos
José Leite
obrigado recordar é viver e aqui estou eu a viver parte do meu passado o meu primeiro emprego em lisboa foui como cobrador da empresa E J. de 1953 a 1956 orgulhome de ter sido a sigunda exsepção que o então jerente da empresa o Snh. Fernando Pedro Jorje por quem ainda tenho grande respeito e admiração me ter ademitido ao serviço da empresa como motorista por norma a empresa não ademitia familia de empregados não passava ninguem de cobrador a motorista e não ademitia empregados sigunda vez o meu muito obrigado ao Snh. pedro gorje e aum grande colaborador da empresa Snh.Dr,Joaqim Gonçalves aqui fica tambe a recordação que tenho de todos os colegas.
Boa noite,
Estava eu aqui a navegar pela Net á procura de imagens sobre o Zoo de Lisboa para um trabalho, quando vejo uma imagem de Lisboa antiga, cliquei naveguei direitinho para... Restos de colecção, adorei pois nasci em 1969 e, embora tenha andado muitas vezes nestes autocarros com a minha Mãe, nunca liguei ao nome, Eduardo Jorge que por sua vez veio a tornar-se na R.N.
Parabéns pelo artigo, fiquei maravilhado com as fotos.
Mário André
Bom trabalho! permita-me só aclarar que em 1975 não havia Câmara da Amadora devido a que, Amadora era parte do Concelho de Oeiras. (vivendo na Damaia utilizei a Eduardo Jorge - pasme-se - para ir para a praia de Algés.
Caro António Galamba
Grato pela correcção.
Cumprimentos
Ola José Leite
Desconhecia na totalidade a Historia da Eduardo Jorge, pelos vistos foi uma empresa de camionagem de transportes de passageiros ate 1975 Interessante historia do seu precurso o que me ´lembro de oivir o meu pai contar, é que a Companhia de Viação Sintra Atlantica andava mal de Finanças e a Empresa Eduardo Jorge limitada lhe deitou a mao, certo ou errado este foi um facto que eu ouvi o meu pai contar, ora isto ja vao 60 anos. Quanto á empresa Gaspar que fazia muitas vezes a carreira Ericeira Lisboa ( Sete Rios ) ? era uma empresa associada A Eduardo Jorge. Resta me desejar- lhe os parabens pelo excelente artigo que fez reviver o passado com alguma alegria
Com os melhores cumprimentos
Francisco Cannas Simoes
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