A Confeitaria "Mexicana" abriu as suas portas em 28 de Dezembro de 1946, na Avenida Guerra Junqueiro, junto à Praça de Londres, em Lisboa. Tratava-se, então, de uma confeitaria, pastelaria e leitaria criada por uma sociedade formada pelos construtores civis de Tomar, José Vicente e seu genro Adelino Antunes, que tinham construído o prédio, e os primos do primeiro, Augusto Godinho e Manuel Penteado. A propriedade do prédio, entretanto, passaria para a “Caixa Sindical de Previdência dos Profissionais Barbeiros e Cabeleireiros”.
“Confeitaria Mexicana”, estabelecimento com o toldo à esquerda na foto
A cave da loja albergava a fábrica de pastelaria, que com a "Confeitaria Nacional" localizada na Praça da Figueira, era uma das duas únicas pastelarias de Lisboa que fabricava a sua oferta de pastelaria e afins. Especialidades como confeites de Páscoa em chocolate, bolo-rei, pingos de tocha, sombreros e os boleros eram receitas originais da "Mexicana".
Localização da “Mexicana” à esquerda da foto. No prédio no centro da foto o “Restaurante Portugal” inaugurado em 1949
Entre 1961 e 1962 a "Mexicana" é alvo de uma profunda reforma e ampliação, cujo projecto ficaria a cargo do arquitecto modernista Jorge Ferreira Chaves (1920-1981). Reforma que ao ser inaugurada em 12 de Setembro de 1962, se traduziria na criação da esplanada, uma primeira sala com serviço de pastelaria e cafetaria, um novo salão de chá ao fundo do estabelecimento, um restaurante na cave (que só abriria nos anos 70) e um salão de festas e banquetes no primeiro andar.
Esplanada da “Mexicana” em 1952
13 de Setembro de 1962
Para além da coluna escultórica que Jorge Ferreira Chaves desenhou, introduziu elementos decorativos concebidos por João Câmara e Mirya Toivolla que executaram o mural do restaurante localizado na cave, e o vitral policromo na entrada das instalações sanitárias de autoria de Mário Costa. Querubim Lapa (1925-2016) criaria para este espaço dois grandes painéis cerâmicos em azulejos policromos: um que se situa na entrada do estabelecimento, em tons de azul e amarelo/dourado e outro, no salão de chá, intitulado "Sol Mexicano", obra impressionista que evoca os cactos dos desertos e o sol daquele país. Outros elementos decorativos a referir, como o passarinhário com periquitos e o mobiliário (mesas, cadeiras e móveis de apoio) desenhados por José Espinho e fabricado pela empresa "Móveis Olaio".
Entretanto, e dado que competia ao Governo autorizar os empregados, que atendiam o público, o uso de mangas de camisa, em 4 de Julho de 1968 o vespertino “Diário Popular” noticiava em tom de legenda, ao publicar a seguinte fotografia:
«Os empregados de balcão da pastelaria "Mexicana", na avenida Guerra Junqueiro, foram autorizados, por decisão do Ministério das Corporações, a trabalhar, a partir de hoje, em mangas de camisa. Por que não? Nesta época de calor intenso servir (encalorado) uma "bica" ou (em estado de "derretimento") um refrigerante, é desagradável à vista, pouco higiénico e péssimo para o empregado. Os que trabalham na "Mexicana" (como se pode ver na gravura) fazem-no, agora, com muito mais alegria - e menos calor.» foto e notícia gentilmente cedida pelo blog IÉ-IÉ.
A “Mexicana” foi local de encontro de vários artistas ligados ao Surrealismo e ao Neorealismo bem como de arquitectos da geração que fixou o Movimento Moderno em Portugal, entre os quais o próprio Jorge Ferreira Chaves cujo atelier se situava nas imediações. Pelo requinte e qualidade da sua arquitectura, e após a obra de 1961/1962, foi o primeiro estabelecimento deste tipo a obter o estatuto de "Utilidade Turística", atribuído pelo “SNI - Secretariado Nacional de Informação”. Este estatuto reduzia significativamente as obrigações fiscais da empresa, porém viria a ser retirado, ao fim de poucos anos, por a gestão do estabelecimento não corresponder ao nível exigido.
16 de Dezembro de 1971
24 de Dezembro de 1971
Em 1994 seria apresentada por Manuel Ferreira Chaves, filho do arquitecto Jorge Chaves, e pelo arquitecto Michel Toussaint a candidatura a “Monumento de Interesse Público”. Depois de dez anos em apreciação na Secretaria de Estado da Cultura, o despacho foi assinado a 25 de Março de 2014. A classificação atribuída, salvaguardou o património da pastelaria, o passarinhário, o mobiliário (cadeiras e mesas) e o bengaleiro do restaurante, no piso de baixo.
Actualmente local de reunião da tertúlia tauromáquica "A Mexicana". Nesta foto de 2013 reunião no piso do restaurante
Em 2015, a pastelaria "Mexicana" propriedade dos herdeiros dos fundadores, é adquirida por Rogério Pereira, proprietário da "Carcassone", pastelaria e cafetaria na Avenida da Igreja, no bairro de Alvalade, em Lisboa. Depois de encerrada, a “Mexicana”, é alvo dum processo de recuperação, seguindo o projecto de 1962. A fábrica de pastelaria que ainda se mantinha intacta desde 1946, é remodelada e actualizada, na cave é criada uma "Taberna" permitindo aos clientes comer "fora de horas" e no piso térreo apenas se procede a pequenas alterações de fundo, mais visíveis a nível da sala de entrada. A sua reabertura teve lugar em 5 de Dezembro de 2015.
Fernando Medina (Presidente da CML), Rui Nabeiro (“Delta Cafés”) e Rogério Pereira. Na foto da direita Querubim Lapa ao centro com sua mulher Suzana Barros e Rogério Pereira
fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa
3 comentários:
As pastelarias/cafés Monumental, Monte Carlo, Mexicana e Luanda vieram substituir os cafés da baixa de Lisboa onde se faziam as tertúlias antes da década de 50. Os dois primeiros já desapareceram. Felizmente, ainda restam os outros dois.
Quero ir quando for a Lisboa!
Abraços imensos do Brasil
Bia <º(((<
Fui hoje á Mexicana, o café pastelaria onde estudei durante muitos anos quando frequentei o Instituto Superior Técnico.
A zona, que tinha outros cafés famosos como a Capri e a Roma e o Londres era conhecida pelo Bairro do Café. E porquê ? Porque os proprietários das Roças de café de Angola vinham aí investir o seu dinheiro em prédios de rendimento. Além disso quando vinham de férias á Metrópole procuravam uma moça jovem para casar. Então era normal que um homem de 60 anos casasse com uma jovem de 25 ou30 anos. Essas senhoras quando tinham 50 ou 60 anos e ficavam viúvas, vinham á Mexicana engatar um jovem estudante do Instituto Superior Técnico para se divertirem.
A Mexicana que foi inaugurada em 1962 tem no seu interior duas curiosidades:
Um painel grandioso do grande artista Querubim Lapa e uma montra/gaiola com passarinhos que têm obrigação de manter por vontade testamentaria da proprietária do terreno ,onde foi construído o edifício.
Isto da gaiola dos passarinhos contou-me a senhora que era a proprietária do terreno, que há uns 60 ia todas as tardes á Mexicana para ver se via alguma amiga do seu tempo, se sentava na minha mesa e contava histórias de antigamente. Pouco tempo ali estava pois saía desgostosa por não ver amigas do seu tempo.
Personagem também interessante que frequentava a Mexicana era a Titá Reis, filha do famoso Alves dos Reis que fez as notas falsas que até o Banco de Portugal enganou.
A Titá escrevia versos de amor que me vinha entregar á mesa, isto quando eu tinha 30 anos e ela 90. Para me seduzir mostrava as fotografias de quando tinha 18 anos.
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