Alfredo Nunes de Mattos, portuense criou em 1910 uma firma, ainda modesta, sob a denominação de “Nunes de Mattos & C.ª” - Invicta Film, para se dedicar à produção de «panorâmicas», filmes de reportagem e fitas de propaganda industrial. Para operadores chamou Manuel Cardoso, técnico competente que estivera ligado à extinta “Portugalia Film”, e o aragonês Thomas Mary Rosell, que, além de operador, era também responsável pelos trabalhos laboratoriais. De 1910 a 1917 foram muitas as dezenas de filmes produzidos por esta sociedade. A 3 de Julho de 1912 Alfredo de Mattos regista a marca “Invicta Film”, na repartição de Propriedade Industrial.
1912
De muitos se conhecem os títulos, embora quase nada reste desse documentarismo em que a firma de Nunes de Mattos se especializara. Com enorme sentido de oportunidade, um desses documentários-reportagem incidiu sobre o naufrágio do navio «Veronese», que ocorreu frente à Boa Nova (em Leça) na madrugada de 10 de Fevereiro de 1913. O filme tinha uma metragem excepcional para a época (300 metros) e dele foram vendidas para o estrangeiro 108 cópias.
Naufrágio do “Varonese”
Esta firma, que tivera a sua sede no n.º 135 da Rua de Santo Ildefonso, no Porto, instalou-se mais tarde, com um pequeno estúdio e um laboratório, numa dependência do “Salão Jardim Passos Manuel”, o antepassado do “Coliseu” - a que Alfredo Nunes de Matos estava ligado como orientador e gerente -, inaugurado em 19 de Dezembro de 1908, na Rua Passos Manuel, famosa casa de espectáculos de cinema e music-hall , a que Alfredo Nunes de Matos estava ligado como orientador e gerente.
Em fins de 1917 decide desenvolver a sua actividade, encontrando no banqueiro José Augusto Dias o primeiro apoio financeiro. E assim, no dia 22 de Novembro de 1917, constituía-se uma nova sociedade por quotas, com um capital de 150 mil escudos, que adoptaria a designação de “Invicta Film Limitada”.
Alfredo Nunes de Mattos ocupa o cargo de gerente-técnico dentro do Conselho de Administração da Sociedade que, por sua vez, contrata para director artístico da empresa Henrique Ferreira Alegria, homem já ligado a negócios cinematográficos, pois a ele se devem a construção e exploração do cinema “Olympia”, do Porto, que à data da sua inauguração, em 18 de Maio de 1912, ostentava o nome pomposo de “Olympia” Kinema-Teatro”. Todo o pessoal técnico da antiga firma de Nunes de Mattos passa para a nova sociedade que se encontra, assim, apta a funcionar antes mesmo da construção e equipamento dos projectados estúdios.
Alfredo Nunes de Mattos Henrique Ferreira Alegria
Em 1918, Alfredo Nunes de Mattos e Henrique Alegria partem para Paris com o encargo de adquirirem o melhor material técnico e contratarem pessoal especializado. Entretanto, tornava-se necessário obter um local para a implantação do novo complexo industrial. Depois de várias pesquisas, foi decidido comprar a “Quinta da Prelada”, sita ao Carvalhido, no Porto, propriedade da “Santa Casa da Misericórdia”. A transacção foi feita por 27.161$00. Os terrenos tinham uma área de 50.000 metros quadrados. Em tempos recuados a casa e “Quinta da Prelada” pertenceram à família dos Noronhas, tendo sido reformadas, em 1770, pelo arquitecto italiano Nicolau Nazoni.
Com tudo pronto para a grande arrancada começa a construção dos estúdios e laboratórios da Prelada, cuja conclusão só se verificaria em 1920. Isto não impediu, no entanto, que a “Invicta Film” iniciasse, de imediato, a produção de filmes de enredo e longa-metragem. Por contrato com a casa “Pathé-Fréres”, esta então famosa produtora francesa obrigava-se a fornecer o filme virgem necessário, tirar cópias, fornecer material e mesmo fazer a montagem dos negativos. Em meados de Maio de 1918, já quase todos os elementos contratados em França se encontravam no Porto. E, no mês seguinte, iniciava-se a filmagem, sob a direcção de Georges Pallu, de “As Aventuras de Frei Bonifácio”, adaptação de um conto ainda inédito de Júlio Dantas. Em 4 de Outubro de 1918, o filme (com duas partes - 800 metros) faz a sua estreia no cinema “Olympia”, de Lisboa. Foi seu protagonista o actor Duarte Silva que, por muito tempo, se conservou ao serviço da “Invicta-Film”.
Demonstrada, com o filme “As Aventuras de Frei Bonifácio”, a capacidade dos técnicos contratados em França, a empresa não espera pela construção dos estúdios e e laboratórios do Carvalhido para prosseguir com a produção de filmes de enredo. É assim que, em princípios de 1919, entra em rodagem uma fita mais ambiciosa, adaptação de um romance muito popular de Manuel Maria Rodrigues: “A Rosa do Adro”. Pensa-se, na “Invicta Film”, que a produção deve apoiar-se na literatura nacional para garantir o êxito comercial dos seus filmes com a popularidade de que gozavam certas obras literárias. Não só obras menores: Eça, Camilo, Júlio Dinis, Abel Botelho, são autores que podem assegurar o interesse do público. “O Primo Basílio”, “Amor de Perdição”, “Os Fidalgos da Casa Mourisca”, “Mulheres da Beira” entram nos projectos de produção da “Invicta-Film”.
Anúncio da produção da “Invicta Film” e o realizador Georges Pallu (1869-1948)
Num país com um pequeno número de salas de cinema, sem saída fácil para as suas produções e sem possibilidades de expansão para dentro e para fora do país, onde a concorrência é, a todos os níveis, cada vez mais forte; sem qualquer apoio a nível de Estado, que, por sua vez, enfrentava constantes problemas e inquietantes crises económicas e políticas, a “Invicta Film”, tão modelarmente erguida poucos anos antes, irá soçobrar. “Cláudia” e “Lucros Ilícitos” (1924), filmes medíocres e incaracterísticos (que se pretendem «modernos», com a jovem francesinha a dar-lhes um ar de frescura) serão o «canto do cisne» da empresa portuense.
Seguindo a tradição portuguesa de importar técnicos e artistas, a “Invicta-Film” importou cineastas. Até aqui nada de mal. Só que a empresa não soube renovar os seus quadros. George Pallu era um homem culto, inteligente, honesto, proficiente, mas fora formado na escola do «Film d’Art», quando ainda o cinema era balbuciante como meio de expressão. E se, durante um ano ou dois, os filmes da “Invicta Film” puderam pôr-se a par da produção corrente que vinha de fora, em breve ia sobrar-lhes em regionalismo o que lhes faltava em qualidade e invenção formal. Nesta empresa, todos pareciam alheios ao desenvolvimento do fenómeno cinematográfico que estava a operar-se por todo o lado.
De 1925 a 1928 , a “Invicta Film”, já em vias de liquidação, ainda conservará alguma actividade laboratorial, mas essa mesma (confecção de legendas para os filmes estrangeiros) lhe será arrebatada pela distribuidora “Castello Lopes, Lda.” que, para o efeito, montou laboratório próprio, em Lisboa
Em 5 de Julho de 1930 é vendido o studio da "Invicta Film" do Porto, e em 2 de Janeiro de 1931 é ditado o fim da “Invicta Film, Limitada”. Todos os haveres da firma vão a leilão e o estúdio, já posto ao abandono após uma última utilização por Rino Lupo para filmar os interiores do filme “José de Telhado”, será demolido.
Filmografia da “Invicta Film, Limitada” :
1918 - As Aventuras de Frei Bonifácio, de Georges Pallu
1919 - A Rosa do Adro, de Georges Pallu
1919 - O Comissário de Polícia, de Georges Pallu
1919 - O Mais Forte, de Georges Pallu
1920 - Os Fidalgos da Casa Mourisca, de Georges Pallu
1920 - Barba Negra, de Georges Pallu
1920 - Amor Fatal, de Georges Pallu
1921 - Amor de Perdição, de Georges Pallu
1921 - Quando o Amor Fala, de Georges Pallu
1921 - Mulheres da Beira, de Rino Lupo
1922 - O Destino, de Georges Pallu
1922 - O Primo Basílio, de Georges Pallu
1922 - Tinoco em Bolandas, de António Pinheiro
1922 - Tempestades da Vida, de Augusto de Lacerda
1922 - O Glorioso Raid Lisboa-Rio de Janeiro
1923 - Claudia, de Georges Pallu
1923 - Lucros Ilicitos, de Georges Pallu
fotos in: Cinemateca Portuguesa, Hemeroteca Digital
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