«Segundo o boceto histórico do sr. Conde de Samodães, em 30 de Agosto de 1861, reuniram-se no edifício da Bolsa, os fundadores do Palácio de Cristal Portuense, sob a presidência do sr. Guilherme Augusto Machado Pereira, sendo eleitos para a direcção e conselho fiscal os srs. Alfredo Allen, Francisco Pinto Bessa, Visconde da Trindade, José Joaquim Pereira de Lima e José Frutuoso Aires de Gouveia Osório.»
Em 3 de Setembro de 1861, o Rei D. Pedro V inaugurou os trabalhos de construção do futuro "Palacio de Crystal Portuense" lançando um punhado de terra num carrinho de serviço. A planta, perfil, alçado e cortes do edifício foram feitos pelo arquitecto inglês Thomas Dillen Jones.
Medalha comemorativa da inauguração dos trabalhos, e início das mesmas em 1861
No dia seguinte à inauguração o Rei D. Pedro V partiu para Lisboa, tendo-lhe sido entregue, antes de embarcar, o diploma de presidente honorário da "Sociedade do Palacio de Crystal Portuense". A obra de pedra, ferro e cristal, segundo o Dr. Carlos de Passos, foi entregue aos empreiteiros "C. D. Young & Cª." por 108 contos de reis, sob a inspecção do engenheiro F. W. Shields e direcção do engenheiro Gustavo Adolfo Gonçalves de Sousa. Emilio David, jardineiro-paisagista alemão, encarregou-se do desenho dos jardins e do parque. As decorações forma entregues a um pinto inglês e a direcção coube a F.W. Shields.
O edifício media 150 metros de comprimento por 72 metros de largura e era dividido em três naves cobertas de ferro e vidro. No fundo da nave erguia-se um magnifico órgão construído por C. W. Vidor, um dos melhores do mundo. No interior dos jardins foi mandado edificar, pela princesa de Montléart, a capela de Carlos Alberto da Sardenha, que lá repousa desde 1849, data da sua morte. A capela de granito, em linhas e adornos de influência italiana, encontra-se junto ao lago.
Nave Central com o órgão ao fundo
Restaurante Merendeiro
Aos 18 de Setembro de 1865, o rei D. Luís I, Dona Maria Pia, o príncipe herdeiro D. Fernando e o Infante D. Augusto inauguraram o "Palacio de Crystal Portuense", à semelhança do "Crystal Palace", em Londres, e a primeira "Exposição Internacional Portuguesa". Estas exposições serviam para a actualização científica e tecnológica e para, através de contactos internacionais, se aumentarem as trocas comerciais.
Excerto do discurso do Rei D. Luís I, no artigo alusivo à inauguração em "O Jornal do Porto"
«(...) Assim Portugal depois de atravessar longos periodos de desventuras, que o fizeram descer do fastigio da sua passada grandeza, se vê agora, graças á Providencia, entrado em uma época de esforços e commettimentos, que fomentados e fortalecidos pela paz e pela liberdade lhe hão de assegurar em proximo futuro o logar que outr'ora occupou entre as nações mais cultas e afortunadas.
(...) Este certame do trabalho, esta festa verdadeiramente nacional, é um marco tão glorioso que levantamos no caminho dos nossos progressos, abre á industria nacional uma época de tantos e taes aperfeiçoamentos, e promette ao paiz tão variadas vantagens, que sinto verdadeira ufania em que este grande successo se realisasse, como feliz presagio no começo do meu reinado.
(...) aos votos que fazeis pela minha felicidade e da minha excelsa esposa, pela do principe real, do meu augusto pae, do serenissimo infante D. Augusto e mais familia real, correspondo com os mais fervorosos votos pelo engrandecimento e ventura do paiz que nos serviu de berço.»
Gravura do dia da inauguração
O artigo concluía:
«Concluindo diremos que a exposição portugueza é dignissima de attenção e estudo, e que foi de todo ponto brilhante a festa da sua inauguração. Podemos dizel-o desfogadamente sem receio de que nos hajam por suspeitos: a direcção do Palacio de Crystal excluindo-nos do recinto da exposição, vendeu-nos pela ridicula quantia de 12$000 reis o direito de a elogiarmos sem remorso. Recebam os directores mil agradecimentos por nos darem tão barato este prazer».
Anúncio no dia da inauguração Exposição de um dirigível
Casino do Palácio de Cristal
A "Exposição Internacional Portuguesa" foi organizada pela então "Associação Industrial Portuense", hoje "Associação Empresarial de Portugal". Esta exposição contou com 3.139 expositores, dos quais 499 franceses, 265 alemães, 107 britânicos, 89 belgas, 62 brasileiros, 24 espanhóis, 16 dinamarqueses e ainda representantes da Rússia, Holanda, Turquia, Estados Unidos e Japão.
Depois desta outras lhe seguiram como foi o caso da "Exposição da Rosas", em 1879, "Exposição Colonial Portuguesa" em 1894 inaugurada por D. Carlos, constituindo um dos elementos memorativos do "V Centenário Henriquino", e a "Exposição Agrícola" em 1903. Foi neste recinto que se realizou o I Salão Automóvel em Portugal a 22 de Junho de 1914.
"Exposição da Rosas", em 1879 "I Salão Automóvel do Porto" a 14 de Junho de 1914
O “Farman-Maurice” no Palácio de Cristal em 1912. Um dos Primeiros Aeroplanos em Portugal
Em 1933 a Câmara Municipal do Porto adquiriu o "Palácio de Cristal Portuense" e seus anexos, entretando num elevado estado de degradação, tendo-lhe introduzido importantes melhoramentos.
Entre Junho e Setembro de 1934 acolhe a primeira "Exposição Colonial Portuguesa". Esta exposição, cujo comissário foi o Capitão Henrique Galvão, estava inserida numa política estruturada na afirmação da ordem social, económica e financeira estendendo-se a todo Império Colonial.
"Exposição Colonial Portuguesa"
Arraial da "Legião Portuguesa" organizado durante a Exposição
O Palácio de Cristal foi ainda um importante espaço de cultura, contendo um órgão de tubos que era dos maiores do mundo. Foi neste local que se realizaram importantes concertos do compositor Viana da Mota ou da virtuosa violoncelista Guilhermina Suggia. Multidões como a que se pode ver na foto seguinte, que Aurélio da Paz dos Reis fotografou na Nave Central do Palácio de Cristal, em 1906, acorriam a este espaço histórico para assistir a concertos sinfónicos. Durante décadas, a vida musical no Porto foi intensa e muito participada, desde as operetas e zarzuelas que ocupavam o Teatro Baquet aos Concertos Populares no Águia d'Ouro e aos muitos recitais com várias das grandes figuras da cena musical internacional, como Cortot, Rubinstein e Ravel, que actuavam na cidade do Porto.
Concerto em 1906
Em 1950 nos jardins do Palácio de Cristal instalou-se a Feira Popular.
O "Palácio de Cristal Portuense" não foi capaz de atrair multidões de visitantes, não alcançando, por isso o sucesso desejado. Na verdade, associado ao Palácio de Cristal está a história de um rol de desaires financeiros que, em grande parte justificaram a impossibilidade de preservação do edifício e legitimaram o vaticínio da sua morte, em 1951, por parte do governo do Dr. Oliveira Salazar, face à necessidade de se encontrar um local para a construção de um recinto capaz de receber os campeonatos da Europa e do Mundo de hóquei em patins em 1952.
O actual "Pavilhão Rosa Mota", originariamente designado também ele por Palácio de Cristal ou Pavilhão dos Desportos, teve projecto arquitectónico de José Carlos Loureiro e projecto de engenharia de António Soares. Em 1952 teve início a construção do pavilhão dos desportos e em Junho de 1952, ainda sem cobertura, o pavilhão acolheu o Campeonato de Hóquei em Patins; depois disto as obras foram interrompidas, tendo sido retomadas em 1955 com a conclusão da cúpula; O amplo recinto coberto por calote esférica, apresenta um carácter polifuncional, tendo em linha de conta que o seu programa arquitectónico teve em vista várias finalidades: alberga eventos desportivos, exposições, reuniões formais e/ou informais com uma constante; um enorme afluxo de público.
fotos in: Do Porto e Não Só, Atébloguinho!, Gaveta de Postais, Delcampe.net, Hemeroteca Digital, Arquivo Nacional Torre do Tombo
1 comentário:
"política estruturada na afirmação da ordem social, económica e financeira", se em 1934 sabiam porque hoje não sabem ?
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