Restos de Colecção: Hotel Palácio do Estoril

8 de dezembro de 2013

Hotel Palácio do Estoril

“Estoril Palácio Hotel”, cedo conhecido por “Hotel Palácio”, foi inaugurado em 30 de Agosto de 1930, pelo Cghefe de Estado General Óscar Carmona, constituindo um dos equipamentos estruturantes do projeto encomendado ao arquiteto Henri Martinet, por Fausto de Figueiredo e Augusto Carreira de Sousa, que, a partir de 1914, procurariam impor o Estoril enquanto «estação marítima, climatérica, termal e sportiva» de renome internacional. A sua construção ficou a cargo da firma «Entreprises de Travaux».

“Estoril Palácio Hotel”  nos anos 30 do século XX

Fausto Cardoso de Figueiredo (1880-1950)

Vista do lado da entrada do “Estoril Palácio Hotel”

Arquitecto Raoul Jourde (1889-1959)

Ainda que a primeira pedra do ambicioso projeto fosse lançada em 16 de Janeiro de 1916, a guerra e as dificuldades de financiamento condicionariam a sua concretização, pelo que o Hotel Palácio apenas foi inaugurado catorze anos depois, sob a direção do arquiteto Raul Jourde e do decorador M. Fitté. No dia anterior à abertura, Fausto de Figueiredo ofereceria um chá aos representantes da imprensa na esplanada do Tamariz, para os convidar, depois, a visitar a nova unidade hoteleira, dotada de duzentos quartos, de cem casas de banho e de suites no corpo central.

“Estoril Palácio Hotel” com o “Hotel do Parque”  à sua direita e as “Arcadas do Parque” à sua esquerda

Construído ao lado das Termas do Estoril - mais tarde “Hotel do Parque” - o “Estoril Palácio Hotel “, tinha a  traça das linhas art déco, e pelo decorador Lucien Donnattao ao jeito de outros lugares de culto europeus como Biarritz. 

A inauguração oficial em 31 de Agosto foi precedida, no dia anterior, de um «chá» oferecido na "Esplanada do Tamariz" aos representantes da imprensa seguido de uma visita ao novo Hotel. Os artigos são entusiastas: 200 quartos, 100 casas de banho, «algumas delas privativas de compartimentos», suites no corpo central - que constituíram grande novidade - mobiliário «lindo, confortável, moderno, polícromo» (in: "O Século"), «de linhas modernas mas sem exageros arte nova» (in "Diário de Noticias"), obra de empresa portuguesa como orgulhosamente referiu Fausto Figueiredo - "Armazéns Nascimento" do Porto - decoração «sóbria, de feição absolutamente modernista», modelar instalação eléctrica, cozinhas totalmente equipadas, um «panorama surpreendente» do último andar... o hotel «fica sendo um dos mais vastos e o mais moderno hotel português» (in: "O Século"). Obra de Raoul Jourde que respeitara «mais ou menos» o projecto anterior do senhor Martinet, decoração do arquitecto M. Fitté, construção do sr. E. Reynes a ser explorado pela «Sociedade Arrendatária Internacional» representada na inauguração por Cyril de Vere, «empresa exploradora dos hotéis, casinos, piscinas, terreno de golf, campo hípico e todas as demais diversões que fazem o encanto mundano da Costa do Sol» (in: "Diário de Notícias"). 

No dia seguinte, a inauguração oficial foi feita com a participação do Presidente da República. ministros e representantes do corpo diplomático. 

Fausto Figueiredo. que recebeu a "Grã-Cruz de Mérito Agrícola e Industrial" afirmou: - « ... Declaro com muito orgulho de português - já não podemos dizer que não temos um hotel! Este se não é dos melhores do Mundo, não nos envergonhará lá fora. A Sociedade Estoril-Plage fez um grande esforço. Continuará.» Confiou a outros mais competentes e idóneos a exploração. Mas garantiu o direito de propriedade com ardor: - «Isto é obra de portugueses e propriedade de portugueses».

O Chefe de Estado General Óscar Carmona afirmou, na ocasião: «Todos nós sabemos a triste situação do País ainda há meia dúzia de anos. Parecia divorciado da civilização. Felizmente que os esforços dos homens bons abriram novos caminhos e Portugal vai entrando assim no caminho do progresso». 

Finalmente o articulista do jornal "O Século" termina: «resta acrescentar agora que a lei da regulamentação do jogo veio permitir a Fausto Figueiredo a realização da sua obra de turismo largos anos sonhada e que só com essa lei pôde encontrar solução», enquanto o do "Diário de Notícias" esclarece: «Mais de uma dezena de anos estiveram paradas as obras no Estoril até que a regulamentação do jogo veio incitar Fausto Figueiredo a finalizar o seu sonho».

       Última modificação no exterior do edifício, nos anos 60 frente e traseiras, passando a designar-se “Hotel Palácio”

 

           

 

Quando na década de 40 do século passado a Europa se via a braços com a Segunda Guerra Mundial, Portugal devido à sua posição neutra no conflito, e pela sua privilegiada localização geográfica, foi lugar de eleição de espiões de ambos os lados da barricada - aliados e alemães -, que aqui traficavam informações valiosas para o teatro de guerra. O “Estoril Palácio Hotel” era então uma espécie de bunker de luxo. Alguns conhecidos agentes secretos aliados e alemães tramaram, durante anos, manobras de espionagem, apenas deixando transparecer o seu estado de espírito quando, ocasionalmente, encomendavam o champanhe mais caro do hotel. Este “champagne news service” antecipava as informações das próprias agências noticiosas.

 

« - Visitem Portugal, porque, além das suas incomparáveis belezas naturais, ele proporcionar-vos-ha, uma hospedagem confortavel e não inferior á que recebeis nos melhores "Palaces" do mundo.
Porque o Estoril Palacio Hotel - divo-lo quem ja tem tido ocasião de apreciar alguns dos melhores hoteis da Europa - pôde, sem desdoiro, colocar-se na primeira categoria dos hoteis para gente rica, desejosa de todo o conforto
.
Pormenorizar? Descrever quantos quartos, quantas salas, quantas casas de banho, quantas lampadas possui o hotel agora inaugurado, não vale a pena. Basta que se diga isto: o Estoril Palacio Hotel é um edifício magnifico, de linhas modernas, tanto exterior como interiormente, com quartos vastos, amplas janelas, salas lindissimas, todo um conjunto maravilhoso e atraente que proporciona todo o conforto que se possa exigir.» in: Diário de Lisboa

 

Estoril (Palácio Hotel).16    

 

 

A história do “Estoril Palácio Hotel” confunde realidade com ficção: atravessou uma guerra mundial e uma revolução nacional, foi palco de momentos altos em épocas áureas e serviu de refúgio aos maiores líderes europeus em épocas de crise, albergou espiões e foi lugar de filmagens - como a de James Bond, o célebre agente secreto 007, no filme “Ao Serviço de Sua Majestade”.

Contudo o apelo do Estoril nessas décadas de ouro, não se fazia sentir apenas junto dos espiões. O clima ameno, as praias de águas tranquilas, as boutiques, as esplanadas e o Casino Estoril atraíam também as elites europeias endinheiradas que chegavam à vila através do mítico comboioSud-Express”, que à data fazia a ligação entre Paris e a estância balnear portuguesa.

"Sud-Express", no Estoril

 

 

Segundo o testemunho de José Afonso, o funcionário mais antigo do Hotel, empregado desde 1951, numa entrevista ao jornal "O Observador" em  28 de Janeiro de 2017, relatava:

«(...)Embora não vivessem no Hotel, estes aristocratas usufruíam dos serviços ali prestados. cabeleireiro, barbeiro, massagista, restaurante, bar. Naquela época, o restaurante do Hotel servia 250 almoços e 300 jantares por dia. Um salão que agora foi transformado em sala de pequenos almoços, dividido para dar lugar ao Grill Four Seasons. O Hotel mudou muito desde que José Afonso chegou.
Quando vim para cá talvez 50% dos quartos não tinham casa de banho, usava-se o bacio Vista Alegre. Havia algumas casas de banho para se tomar banho e o aquecimento era feito através de caldeiras alimentadas a carvão, a nafta e depois a gasóleo. Agora é a gás (...)»

Do Livro de Honra, dos álbuns de fotografias e das fichas de clientes do “Hotel Palácio” constam testemunhos valiosos: da rainha Vitória Eugénia de Espanha e de toda a família real espanhola, dos príncipes Grace e Rainier do Mónaco ou de Antoine de Saint-Exupéry. As festas de casamento da princesa Maria de Sabóia, em 1955, e da infanta Pilar de Espanha, em 1967, são outros dos marcos da vida do “Estoril Palácio Hotel”.







Folheto gentilmente cedido por Pedro Madeira

As obras de remodelação, iniciadas ainda na década de 50 do século XX, que dotaram a unidade de um quinto andar e de uma nova ala, construída de raiz, com cozinha e sala de refeições, permitiriam, em 8 de Julho de 1964, a obtenção do reconhecimento oficial da sua «utilidade turística». Em 1966 inaugurou uma piscina privativa, abastecida pela nascente das velhas termas.

Na década de 1980 seria alvo de uma profunda recuperação e remodelação, sob a orientação de Lucien Donat. Deixou de pertencer à família Figueiredo em 1983, passando, desde então, a ser administrado pela família do iraquiano Albaker, cujo primeiro contacto com o hotel remonta a 1974.

                                                                            “Palácio Estoril” no século XXI

 

 

 

 

Hoje o “Palácio Estoril Hotel Golf & Spa”” faz parte das cadeias “Condé Nast Johansens” e “Great Hotels of the World’”.

fotos in: Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Delcampe.net, Palácio Estoril

2 comentários:

Paulo Morgado disse...

Sugiro uma referência ao Cinema Palácio, que funcionou anexo ao Hotel e que deixou de funcionar em meados dos anos 80, ocupado pela expansão do Bar FROLIC (que entretanto também fechou). Era uma sala excepcional, elegante, com excelente qualidade de projecção, essencialmente dedicada a filmes de reprise (um por dia) durante a semana e continuação de Estreia aos fins de semana (Sexta, sábado e domingo).

De resto, a quantidade de salas de cinema que existiram em Cascais, Monte Estoril, Estoril e São João do Estoril, só por si, merecia uma análise!

José Leite disse...

Caro Paulo Morgado

Nunca encontrei alguma referência ao Cinema Palácio, motivo pela qual o não mencionei.

Quanto a salas de cinema em cascais ainda aparecem referências a algumas.

Quanto ao Estoril, tirando as salas dos 2 Casinos (o antigo e o actual), o mesmo problema. Monte Estoril e São João do Estoril, então nem me pronuncio ...

A análise que me sugere só me é possível, como noutras localidades, se existirem informações, fotos e documentos que permitam ou justifiquem a mesma, que infelizmente, ou não existem ou são escassas.

O meu trabalho não vive só das boas intenções mas da realidade que me é facultada.

Mas se o Paulo tiver informações e documentação, ou onde recolhe-las na internet, poderei pensar no assunto.

Os meus cumprimentos