A cervejaria “Portugalia”, localizada na Avenida Almirante Reis, em Lisboa, foi inaugurada ao públioc em 10 de Junho de 1925, junto às instalações da antiga fábrica da “Companhia Productora de Malte e Cerveja Portugalia”. Já funcionava desde 1911 quando ainda se denominava "Germânia", e era utilizada pelos clientes da fábrica quando ali iam comprar barris de cerveja.
No início do século XX, a “Fábrica de Cerveja Leão” (fundada em 1878) e a “Companhia Portuguesa de Cervejas” (fundada em 1903) fundiram-se e deram origem à “Sociedade Portugueza Germania, Lda. - Fabrica de Cerveja”, em Março de 1912, que tinha o objectivo de produzir uma das melhores cervejas do mundo. Para tal, foi comprado, em 1912, um enorme terreno na Av. Almirante Reis e construída uma fábrica com 15.000 m2, entre os anos de 1912 e 1913, sob o projecto do arquitecto António Rodrigues da Silva Júnior (1868-1937). importado o mais moderno equipamento e convidados os melhores técnicos estrangeiros como consultores.
Construção da futura fábrica de cerveja “Germania, Lda.” e terreno a ser ocupado pela futura cervejaria “Portugalia”
Em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), como o país alinhava pelos Aliados e o sentimento era anti-germânico, por uma opção de marketing, a fábrica “Sociedade Portugueza Germania, Lda.” passou a designar-se “Portugalia, Limitada” em 1916.
Em 25 de Maio de 1921, após a construção de uma malteria destinada à produção de malte a partir de cevadas nacionais, e por escritura pública, passa a designar-se “Companhia Productora de Malte e Cerveja Portugalia”, com capital social de 3.500 contos. Em 1922, a própria “Portugalia, Lda.” decide a criação da “Empresa Produtora de Garrafas”.
Rótulo de garrafa
1929
1931
1943 1944
A 10 de Junho de 1925, nasce anexa à fábrica de cerveja uma cervejaria, a “Portugalia”. O motivo desta abertura foi a dificuldade que existia para os clientes encherem os seus próprios barris, pois a única distribuição que existia na altura eram através de poucas carroças com condições precárias, levando os clientes a deslocarem-se à fábrica o que precipitou a abertura da cervejaria. Esta ideia simples de criar um local onde os clientes aguardavam o enchimento dos seus barris teve um enorme sucesso.
Enchimento de barril de cerveja na “Portugalia”, nos anos 20 do século XX
11 de Junho de 1925 14 de Junho de 1925
Segundo se pode ler na Wikipedia, foi «na esplanada do último piso da Cervejaria Portugália na Avenida Almirante Reis, um edifício do começo do século XX.», que foram gravadas as cenas finais do filme “A Canção de Lisboa” do realizador e arquitecto Cottinelli Telmo (1897-1948), e estreado em 7 de Novembro de 1933. Pessoalmente, não acredito muito que tenha sido nesta esplanada - também referida no site oficial da “Portugália” - duvidando mesmo da sua existência em 1933, já que só existia o piso térreo e um subterrâneo, e se analisarmos a gravura no poster acima publicado não se vislumbra nem esplanada nem espaço para ela … Isto apesar de nas cenas aparecerem símbolos publicitários, colocados de um modo provisório e não com aspecto permanente, à cerveja “Portugalia”. Os 2 andares por cima da cervejaria, onde se incluída a esplanada para cinema, só aparecem no novo edifício construído no início dos anos 50. Inclino-me mais para outras esplanadas mui conhecidas na época, ou mesmo cenário nos estúdios da “Tobis Portuguesa” onde foi rodado o filme, mas …
Obs: segundo comentário a este artigo da D. Maria Parente, em 7 de Janeiro de 2016, a minha tese é corroborada e as referidas cenas finais terão sido filmadas na esplanada do “Salão Jansen”, pertença da fábrica de cerveja “Jansen” na Rua António Maria Cardoso. A esplanada ia da Rua António Maria Cardoso até à Rua do Alecrim, espaço (incluindo o “Salão Jansen”) que viria a ser ocupado a partir de 26 de Outubro de 1935 pelo “Retiro da Severa”, cuja história pode ser consultada neste blog no seguinte link: “Retiro da Severa”.
Dois fotogramas do filme “Canção de Lisboa” com a esplanada como cenário
Nota: na 1ª foto anterior, sentados na mesa e da esquerda para a direita: Manuel Santos Carvalho, Ana Maria, Manoel de Oliveira e Vasco Santana
Em 21 de Junho de 1934, é criada a “Sociedade Central de Cervejas, S.A.R.L.” - onde se impõem os interesses da família Vinhas, detentora da “Portugalia” - cujo primeiro Conselho de Administração seria eleito em Julho do mesmo ano, com a seguinte composição: António Marques de Freitas (“Portugalia”), Camilo Infante de La Cerda (“Fábrica de Cerveja Jansen”), Cândido Sotto Mayor (“Cª. de Cervejas de Coimbra”), Estolano Dias Ribeiro, José Maria Dias Ferrão e M. H. de Carvalho, Lda (“Cª. de Cervejas Estrela”). O capital inicial perfilhava os 100 000 escudos, divido do seguinte modo: Portugália e Estrela com 40,9%, Jansen com 10,2% e Coimbra com 8%.
A fábrica e a cervejaria “Portugália” passaram por reestruturações, entre 1952 e 1956, com o início da construção da nova malteria da “Portugália”, por uma equipa liderada por Sebastião de Oliveira (engenheiro da SCC), com apoio de Vitória Pires, subsecretário de Estado da Agricultura.
Maqueta
A cervejaria “Portugália” é profundamente alterada, tendo sido construído um novo edifício, projectado pelo arquitecto Guilherme Gomes, e concluído em 1956. Ficaria com umas instalações mais alargadas e modernas, nomeadamente a sala de refeições que passou a ter no primeiro piso, uma sala de bilhar e no terceiro piso passou a existir um terraço onde funcionava, nas noites de Verão, cinema ao ar livre de seu nome “Cine Esplanada Portugalia”. A época cinematográfica tinha início em Junho e terminava em finais de Setembro. Este cine-esplanada abriu em 04 de Junho de 1956 e encerraria definitivamente em 24 de Setembro de 1966.
Primeiras exibições do “Cine Esplanada Portugalia”, num anúncio de 4 de Junho de 1956
Última exibição do “Cine Esplanada Portugalia”, em 24 de Setembro de 1966
Novo edifício da cervejaria “Portugália” podendo-se ver os holofotes para o terraço do cinema ao ar livre de seu nome “Esplanada Portugália”
Interior da “nova” cervejaria “Portugália”
Título de uma acção de 12 de Fevereiro de 1966
A seguir à revolução de 1974, a cervejaria “Portugália” passou por alturas complicadas, situação que melhorou quando as famílias Carvalho Martins e Carvalho Vinhas voltaram à sua gestão, que só terminaria em 1997, com o início da expansão do conceito da cervejaria da Avenida Almirante Reis, para uma rede de restaurantes que mantém o mesmo espírito, ambiente e serviço que se destacavam em Lisboa numa das cervejarias mais conhecidas de Portugal.
“Portugália”, actualmente
Quanto à fábrica de cerveja “Portugalia” …
Hoje a “Portugália”, com 90 anos de existência, concluídos este ano, é um grupo com 32 unidades de restauração em Portugal e uma em Macau. É proprietária de mais quatro marcas além da “Portugália”, como a “Portugália Balcão”, “La Brasserie de L’Entrecôte”, “Cervejaria Ribadouro” e “Cervejaria Trindade”. Para os ineterssados em estatística ficam os números: por ano são consumidos 550.000 litros de cerveja, 1.500.000 bifes, 1.200.000 ovos e 1.500.000 Kg de pão. São também consumidos 95.000 Kg de marisco divididos por 2.400.000 clientes.
Uma curiosidade descoberta nas minhas pesquisas:
No mesmo dia 10 de Junho de 1925, descobri um anúncio publicitário, no jornal “Diario de Lisbôa” , à inauguração da “Cervejaria e Restaurant Portugalia, Limitada.” na Rua da Trindade, 11 a 15 em Lisboa …
10 de Junho de 1925
Fiquei intrigado na coincidência dos nomes com a cervejaria “Portugalia”, inaugurada no mesmo dia 10 de Junho de 1925, na Avenida Almirante Reis e, recuando um dia, descobri a seguinte notícia da inauguração da cervejaria e restaurant, acima referidos …
9 de Junho de 1925
Lendo com atenção a notícia, a dado passo pode-se ler: «- Não. Passa a denominar-se Restaurant Portugal, Ltd.ª» no último parágrafo do lado esquerdo da notícia.
Das duas uma: ou o jornal “Diario de Lisbôa” confundiu as duas cervejarias sem querer, ou esta cervejaria da Rua Nova da Trindade, aproveitou-se da popularidade da cerveja “Portugalia” para “furo” publicitário, já que eram inauguradas no mesmo dia … que chego a duvidar já que nem no “Diario de Lisbôa” nem no “A Capital”, nem noutros dois jornais encontrei qualquer notícia, ou publicidade, à inauguração da cervejaria “Portugalia”. Aliás se lermos com atenção o recorte da notícia da inauguração publicado neste artigo mais atrás, pode-se ler: «foi-nos tambem dado a visitar as instalações construídas há um ano.» Ora, essas instalações (da nova malteria) tinham sido inauguradas em 1921 … aqui fica mais uma dúvida.
E «como a conversa é como as cerejas» … anos mais tarde, seria inaugurado o “Restaurante Portugal” na Rua do Carmo e, em 1949, outro restaurante com o mesmo nome seria inaugurado na Praça de Londres.
Anúncio em 29 de Dezembro de 1949 e “Restaurante Portugal” na Praça de Londres
Bibliografia:
• Dissertação de mestrado em História Contemporânea de Filipe Guimarães da Silva: "A nacionalização que se deseja" (2012) - FCSH - Universidade Nova de Lisboa
• Mestrado em Design de Cátia Milene Azevedo Esteves: "Rótulos Portugueses de 1930 a 1980" (2012) - ESAD - Arte e Design
fotos in: Hemeroteca Digital, Arquivo Municipal de Lisboa, Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Sociedade Central de Cervejas
4 comentários:
Ora bem! 😀
Mais uma vez, feliz Natal!
Caro "Bic"
Muito grato e retribuo os seus votos de Feliz Natal a si e à sua família.
Cumprimentos
José Leite
Como muito bem duvida, o filme o Pátio das Cantigas, não foi filmado na Portugália mas sim, numa Esplanada que existia na rua que desce do Camões para o Cais do Sodré (não me recordo de momento o nome da rua). Essa Esplanada ficava do lado esquerdo de quem desce, num ponto alto que, durante muitos anos depois 'virou' um descampado. Creio que agora tem uns apartamentos de luxo. Mas, o filme foi feito aí e não na Portugália.
D. Maria Parente
Muito grato pela sua ajuda.
Eu já desconfiava que fosse por esses lados.
Essa esplanada era a da ainda "Cervejaria Jansen" que ficava ao lado da fábrica de cerveja "Jansen".
A partir de 26 de Outubro de 1935, essa esplanada e o respectivo "Salão Jansen" passariam a ser ocupados pelo "Retiro da Severa", que vinha do "Parque Mayer"
Acerca da história do "Retiro da Severa" convido-a a consultar neste blog o seguinte linK.
http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2015/12/retiro-da-severa.html
Mais uma vez, muito agradeço a sua preciosa contribuição.
Os meus cumprimentos
José Leite
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