O “Real Colyseu de Lisboa”, abriu as suas portas em 24 de Dezembro de 1887, na Rua da Palma, em Lisboa, nos jardins da propriedade da Condessa de Geraz de Lima, e veio, em certa medida, substituir os “Recreios Whittoyne” que tinham sido demolidos, no início desse ano, a fim de ser construída a “Estação do Rossio”, e cuja construção teve início em 21 de Maio de 1887.
Recordo que o “Circo Whittoyne”, propriedade da “Empreza Exploradora de Recreios Whittoyne”, tinha sido inaugurado em 6 de Novembro de 1875 e ocupava grande parte dos jardins contíguos ao “Palácio Castelo Melhor”, actual “Palácio Foz”. O seu nome era o apelido do palhaço “Henry” que trabalhara no “Theatro-Circo de Price”, no Salitre. Em 1881 transforma-se em “Recreios Whittoyne” e mais tarde em “Colyseu dos Recreios”.
Por altura da sua demolição, em Julho de 1877, a revista “Occidente” escrevia:
«Os "Recreios Whitoyne", nos seus jardins, offereciam ao mesmo público de verão, concertos ao ar livre, fogos de vistas, e ás vezes até umas tentativas de café concerto, com umas canções muito frescas cantadas por umas francezas que já o não eram muito: o seu Colyseu dava-nos opera italiana, zarzuella hespanhola, e ás vezes até companhia de declamação».
O mesmo lugar outrora ocupado pelos “Recreios Whitoyne”, e área envolvente, nos finais dos anos 40 do século XX
Em Setembro de 1877 era decidida em assembleia-geral a liquidação da empresa e, em Dezembro de 1888 …
Por outro lado, o “Real Colyseu de Lisboa” era um espaço de diversões dentro do mesmo estilo do anterior. Era um barracão desprovido de comodidade com paredes de madeira e cobertura assente em pilares de ferro que não lhe conferiam o aspecto que o fizesse distinguir de outros recintos, como também a sua localização numa zona pouco central. Lembro que nessa altura o Chiado, Rossio e Cais de Sodré eram as zonas mais habitacionais de Lisboa nos finais do século XIX.
Anúncio em 1890
Sousa Bastos, no seu livro “Diccionario do Theatro Portuguez” publicado em 1908, resumia sucintamente a história do “Real Colyseu de Lisboa” no seguinte texto:
«Esta casa de espectáculos, sita na rua Nova da Palma, tem funccionado com companhias equestres acrobáticas, gymnasticas, mímicas, de opera, opera cómica, zarzuela e opereta. Foi este theatro-circo construído em terrenos da Condessa de Geraz de Lima, hoje do seu viuvo, o Conde da Folgosa. Foi feito por meio de obrigações. Tendo fallido a empreza, ficaram os obrigacionistas sem coisa alguma.»
1896
Aspecto do foyer e da sala de espectáculos por ocasião do “Concuso do Seculo de 1908”
Em 1926, servindo já, de armazém de encomendas postais dos Correios
Planta
Vista exterior em 1927
O empresário do “Real Colyseu de Lisboa”, António dos Santos Júnior, chama o electricista de Budapeste, Edwin Rousby que viria a ser o introdutor do cinema em Portugal. Tal sucedeu no “Real Colyseu de Lisboa”, na Rua da Palma, a 18 de Junho de 1896. O empresário António Manuel dos Santos Júnior que, tendo assistido à sensacional novidade em Espanha, decidiu revelar o “Animatographo” entre nós. Para cumprir a promessa, Edwin Rousby veio de Madrid, chegando a Lisboa em 15 de Junho.
A apresentação do “Theatrograph” de Robert W. Paul decorreu no início da tarde do dia 18 de Junho, para a Imprensa, seguindo-se à noite a divulgação ao público. Lisboa era a oitava grande cidade europeia a alcançar tal privilégio. Em 22 de Junho, Edwin Rousby concluía os cinco espectáculos para que fora contratado, logrando o empresário António Santos Júnior retê-lo no “Real Colyseu de Lisboa”, embora já estivesse comprometido com sessões em Barcelona. Em 17 de Julho, o “Animatographo Rousby” exibir-se-ia no “Theatro-Circo do Príncipe Real” no Porto, em sessões a que assistiu Aurélio da Paz dos Reis. Seguiram-se Espinho e Figueira da Foz.
“Theatrograph” de Robert W. Paul
Inicialmente anunciado o "número" de Rousby como "Animatographo e Cinematographo", para 17 de Junho de 1896, as coisas correram mal. O "Real Colyseu de Lisboa" não tinha electricidade e o gerador alugado não foi eficaz, pelo que os 200 convidados tiveram de aceitar as desculpas de Rouby, ficando a sessão adiada para o dia seguinte. No dia seguinte, 18 de Junho de 1896, tudo correu bem , com os 8 filmes de 20 segundos a 1 minuto cada, exibidos.
Nessa altura, estava em cena no "Real Colyseu de Lisboa" a opereta em 3 actos "O Comendador Ventoinha". O espectáculo de "animatographo e cinematographo" foi apresentado num dos intervalos, sem encarecer o preço, que era de 100 réis na "geral". Havia uma tela branca, para ecrã com a dimensão de 3,00 mts. por 2,5 mts., com a projecção efectuada nas costa do ecrã, humedecido para aumentar a transparência.
Sequência noticiosa do evento no jornal “Diario Illustrado”
Como explicou o DN na altura: «Mr. Rousby coloca o aparelho (…), ao fundo do palco, vindo as figuras projetar-se num quadro de tela fixado à boca de cena, algo que encanta e maravilha, por ser a reprodução da vida».
«Os circos são os primeiros locais que trazem as experiências científicas. O cinema aparece nos circos porque eles traziam companhias de palhaços, mas também traziam os chamados “fenômenos” e também as novidades técnicas. O Real Coliseu e o Coliseu dos Recreios eram espaços versáteis. Por isso, é que se chamavam teatros-circos. Isso é uma invenção portuguesa.» Margarida Acciaiuoli.
Em 1907 é gravado do 1º fono-filme em Portugal, no palco exterior do "Real Colyseu de Lisboa", efectuada por João Freire Correia, proprietário da "Fotografia Londres" na Rua das Chagas, e Manuel Cardoso, com a participação da actriz Júlia Mendes. Esta película viria a ser exibida entre 2 actos da revista “Ó da Guarda”.
João Freire Correia na realização com a interpretação de Júlia Mendes
Entretanto em 10 de Maio de 1907
Em 12 de Julho de 1907 é inaugurado o famoso “Paraizo de Lisboa”, na “Quinta da Folgosa”, nos terrenos contíguos ao Colyseu. Propriedade de Rodrigo de Sousa, Carlos Esteves, João & José Vasconcelos, Lorjó Tavares e Jaime Victor, era um parque de diversões, na Rua da Palma entre o chafariz do Intendente e o “Real Colyseu de Lisboa”.
12 de Julho de 1907
O “Paraizo de Lisboa” tentava recriar, em Lisboa, os afamados "bals" parisienses, igualmente já desaparecidos.. Este recinto ornado de pequenas muralhas, com "promenade" ao ar livre, ringue de patinagem, barracas de comes e bebes, circo e animatógrafo, labirinto de espelhos e um palco em “art-noveau” instalado sobre ... um lago. A área - amplo espaço da Rua da Palma, entre o “Real Colyseu de Lisboa” e o “Palácio Folgosa” - acabou por ser urbanizada na década de 20 do século XX. Todos estes terrenos pertenciam ainda, em 1900, ao património da “Casa de Folgosa”.
Na foto da direita o novo edifício do “Paraizo de Lisboa”, inaugurado em 15 de Dezembro de 1909
18 de Novembro de 1914
O “Real Colyseu de Lisboa” viria a encerrar em 1917. Depois de ter servido de armazém de encomendas postais dos Correios, o edifício foi demolido em 1926, e o seu espaço daria lugar à “Garage Auto-Lys”, projectada pelo arquitecto Hermínio Barros e construída entre 1933 e 1934, ano da sua inauguração. Quanto ao recinto “Paraiso de Lisboa” depois de demolido daria lugar ao quarteirão do desaparecido “Cine-Rex / Teatro Laura Alves” inaugurado em 23 de Novembro de 1936.
Garagem “Auto-Lys” e o “Cine-Rex” a seu lado
fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Hemeroteca Digital, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian
1 comentário:
Excelente artigo. Obrigado.
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