Restos de Colecção

17 de março de 2024

Farmácia Formosinho

A "Pharmacia Formosinho", propriedade de Manuel Rodrigues Aguado Formosinho, abriu as suas portas, pela primeira vez, por volta do dia 28 de Agosto de 1903, na Praça dos Restauradores nº 21, ainda nos anexos do "Palácio Castello Melhor" ("Palácio Foz"). Com a construção do "Eden-Teatro" entre 1913 e 1914, a "Farmacia Formosinho", já propriedade de Adriano Gueiffão Ferreira, muda-se, definitivamente, para o nº 18, do mesmo edifício.



"Pharmacia Formosinho" dentro do rectângulo amarelo entre 1900 e 1905


29 de Agosto de 1903


"Pharmacia Formosinho" dentro do rectângulo amarelo em 1907

Quanto ao fundador Manuel Rodrigues Aguado Formosinho (?-1948), foi casado e sem descendência e viveu em Lisboa. Os outros irmãos de Manuel foram Bento, João, Gregório, Francisco, Maria das Mercedes e Joaquina que foram viver no Brasil, onde se estabeleceram com negócios entre os quais uma chapelaria de renome no Rio de Janeiro e todos com descendência.

O farmacêutico Adriano Gueiffão Ferreira (1885 -?), já tinha tomado posse da "Farmacia Formosinho" em 1910, com a firma "Laboratorios da Farmacia Formosinho", conforme anúncio publicitário seguinte. Este mesmo farmacêutico viria a requerer o registo das marcas como o "Dynamogenol" (1916), "Nucleocalcina" (1917), "Convulsina" e "Laxatol" (1919). 


1910


1912


13 de Dezembro de 1915


"Farmácia Formosinho" à esquerda na foto (a seguir ao tapume frente à camioneta) por volta de 1936


Setembro de 1928


15 de Julho de 1916

1916


1918


Exemplo de farmácia no início do século XX (aqui C.ª Portuguesa de Higiene - Farmácia Estácio)


1919


1926


Exemplo de laboratório farmacêutico nas primeiras décadas dos século XX

«Nos últimos anos do regime monárquico, já em pleno século XX, assistiu-se à constituição em Portugal de diversos laboratórios que tiveram como embrião, tal como sucedera com diversos colossos da Indústria Farmacêutica mundial, uma farmácia comunitária ou de oficina.
Instalaram-se, assim, gradualmente, as bases para a produção em série de medicamentos, num regime semi-industrial, processo que, ao longo dos anos, tornou obsoleta e fez cair em desuso a tradição oficinal de preparar os fármacos em doses unitárias e de forma personalizada em função de cada doente.
Enquanto alguns dos novos laboratórios se dedicaram, sobretudo, à produção de preparados galénicos, como foi o caso do Laboratório Farmacêutico J. Neves & Cª, fundado em Lisboa, em 1892, pelo farmacêutico José Vicente das Neves, outros enveredaram pelas especialidades farmacêuticas. Foi o caso, entre outros, da firma João José da Costa & C.ª, da farmácia e drogaria Pires & Barata, dos laboratórios da Farmácia Formosinho e da sociedade Pires & Mourato. Esta última foi criada em 1904 pelos farmacêuticos Manuel Adriano Mourato Vermelho e Serafim Pires Coelho David, que adquiriram a Farmácia Costa, instalada na actual Rua da Prata, tendo mudado o seu nome para Farmácia Normal.» in: "A Indústria Farmacêutica em Portugal - 75 Anos "
Edição em 2014 da "Apifarma".


28 de Julho de 1901

Por curiosidade, e satisfazendo os pesquisadores nestas matérias, publico de seguida uma tabela de preços de análises laboratoriais da "Pharmacia Normal" do início do século XX, e ainda em réis. 





A "Farmácia Formosinho" passaria para a gerência de Álvaro Andrade Gueifão Ferreira, a partir de 1948, tendo este adquirido em 31 de Dezembro de 1949, o trespasse de outra, em Lisboa, a "Farmácia Marques" propriedade até então de António Alberto Marques.


"Farmácia Formosinho" entre os dois "Nabos" nos anos 40 do século XX


1934


1936


1937


1936

"Farmácia Formosinho" à esquerda nesta foto de 1964

A "Farmácia Formosinho" encerrou definitivamente no início dos anos 80 do século XX, tendo-se instalado em Junho de 1986, no seu lugar, o restaurante e cervejaria "A Traineira", propriedade da firma "Castro, Domingos & Martinez, Lda.", conforme se pode observar na foto seguinte.


"A Traineira" (à esquerda na foto) e "Drugstore Chic-Choc" que substituiu o Café "Avis"

13 de março de 2024

"Panificação Mecânica" de Campo de Ourique

A padaria "Panificação Mecânica" foi aberta por volta de 1915 na, então, Rua de S. João dos Bemcasados (actual Rua Silva Carvalho), no Bairro de Campo de Ourique, em Lisboa. Desde 1958 que é propriedade da firma familiar "Panificação Mecânica, Lda."


Esteve na sua origem a construção da "Fabrica de Mechanica de Pão" de Campo de Ourique, cuja autorização para a «construção de uma casa de fornos» num logradouro existente na esquina da Rua de S. João dos Bemcasados com a Rua de Campo de Ourique, foi solicitada em 1902 à CML, pela recém criada "Companhia de Panificação Lisbonense, S.A.R.L." por escritura pública de 15 de Março de 1902.

De referir que à data da constituição da Companhia, já existiam duas padarias nesta Rua de S. João dos Bemcasados, que entraram para a mesma com os seus estabelecimentos devidamente avaliados, e que passo a enumerar:

- Rua de S. João dos Bemcasados, nº 39, propriedade da firma "José Alvarez e Filhos", no valor de 25:000$000 réis. José Alvarez era o maior accionista da Companhia com activos no valor de 354:000$000 réis, seguido de Antonio Castanheira Moura (Presidente da Direcção).
- Rua de S. João dos Bemcasados, nº 133, propriedade de Joaquim Pedro Garcia, no valor de 25:000$000 réis.

Entre os anos de 1905 e 1908, fruto de uma vaga de fusões e aquisições, foram criadas num primeiro momento a "Nova Companhia Nacional de Moagem, S.A.R.L.", em Lisboa em 28 de Junho de 1907, e a "Companhia de Moagem Invicta, S.A.R.L.", no Porto. Sete anos mais tarde, em 1914, a "Companhia de Panificação Lisbonense, S.A.R.L.", viria a ser adquirida (e dissolvida em 18 de Julho de 1914), pela "Nova Companhia Nacional de Moagem, S.A.R.L." com todo o seu vasto património de fábricas de panificação e padarias espalhadas por Lisboa.

11 de Dezembro de 1915

Uma dessas fábricas era a "Fabrica de Mechanica de Pão" de Campo de Ourique, que no final de 1915 já funcionava como padaria com venda ao público. Tal ficou a dever-se a importantes transformações das suas instalações operadas entre finais de 1914 e ano de 1915.

4 de Janeiro de 1916

O sector de venda ao público, foi construído em estilo "Art-Nouveau" que teve um grande impacto em França, o mesmo não sucedendo no nosso país. Esta nova linguagem decorativa, concretizada sobretudo através do trabalho do ferro, madeira, vidro, cerâmica e de algum modo na arquitetura, através da decoração das fachadas, é assinalada no contexto nacional com exemplos paradigmáticos como o da Panificação Mecânica.

O "SIPA - Sistema de Informação para o Património Arquitetónico" descreve deste modo, o edifício e espaço de padaria:

«Edifício residencial multifamiliar e comercial Arte Nova. O revestimento a azulejo dá sua fachada uma certa dinâmica pelo desenho dos mesmos e pelo seu colorido. Nesta fachada há a destacar a estrutura em ferro da padaria num desenho de curvas e rectas, de sabor modernista do princípio do século, embora denote um gosto néoclassizante nas pilastras e na composição formal. O seu interior, é bastante interessante, com uma profusão de materiais (madeira, vidro, azulejo, ferro) numa articulação estética entre uma decoração ligada a conceitos de Arte Nova e conceitos anteriores a esta. No interior da padaria, os panos de parede entre os vãos das portas de acesso e das montras são revestidos a azulejo policromado tendo como motivos borboletas e espigas. As aberturas das paredes de fundo, têm molduras de azulejos com motivos vários conjuntos florais, troncos, espigas, insectos e pássaros, todos eles Arte Nova da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro.»

Por outro lado, numa palestra proferida em 1968 por J.M. dos Santos Simões (1907-1972) na FCG:

«As padarias foram um grande consumidor de azulejo. Posso aconselhar-vos uma visita a uma das maiores padarias de Lisboa, e das mais deliciosas do ponto de vista estético, que era uma das padarias da Companhia de Panificação, ainda chamada hoje "A Panificação", na esquina da Rua de S. João dos Bemcasados, a Campo de Ourique. Os azulejos para aí foram feitos por Manuel Gustavo Bordallo Pinheiro. Foram feitos nas Caldas, e são dos mais curiosos azulejos "arte nova" que se encontram ainda em Lisboa.» 


Manuel Gustavo Bordallo Pinheiro (1867-1920)

Manuel Gustavo Bordallo Pinheiro (1867-1920), foi filho de Raphael Bordallo Pinheiro (1846-1905). Foi desenhador humorista, ilustrador e ceramista. Autor de vasta obra gráfica, fez banda desenhada e destacou-se como pioneiro da ilustração infantil em Portugal. Inovou na cerâmica, conciliando a tradição naturalista das Caldas da Rainha e a Arte Nova. Principal seguidor de seu pai, publicou pela primeira vez no jornal paterno "O António Maria", em 1884, colaborando desde aí ativamente e com enorme dedicação nos jornais fundados pelo seu pai, como também nos "Pontos nos ii" e em "A Parodia", que veio a dirigir até 1907.


Em 17 de Dezembro de 1919, é constituída a "Companhia Industrial de Portugal e Colónias, S.A.R.L.", que resultava da fusão da "Nova Companhia Nacional de Moagem, S.A.R.L." e da "Companhia Nacional de Alimentação, S.A.R.L.". Esta nova companhia será a nova proprietária da "Padaria Mecânica" de Campo de Ourique, que, em 1958, a vende a uma nova empresa familiar, constituída para o efeito a "Padaria Mecânica, Limitada".

Entretanto, em 1920 ...

Esta padaria tem desde 18 de Agosto de 1956, como vizinha no andar superior, a "Sociedade Filarmónica Alunos de Apolo", fundada em 26 de Maio de 1872, nesta mesma Rua no nº 41-1º andar, e cuja história pode consultar neste blog, no seguinte link: "Sociedade Filarmónica Alunos de Apolo".


"Panificação Mecânica" e "Sociedade Filarmónica Alunos de Apolo"

Em 9 de Maio de 1983, o "Diário da República" publica o decreto 31/83, do Ministério da Cultura e Coordenação Científica, em que o "Instituto Português do Património Cultural", classifica o edifício e o estabelecimento da "Panificação Mecânica, Lda.", como "Imóvel de Interesse Público".

O negócio foi prosperando, e na década de 80 do século XX esta padaria sofreu algumas modificações de nota nomeadamente, a substituição dos balcões primitivos por balcões de vidro e metal. Deixava de ser só uma padaria, tendo sido introduzida a pastelaria e o serviço de refeições. Para tal, o espaço da loja não chegaria, havendo também o espaço de produção; não só para venda no local, mas também para fornecer para fora.

1984


1991



Nos dias que decorrem a "Panificação Mecânica" deixou de ser só uma padaria. Actualmente, confecciona também pastelaria e refeições, de filetes de pescada a bifes de porco panado. São ao todo, entre balcão e fábrica, mais de 40 funcionários a trabalhar na "Panificação Mecânica". Este estabelecimento produz: Bolos; Pão; Refeições; Bolos de aniversário; Bolos de casamento; Bolos miniaturas, etc.



E com isto tudo, já lá vão cerca de 108 anos desde a instalação da padaria em finais de 1915 ...

fotos in: Hemeroteca Digital de LisboaArquivo Municipal de LisboaBiblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Fotold, Art-Nouveau World