Restos de Colecção: Estabelecimento Prisional de Lisboa

8 de abril de 2011

Estabelecimento Prisional de Lisboa

A Cadeia Penitenciária de Lisboa, com os seus 126 anos de funcionamento ininterrupto, insere-se num reduzido grupo de realizações que, no século XIX, visaram a instalação completa de um serviço público em estruturas próprias e expressamente delineadas para tal num período caracterizado, no que se refere aos programas públicos, pela adaptação, com maior ou menor grau de improvisação, de edifícios existentes.

A 1 Julho de 1867 a “Reforma Penal e de Prisões” estabelece que:  «as penas de prisão maior celular sejam cumpridas em 3 cadeias gerais penitenciárias a criar no reino, entre as quais a do distrito da relação de Lisboa, com 500 celas para condenados do sexo masculino. As instalações seriam erguidas em lugar apropriado fora da cidade (Art. 28º), e incluiriam, além das celas, uma capela, aposentos para os empregados, "casas para escrituração, arquivo, botica, banhos e provisões", e "terrenos adjacentes convenientemente dispostos para passeio e exercício dos presos", sendo o conjunto rodeado por um muro "de altura suficiente para lhes dar segurança e impedir a vista de penetrar da parte exterior no pátio e mais dependências da prisão" (Art. 29.º). »

Actualmente, uma característica particular do ‘Estabelecimento Prisional de Lisboa’ assume especial preponderância e sobrepõe-se às demais, porventura em prejuízo da integridade futura deste objecto arquitectónico excepcional: a sua localização. Erguido em situação periférica ao centro urbano, junto à primeira Circunvalação de Lisboa (1852, depois Rua Marquês de Fronteira), em ponto intencionalmente remoto e isolado, o conjunto foi englobado pelo crescimento urbano da capital a partir da abertura do Parque Eduardo VII e das malhas urbanas subsidiárias deste, em direcção aos sítios de Campolide e São Sebastião da Pedreira.

O projecto para Cadeia Penitenciária Central de Lisboa (1864-1885) foi da autoria dos engenheiros: Joaquim Júlio Pereira de Carvalho, Luís Victor Le Cocq e Ricardo Júlio Ferraz.

Fases de construção de novos edifícios, já no séc. XX

   

O complexo prisional é polarizado por um edifício principal, datado do séc. XIX, de planta em estrela, encontrando-se este rodeado por 5 outros edifícios, de construção posterior, todos de planta rectangular, formando, juntamente com o edifício da administração. As faces de um hexágono que, aquém dos muros exteriores, isolam a zona prisional dos demais espaços que compõem o complexo, reforçando os meios de segurança, de vigilância e de controlo.

 

Aspectos exteriores, entre 1900 e 1913

 

                         Portão de entrada                                                         Hospital da Penitenciária

   

                            Entrada                                                     Páteo                                           Carro celular                         

             

O conjunto integra assim diversos edifícios, que foram surgindo por obras de melhoramento e ampliação, na tentativa de adaptar uma penitenciária do séc. XIX às necessidades renovadas da organização prisional, em obras de qualificação que se estenderam também ao interior do edifício mais antigo. O Estabelecimento Prisional de Lisboa, além do edifício central, que o caracteriza por excelência - histórica e funcionalmente -, conta com estruturas construídas autónomas onde funcionam as oficinas de mecânica-auto, tipografia / encadernação, serralharia, carpintaria, electricidade, a escola (lecciona todos os níveis de ensino a todos os reclusos do estabelecimento prisional), a lavandaria (recentemente construída), o ginásio e a messe do corpo de guarda prisional.

Fotos seguintes de 1903

                                             Oficina de Carpintaria                                 Anfiteatro da escola

     

                           Sala de cirurgia do Hospital                                                    Padaria

  

O edifício principal, planta em estrela, composta por 6 corpos paralelepipédicos, desenvolvidos em 4 pisos. Cada um dos seis corpos que desenham a estrela - desenvolvendo-se os maiores, a partir do corpo central,  é rematado por um corpo de planta semi-circular, em dois pisos, aproveitamento dos primitivos recreios do sistema penitenciário oitocentista. A disposição em estrela cria espaços descobertos, aproveitados para recreio dos reclusos, encontrando-se em dois deles um campo polidesportivo e um campo polivalente.

Actualmente o alojamento dos reclusos realiza-se, neste edifício, a partir de alas alfabetadas de A a F . As celas dispõem-se de um lado e outro, todas dotadas de sanitários, contando cada ala ainda com camaratas, balneário, refeitório, bar/sala de convívio, sala de musculação e biblioteca. A cada uma das alas corresponde um tipo de reclusos, relacionado com a situação em que se encontra dentro do estabelecimento: reclusos toxicodependentes aderentes ao programa "unidade livre de droga"; reclusos trabalhadores, estudantes e em formação profissional; reclusos em cumprimento de penas médias e reclusos alojados no sector disciplinar e no sector de segurança; reclusos condenados em penas mais longas; reclusos em detenção preventiva e jovens condenados com idade inferior a 21 anos; e reclusos em detenção preventiva que exigem maior segurança.

                                                 Edifício Principal (1903)                                                Corpo de celas

  

               Celas e presos com capuz  (1903)                                                   Cozinha (1903)

  

Na penúltima foto, pode-se observar 2 presos com capuz. Isto deve-se à observância do “Regulamento Provisório da Cadeia Geral Penitenciária do Distrito da Relação de Lisboa, Decreto de 20 Nov. 1884”  que estipulava o seguinte:

«O regime penitenciário é de absoluta separação dos condenados entre si, sendo a cada um destinada uma cela em que tenha de habitar" (art. 3.º) e que os presos cumprindo pena de prisão maior celular e que não fossem declarados incapazes, "serão obrigados a trabalhar dentro da respectiva cela, ou em compartimentos adequados para esse efeito" (art. 4.º ). Os reclusos receberiam instrução para o exercício de uma profissão fora da cadeia, instrução primária e instrução moral e religiosa. Os exercícios físicos quotidianos, a efectuar nos pátios ou dependências da cadeia, deveriam assegurar que os reclusos "não tenham entre si comunicação alguma, nem possam conhecer-se" (art. 9.º). Fundamental para manter a incomunicabilidade dos reclusos, que "não poderão, sob qualquer pretexto, ver-se nem comunicar entre si por escrito, por palavras ou sinais", é a utilização por estes, fora das celas, de "um capuz que lhes encubra o rosto e que não poderá ser levantado senão nos pátios de passeio, no anfiteatro da capela, ou em outros lugares em que não esteja presente outro preso" (art. 159.º), o mesmo valendo para os reclusos ocupados "em serviços ou trabalhos, fora das celas", que não podem "dirigir-se por palavras ou gestos aos presos que se ocupem no mesmo serviço, ou que estejam próximos».

Em Fevereiro de 1913 é abolido o capuz nas cadeias de Portugal

Fotos in: Arquivo Municipal de Lisboa, Hemeroteca Digital

Estabelecimento Prisional Central de Lisboa está vocacionado para receber, essencialmente, reclusos condenados a penas de prisão, embora conte com uma percentagem significativa de reclusos preventivos da área de Lisboa (cerca de 57 % da população prisional do estabelecimento).Tem uma lotação fixada em 887 reclusos mas encontra-se com valores excedentários, chegando a albergar mais de um milhar de homens. Quanto à classificação, é um estabelecimento de segurança, em regime fechado, e assegura formação profissional e ocupação laboral na área oficinal.

2 comentários:

Anónimo disse...

excelente artigo

José Leite disse...

Grato pelo seu comentário
Cumprimentos

J.Leite