Restos de Colecção

20 de novembro de 2024

York Bar

O "York Bar", foi fundado pelo barman Ângelo Pereira, em 14 de Novembro de 1929, na Rua Serpa Pinto, 23 em Lisboa. Esta bar, e boite, foi projectado pelo arquitecto Jorge de Almeida Segurado (1898-1990) e decorado por António Soares. Era o primeiro passo de Ângelo Pereira como proprietário ou gerente de conceituados bares, dancings e restaurantes lisboetas, como veremos mais adiante.


Fachada do "York Bar" na Rua Serpa Pinto

No dia da inauguração o jornal "Diário de Lisboa" noticiava:

«Lisboa moderniza-se dia a dia.
Hoje, realizou-se a inauguração de um novo estabelecimento, onde o lisboeta pode encontrar aquela alegria de viver que dão o conforto, o bom gôsto, os líquidos espirituosos e a atmosfera agradável da "tertúlia". O "York Bar" instaladao na Rua Serpa Pinto, 23 em pleno Chiado, e que constitui uma bela afirmação de progresso e de espirito de iniciativa.»


Foto a noite de inauguração, com os arquitectos Carlos Ramos e Pardal Monteiro (3º e 4º em pé a contar da direita)

O mesmo jornal no dia seguinte ...

«Lisboa, capital europeia das mais belas, sente a necessidade de ser, simultaneamente, das mais modernas.
As exigencias de vida de hoje, obedecendo ao imperio despotico de correntes de bom gosto e elegancia, obrigam a cidade de Ulisses a europeisar-se, a internacionalizar-se sob determinado ponto de vista, ou pelo menos, a transigir no set: casticismo, a permitir que, a par dos seus recreios pitorescos e bebidas indígenas - o vinho e o retiro - surjam locais e formulas tão «Novo Mundo» como o «bar» e o «cocktail».
Tal transigencia «alfacinha» satisfaz nao só os portugueses elegantes e viajados, frequentadores da «calle» do «Savoyan, de Madrid, como os turistas americanos, nostalgicos dos «bars», de Nova York.
Estas considerações vem a proposito da inauguração do «York Bar», uma «boite» bizarra que ontem surpreendeu a curiosidade lisboeta, ali na rua Serpa Pinto.
Um portico modernista e uma porta giratoria dão acesso ao mais ousado «bar» que a cidade ainda conheceu, projecto que, apesar do reduzido das dimensões, representa um grande, um autentico triunfo do arquitecto Jorge Segurado e do pintor Antonio Soares. O primeiro realizou pelos processos mais modernistas, um «cercle» elegantissimo, ideal para o fim a que se destina; o segundo colaborou no plano geral de decoração e pintou deliciosos quadros que se combinam maravilhosamente com o ambiente. «Maples» confortaveis completam a linda casa de estar, onde um «barman» afamado, Harry Dimauro, vindo de Biarritz, prepara os mais «esquisitos» «coktail».
A inauguração do York Bar, a que assistiram jornalistas, artistas e «sportsman», marca um acontecimento citadino e merece, sem favor, ser arquivada para a historia da Lisboa moderna com estas ligeiras considerações.
Lisboa, na frase dum antigo e elegante jornalista, ja tem onde tomar o seu «coktail» das Cinco.»


26 de Junho de 1933


25 de Dezembro de 1935


1943

Ângelo Pereira, além de barman de profissão, viria a ser proprietário e/ou somente gerente de conceituados estabelecimentos hoteleiros lisboetas, como: gerente da "Taverna Imperial" inaugurada em 31 de Dezembro de 1931, na Praça dos Restauradores; gerente do Bar-Dancing "Arcádia" inaugurado em 5 de Fevereiro de 1932, na Rua Eugénio dos Santos; proprietário e gerente do restaurante "Negresco", inaugurado em 5 de Março de 1937, na Rua Jardim do Regedor.


30 de Dezembro de 1944

O "York Bar" terá encerrado definitivamente em 1951, já que a última publicidade a esta casa, e que tive acesso, apareceu na "Gazeta dos Caminhos de Ferro" em 1 de Janeiro de 1951, e que publico de seguida. Por sua vez, o "Arcádia" continuou «a todo o vapor» nos anos seguintes, mas quanto ao "York Bar" desapareceu por completo, pelo menos na imprensa da época ...


1 de Janeiro de 1951

17 de novembro de 2024

Sociedade Torlades

A "Sociedade Torlades"Agentes de navios a vapor, importadores de carvão e trigo - foi fundada como "Torlades & Companhia", por volta te 1811, com as suas primeiras instalações na Rua das Flores, 50 em Lisboa. Era propriedade da "House of Torlades O'Neill.


Recibo da "Torlades & Companhia " datado de 11 de Outubro de 1811


Primitiva sede da "Sociedade Torlades" na Rua das Flores, 50 (toldo do meio à direita)

A irlandesa Casa de Torlades O'Neill estava estabelecida em Lisboa desde o início do século XVIII. João O'Neill e um irmão (não mencionado) estão numa "Lista de Pessoas que são Súditos de Sua Majestade Britânica com Estabelecimentos Comerciais nesta Corte", uma lista compilada em 1755,  provavelmente como um censo pós terremoto. No entanto, eles não parecem ter sido membros da "British Factory" - a associação de "factors" estabelecida e comercializando em Lisboa na época.


Brazão da Casa Torlades O'Neill, exposto na Torre de S. Sebastião, em Cascais

Na sua chegada  a Portugal, em 1740, os O'Neill's ficaram, inicialmente, no Bom Sucesso, onde foram acolhidos pelo Padre Brian Brulaughan, o reitor do Corpo Santo,  mudando-se, mais tarde,  para a Rua da Emenda, em Lisboa. Shane (João) O’Neill então atravessou o Tejo, para comprar a Quinta da Arealva, que ficava à beira do rio e tinha seu próprio cais. Na Quinta, ele cultivava uvas para vinho. Brulaughan mais tarde apresentou-o à sua futura esposa, Valentina Maria Josefa Ferreira, e casaram em Lisboa em 1750. João morreria em 1788. Seus irmãos casaram-se com outras famílias irlandesas expatriadas.


14 de Outubro de 1824

17 de Outubro de 1833

O primeiro filho de João, Conn, morreu jovem. Seu filho sobrevivente, Carlos O'Neill (1760-1835), foi educado na "St. Omer British Catholic School", em Douai na Normandia. As duas irmãs de Carlos foram Prioresas no Bom Sucesso, em Lisboa. Ele tornou-se comerciante e um grande proprietário de terras, especialmente na área de Setúbal. Casando-se com Ana João Torlade em 1784, herdou a casa comercial “Torlades & C.ª ” do seu sogro, Jacob Frederico Torlade, que originalmente veio de Hamburgo e que se tinha naturalizado português em 1781. A casa comercial "Torlades & C.ª " tinha uma variedade de interesses comerciais, incluindo exportações de laranja e sal, e uma fábrica de conservas de sardinha, a "Sociedade de Pescarias Setubalense". Torlade também era o cônsul de Setúbal para a Liga Hanseática. Além da empresa, O'Neill também herdou através de sua esposa a “Quinta das Machadas” em Setúbal. Esta tinha sido comprada como terra agrícola por seu pai da família Botelho de Moraes Sarmento: ali construiu uma casa, em 1770, e criou a primeira exploração agrícola intensiva de Portugal para cultivar laranjas para exportação. Em determinado momento, a Quinta tinha 6.000 laranjeiras, além de vinhas e oliveiras. Atualmente tem apenas oito hectares, mas permaneceu na família. A casa e o jardim são no estilo pombalino.

Escritura de aforamento datada de 3 de Janeiro de 1836 (primeira e última páginas)

No início do século XIX, o então chefe da família, José Maria O'Neill (1788 -?), neto de João, tornou-se Cônsul Honorário da Dinamarca e, na década de 1830, enviou seus dois filhos mais velhos para Copenhague para aprender dinamarquês. Eles viveram com os Wulffs, onde conheceram Hans Christian Andersen.

O impacto da “Guerra Peninsular” (1807-1814) nos O'Neill’s pode ter sido relativamente pequeno. Durante o breve período em que o país foi controlado pelos franceses sob o comando do General Junot, o estupro e saque pelos soldados franceses foram comuns. No entanto, sob o líder das tropas francesas ao sul do Tejo, Jean François Graindorge, os franceses foram contidos, supostamente porque sua amante portuguesa o persuadiu a controlar suas tropas. Carlos O'Neill era um amigo muito próximo de Joaquim Pedro Quintela (Conde de Farrobo), um dos homens mais ricos da época e um grande financiador do Real Theatro de S. Carlos. Mantinha um camarote, embora não se saiba se o terá utilizado durante a ocupação francesa.

Em 1819, Carlos O’Neill comprou uma fábrica de couro e as terras agrícolas onde ela estava implantada, e trouxe da Irlanda uma dupla pai e filho chamados Broughton para administrá-la. Em 1826, a fábrica de curtumes estava sendo gerida por seu segundo filho, Henrique O’Neill (Visconde de Santa Monica), empregando 80 trabalhadores. Mais tarde, a herdade e a propriedade da fábrica foram transferidas para a casa comercial "Torlades & C.ª ". No entanto, talvez não tenha sido um grande sucesso financeiro, pois em 1842 a propriedade estava alugada a agricultores locais. Posteriormente, a terra foi transferida para Pauline, filha de Henrique, quando ela se casou com um proprietário de terras local de descendência holandesa, José de Groot Pombo.

Henrique O'Neill (1823-1889)

Em 1843 a "Torlades & C.ª " já tinha mudado a sua sede para a Travessa do Sequeiro das Chagas, nº 3, em Lisboa. Mantinha um estaleiro na Rua do Caes do Tojo, à Boavista, em Lisboa.


8 de Fevereiro de 1843

11 de Março de 1846

Carlos era amigo da Rainha Maria I. Como era costume, como afilhado do filho mais velho da Rainha, José Maria, Príncipe do Brasil, seu filho mais velho recebeu o nome de José Maria. Outra evidência de que a família já se estava movendo nos mais altos círculos portugueses vem do facto de que recebeu uma visita do Rei João VI na “Quinta das Machadas” em 1825. Carlos e sua esposa tiveram nove filhos. José Maria O’Neill, que nasceu em 1788, herdou a casa comercial "Torlades & C.ª ". Também esteve envolvido com a "Companhia Lisbonense de Iluminação a Gás", que iniciou operações no dia 30 de julho de 1848 com a iluminação de 26 lâmpadas a gás em Lisboa, e também esteve na fundação da "Casa Bancária Torlades Lda.".

Carlos O'Neill construiu uma casa no centro de Lisboa, na Travessa de Guilherme Cossoul, em 1825. A família O'Neill viveu lá até 1839, quando se mudaram para a Rua das Flores depois que um ladrão (José do Telhado) ter matado um criado e roubado algum dinheiro. A casa na Rua das Flores permaneceu na família até 1953 e foi o local de nascimento do atual chefe da família.

José Carlos O'Neill(1815-1887), que era o primogênito de José Maria O'Neill, continuou, junto com seu irmão Jorge Torlades O'Neill I (1817-1890), a expandir os negócios da casa comercial "Torlades & C.ª ". José Carlos morreu sem filhos em 1887 e foi brevemente sucedido como chefe da família por seu irmão.

Com a morte de Jorge Torlades O'Neill I (1817-1890) em 1890, seu filho mais velho, Jorge Torlades O'Neill II (1849-1925), tornou-se o chefe da família O'Neill em Portugal. Na “Quinta do Pinheiro”, seu pai tinha recebido inúmeros convidados e Jorge O'Neill herdou dele um círculo de amigos, como o editor de jornais João Pinheiro Chagas, o escritor Ramalho Ortigão e o artista Raphael Bordallo Pinheiro. Jules Verne visitou a Quinta em algumas ocasiões, em 1878 e 1884. Jorge O'Neill II também recebia em sua casa na Rua das Flores em Lisboa, onde visitantes frequentes incluíam o escritor e político Joaquim Pedro de Oliveira Martins. A casa da Rua das Flores foi usada, a partir de 1889, para jantares dos "Vencidos da Vida". Este era um nome usado por um grupo informal de intelectuais para indicar, a sugestão de Martins, que seus membros (anteriormente conhecidos como a “Geração de 1870”) haviam sido derrotados em suas tentativas de modernizar o país. O'Neill tornou-se um “derrotado honorário”, junto com o Rei D. Carlos I e a escritora Maria Amália Vaz de Carvalho. A partir desse momento, ele também se tornou bom amigo de outros "Vencidos da Vida", como o escritor Eça de Queiroz e o Conde de Sabugosa.

Jorge Torlades O'Neill (1849-1925)


1878

27 de Setembro de 1891

Falando dinamarquês, alemão e francês, além de português e inglês, Jorge O’Neill continuou a dirigir a casa comercial "Torlades & C.ª", que se tornaria na "Sociedade Torlades", em 1897. Nessa época, parece que foi introduzido capital externo no negócio, com os dois outros sócios gerentes sendo J. W. H. Bleck - fundador da "Lisbon Coal and Oil Fuel Company Limited" para representar os produtos da companhia de petróleo Shell em Portugal - e Manuel de Castro Guimarães. O endereço da empresa, já era Rua Áurea, 32 , em Lisboa, não muito longe da Praça do Comércio, e descreve o negócio como “Agentes de navios a vapor, importadores de carvão e trigo”

"Sociedade Torlades" no segundo quarteirão do lado direito do postal

No prédio da esquerda (mais escuro) tinha estado instalada a "Sociedade Torlades", em foto de 1932


29 de Setembro de 1905


16 de Dezembro de 1907

1909

Naquele ano, além de Jorge e seu filho, Hugo, os sócios-gerentes eram então dados como Charles H. Bleck, W.E. Bleck e D. L. de Lancastre. Jorge O'Neill, além de ter sido um dos fundadores do "Banco Lisboa & Açores", também era Diretor do "Banco de Portugal" e fazia parte do Conselho de Administração da "Anglo-Portuguese Telephone Company", da "Companhia dos Caminhos-de-Ferro Portugueses", "Companhia Nacional de Fósforos", etc. 

Charles H. Bleck

E a propósito destas multi ocupações profissionais, de Bleck, O'Neill e outros ... no jornal "A Choldra" de 17 de Abril de 1926.

17 de Abril de 1926

O herdeiro de Jorge foi Hugo José Jorge O'Neill (1874-1940). Hugo, um Oficial da Marinha Portuguesa, era sócio-gerente da "Sociedade Torlades" quando esta faliu em 1929. Esta falência foi seguida por um longo processo judicial, tendo sido considerada fraudulenta. Hugo foi sucedido por Jorge Maria O'Neill (1908-1988), que era engenheiro eléctrotécnico, formado pela Universidade de Lausanne, na Suíça.


Recibo de vencimento de 23 de Novembro de 1923


16 de Junho de 1926

Dos últimos anúncios publicitários, este no "Almanaque de "O Século" de 1927

O atual Chefe da Família O'Neill em Portugal, Hugo Ricciardi O'Neill (nascido em 1939), continua a ocupar a “Quinta das Machadas” em São Julião, Setúbal. Foi Presidente da "Associação Portuguesa das Casas Antigas", Governador da Associação Europeia de Casas Históricas e Presidente do "Clube Naval Setubalense", entre outras funções. Seu único filho, e herdeiro aparente, é Jorge Maria Empis O'Neill (nascido em 1970).

Hugo Ricciardi O'Neill (nascido em 1939) - foto de Miguel Baltazar in: "Expresso" (19-07-2017)

Bibliografia:

- "The O'Neills of Portugal" by Andrew Sheperd - British Historical Society of Portugal, Newsletter 9, December 2020
- "A Visit to Portugal" by Hans Christian Andersen - 1866

15 de novembro de 2024

Rocha, Amado & Latino, Lda.

A loja de ferragens, arames e metais para a construção civil "Rocha, Amado & Latino, Lda.", foi fundada em 1880, na Rua Nova do Almada, em Lisboa sob a sua primeira denominação: "Silveira & C.ª ".

Do livro "Praça de Lisboa", organizado por Carlos Bastos, e publicado de 1945, retirei o seguinte apontamento histórico:

«Esta acreditada casa, hoje uma das mais sólidas do ramo, já perfez 65 anos de honrosa actividade, pois a sua fundação remonta a 1880, ano em que foi inaugurada pela firma Silveira & C.a, constituída entre António Nunes da Silveira e José M. Chicharo, antigos empregados da firma J. B. Fernandes.
Em 1885, tendo saído o sócio José M. Chicharo e entrado, em sua substituição, Domingos José  Marques Guimarães, o pacto social modificou-se para Silveira & Guimarães, que se conservou até 1890, passando então a Silveira, Guimarães & C.a, em virtude de haver ingressado na Sociedade António Augusto Marques Guimarães, filho de Domingos José Marques Guimarães.
Pela retirada de António Nunes da Silveira, em 1913, a firma passou a girar sob a razão social de António Guimarães & C.a, sendo formada por António Augusto Marques Guimarães e Carlos Júlio Ferreira da Rocha, êste último até então empregado da casa, para a qual tinha entrado em 1901 como marçano. Muito embora, em 1916, Joaquim Raimundo Amado viesse compartilhar da sociedade, dêsse facto não resultou qualquer alteração da firma.
Em 1918, porém, com a morte do sócio António Augusto Marques Guimarães, os dois sócios sobreviventes admitiram como novo sócio a Latino Nunes Ferreira e adoptaram a firma Rocha, Amado & Latino.
Em 1921, finalmente, com a entrada dos sócios António Gonçalves da Silveira, Manuel Ferreira da Rocha e Bruno Renato Ferreira da Rocha, constituíu-se a actual firma Rocha, Amado & Latino, Lda.
Assim os actuais sócios são Carlos Júlio Ferreira da Rocha, Joaquim Raimundo Amado, Latino Nunes Ferreira, António Gonçalves da Silveira, Manuel Ferreira da Rocha e Bruno Renato Ferreira da Rocha, a cuja harmoniosa e inteligente colaboração se deve o próspero incremento tomado pela casa nestes últimos anos, de modo a dignificar as brilhantes tradições criadas pelos fundadores.
O primeiro estabelecimento fundado pela firma Silveira & C.ª foi na Rua Nova do Almada 13 e 15 e ai continua sendo a sede da casa, que nêle explora especialmente o comércio de ferragens e ferramentas. No entanto, ampliando a sua esfera de acção, a actual firma, em 1921, montou um novo estabelecimento à Rua da Boa Vista, 54, onde exerce o ramo de metais e arames e em 1934, outro ainda, na Rua da Prata, 82, destinado especialmente ao negócio de arames, rêdes, gaiolas e todos os trabalhos de arameiro.
De progresso em progresso, perseverando sempre na manutenção duma continuidade comercial condigna das tradições criadas em quási um século de brilhante existência, a actual firma Rocha, Amado & Latino, Lda, constitue um alto exemplo de actividade, permanente e progressiva, sendo por isso merecedora dos maiores louvores e das mais justas referências.
Ocupando hoje sólida posição no mercado interno, a sua vasta clientela estende-se a todo o País, não havendo localidade distante ou modesta em que deixe de contar com dedicados fregueses e amigos.»


24 de Março de 1933


17 de Abril de 1936


1940


1944


Loja da Rua Nova do Almada em 1945

A seguinte publicação de alteração de estatutos em "Diário da República" de 4 de Junho de 1948, confirmava os sócios e instalações existentes desta firma:

«Para os devidos efeitos se anuncia que, por escritura de 4 do corrente mês de Junho, lavrada nas notas do cartório do notário Tavares de Carvalho, desta comarca, o pacto da firma Rocha, Amado & Latino, Limitada, sociedade por quotas de responsabilidade limitada, com sede nesta cidade, conforme resolução dos respectivos sócios, Carlos Júlio Ferreira da Rocha, Joaquim Raimundo Amado, Latino Nunes Ferreira, Antonio Goncalves da Silveira, Manuel Ferreira da Rocha e Bruno Renato Ferreira da Rocha, foi substituido inteiramente pelo constante dos artigos seguintes :

Artigo 1º

A sociedade continua a adoptar a firma Rocha, Amado & Latino, Limitada, a ter a sua sede em Lisboa, estabelecimento principal na Rua Nova do Almada, 18 e 15, e outros estabelecimentos na Rua da Boa Vista, 54, e Rua da Prata, 84, nesta mesma cidade.»


1964


Medalha comemorativa dos 94 anos de existência em 1974

Em 23 de Maio de 1986, com a publicação no DR da alteração parcial do pacto social da empresa de construções "OPCA - Nova Organização de Obras Públicas e Cimento Armado, Lda.", com sede na Avenida Marechal Gomes da Costa, em Lisboa, fica-se a saber que a "Rocha , Amado & Latino, Lda." tinha uma participação de 57.255$00, no capital social desta empresa, nessa data.

A firma "Rocha, Amado & Latino, Lda", então sediada na Rua da Boavista, em Lisboa, viria ser liquidada e dissolvida ao fim de 129 anos de existência, a 20 de Outubro de 2009.

Em Outubro de 2011, o panorama das lojas de ferragens na Baixa lisboeta, e segundo um artigo do "Gabinete de Estudos Olissiponenses" da autoria de Guilherme Pereira, e que passo a transcrever, era o seguinte:

«São 9 lojas de 8 firmas com 38 pessoas ao serviço. Destas 8 empresas uma data de 1836, três de 1921 ou 1922, duas de 1946 ou 1948, outra de 1970 e a mais recente de 2011. Cinco mantêm-se na mesma família sendo que três são em 3ª geração e duas em 2ª geração. Duas delas com 90 ou mais anos, mudaram de proprietários nos anos 1990. Todas elas fizeram alguma remodelação nos anos 80 e 90 para o auto-serviço e para a oferta de ferramentas eléctricas, uma novidade na época. Até aí a loja de ferragens tipo era um armazém comprido, com uma balança e as paredes todas revestidas de caixas em madeira, das quais pendia como amostra a respectiva peça. Hoje só uma é que ainda  se mostra assim, a Silmosi, as outras alteraram essa apresentação, senão na íntegra pelo menos parcialmente. (…)
Se 8 destes 9 estabelecimentos estão concentrados na Baixa poente - R.Fanqueiros, R.Madalena, Poço do Borratém, mais existem na R. Boavista e no Conde Barão, tradicionalmente zonas deste tipo de comércio de máquinas e ferramentas. São estabelecimentos de espaço diminuto a médio - pois os grandes armazéns, as grandes firmas foram fechando ao longo do último quartel do século XX acompanhando a desindustrialização da capital: JB Fernandes; Senna, Botto & Leitão; Horácio Alves; Rocha, Amado e Latino Lda.  (R.Prata e R.Nª Almada); Teixeira Lopes & Neves; Francisco José Simões, J.Pinto Coelho (na Boa Hora), Sociedade Aços e Metais.»

A mencionar: "Loja de Ferragens José M. de Almeida Duarte" - 1836 (Calçada do Combro); "Costa & Costa, Lda." - 1922 (R. João das Regras); "Casa Guedes" - 1922 (R. Portas de Sº Antão); "Silmosi" - 1946 (Rua da Conceição); "Ferragens G. Lemos, Lda." - 1948 (R. da Madalena); "Mundo das Ferramentas" - 1970 (R. João das Regras; "Caromel" - 1996 (R. do Comércio); "Brilhipotencia" - 2011 (R. de S. Paulo).

fotos in: Hemeroteca Digital de Lisboa

13 de novembro de 2024

E-book "Chiado" Séculos XIX e XX - VOL II

Já se encontra disponível para download e consulta gratuitos, o segundo volume da trilogia "Chiado"  Séculos XIX e XX .

Relembro que este faz parte de uma trilogia com o mesmo título, com os restantes VOL I (já publicado) e VOL III a ser publicado em 11 de Dezembro deste ano 2024, e que totalizarão 122 artigos históricos em 547 páginas.

«Trata-se de uma colectânea de 122 artigos históricos, já publicados neste blog ao longo dos quinze anos de existência, e referentes a variados equipamentos que existiram, ou ainda existem, na zona do Chiado. A distribuição pelos três e-books será por ordem alfabética - VOL I : de A a E;  VOL II : de F a M;  VOL III : de O a Y. Os temas serão: Hotéis, Teatros, Restaurantes, Lojas, Cinemas, Bares e Boites, Cafés, Grandes Armazéns, Livrarias, Tipografias, Instrumentos Musicais, etc.
A zona abrangida pelos três e-books inclui; Rua do Carmo, Rua Nova do Almada, Rua Garrett (e suas ruas transversais), Praça Luiz de Camões, Rua do Alecrim (até ao Largo Barão de Quintella) e Rua da Misericórdia.
Como sempre nada de profissional, mas de boa vontade ...»

Para aceder ao e-book VOL II, a fim de uma simples consulta ou para guardar em formato PDF, bastará clicar na figura seguinte.


Clicar na imagem para consulta e download gratuitos (26 MB)




Para quem quiser consultar ou fazer o download do VOL I, clicar na imagem seguinte. Além desta via poderá, em qualquer altura, aceder a estes e-books (livros), e outros já publicados, na barra de menus deste blog.


Clicar na imagem para download e consulta gratuitos (30 MB)


Lembro que, o segundo volume (VOL IIIdesta trilogia será disponibilizado no dia 11 de Dezembro próximo.




Com 40 artigos históricos ao longo de 168 páginas, o "Chiado"  Séculos XIX e XX - VOL III , terá o seguinte índice ...


Clicar para ampliar

10 de novembro de 2024

Farmácia Franco

A "Pharmacia Franco" teve a sua origem na botica fundada em 1821 por Ignacio Jose Franco (1797-1864), natural de Turcifal-Torres Vedras, na, então, Rua Direita de Belém (actual Rua de Belém desde 1890), em Lisboa. Seu filho, Pedro Augusto Franco (1833-1902), depois de adquirir umas casa velhas, que até 1834 tinham sido as "mercearias" de Belém, e vizinhas onde a botica de seu pai estava instalada demoliu-as quase por completo e no seu lugar construiu, entre 1881 e 1884, um grande edifício onde realojou a "Pharmacia Franco". «Ainda hoje num pátio interior, com serventia pela Farmácia Franco, sobre um arco antigo, existe uma lápide que reza: "Mercearias da Rainha D. Catarina, que Deus tem, instituída para 20 cavaleiros de África. Em Maio de 1619". A data é da reconstrução da casa, pois a fundadora morreu em 1578.» in: Peregrinações - Volume IX - Norberto de Araújo (1939).


"Pharmacia Franco, Filhos" ao centro da foto de 1916




"Pharmacia Franco, Filhos" na 1ª loja do 1º edifício de 2 andares à direita na foto


24 de Março de 1843


Interior da "Pharmacia Franco, Filhos"

Pedro Augusto Franco, (1833-1902) além de farmacêutico e proprietário, foi presidente da Câmara Municipal de Lisboa entre 2 de Janeiro de 1894 e 15 de Fevereiro de 1897, presidente da Junta do Crédito Público - e por inerência foi nomeado presidente da "Caixa Geral de Depósitos" (fundada em 1876) em 1881, cargo que exerceu até 1892 -, famoso influente eleitoral progressista, várias vezes Deputado por Belém, Par do Reino. A 17 de Fevereiro de 1887, foi feito 1º Conde do Restello, pelo Rei D. Luiz I (1838-1889).


Pedro Augusto Franco, (1833-1902) - 1º Conde do Restello


1865

Em 1835, na botica do "Hospital de S. José", foi criada a  primeira associação especificamente farmacêutica, a Sociedade Farmacêutica Lusitana. Em  1836, nasceu o ensino superior farmacêutico, com a criação das Escolas de Farmácia anexas à Faculdade  de Medicina da Universidade de Coimbra e às Escolas Médico-Cirúrgicas de Lisboa e Porto. Mas também foi mantido o antigo acesso à profissão, através de um exame final realizado na Faculdade e nas Escolas Médico-Cirúrgicas após oito anos de prática numa farmácia, havendo assim duas categorias de farmacêuticos, de 1.ª e de 2.ª classe. Esta distinção vigoraria até 1902, ano em que se  determinou por lei a obrigação de todos os candidatos a farmacêuticos, frequentarem o Curso de Farmácia.

A Indústria Farmacêutica despontou em Portugal no último quartel do século XIX, não obstante a existência prévia das oficinas de farmácia e do papel pioneiro desempenhado, entre outros, pelos farmacêuticos Manuel Vicente de Jesus (1825-1889) com farmácia no Largo do Rato, 23, celebrizado pelas suas pílulas de proto-iodureto de ferro, e Pedro Augusto Franco, da "Pharmacia Franco", famoso pelo popular "Vinho nutritivo de carne" , que aparece publicitado pela primeira vez no "Diário do Governo" de 4 de Julho de 1885. Este vinho veio a revelar-se uma das primeiras áreas industriais a desenvolver-se no campo da farmácia em Portugal.

30 de Dezembro de 1866


1878


4 de Julho de 1885

No communicado seguinte de 30 de Outubro de 1856, pode-se observar as principais pharmacias (ou boticas) de Lisboa.


30 de Outubro de 1856

As origens da fase industrial encontram-se intimamente ligadas à criação da "Companhia Portuguesa Higiene" (CPH) - futura "Farmácia Estácio", que representou o primeiro investimento de monta na Indústria Farmacêutica em Portugal, tendo contado com capital angariado fora deste sector e com a colaboração de um conjunto de médicos, farmacêuticos e comerciantes de drogas. Após o progresso científico verificado no séc. XIX, os medicamentos começaram a ser preparados nas fábricas, que surgiram do prolongamento dos laboratórios das pequenas farmácias de oficina. A indústria farmacêutica em Portugal, começou a desenvolver-se a partir de 1890.

Interior da pharmacia da "Companhia Portuguesa Higiene", na Parça D. Pedro V (Rossio)

O fundador da "Pharmacia Franco", Ignacio Jose Franco morre em 19 de Abril de 1864, e a propriedade da mesma passa para a posse de seu filho Pedro Augusto Franco (1º Conde do Restelo). Dez anos mais tarde, a partir de 20 de Abril de 1876, o filho deste, Ignacio Jose Franco (2º Conde do Restelo e com o mesmo nome de seu avô), apesar de exercer o cargo de "Deputado da Nação" (entre 1865-1931), ficou à frente da farmácia praticando «a arte pharmaceutica, manipulação de medicamentos e aviando receitas» desde 20 de Abril de 1876. Pedro Augusto Franco foi considerado como um dos pioneiros da indústria farmacêutica. tendo sido responsável pela produção de diversas especialidades farmacêuticas com reconhecimento no mercado nacional e, mais tarde, internacional. A sua fábrica estava instalada na Estrada do Dafundo e já seria farmacêutico industrial antes de 1861, uma vez que  já nesse ano foi premiado com Medalha de Prata na exposição da "Associação Industrial Portuense".


19 de Abril de 1864


4 de Maio de 1885

Entre as suas especialidades contam-se alguns nomes tais como o "Xarope peitoral de James", contra a tosse e a "Farinha peitoral ferruginosa", contra a debilidade. O escritor Eça de Queiroz faz uma alusão ao famoso "Xarope peitoral de James" na sua obra publicada em 1900,  “A ilustre Casa de Ramires”: «Organizar, com estrondo, o reclamo de Portugal, de modo que todos o conheçam - ao menos como se conhece o Xarope Peitoral de James, hem? E que todos o adotem - ao menos como se adotou o sabão do Congo, hem?» . 

25 de Dezembro de 1864



9 de Outubro de 1886

Contudo, terá sido o "Vinho Nutritivo de Carne" o grande sucesso comercial da "Pharmacia Franco" uma vez que, que como dizia o rótulo do produto, “um cálix d’este vinho representa um bom bife”. De referir que nesta farmácia dava consultas o médico Dr. Antônio de Azevedo Meirelles.

Carta de 9 de Março de 1905


Dezembro de 1907


1909

Mas eis que no dia 28 de Fevereiro de 1904, na sequência de mais um treino, 24 jovens assumiram a formação de um novo clube, o "Sport Lisboa". O acontecimento teve lugar durante uma reunião realizada na, já, "Pharmacia Franco, Filhos", no decorrer da qual foi constituída uma "Comissão Administrativa", presidida pelo mais velho dos Catataus - José Rosa Rodrigues -, ficando a sede e a secretaria instaladas provisoriamente no mesmo local. Manuel Gourlade, tesoureiro do clube, empregado na farmácia e ligado ao grupo dos Catataus, torna-se um elemento influente na dinâmica do novo clube, quer intervindo na componente administrativa, quer na parte técnica - orientando a preparação dos jogadores e adquirindo material de futebol (bolas, apitos, regras de jogo, etc.). Como é do conhecimento dos aficionados, em Setembro de 1908 o "Sport Lisboa" e o "Sport Club de Benfica" (fundado em 26 de Julho de 1906), fundiram-se e deram origem ao "Sport Lisboa e Benfica".

 

Documento da fundação do "Sport Lisboa" em 1904 e primeiro emblema do SLB em 1908

Não sei quando terá encerrado definitivamente a "Farmácia Franco". A última referência publicitária a que consegui ter acesso data de 30 de Junho de 1927 ... No lugar da farmácia, uma agência da "Caixa Geral de Depósitos" (talvez à memória de Pedro Franco, um dos seus Presidentes entre 1881 e 1892 e um dos proprietários da "Pharmacia Franco" ... Quanto à "Pensão Setubalense", que existe desde o início do século XX no mesmo edifício da farmácia, lá continua a funcionar. Mais de 120 anos de existência, já vai sendo raro ...

25 de Dezembro de 1913

 

24 de Dezembro de 1926


30 de Junho de 1927

Agência da "Caixa Geral de Depósitos" no lugar da "Pharmacia Franco, Filhos", e lápide alusiva à fundação do "Sport Lisboa e Benfica"

fotos in: Hemeroteca Digital de LisboaArquivo Municipal de LisboaBiblioteca Nacional Digital, DIGIGOV, Em Defesa do Benfica, A Minha Chama