Restos de Colecção: Luvaria Ulisses

5 de junho de 2019

Luvaria Ulisses

A "Luvaria Ulisses", localizada na Rua do Carmo, em Lisboa, foi fundada em 1925 por Joaquim Rodrigues Simões, sendo, actualmente, uma das lojas mais pequenas e mais antigas da cidade.


Quanto ao nome "Ulisses" ...
«Separa o mundo do céu, as terras e os mares, por isso que ali acaba o litoral de Espanha, e em volta dela começa o oceano da Gália, e o limite setentrional, terminando ali o oceano Atlântico e o Ocidente. Diz-se, por isso, que Lisboa é uma cidade fundada por Ulisses.» José Augusto de Oliveira, trad. 1935 "Conquista de Lisboa aos Mouros" (1147), Lisboa, CML

A “Luvaria Ulisses” é um dos sete estabelecimentos que foram construídos, a partir de escavações para o efeito, na “Muralha do Carmo”. Esta forte barreira de alvenaria, foi construída após o terramoto de 1755, para consolidação do “Monte da Pedreira”, junto às ruínas do Convento do Carmo, e que inicialmente se estendia para Norte até à Rua do Príncipe, actual Rua 1º de Dezembro.

Muralha do Carmo, à direita na foto


Em 1901 abrem as lojas até ao número 87, inclusive, até 1917 altura em que o o comerciante Joaquim Rodrigues Simões - que integrou o executivo camarário entre 1919 e 1923 - requer autorização para construir estabelecimentos na parte ainda desaproveitada da Muralha. Pelo que em 1920  é submetido à Câmara um projecto onde se pretende construir na parte livre, três estabelecimentos, compostos de loja e sobre-loja; o Ministério das Obras Públicas aprova o projecto do engenheiro Artur Cohen, para na então parte cega da muralha se abrirem estabelecimentos, visto reconhecer-se que a iniciativa não punha em perigo a muralha. As obras durariam 4 anos, pelas dificuldades na perfuração; verificou-se que além da Muralha, que é dentada pelo lado interior, agarrando-se assim à estrutura dos terrenos. O engenheiro Domingos Mesquita dirigiu a construção no que respeita a cimento armado, sendo toda a obra finalizada por parte do Estado, pelo engenheiro Valério Vilaça.

Planta de 1882


Durante o cortejo camoniano incluído nas Festas da Cidade, em Junho de 1913


Finalmente, em 1924 instalam-se na “Muralha do Carmo” a “Casa Atlas” (n.º 87-D), a Companhia “Wagons-Lits” (n.º 87 C); “Ourivesaria Raúl Pereira & C.ª, Ltda.”, (n.º 87-B) - actual "Joalharia do Carmo" - e a Joaquim Rodrigues Simões é dada a concessão da loja com o nº 87-A, pelo prazo de 25 anos, onde depois de manter apenas um escritório na sobre-loja, abriria, no espaço que servia exclusivamente de entrada para a mesma, a “Luvaria Ulisses” em 1925, cabendo à Fazenda Pública 20 % das rendas das lojas da Muralha.

Da esquerda para a direita: "Luvaria Ulisses", “Ourivesaria Raúl Pereira & C.ª, Ltda.”, "Wagons-Lits", "Casa Atlas"


O interior da "Luvaria Ulisses", com traça estilo "Império", foi da autoria de Carlos de Alcântara Knotz, mestre entalhador da extinta, e famosa, casa de móveis e decorações "Barbosa & Costa, Lda." localizada no Largo Rafael Bordalo Pinheiro. Quanto ao seu exterior, com a sua fachada em cantaria seguindo as linhas neoclássicas foi projectada pelo Engº Arthur Guilherme Rodrigues Cohen.


Em 1940 o seu proprietário, Joaquim Rodrigues Simões, abriria uma pequena fábrica de confecção de luvas, na Rua dos Correeiros. Em 1949 Artur Mendes, antigo funcionário desta loja entrava para a sociedade, vindo a falecer em 1977.

Seria na década de 70 do século XX que Carlos Carvalho entraria para a "Luvaria Ulisses" como funcionário e mais tarde tornar-se-ia sócio da firma proprietária, cargo que mantém actualmente.





No site desta loja pode-se ler:
«A decoração da loja, que permanece intacta desde a sua fundação, é constituída por móveis de inspiração império, que se coadunam harmoniosamente com a fachada neoclássica.
A Luvaria Ulisses, última casa em Portugal com venda exclusiva de luvas, que desde os primeiros tempos teve como clientes a elite política, cultural e artística da cidade, mantém-se nos nossos dias fiel aos princípios que a nortearam.
A produção conta com uma equipa de profissionais altamente qualificados, mantendo-se todos os processos de fabricação inalterados, sendo a componente artesanal predominante. As diversas pelarias são de primeira qualidade, fruto de uma permanente pesquisa do que de melhor se nos oferece a nível mundial, o design distingue-se entre o clássico e o sport wear, indo ao encontro das exigências da nova geração.»

5 comentários:

LuisY disse...

A Luvaria Ulisses é de facto um mimo, um pormenor de requinte, herdado dos tempos em que a zona do Chiado era a mais chique de Lisboa. Nem sei como ainda resiste e não foi transformada numa casa de pasteis-de-mata. A gerência desta loja está de parabéns por mante-la activa e sempre com sucesso.

Um abraço

Clementine disse...

Amazing post with lots of informative and useful and amazing content. Well written and done!! Thanks for sharing keep posting.

Valdemar Silva disse...

Mas, fotografia mais alargada de que ano será?
Vê-se uma carroça, um automóvel de 1914-16 e mais perto da porta da Luvaria uma mulher vestida de preto, com saias até ao chão, que seria uma cigana ou a imagem é dos anos 191_, nos anos vinte as mulheres já não se vestiam assim.

Valdemar Silva

José Leite disse...

Caro Valdemar Silva

A fotografia é entre 1924 e finais de 1925, já que a "Ourivesaria Raúl Pereira & Cª., Lda." (futura "Joalharia do Carmo" a partir de 1925), ao lado da "Luvaria Ulisses" que abriu em 1925, foi inaugurada em 1926.

Cumprimentos

Valdemar Silva disse...

Obrigado, Sr. José Leite
A minha confusão/admiração foi com a vestimenta da mulher e, no caso de ser uma cigana, andar a 'passear' na Rua do Carmo, em 1925.

Cumprimentos
Valdemar Silva