Restos de Colecção: Grande Bazar Suisso

23 de outubro de 2024

Grande Bazar Suisso

O "Grande Bazar Suisso" de "C. Barella & Irmão", abriu pela primeira vez na Rua do Chiado (Rua Garrett) em 1866, e era uma das lojas de espelhos, molduras e bijuterias das mais elegantes e mais ricas de Lisboa. Pertencia aos irmãos Celestino e Albino Barella, dois irmãos suíços que já viviam há muitos anos em Lisboa, muito simpáticos, muito trabalhadores e muito empreendedores.

"Grande Bazar Suisso" à direita (na foto) da "Pastelaria Marques"


Edifício do "Grande Bazar Suisso" na área delimitada (2 primeiras portas de quem sobe)

Celestino Barella tinha iniciado a sua actividade comercial, em Janeiro de 1866 numa pequena e modestíssima lojinha - "Officina de Dourador e Deposito d'Estampas de Celestino Barella" - na rua Nova do Almada, 39-41, e mais tarde, em 1868 já no nos 4 e 6 da Rua Nova do Carmo,  chegou com seu irmão Albino Barella, à força de trabalho e de perseverança, à luxuosa loja do Chiado, que faria boa figura ao pé das mais elegantes e bem fornecidos de qualquer grande cidade da Europa. 



Loja de Celestino Barella na Rua Nova do Carmo (dentro da elipse desenhada)

Os principais produtos e serviços comercializados pelo "Grande Bazar Suisso" eram os seguintes: Molduras, gravuras, fotografias, desenhos, oleografias, imagens religiosas, fornecimento para douradores e belas artes, vidros polidos para montras, aço em vidro para espelhos, álbuns, passepartouts, estereoscópios, visitas, galerias e baguetes para tapeçaria.

Quanto ao percurso dos dois irmãos Celestino e Albino Barella, o jornal "Diário Illustrado", em 19 de Novembro de 1889, referia-se-lhes do seguinte modo:

«Celestino Barella e seu irmão Albino Barella, são naturaes da Suissa, do cantão Ricino. Vieram para Portugal ha bastantes annos, estabelecendo-se pela primeira vez com loja de estampas e molduras na rua do Poco dos Negros. Mais tarde passavam para a rua do Loreto, onde hoje se acha a padaria Benard.
Foram sempre homens energicos, incansaveis no seu trabalho de douradores. A sorte favoreceu-os por muito tempo, e mais tarde iamos encontral-os na rua Nova do Carmo, onde ainda hoje existe a succursal do grande "Bazar Suisso" que foi pasto das chammas, e que abriu havera uns oito annos.
Foi esta a segunda vez que aquella familia soffreu com o incendio. Da primeira vez foi quando residiam na sobreloja, onde hoje mora o sr. Alfredo Keil, d'um predio que foi devorado por um fogo, e mais tarde reconstruido. Dois filhos de Celestino Barella falleceram em resultado de susto d'esse fogo.

 

0 sr. Celestino Barella, que deve ter uns cincoenta annos, é casado com a sr.ª D Rosa Barella, tendo d'este consorcio cinco filhos, dos quaes se conservam vivos tres. Foi depois do fogo da rua do Crucifixo que tomou a casa do Chiado onde estabeleceu o Bazar Suisso, e no qual deu sociedade a seu irmão.
0 sr. Albino Barella é solteiro e tem pouco mais de quarenta annos. Fazemos votos porque estes dois homens sympathicos e trabalhadores vençam a fatalidade que os prostrou enfermos, e que em breve os vejamos restituidos á sua actividade moral, por agora tão bruscamente interrompida.»  

No "Diário de Noticias"  de 23 de Dezembro de 1897 podia-se ler:

«Estamos na semana do Natal e já se nota por toda a parte um ar de festa nos templos da gastronomia e da elegancia; no vasto armazem de viveres do Martins, na sumptuosa ourivesaria Leitão, na rescendente e apetitosa loja do Ferrari, nos graciosos armazens de bijouterias do. Barella, do Benard e do Pexe. Em todas as ruas as vitrines apparecem engalanadas com quanto póde desafiar o apetite material ou a curiosidade do espirito. Brinquedos para creanças, joias . para mulheres, objectos delicados para os amadores da arte, tentações para todas as edades, iguarias para todos os paladares, deslumbramentos para todas as pupillas.»

Celestino Barella ainda manteve, até ao final do século XIX, uma papelaria nas suas primitivas instalações da Rua Nova do Carmo, nos 4 e 6.

Como foi referido anteriormente, em 14 de Novembro de 1889 deu-se uma explosão no "Grande Bazar Suisso", cujo excerto da reportagem do "Diário Illustrado" do dia seguinte, transcrevo:

« (…) No predio a que acima alludimos estava estabelecido o Bazar Suisso, que occupava os n.° 66 a 72, e era pertencente aos sr.s Barella & Irmão, uma conhecida casa, em frente dos Martyres, distincta por ser um dos mais bonitos estabelecimentos do Chiado. A porta d'escada de serventia do predio é o n.° 74. Os n.0s 76 e 78 eram os da luvaria Benard.
Aproximava se o anoitecer, e tinham-se accendido os candieiros do estabelecimento, faltando o da montra, onde ha dias os operarios da nova companhia tinham mettido encanamento. Quando o moço ia com a vela para accender o bico do candieiro deu-se uma medonha explosão de gaz extravasado. A violencia foi tal que as vidraças dos predios e estabelecimentos que mais proximos lhe ficavam de frente foram feitas em pedaços.
O fogo, arruinando todo o Bazar Suisso, do qual nada se salvou, passou rapido, como dissemos, ao 1.° andar. Estava ahi estabelecido o Turf-Club, que ha pouco se mudára da sua antiga casa fronteira á rua de S. Francisco.
O 2.° andar era habitado pelos proprietarios do Bazar Suisso, os srs Barellas, e as aguas furtadas tambem lhes pertenciam. O prejuizo em todos esses andares foi quasi completo, porque os salvados sao insignificantes.
Quando se deu a explosão achavam-se no estabelecimento os proprietarios, irmãos Barellas, o caixeiro Alexandre Leuzinger, Mannel Lourenco y Martinez, dourador da casa, a sr.ª D. Rosa Barella, e o moço de nome Lourenço. O dourador Martinez foi arremessado ao outro lado da rua, indo cair sobre o passeio, ficando gravemente ferido. O sr. Albino Barella ficou muito queimado e ferido na cabeça, e uma fractura na bacia. O sr. Celestino Barella, irmão d'aquelle, ficou muito contuso. A sr.a D. Rosa Barella ficou ferida no braço direito. O moço Lourenço ficou ferido na cabeça, rosto e mãos. O dourador foi conduzido ao hospital; não é grave o seu estado. O sr. Albino Barella também para ali foi conduzido e acha-se no quarto n.° 1, particular, de 1ª classe. O seu estado é gravissimo, cremos mesmo que desesperado. O sr. Celestino recebeu curativo na pharmacia Durão, que forneceu medicamentos a todos os feridos e onde se achavam prestando soccorros os srs. drs. Salvador, Brito, Azevedo, Joyce, Stromp, Rivotti e Fragoso Tavares. N'essa pharmacia foi tambem curada a sr.a D. Rosa Barella e o moço Lourenço.»


Na revista "Occidente" de 21 de Novembro de 1889


24 de Dezembro de 1889

Contudo, 3 dias depois a 17 de Novembro o mesmo jornal noticiava: 

«0 sr. D. Francisco de Almeida já recebeu da companhia Fidelidade 35:000$000 réis do seguro do predio incendiado; o Turf Club recebeu 6:000$000, e todos os outros segurados já liquidaram os seus seguros com a mesma companhia.
No commissariado da 2.ª divsão levanta-se um auto de investigação sobre as causas do sinistro.»

Do palácio onde havia vivido o Marquês de Nisa, e que então pertencia a D.  Francisco de Almeida, - que tinha albergado o "Grande Hotel de João da Matta" entre 1871e 1873 - restaram apenas as paredes exteriores, tendo desabado a abóbada existente entre a sobreloja e o primeiro andar. Aí, os irmãos Barella perderam sua magnifica casa onde tudo começou, mas também a sua habitação, no 2º piso, como aliás, tinham perdido, alguns anos antes, o espaço onde habitavam, na rua do Crucifixo, num outro incêndio que matou dois elementos da família. Com danos, mas recuperáveis, ficou a sede do jornal "O Dia", paredes meias com o palácio. Casos também da luvaria de Adolfo Malbomisson, os armazéns de modas de "Carvalho e Cª ", "Arsénio e C.ª ", a chapelaria de Augusto Ribeiro e o estabelecimento de máquinas e relógios de Carlos Silva, entre outros.

O "Grande Bazar Suisso", dos irmãos Barella, reabriria em 25 de abril de 1891 e manteve a sua atividade mais 20 anos, tendo encerrado, em definitivo, por altura da implantação da República, em 5 de Outubro de 1910. Entretanto, Celestino Barella tinha falecido em Novembro de 1894. 


23 de Abril de 1891


1898



19 de Dezembro de 1900

De referir, ainda, que Celestino e Albino Barella tinham outro irmão Carlos Prospero Barella, que era farmacêutico e que tinha a "Pharmacia Barella" na Rua do Loreto, 71.

No lugar do estabelecimento "C. Barella & Irmão" instalou-se, em Dezembro de 1910, a loja "Jardim de Lisboa" da firma "J. Peixinho, Lda." (que tinha começado na Rua do Carmo, 49), abrindo no início de 1911. Esta, quando se mudou para o nº 61, por volta de 1915, viria a dar lugar a outra loja de flores e plantas, a "Lopes, Limitada", a que se seguiu a "Marques & C.ª" - Alfaiates e Camiseiros, a "Saboia", etc.


"Jardim de Lisboa" da firma "J. Peixinho, Lda." em fotos de 8 de Julho de 1912


Flores e Plantas "Lopes, Limitada"

Sem comentários: