Restos de Colecção: Discoteca Melodia e Rádio Triunfo

5 de agosto de 2018

Discoteca Melodia e Rádio Triunfo

A terceira discoteca “Melodia”, propriedade da "Rádio Triunfo, Lda. - Fábrica Portuguesa de Discos", foi inaugurada na Rua do Carmo, em Lisboa, em 14 de Julho de 1962. Outras nessa rua já existiam na altura, como: “Sassetti & C.ª”, desde 1848; “Custódio Cardoso Pereira & C.ª”, desde 4 de Março de 1893;  “Discoteca do Carmo”, desde 28 de Fevereiro de 1957; Discoteca Universal”, desde 2 de Dezembro de 1957.

A primeira “Melodia” tinha aberto em 1957, na Rua de Santa Catarina, no Porto, à que se seguiu a segunda, na Rua de Santo António que abriu em 1961, também no Porto.

Discoteca “Melodia” à esquerda nas fotos seguintes

 

A discoteca “Melodia” em construção e anúncio da sua abertura

          

«Abre hoje as suas portas ao público de Lisboa, em plena zona do Chiado (na Rua do Carmo) um novo e modelar estabelecimento de discos. Trata-se de uma das maiores casas da Península no seu género, onde se pode admirar uma montra de dimensões verdadeiramente gigantes. "Melodia" - assim se chama o novo centro do disco de Lisboa - deve-se à iniciativa feliz da Rádio Triunfo, do Porto, a editora da já popular etiqueta Alvorada».

Foto retirada da capa de um EP de Filipe de Brito e editado pela etiqueta “Tecla”

A "Rádio Triunfo, Lda. - Fábrica Portuguesa de Discos", foi fundada na cidade do Porto em 23 de Março de 1946, por Rogério Leal, José Cândido Silva e Manuel Lopes da Cruz. O seu objetco era a produção discográfica, tendo sido a pioneira em Portugal. Em 1947 inaugura a sua fábrica de discos em São Mamede de Infesta, Porto e lá funcionou até 1986.   Além de discos de 78 rpm, esta fábrica iniciou a produção de discos de 45 rpm. Em 1969, teria início a produção de discos esterofónicos em 33 rpm. Em 1982, o proprietário e fundador Rogério Leal faleceu e a fábrica foi adquirida por Arnaldo Trindade, proprietário da “Arnaldo Trindade & C.ª, Lda.” - etiqueta “Orfeu” - fundada em 1956, e José Marques Serafim.

«Foi comprada toda a maquinaria no estrangeiro e em pouco tempo estávamos a produzir os primeiros exemplares em 78 rotações", lembra Joaquim Sousa, antigo encarregado de manutenção. A gravação brasileira em banda magnética "História da Baratinha", foi o disco que marcou o arranque da produção desta nova unidade. Mas os discos em 78 rpm - composto de pó de ardósia, goma de laca e negro de fumo - tinham os dias contados com o aparecimento do vinil. No início dos anos 50, depois de adquirir novas máquinas, a “Fábrica Portuguesa de Discos” começou a colocar no mercado os 45 rotações (o primeiro a sair tinha a voz de João Villaret) e pouco mais tarde os LP (long play). «Sabe que só dois ou três anos depois é que a Valentim de Carvalho começou também a produzir discos. Mas enviou técnicos à nossa fábrica para observar como é que tudo se procedia», prosseguia Joaquim Sousa.

Quanto à qualidade do fabrico dos seus discos, vou reproduzir um comentário de um leitor publicado no blog “IÉ-IÉ”:

«A Rádio Triunfo é responsável por vários atentados à qualidade mínima que um produto musical, em disco, deve ter.
Quando lia a etiqueta, na capa dos discos, ficava logo desapontado. Tenho vários LP´s da Rádio Triunfo, com capas sempre piores que as originais, papelão com celofane mal colado, com imagens esborratadas e desmerecedor das imagens originais.
Os vinis, então, nem se fala. Mal prensados, mal produzidos, com um som, muitas vezes atrás do original. Enfim, não sei que mais dizer de mal da Rádio Triunfo, sem que lhe possa conceder benefícios de alguma qualidade.
Assim, só posso desejar um feliz repouso, à Rádio Triunfo»

 

 

Como já foi referido no início deste artigo, a sua primeira loja abriu em 1957, na Rua de Santa Catarina, à que se seguiu a segunda loja, na Rua de Santo António que abriu em 1961, ambas no Porto.

Enquanto que na cidade do Porto a "Rádio Triunfo, Lda.", utilizava os estúdios da "Emissora Nacional", em Vila Nova de Gaia, e a partir de 1965 os seus, localizados em São Mamede de Infesta, esta editora inauguraria, em 15 de Fevereiro de 1974, os seus estúdios de gravação, em Lisboa na Estrada da Luz e que os considerou como os melhores estúdios de gravação da Europa.

Estúdios da “Rádio Triunfo, Lda.” na Estrada da Luz

Por esta ocasião as revistas “Alvorada” de Fevereiro de 1974 e  “Flama” de 1 de Março de 1974 relatavam:

«Os novos estúdios (são efectivamente dois, um gigante, capaz de acolher uma orquestra sinfónica, com 11x12x5 metros, e outro mais pequeno, com 2,70x2,30x2,30 metros) oferecem à Rádio Triunfo a possibilidade de completar o ciclo do seu equipamento, o que a torna totalmente auto suficiente.»

«Dispondo de uma rede de distribuição nacional, de três estabelecimentos próprios (dois no Porto e um em Lisboa), da representação de mais de centena e meia de etiquetas de renome internacional, de edições musicais (Triunfo), de três fábricas actualizadíssimas (uma de prensagem, outra de matrizes e corte de acetatos e uma terceira de cartuchos e cassettes), além das instalações em Angola (Rua Luís de Camões, em Luanda, e Fadiang - Fábrica de Discos Angolana, em Silva Porto), e Moçambique (Somodiscos - Sociedade Moçambicana de Discos, em Lourenço Marques, Avenida Paiva de Andrade), o que lhe confere uma dimensão intercontinental, falatava à Rádio Triunfo o último elo da sua grande cadeia de produtora.» textos retirados do blogIÉ-IÉ”.

Concurso promovido pelos estabelecimentos “Melodia” em Junho de 1967 e envelope para disco

 


Esta empresa englobava as etiquetas "Alvorada", "Melodia", "Harmonia" e "RT". tendo tido no seu catálogo (pelo menos no início das suas carreiras) artistas como: Amália Rodrigues, Simone de Oliveira, Madalena Iglésias, Maria de Lourdes Resende, Carlos do Carmo, António Calvário, Tony de Matos, Fernando Farinha e José Afonso.

No início dos anos 70 do século XX, o poderoso Arnaldo Trindade, como referido anteriormente dono da “Arnaldo Trindade & C.ª, Lda.” que tinha a etiqueta “Orfeu”, compra a "Rádio Triunfo, Lda. - Fábrica Portuguesa de Discos", passando a representar a “WEA” e a “CBS”. Com o aparecimento do CD (compact disc) era necessário um investimento de um milhão de contos, em maquinaria para se atualizar, o que levou ao encerramento da “Rádio Triunfo, Lda. - Fábrica Portuguesa de Discos”, em 14 de Março de 1986. Sensivelmente na mesma altura, Arnaldo Trindade entregou a etiqueta “Orfeu” ao sócio lisboeta deixando, de vez, o mundo discográfico. Ficaria para a história como «um homem do vinil».

O que restou da Discoteca “Melodia” (onde está o bombeiro à esquerda na foto) no incêndio de 25 de Agosto de 1988

Mais tarde, todo o catalogo da “Arnaldo Trindade & C.ª. Lda.” incluindo todas as etiquetas da mesma, assim como todo o espólio da “Rádio Triunfo, Lda.” veio a ser integrado na “Movieplay Portuguesa”.

fotos in: Biblioteca de Arte-Fundação Calouste Gulbenkian (Estúdio Mário Novais), Hemeroteca Municipal de LisboaArquivo Municipal de Lisboa, IÉ-IÉ, Biblioteca Nacional de Portugal

3 comentários:

rmg disse...


Meu caro

Mais um excelente artigo sobre as discotecas de Lisboa.

Conheci bem todas e ainda sou cliente quase diário das poucas que ainda existem, ainda que na forma de "2ª mão", os colecionadores vão morrendo e os herdeiros não sendo apreciadores ou não tendo espaço desfazem-se do espólio pois hoje trazem toda a música do mundo no bolso.

Mas permita-me que lhe chame a atenção para algo que já uma vez tive a oportunidade de focar aqui.

A realidade é que transformar escudos de 1986 em euros de 2018 de forma "directa" não faz sentido e dá uma ideia incorrecta do que estava em causa (já não falando das diferenças nas estruturas de custos entre as duas épocas para não complicar desnecessáriamente).

Há uma actualização financeira a fazer e para além da tabela todos os anos emitida pelo
Ministério das Finanças para efeitos legais variados pode-se de forma prática utilizar a calculadora ao fundo desta página do link

https://www.pordata.pt/Portugal

Não sei exactamente em que ano a questão se terá posto mas se fizer algumas tentativas ali nos anos anteriores poderá verificar que estamos a falar de valores bem altos a "preços de 2018" e que, tendo coincidido com um período de inflações que chegaram a atingir os 30%, eram de facto muito dinheiro para começar "vida nova" num mercado modestíssimo como sempre foi o nosso.

Um abraço

RuiMG

José Leite disse...

Caro Rui

Grato pelo seu comentário.

Eu sei bem disso. Tinha colocado esse valor para apenas dar uma ideia do que significavam "contos" para os mais jovens.

Mas o Rui tem razão, e como "não há bela sem senão..." e para não induzir as pessoas em erro, no valor em si actual, já retirei essa adenda.

Os meus cumprimentos
José Leite

rmg disse...


Meu caro José Leite

Obrigado pela resposta.

Percebo agora a sua ideia, só estava eu a ver que aquele milhão de contos se fôsse de 1985 - por hipótese muito provável - seriam 25 milhões de hoje. muito dinheiro para arriscar…

Cumprimentos

RuiMG